A prisão preventiva e a sua utilização abusiva: o impacto nos direitos fundamentais
A prisão preventiva é uma medida cautelar com objetivo de garantir a ordem pública. O uso excessivo tem gerado preocupação quanto ao respeito aos direitos fundamentais dos indivíduos envolvidos.
- Introdução
- 1. Prisão preventiva e seus fundamentos
- 2. Utilização abusiva da prisão preventiva no Brasil e os dados estatísticos
- 3. O impacto da prisão preventiva nos direitos fundamentais do acusado
- 4. Identificação de critérios adequados para a aplicação da prisão preventiva
- 5. Entendimento dos tribunais brasileiros em relação ao tema
- Conclusão
- Referências
Introdução
A prisão preventiva é uma medida cautelar prevista no Código de Processo Penal brasileiro, que tem por finalidade assegurar a ordem pública, a aplicação da lei penal e a garantia da instrução criminal. No entanto, em muitos casos, essa medida tem sido utilizada de forma abusiva, resultando em violações de direitos fundamentais, como a liberdade, a presunção de inocência e o devido processo legal.
A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5º, prevê uma série de direitos fundamentais que devem ser garantidos a todos os cidadãos brasileiros. A prisão preventiva, quando utilizada de forma abusiva, pode comprometer seriamente a garantia desses direitos, tornando-se uma ferramenta de repressão ao invés de um instrumento de proteção social.
O abuso da prisão preventiva no Brasil é uma realidade alarmante, e que afeta principalmente a população mais vulnerável. Dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) indicam que cerca de 41% da população carcerária brasileira é composta por presos provisórios, ou seja, pessoas que ainda não foram condenadas em definitivo. Isso demonstra a utilização excessiva da prisão preventiva como uma forma de punir antecipadamente pessoas que ainda não foram julgadas.
Além disso, a falta de critérios claros para a sua aplicação e a morosidade do sistema judiciário acabam por prejudicar pessoas que muitas vezes são mantidas presas por longos períodos sem uma justificativa plausível. Isso pode levar à superlotação dos presídios, à criminalização da pobreza e à perpetuação da desigualdade social.
Assim, o estudo intenciona resolver o seguinte problema: Como a falta de critérios claros para a aplicação da prisão preventiva no Brasil tem contribuído para sua utilização abusiva, resultando em presos provisórios que aguardam julgamento por longos períodos, violando a presunção de inocência e afetando principalmente as populações mais vulneráveis?
A relevância social e jurídica do tema é evidente, uma vez que afeta diretamente a vida de muitas pessoas e pode comprometer a garantia dos direitos fundamentais. A utilização abusiva da prisão preventiva também é um reflexo do sistema penal brasileiro, que muitas vezes é seletivo e injusto, principalmente em relação às populações mais vulneráveis.
A problemática da prisão preventiva abusiva tem sido alvo de discussão tanto no âmbito nacional quanto internacional, e já foi objeto de análise por diversos organismos internacionais, como a Comissão Interamericana de Direitos Humanos e a Organização das Nações Unidas.
Diante do exposto, o objetivo desta pesquisa é analisar o impacto da prisão preventiva na garantia dos direitos fundamentais, em especial a liberdade, a presunção de inocência e o devido processo legal. Além disso, pretende-se identificar os critérios que devem ser utilizados para a sua aplicação, de modo a evitar a sua utilização abusiva.
Em relação à metodologia, será realizado um levantamento bibliográfico com obras e artigos de autores de renome, a fim de identificar os principais aspectos teóricos e práticos relacionados ao tema. A análise de jurisprudência será realizada por meio da pesquisa de decisões judiciais proferidas por Tribunais brasileiros em casos de prisão preventiva.
1. Prisão preventiva e seus fundamentos
A prisão preventiva é uma medida cautelar de natureza processual que pode ser decretada durante a investigação criminal ou no decorrer do processo penal. Consiste na privação provisória da liberdade do indivíduo, antes do trânsito em julgado da sentença condenatória, e tem como objetivo garantir a ordem pública, a ordem econômica, a conveniência da instrução criminal ou assegurar a aplicação da lei penal, com fulcro no art. 312, do Código de Processo Penal.
Devemos destacar que a prisão preventiva não possui um caráter punitivo, mas sim cautelar, uma vez que visa a garantir a efetividade do processo penal. É possível ressaltar que a medida deve ser aplicada de forma excepcional e sempre pautada pelos princípios da legalidade, necessidade e proporcionalidade.
Corroborando ao estudo, Nucci afere que a prisão preventiva é:
Uma espécie de prisão cautelar, com o objetivo de assegurar a aplicação da lei penal, a conveniência da instrução criminal ou garantir a ordem pública e econômica, desde que provada desde que provada a materialidade do crime e indícios suficientes de autoria. (NUCCI, 2018)
Nesse sentido, a prisão preventiva deve ser decretada apenas quando não for cabível a aplicação de outras medidas cautelares menos gravosas, como o monitoramento eletrônico, o comparecimento periódico em juízo ou a proibição de contato com determinadas pessoas. O autor enfatiza que, em consonância com o princípio da presunção de inocência, a prisão preventiva deve ser a última opção na escala das medidas cautelares.
