PL 2630: O vírus das fake news e a liberdade de expressão

PL 2630: O vírus das fake news e a liberdade de expressão

Analisa os principais pontos críticos e positivos do PL 2630/2020 e suas divergências em relação ao Marco Civil da Internet e a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) vigentes no Brasil.

Neste artigo:
  • Introdução
  • Pontos críticos
  • Pontos positivos
  • Conclusão

Introdução

O Projeto de Lei (PL) 2630/2020, conhecido como Lei das Fake News, tem gerado intensos debates e controvérsias entre especialistas, políticos e a sociedade em geral. O projeto visa combater a disseminação de informações falsas e enganosas na internet e prevê uma série de medidas para responsabilizar as plataformas digitais e seus usuários por conteúdos ofensivos e desinformativos.

Neste artigo, serão pontuados os principais pontos críticos e positivos do PL 2630/2020 e suas divergências em relação ao Marco Civil da Internet e a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) vigentes no Brasil. Além disso, citarei também os principais pontos em relação a política de gênero e minorias.

Pontos críticos

  • Obrigatoriedade do fornecimento de dados pessoais: a obrigatoriedade de fornecimento de dados pessoais para a criação de contas em redes sociais pode ferir a privacidade dos usuários. O que pode gerar conflitos em relação à LGPD. 
  • O PL 2630/2020 não estabelece uma clara definição do que seriam os dados pessoais sensíveis, o que pode gerar incertezas em relação à proteção desses dados e violar a LGPD. Além disso, o projeto impõe penalidades às plataformas digitais que não cumprirem com as suas obrigações, o que pode gerar conflitos com o Marco Civil da Internet.
  • O projeto prevê a possibilidade de retirada de conteúdo das plataformas digitais sem ordem judicial, o que é positivo e acelera em casos, em que por exemplo, a informação esteja afetando à honra de alguém, mas é necessária que seja feita em dosagem correta para não se tornar censura uma restrição à liberdade de expressão, o que seria um ataque aos princípios estabelecidos no Marco Civil da Internet.
  • A possibilidade de judicialização excessiva: a criação de mecanismos de responsabilização das plataformas digitais pode gerar um aumento da judicialização e uma sobrecarga no sistema judiciário. Algo a ser levado em consideração.
  • Em seu artigo 7º temos uma grande problemática: O fim da publicidade direcionada previsto no Projeto de Lei 2630/2020, pode gerar alguns impactos negativos no ambiente digital. A publicidade direcionada é uma prática comum nas redes sociais e serviços de mensagens instantâneas, que consiste em coletar informações sobre o usuário, como idade, gênero, localização, interesses e comportamentos online, a fim de exibir anúncios personalizados com maior chance de serem relevantes para o usuário. Sabemos que se faz necessário limites, pois algumas empresas acabam fazendo um uso abusivo dessa ferramenta, porém, em contrapartida, não pode ser tão restringida. Afinal, essa prática é considerada importante para as empresas que desejam obter melhores resultados em suas campanhas publicitárias, e também para os usuários, que podem receber anúncios mais úteis e relevantes e com o fim da publicidade direcionada poderão ser gerados alguns problemas, como a redução na efetividade das campanhas publicitárias, o aumento nos custos de publicidade e a redução na oferta de serviços gratuitos online. Isso tudo levando em consideração o fato de que muitas empresas dependem da publicidade para monetizar seus serviços e isso poderá automaticamente gerar um certo impacto econômico no país. Portanto, é importante encontrar um equilíbrio entre a proteção dos dados pessoais dos usuários e a manutenção da publicidade direcionada, de forma a garantir que os usuários tenham controle sobre suas informações e que as empresas possam continuar a oferecer serviços relevantes e de qualidade.
  • Responsabilização excessiva das plataformas digitais: o projeto transfere para as plataformas digitais uma grande responsabilidade no combate às fake news, podendo gerar uma sobrecarga e inviabilizar a atuação dessas empresas no país.
  • Falta de clareza nas definições: algumas definições presentes no projeto, como a de "fake news", são vagas e imprecisas, o que pode gerar incertezas e dificuldades na sua aplicação.
  • Ausência de um debate amplo e democrático: a aprovação do projeto sem uma ampla discussão com a sociedade civil, os especialistas e os políticos pode gerar problemas de legitimidade e efetividade.
  • Riscos de vazamento de dados: a criação de um cadastro com informações sobre os usuários das redes sociais pode gerar riscos de vazamento de dados e de violação da privacidade.
  • Incompatibilidade com o Marco Civil da Internet e a LGPD: o projeto apresenta pontos que divergem do Marco Civil da Internet e da LGPD, gerando problemas de conflito normativo. 