Conforme pontua Lopes Jr. (2018, p. 81), a prisão preventiva pode ser decretada subsidiariamente às cautelares diversas da prisão, ou seja, somente quando estas se mostrarem insuficientes para alcançar os fins almejados. Nesse sentido, “o juiz deve considerar a adequação e a suficiência das medidas alternativas, sempre levando em conta a proporcionalidade e a necessidade da medida”.
Assim, a decretação da prisão preventiva como medida subsidiária deve ser fundamentada, demonstrando a impossibilidade de aplicação das cautelares diversas da prisão e a necessidade de privação da liberdade. Essa fundamentação deve estar embasada em elementos concretos do caso, e não em meras conjecturas ou generalizações.
Vale enfatizar a importância da promoção de uma cultura de aplicação das cautelares diversas da prisão, reduzindo o encarceramento provisório e garantindo maior respeito aos direitos fundamentais dos indivíduos. Para tanto, é fundamental que os operadores do Direito estejam comprometidos com a aplicação das medidas cautelares de forma adequada e proporcional.
A despeito da natureza cautelar da prisão preventiva, é importante mencionar a crítica de Nucci quanto à sua aplicação no Brasil. O autor adverte que a medida tem sido utilizada de maneira excessiva e, por vezes, como forma de antecipação de pena, o que viola o princípio da presunção de inocência e fere os direitos fundamentais do indivíduo.
Para minimizar os abusos na aplicação da prisão preventiva, defende-se o controle jurisdicional mais rígido, de modo que o juiz analise criteriosamente a necessidade e proporcionalidade da medida, bem como a adequação das alternativas menos gravosas. Além disso, eleva-se a promoção de uma maior conscientização sobre o tema, a fim de reduzir a cultura do encarceramento e garantir a efetividade dos direitos fundamentais.
De acordo com Aury Lopes Jr. (2018, p. 113):
Acerca dos requisitos da prisão preventiva, vale dizer que seu cabimento deve ser limitado a circunstâncias específicas, conforme estabelecido pelo Código de Processo Penal brasileiro. Primeiramente, é importante ressaltar que a prisão preventiva só poderá ser decretada quando presentes os requisitos do fumus comissi delicti (fumaça do cometimento do delito) e do periculum libertatis (perigo da liberdade). O primeiro se configura quando há indícios suficientes de autoria e materialidade do delito, enquanto o segundo se caracteriza pela necessidade de garantir a ordem pública, a ordem econômica, a instrução criminal ou a aplicação da lei penal.
O artigo 313 do CPP apresenta as situações em que a prisão preventiva será admitida. Entre elas, estão os crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a quatro anos; os crimes de violência doméstica e familiar, ou praticados contra a mulher em situação de violência doméstica e familiar; e, ainda, os crimes que envolvem a prática de violência real ou grave ameaça, quando há risco à integridade física ou psicológica da vítima ou de testemunhas.
É importante destacar que, de acordo com o princípio da proporcionalidade, a prisão preventiva deve ser a última opção na escala das medidas cautelares, sendo aplicável apenas quando as medidas alternativas previstas no artigo 319 do CPP se mostrarem insuficientes para garantir a ordem. Em síntese, a prisão preventiva deve ser decretada com cautela, respeitando os princípios da legalidade, necessidade e proporcionalidade, e apenas nas hipóteses previstas pelo CPP. A análise cuidadosa das circunstâncias legais é fundamental para garantir o respeito aos direitos fundamentais e assegurar a efetividade do processo penal brasileiro.
É crucial compreender que essa medida não deve ser aplicada indiscriminadamente e que, em determinadas situações, como nos casos de excludentes de ilicitude, sua aplicação é inadmissível. As excludentes de ilicitude estão previstas no Código Penal brasileiro, em seu artigo 23, e consistem em situações em que o agente pratica uma conduta típica, mas não há crime, visto que a conduta é considerada lícita. Entre as excludentes de ilicitude, encontram-se a legítima defesa, o estado de necessidade, o estrito cumprimento do dever legal e o exercício regular de um direito.
A presença de uma excludente de ilicitude afasta a tipicidade penal, tornando a conduta atípica e, consequentemente, não passível de punição. Dessa forma, a decretação de uma prisão preventiva em casos onde há excludentes de ilicitude seria incompatível com o ordenamento jurídico e violaria o princípio da legalidade, uma vez que não haveria justa causa para a instauração do processo penal.
Assim, é fundamental que os operadores do Direito estejam atentos à presença de excludentes de ilicitude durante a investigação e o processo penal, a fim de evitar a aplicação indevida da prisão preventiva. Em casos onde a existência de excludentes de ilicitude é evidente, a prisão preventiva se mostra inadmissível, devendo ser respeitados os direitos fundamentais do indivíduo e o princípio da presunção de inocência.
O Código de Processo Penal (CPP) não estipula um prazo máximo para a prisão preventiva, diferentemente do que ocorre com a prisão temporária. Entretanto, isso não significa que a prisão preventiva possa se prolongar indefinidamente. A jurisprudência e a doutrina têm enfatizado a necessidade de se respeitar os princípios da proporcionalidade e razoabilidade na duração da medida, de forma a evitar a perpetuação de prisões cautelares.
O princípio da proporcionalidade exige que a medida seja adequada e necessária para atingir os fins almejados, sem se estender além do estritamente necessário. Já o princípio da razoabilidade impõe que a prisão preventiva seja mantida apenas enquanto estiverem presentes os fundamentos que justificaram sua decretação, não podendo persistir além do tempo justificado pela situação concreta.
Nesse contexto, a duração da prisão preventiva deve ser analisada em relação às peculiaridades de cada caso, levando-se em consideração a complexidade da investigação e do processo, a quantidade de réus e testemunhas, o risco de reiteração delitiva, entre outros aspectos. É fundamental que o Poder Judiciário atue de forma diligente e eficiente, buscando evitar que a prisão preventiva se prolongue além do necessário, transformando-se em uma antecipação de pena.
Em síntese, o prazo da prisão preventiva não possui um limite específico estabelecido no CPP, mas deve ser pautado pelos princípios da proporcionalidade e razoabilidade. É imperativo garantir que a duração da medida esteja em conformidade com a situação concreta e que não se transforme em um instrumento de violação dos direitos fundamentais dos indivíduos.
Portanto, diante da relevância da prisão preventiva como medida cautelar no processo penal e da necessidade de respeitar os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, é fundamental analisar como essa medida tem sido aplicada no Brasil. Para isso, é essencial abordar o próximo tópico: a utilização abusiva da prisão preventiva no Brasil, através de dados e estatísticas. Essa análise permitirá compreender melhor os desafios enfrentados no sistema penal brasileiro e identificar possíveis soluções para aprimorar a aplicação dessa medida, garantindo o respeito aos direitos fundamentais e assegurando a efetividade da justiça.
2. Utilização abusiva da prisão preventiva no Brasil e os dados estatísticos
Como já abordado, a prisão preventiva, medida cautelar de natureza processual, tem como objetivo garantir a ordem pública, a ordem econômica, a conveniência da instrução criminal ou assegurar a aplicação da lei penal. No entanto, sua utilização no Brasil tem sido marcada por abusos e banalização, o que levanta preocupações acerca do respeito aos direitos fundamentais dos indivíduos e da efetividade da justiça.
Diversos estudos e pesquisas apontam para a crescente utilização da prisão preventiva no sistema penal brasileiro, em detrimento da aplicação de medidas cautelares diversas da prisão. Essa prática, além de sobrecarregar o sistema prisional, muitas vezes resulta em violações de direitos humanos e, em alguns casos, antecipa a pena, mesmo antes da conclusão do processo e de uma sentença definitiva.
Nesse contexto, a Lei nº 12.403/2011 trouxe importantes modificações no Código de Processo Penal (CPP) com relação às medidas cautelares, incluindo a prisão preventiva. A referida lei buscou ampliar o leque de medidas cautelares diversas da prisão e restringir o cabimento da prisão preventiva, estabelecendo critérios mais rigorosos e reforçando a necessidade de fundamentação das decisões judiciais.
A Lei nº 12.403/2011 representa um avanço na busca pela redução do uso abusivo da prisão preventiva no Brasil. No entanto, ainda é possível observar práticas de banalização dessa medida, especialmente em decorrência da cultura punitivista e da pressão por resultados imediatos no combate à criminalidade. A aplicação indiscriminada da prisão preventiva gera graves consequências, como o aumento do encarceramento provisório e o comprometimento da presunção de inocência.
A superlotação do sistema prisional brasileiro é um dos problemas mais urgentes a serem enfrentados no país. A utilização abusiva e banalizada da prisão preventiva contribui significativamente para essa situação, agravando as condições de vida dos detentos e prejudicando a ressocialização e a reinserção social. A falta de critérios mais claros e objetivos para a decretação da prisão preventiva, aliada à cultura punitivista e à insegurança pública, impulsiona o encarceramento provisório, muitas vezes sem a devida análise das peculiaridades de cada caso. Esse cenário, além de contribuir para o colapso do sistema prisional, fomenta a violação de direitos humanos e dificulta a realização de uma justiça efetiva e equitativa.