Pontos positivos

  • O projeto prevê a responsabilização das plataformas digitais pela disseminação de informações falsas e desinformativas. 
  • O projeto prevê a criação de uma Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD), que terá a responsabilidade de fiscalizar e regulamentar a proteção de dados pessoais no país. Essa autoridade é prevista tanto na LGPD quanto no PL 2630/2020, o que pode ser visto como um ponto positivo em relação à convergência entre as duas leis. Mas, é necessário que esse órgão seja criado de forma independente e isento no que tange os interesses do governo ou das empresas das plataformas digitais, isso para que funcione de fato.
  • Transparência nas redes sociais: o projeto prevê a criação de mecanismos de transparência nas redes sociais, como a identificação de anunciantes e a divulgação de informações sobre os algoritmos utilizados para seleção de conteúdo. Essas medidas podem contribuir para a transparência e a responsabilidade das plataformas digitais em relação aos conteúdos divulgados.
  • Educação digital: o projeto prevê a criação de medidas de educação digital, visando conscientizar os usuários sobre o problema das fake news.
  • Fortalecimento da democracia: o combate às fake news é fundamental para o fortalecimento da democracia e a proteção dos direitos fundamentais.
  • Proteção do interesse público: o projeto tem como objetivo proteger o interesse público, uma vez que a disseminação de informações falsas e desinformativas pode gerar danos sociais, políticos e até econômicos.
  • Fortalecimento das eleições: o projeto visa fortalecer as eleições, combatendo a disseminação de fake news e a manipulação do debate público até mesmo combatendo o uso de robôs nas redes sociais. O projeto prevê a proibição do uso desses robôs.
  • Cooperação internacional: o projeto prevê a cooperação internacional para o combate às fake news, permitindo uma ação mais efetiva contra esse problema em escala global.
  • Criação de medidas preventivas: o projeto prevê a criação de medidas preventivas, visando evitar a disseminação de fake news e reduzir o impacto dessas informações sobre a sociedade.
  • Diálogo com as plataformas digitais: o projeto prevê o diálogo entre o poder público e as plataformas digitais, visando uma atuação conjunta no combate às fake news. 

O PL 2630/2020 também tem um capítulo específico que trata da proteção das minorias, reconhecendo a vulnerabilidade desses grupos no contexto da disseminação de informações falsas e desinformativas. Algumas das medidas previstas para a proteção das minorias são: 

  • Inclusão de representantes das minorias nos órgãos de transparência e accountability: o projeto prevê a inclusão de representantes das minorias nos órgãos criados para promover a transparência e a accountability das plataformas digitais. 
  • Proteção das identidades de gênero e orientação sexual: o projeto estabelece a proteção das identidades de gênero e orientação sexual, garantindo o respeito à diversidade e o combate à disseminação de informações discriminatórias. 
  • Fortalecimento das políticas de diversidade e inclusão nas plataformas digitais: o projeto estabelece a obrigatoriedade de as plataformas digitais implementarem políticas de diversidade e inclusão, visando combater a discriminação e promover a diversidade cultural e social. 
  • Combate à disseminação de discurso de ódio: o projeto prevê medidas para o combate à disseminação de discurso de ódio, incluindo a responsabilização das plataformas digitais pelo conteúdo que circula em suas redes. 
  • Proteção da privacidade das minorias: o projeto estabelece a proteção da privacidade das minorias, garantindo o respeito à intimidade e à vida privada desses grupos. 

É importante destacar que a proteção das minorias deve ser uma preocupação constante na discussão do PL 2630/2020, a fim de garantir que esses grupos não sejam ainda mais vulnerabilizados pela disseminação de informações falsas e desinformativas nas redes sociais.   

Para resumo de todas essas pontuações acima, escrevo que: O PL 2630/2020 é uma proposta que visa combater a disseminação de informações falsas e desinformativas na internet. Isso todos nós já sabemos, mas esse apresenta pontos críticos e diverge em determinados pontos em relação ao Marco Civil da Internet e a LGPD.

É fundamental que a discussão em torno do projeto seja ampla e democrática, envolvendo especialistas e entidades das áreas de tecnologia e do Direito, que por vezes acabam sendo deixados de lado, políticos e a sociedade em geral, para que se chegue a uma solução equilibrada, legítima e eficiente para o problema das fake news.

Além disso, é importante lembrar que o combate às fake news envolve a participação ativa de todos os setores da sociedade e a implementação de políticas públicas efetivas que promovam a transparência, a educação e a proteção dos direitos fundamentais.

É importante ressaltar que o PL 2630/2020 não deve ser visto como uma solução única e definitiva para o problema das famosas "fake news", já que a questão é complexa e envolve diversos fatores, como a educação da população, o fortalecimento da mídia independente e a regulamentação do financiamento de campanhas políticas.