Nesse sentido, é imprescindível buscar alternativas à prisão preventiva, a fim de descongestionar o sistema carcerário e garantir uma aplicação mais justa e coerente das medidas cautelares. A utilização de medidas cautelares diversas da prisão, como previsto na Lei nº 12.403/2011, pode ser uma solução viável para reduzir o uso abusivo da prisão preventiva e promover uma justiça mais eficiente e adequada às necessidades do Estado Democrático de Direito.
É importante ressaltar que a adoção de medidas cautelares diversas da prisão não significa impunidade, mas sim a busca por meios proporcionais e adequados para garantir os direitos fundamentais dos indivíduos e a efetividade do processo penal. Nesse contexto, é fundamental investir na capacitação dos operadores do Direito e na criação de mecanismos que garantam a eficácia dessas medidas alternativas, como o monitoramento eletrônico e o acompanhamento psicossocial dos acusados.
Além disso, é necessário fomentar um debate público sobre a problemática do uso abusivo da prisão preventiva, a fim de conscientizar a sociedade e os atores envolvidos sobre a necessidade de mudanças na política criminal e na postura punitivista. A busca por soluções que privilegiem a justiça, a proporcionalidade e a dignidade humana são um passo fundamental para superar os desafios enfrentados pelo sistema penal brasileiro e garantir a construção de um país mais justo e igualitário.
As informações a seguir foram divulgadas na versão 2022 do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, publicado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP). As estatísticas comparativas entre 2020 e 2021 se referem apenas ao intervalo de janeiro a junho de cada ano. Isso ocorre, pois, o relatório do segundo semestre desses anos não foi disponibilizado pelo Sistema de Informações do Departamento Penitenciário Nacional (Sisdepen) a tempo de ser inserido na edição. São Paulo continua sendo o estado com a maior população prisional do país: 209,4 mil. Logo após, estão Minas Gerais (70,5 mil), Rio de Janeiro (53,1 mil), Pernambuco (48,4 mil, após um aumento expressivo de 46,2% em relação a 2020) e Rio Grande do Sul (41,3 mil) (FBSP, 2022).
Conforme o Anuário, em 2021, 28,5% da população prisional era formada por presos provisórios (233,8 mil). Os indivíduos condenados no sistema carcerário totalizavam 586,9 mil, um número 10,7% maior que o ano anterior, quando havia aproximadamente 530 mil condenados. Sergipe foi o estado que apresentou o maior crescimento na população de detentos provisórios. A porcentagem era de 42,4% em 2020, mas atingiu 79,9% no ano seguinte (FBSP, 2022).
Em contrapartida, a proporção de presos provisórios no Distrito Federal diminuiu de 23,3% para 13,2% no mesmo período. Quanto ao número de pessoas sob custódia policial, houve um pequeno declínio, de 5.552 para 5.524. Esse índice tem apresentado queda contínua nos últimos anos. Além do aumento absoluto nacional, ocorreu um crescimento de 7,3% na taxa de população carcerária. A variação foi de 358,7 presos por 100 mil habitantes em 2020 para 384,7 em 2021. Esse foi o maior incremento desde 2017, quando o número era de 349,8 (FBSP, 2022).
Diante desse panorama, é evidente que a utilização abusiva e banalizada da prisão preventiva no Brasil é um dos principais fatores que contribuem para o agravamento da crise do sistema carcerário. O aumento expressivo na população de presos provisórios, conforme apontado pelo Anuário Brasileiro de Segurança Pública (FBSP, 2022), revela a necessidade de repensar a aplicação dessa medida cautelar e adotar práticas mais eficientes e justas no processo penal.
Nesse sentido, é fundamental que o Poder Judiciário e os demais atores do sistema penal estejam comprometidos com a observância dos princípios constitucionais e com a aplicação adequada das medidas cautelares diversas da prisão, sempre que possível. A mudança de mentalidade é essencial para garantir a efetivação das mudanças propostas pela Lei nº 12.403/2011 e a superação da cultura punitivista que predomina no Brasil.
3. O impacto da prisão preventiva nos direitos fundamentais do acusado
O impacto da prisão preventiva nos direitos fundamentais do acusado é um tema de grande relevância no cenário jurídico atual. A presunção de inocência, um dos pilares do Estado Democrático de Direito, é abordada por Capez (2017, p. 98), que argumenta ser “um direito fundamental garantido pela Constituição Federal de 1988”. No entanto, a prisão preventiva, quando aplicada de forma abusiva, pode violar esse princípio, uma vez que o acusado é privado de sua liberdade antes de ser considerado culpado em definitivo.
Nesse contexto, podemos ressaltar que a prisão preventiva deve ser uma medida excepcional, e não uma regra. A sua aplicação indiscriminada viola o princípio da presunção de inocência e vai contra a ideia de um Estado Democrático de Direito, onde todos devem ter seus direitos fundamentais garantidos. O autor ainda destaca que a prisão preventiva só deve ser aplicada em casos extremos, quando houver fundamentos suficientes para justificar tal medida.
Ainda sobre a presunção de inocência, há argumentos que a utilização abusiva da prisão preventiva pode ser vista como uma forma de punição antecipada do acusado. Essa situação é especialmente preocupante quando considerados os longos períodos em que muitos presos provisórios aguardam julgamento, sofrendo as consequências de uma condenação sem ter sido efetivamente julgados.
Outro direito fundamental afetado pela prisão preventiva é o devido processo legal. A garantia do mesmo envolve a observância de um conjunto de normas e procedimentos que asseguram a proteção dos direitos individuais e coletivos. Nucci defende que a aplicação abusiva da prisão preventiva viola esse princípio ao ignorar os direitos do acusado, especialmente o direito à liberdade.
A superlotação dos presídios é outro grave problema decorrente do uso abusivo da prisão preventiva. Destaca-se que a superlotação carcerária compromete a ressocialização do indivíduo, além de contribuir para a violação de direitos fundamentais como a integridade física e a dignidade da pessoa humana. Assim, ressalta-se que a prisão preventiva deveria ser aplicada com parcimônia e somente quando estritamente necessária.
Azevedo, por sua vez, aborda a questão da seletividade do sistema penal brasileiro e a criminalização da pobreza, que são agravadas pela prisão preventiva abusiva. O autor enfatiza que as populações mais vulneráveis são as mais afetadas por esse problema, uma vez que essas pessoas têm menos acesso à justiça e, consequentemente, menos chances de garantir seus direitos fundamentais. Dessa forma, é fundamental reavaliar a aplicação da prisão preventiva no Brasil, a fim de garantir a proteção dos direitos fundamentais dos acusados e assegurar um processo penal justo e equilibrado.
A problemática do uso abusivo da prisão preventiva também se relaciona com a morosidade do sistema judiciário brasileiro. O excesso de prisões preventivas ocorre em grande parte devido à lentidão do processo penal, que se arrasta por anos, mantendo os acusados em situação de privação de liberdade. É possível evidenciar, assim, a importância de se buscar soluções que agilizem o trâmite processual e garantam a efetividade do princípio da duração razoável do processo.
Nesse sentido, Tavares aponta para a necessidade de implementação de medidas alternativas à prisão preventiva, como a aplicação de medidas cautelares diversas, que possam garantir os objetivos processuais sem violar os direitos fundamentais dos acusados. O autor defende que, além de serem menos lesivas à liberdade, essas medidas podem contribuir para a redução da superlotação carcerária e assegurar uma maior efetividade do processo penal (TAVARES, 2015).
Nesse panorama, a análise do impacto da prisão preventiva nos direitos fundamentais do acusado revela a necessidade de uma revisão das práticas e critérios adotados no sistema penal brasileiro. A busca por soluções que garantam o respeito à presunção de inocência, o devido processo legal e a dignidade da pessoa humana deve ser prioridade para assegurar um sistema penal mais justo e equilibrado, que não viole os direitos fundamentais dos acusados.
A discussão sobre o impacto da prisão preventiva nos direitos fundamentais do acusado também exige uma reflexão acerca do papel do Poder Judiciário e dos operadores do direito nesse contexto. A responsabilidade pela aplicação correta da prisão preventiva e a garantia dos direitos fundamentais recai sobre os magistrados, promotores e defensores. Vale elevar a formação jurídica sólida e comprometida com os valores constitucionais, a fim de evitar a banalização dessa medida cautelar e assegurar a efetiva proteção dos direitos fundamentais.
Com relação à legislação, Moraes argumenta que a revisão das normas que tratam da prisão preventiva no Código de Processo Penal pode ser uma medida eficaz para coibir o seu uso abusivo. O autor sugere a criação de dispositivos legais que estabeleçam critérios mais rígidos para a decretação da prisão preventiva, bem como a previsão de prazos máximos de duração dessa medida cautelar, a fim de evitar a privação prolongada e indevida da liberdade dos acusados (MORAES, 2017).
Além disso, nota-se a relevância do controle judicial e da fiscalização externa como instrumentos de combate ao uso abusivo da prisão preventiva. A supervisão das decisões judiciais que decretam a prisão preventiva e a atuação de órgãos externos, como o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e o Ministério Público, são fundamentais para garantir a legalidade e a proporcionalidade dessas medidas, bem como para assegurar o respeito aos direitos fundamentais dos acusados.
Em suma, o impacto da prisão preventiva nos direitos fundamentais do acusado evidencia a necessidade de um esforço conjunto entre os diversos atores do sistema penal brasileiro para enfrentar o problema do uso abusivo dessa medida cautelar. Portanto, a adoção de critérios claros e objetivos para a sua aplicação, a capacitação dos operadores do direito, a revisão da legislação e o fortalecimento do controle judicial e da fiscalização externa são medidas imprescindíveis para garantir a proteção dos direitos fundamentais e a construção de um sistema penal mais justo e democrático.