O combate às fake news deve ser encarado como um processo contínuo, que envolve a participação ativa da sociedade. E, que para além disso, não seja usado como instrumento político, mas sim, para proteção da Democracia. Um projeto que não venha comprometer a liberdade de expressão e os direitos fundamentais dos cidadãos, mas que proteja os citados. Por isso, ressalto que se faz fundamental os debates em torno do projeto sejam amplos e democráticos para um projeto harmônico.  

Como vimos até aqui o PL 2630/2020 apresenta pontos positivos no que se refere ao combate às fake news, como a responsabilização de plataformas digitais e a criação de mecanismos de transparência e controle, mas também apresenta pontos críticos que precisam ser discutidos, como a obrigatoriedade do fornecimento de dados pessoais e a possibilidade de censura. É fundamental que se chegue a uma solução equilibrada e que promova a proteção dos direitos fundamentais e a transparência na internet.

É importante destacar que, mesmo com a pressa para aproveitar o momento para que esse seja aprovada por parte do legislativo federal, essa aprovação deve ser feita com cautela, a fim de evitar os pontos críticos apontados acima. É preciso assegurar que as medidas adotadas sejam proporcionais e efetivas, sem gerar excesso de responsabilização das plataformas digitais ou limitações à liberdade de expressão. A criação de um marco regulatório para as redes sociais é importante para proteger a democracia e os direitos fundamentais, mas deve ser feita com base em um debate amplo, democrático e transparente. 

Embora o PL 2630/20 seja uma importante ferramenta para combater a disseminação de informações falsas, incluindo as "deepfakes", essa ainda não é o suficiente para combater esse tipo de conteúdo de forma efetiva.

A DeepFake é uma ferramenta que utiliza recursos de inteligência artificial para substituir rostos em vídeos e imagens, imitando a voz e distorcendo o conteúdo das falas originais. Essa tecnologia está em constante evolução e é muito difícil detectar e remover todas as imagens ou vídeos deepfakes das redes sociais e serviços de mensagens instantâneas. Além disso, a legislação é insuficiente para lidar com situações complexas, como a criação de deepfakes com fins artísticos ou humorísticos, que não necessariamente têm o objetivo de prejudicar ou difamar pessoas ou instituições.

Portanto, é importante que além da legislação, as empresas de tecnologia invistam em soluções de inteligência artificial capazes de identificar deep fakes com maior precisão e rapidez, e que sejam capazes de desativá-las ou retirá-las das plataformas. Também é fundamental que os usuários de redes sociais e serviços de mensagens instantâneas desenvolvam o senso crítico para identificar conteúdos falsos e manipulados, a fim de evitar a propagação desses conteúdos. Em resumo, a Lei 2630/20 é um importante passo no combate às deepfakes, mas é necessário que haja um esforço conjunto entre empresas de tecnologia, legisladores e usuários para combater efetivamente esse tipo de conteúdo. 

Conclusão

Diante dos desafios impostos pelas fake news, a sociedade democrática se encontra em um momento crucial de repensar as suas bases e garantir a transparência e a lisura dos processos eleitorais e de tomada de decisão.

Nesse contexto, o PL 2630/2020, conhecido como Lei das Fake News, apresenta-se como uma importante medida para o enfrentamento desse problema. O projeto de lei, em sua essência, visa estabelecer mecanismos de responsabilização dos provedores de redes sociais e de mensagens por conteúdos falsos e enganosos divulgados em suas plataformas, sem comprometer a liberdade de expressão e a privacidade dos usuários.

No entanto, como em qualquer proposta legislativa, há questões controversas e que demandam um amplo debate público e aprofundamento técnico, como o papel das autoridades reguladoras, a definição precisa dos termos utilizados na lei e a possibilidade de utilização indevida das regras para fins políticos. É preciso garantir que a democracia seja fortalecida e aprimorada, sem que isso signifique uma restrição indevida aos direitos fundamentais.

Em suma, o combate às fake news é um desafio que requer esforços conjuntos da sociedade, das instituições públicas e das empresas privadas, visando garantir um ambiente informacional saudável e transparente. Deve ser acompanhado de uma ampla e plural discussão e aprimoramento técnico para que seja eficaz e respeite os princípios democráticos e constitucionais.

As fakes news são como vírus que se espalham rapidamente, contaminando a sociedade e minando a nossa capacidade de distinguir o certo do errado. Combatê-las é uma questão de saúde pública para a democracia.

Mas, precisamos pontuar o equilíbrio entre a democracia e o combate às fake news, pois a liberdade de expressão deve ser protegida, mas não pode ser usada como justificativa para espalhar mentiras e manipular a opinião pública. Devemos garantir a informação verídica como base para a tomada de decisões democráticas.

Sobre o(a) autor(a)
Isabella Trevisani
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