4. Identificação de critérios adequados para a aplicação da prisão preventiva
As hipóteses de cabimento da prisão preventiva no Brasil estão previstas no artigo 312 do Código de Processo Penal (CPP) e envolvem diferentes situações nas quais a medida cautelar se mostra necessária. Conforme estabelecido pela legislação, a prisão preventiva pode ser decretada quando houver indícios suficientes de autoria e materialidade do crime, além da presença de condições específicas, como a garantia da ordem pública, a ordem econômica, a conveniência da instrução criminal ou a aplicação da lei penal.
A prisão preventiva pode ser utilizada para garantir a ordem pública quando há risco de o acusado, se solto, continuar cometendo crimes ou gerar sensação de insegurança na sociedade. Nesse contexto, a medida cautelar funciona como forma de proteção à sociedade e de prevenção a novos delitos. Já a garantia da ordem econômica é uma hipótese de cabimento da prisão preventiva quando o acusado representa uma ameaça ao sistema econômico ou à estabilidade financeira do país. Essa situação pode ocorrer, por exemplo, em casos de crimes financeiros ou de corrupção de grande vulto, que possam causar danos significativos à economia nacional.
A conveniência da instrução criminal é outra situação em que a prisão preventiva pode ser aplicada. Nesses casos, a medida cautelar é necessária para preservar a coleta de provas e garantir que o acusado não interfira no processo, seja por intimidação de testemunhas, destruição de provas ou qualquer outra ação que possa prejudicar a investigação e o julgamento.
A prisão preventiva pode ser decretada para assegurar a aplicação da lei penal, ou seja, garantir que o acusado não fuja ou se esconda antes de ser julgado e, eventualmente, cumprir a pena a ele imposta. Essa hipótese é especialmente relevante nos casos em que há risco concreto de fuga ou quando o acusado já demonstrou a intenção de se evadir da justiça.
Em todas essas situações, é fundamental que a decisão pela prisão preventiva seja devidamente fundamentada e que a medida cautelar seja proporcional à gravidade do crime e às circunstâncias do caso concreto. Isso é essencial para evitar a utilização abusiva da prisão preventiva e garantir o respeito aos direitos fundamentais do acusado.
Assim, a identificação de critérios adequados para a aplicação da prisão preventiva é fundamental para evitar sua utilização abusiva e garantir a efetiva proteção dos direitos fundamentais dos acusados.
Neste sentido, destacamos a importância da análise concreta dos requisitos legais para a decretação da prisão preventiva, como a existência de prova da materialidade do crime e a presença de indícios suficientes de autoria, além de outros fundamentos específicos, como a garantia da ordem pública, a ordem econômica, a conveniência da instrução criminal e a aplicação da lei penal.
Lopes Jr. (2018, p. 214) acrescenta que a necessidade da prisão preventiva deve ser demonstrada de forma fundamentada, “com base em elementos concretos que justifiquem a medida cautelar”. O autor enfatiza a importância do princípio da proporcionalidade na análise da prisão preventiva, considerando a gravidade do crime, a personalidade do acusado e os riscos que sua liberdade poderia trazer à sociedade e à instrução processual.
Outro aspecto relevante apontado é a priorização de medidas cautelares alternativas à prisão preventiva, como o monitoramento eletrônico, a proibição de contato com determinadas pessoas e a restrição de acesso a determinados locais. Nesse panorama, a aplicação dessas medidas pode garantir a efetividade da persecução penal e a proteção da sociedade sem a necessidade de privar o acusado de sua liberdade, respeitando, assim, o princípio da presunção de inocência.
Neste sentido há quem defenda a importância da observância do princípio da subsidiariedade na aplicação da prisão preventiva, o qual estabelece que essa medida cautelar deva ser utilizada apenas quando as demais medidas cautelares se mostrarem insuficientes para alcançar os objetivos do processo penal. Podemos salientar que a prisão preventiva deve ser vista como uma exceção, e não como uma regra, e que a sua decretação deve ser devidamente fundamentada e necessária para o caso concreto.
No que se refere à duração da prisão preventiva, vale elevar a necessidade estabelecer prazos máximos para a sua manutenção, de modo a evitar a privação prolongada e indevida da liberdade dos acusados. Defende-se a criação de dispositivos legais que prevejam prazos máximos para a revisão da prisão preventiva e a possibilidade de concessão de liberdade provisória em caso de excesso de prazo, sempre considerando as peculiaridades de cada caso e a necessidade de garantir o devido processo legal.
Em suma, a identificação de critérios adequados para a aplicação da prisão preventiva envolve a análise criteriosa dos requisitos legais, a observância dos princípios da proporcionalidade, subsidiariedade e presunção de inocência, a priorização de medidas cautelares alternativas e a fixação de prazos máximos para a sua duração. Ao atentar para esses aspectos, é possível garantir uma maior proteção aos direitos fundamentais dos acusados e evitar a utilização abusiva da prisão preventiva no sistema penal brasileiro.
Rangel enfatiza o controle judicial efetivo na aplicação da prisão preventiva. O autor defende a necessidade de uma atuação proativa por parte dos magistrados, que devem analisar cuidadosamente cada caso concreto e verificar se a prisão preventiva é realmente necessária e proporcional. Essa postura contribui para a garantia do devido processo legal e dos direitos fundamentais do acusado, evitando o uso indiscriminado dessa medida cautelar (RANGEL, 2019).
A transparência e a objetividade na fundamentação das decisões judiciais que decretam a prisão preventiva são essenciais para garantir o respeito aos direitos fundamentais dos acusados. Devemos salientar a importância de se evitar argumentos genéricos e abstratos, bem como a utilização de estereótipos e preconceitos na análise dos casos, de modo a assegurar a imparcialidade e a justiça na aplicação dessa medida cautelar.
Em conclusão, para garantir a aplicação adequada da prisão preventiva no sistema penal brasileiro, é fundamental que sejam observados os critérios legais e os princípios da proporcionalidade, subsidiariedade e presunção de inocência. O controle judicial efetivo e a fundamentação transparente e objetiva das decisões judiciais são essenciais para evitar o uso abusivo dessa medida cautelar e assegurar o respeito aos direitos fundamentais dos acusados. Ao atentar para esses aspectos, será possível construir um sistema penal mais justo e eficiente, que proteja a sociedade e respeite os direitos dos cidadãos envolvidos no processo.
5. Entendimento dos tribunais brasileiros em relação ao tema
O entendimento dos tribunais brasileiros em relação à aplicação da prisão preventiva é de suma importância para a compreensão das tendências e práticas adotadas no sistema penal do país. A análise da jurisprudência e das decisões judiciais proferidas pelos tribunais superiores e estaduais pode fornecer valiosos insights sobre o posicionamento dos magistrados diante das questões envolvendo a prisão preventiva e seus critérios de aplicação.
Essa análise também pode evidenciar eventuais divergências de entendimento entre os tribunais e a necessidade de uniformização da jurisprudência sobre o tema, visando garantir maior segurança jurídica e proteção aos direitos fundamentais dos acusados.
Nesse sentido, verifica-se Habeas Corpus deliberado pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região:
PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. CRIMES CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL E DE LAVAGEM DE DINHEIRO. PRISÃO PREVENTIVA PRESENÇA DE REQUISITOS DA SEGREGAÇÃO CAUTELAR. INDÍCIOS DE AUTORIA E MATERIALIDADE. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA, DA ORDEM ECONÔMICA E DA INSTRUÇÃO CRIMINAL. CONDIÇÕES FAVORÁVEIS DO PACIENTE. ESPECIALIZAÇÃO DE VARAS FEDERAIS: INCORRÊNCIA DE OFENSA AO PRINCÍPIO DO JUIZ NATURAL. 1. Habeas corpus visando a revogação de prisão preventiva do paciente, investigado por suposta prática de crimes contra o Sistema Financeiro Nacional e de lavagem de dinheiro. [...] 4. A necessidade da custódia cautelar é justificada, notadamente, para garantia da ordem pública, com a finalidade de fazer cessar a atividade criminosa, já que há indícios suficientes da existência de uma organização criminosa, com estrutura extremamente requintada, tendo por desiderato a prática de diversos crimes, notadamente contra o Sistema Financeiro Nacional e que foi desbaratada pela Polícia Federal quando ainda em plena atividade, bem como da participação relevante do paciente. 5. Patente a existência de motivos autorizadores da prisão com fundamento também na garantia da ordem econômica, haja vista a magnitude da lesão causada na sociedade, mostrando-se necessário o resguardo da credibilidade das instituições públicas envolvidas. 6. Demonstrada a necessidade da custódia cautelar para preservar a instrução criminal, uma vez que, devido à natureza dos delitos, seria deveras simples aos envolvidos colocarem em risco a coleta de provas, bem como em razão de que os elementos colhidos nas investigações indicam que o paciente e os demais envolvidos usam de todos os meios possíveis para dissimular a prática da atividade delitiva, de forma que há receio concreto de que, uma vez em liberdade, venha a ocultar ou destruir provas. 7. A prisão preventiva atacada não ofende os princípios constitucionais do devido processo legal e da presunção de inocência, uma vez que foi devidamente motivada e se encontra em conformidade com as exigências legais, atendendo aos termos do artigo 312, do Código de Processo Penal. 5. Condições pessoais favoráveis ao paciente – primariedade, bons antecedentes e residência fixa – não afastam, por si só, a possibilidade da prisão preventiva, quando demonstrada a presença de seus requisitos. Precedentes do STF e do STJ. [...] 8. Ordem denegada. (Habeas Corpus nº 0036947-87.2007.4.03.0000. Tribunal Regional Federal da 3ª Região, Rel. Juiz Fed. Con. Márcio Mesquita, 1ª Turma, DJe 05 jun. 2007).
A análise do julgado acima envolve um Habeas Corpus requerendo a revogação da prisão preventiva de um indivíduo investigado por suposta prática de crimes contra o Sistema Financeiro Nacional e lavagem de dinheiro. A decisão do tribunal aponta a necessidade da prisão preventiva, com base na garantia da ordem pública, da ordem econômica e da instrução criminal. Contudo, cabe destacar a possibilidade de uma interpretação diferente quanto à garantia da ordem econômica e da ordem pública.
Aponta-se no caso que a prisão preventiva em garantia da ordem econômica, tendo em vista exclusivamente a magnitude da lesão causada, e a garantia da ordem pública, como resguardo da credibilidade das instituições, podem ser consideradas insuficientes para justificar a medida cautelar. Isso ocorre porque a prisão preventiva, enquanto medida cautelar, não deve ter como objetivo a antecipação da punição ou a resposta penal em si.
Nesse sentido, a prisão preventiva deveria ser decretada apenas quando houvesse um risco concreto e atual que justificasse a medida, como a continuidade da atividade criminosa ou a ameaça à integridade das investigações. No caso em análise, a fundamentação da prisão preventiva com base na magnitude da lesão causada e no resguardo da credibilidade das instituições pode ser questionada, visto que esses argumentos não se referem a uma cautela diretamente relacionada a algum direito.
Em vez disso, esses fundamentos parecem estar mais relacionados a uma resposta penal e antecipação da punição, o que não seria adequado no contexto da prisão preventiva. Logo, seria importante que a decisão se baseasse em critérios mais específicos e concretos, diretamente relacionados à necessidade da medida cautelar e aos riscos apresentados pelo investigado, respeitando os princípios da proporcionalidade, subsidiariedade e presunção de inocência.
Em seguida, vale avaliar a fundamentação relativa à reiteração delitiva no Habeas Corpus deliberado pelo 16ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo:
Habeas Corpus. Tráfico de drogas, porte ilegal de arma de fogo de uso permitido, ameaça e vias de fato. Pleito objetivando a revogação da prisão preventiva do paciente, com a expedição de alvará de soltura em seu favor. Inviabilidade. Afigura-se necessária e adequada a manutenção da segregação preventiva para garantia da ordem pública, pois possuidor de maus antecedentes, com condenação definitiva por crime patrimonial. Reiteração delitiva que justifica a prisão cautelar. Alegado excesso de prazo, não ocorrência, posto estar o paciente preso há, aproximadamente, 6 meses, cuidando-se de delitos tráfico de drogas e porte ilegal de arma de fogo de uso permitido, de modo que não se mostra desproporcional o prolongamento da prisão cautelar até esse momento, sendo pertinente ressaltar que, para a apuração de tal ocorrência, devem ser observados os critérios da razoabilidade e da proporcionalidade, visto ter sido demonstrado o bom andamento da marcha processual Observa-se, por fim, inexistir notícia, nos autos, de que a unidade prisional onde se encontra recolhido não esteja adotando as medidas básicas para evitar a prevenção da disseminação da COVID-19, tampouco demonstrado que integre grupos de risco. Ordem denegada. (Habeas Corpus Criminal nº 2056266-41.2021.8.26.0000. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, Rel. Des. Guilherme de Souza Nucci, 16ª Câmara de Direito Criminal, DJe 17 abr. 2021).
A decisão acima mantém a prisão preventiva com base na garantia da ordem pública, considerando os maus antecedentes e a reiteração delitiva do paciente. Contudo, é importante analisar se a simples presença de maus antecedentes ou reincidência são critérios suficientes para justificar a prisão preventiva. Entretanto, argumenta-se que a simples presença de maus antecedentes ou reincidência não devem ser critérios absolutos para a decretação da prisão preventiva. Se o legislador entendesse dessa forma, poderia ter esclarecido tal posição nas diversas revisões do CPP.
A prisão preventiva é uma medida cautelar que deve ser aplicada de forma excepcional, quando houver necessidade concreta e atual que justifique a restrição da liberdade do indivíduo. O princípio da presunção de inocência e o direito à liberdade devem ser respeitados, sendo a prisão preventiva decretada somente quando demonstrada a presença de seus requisitos legais.
Assim, a análise jurisprudencial do julgado sugere que é fundamental questionar a manutenção da prisão preventiva com base apenas na reiteração delitiva e nos maus antecedentes, sem que haja uma fundamentação concreta que demonstre a necessidade da medida cautelar. Para garantir a legalidade e a proporcionalidade da medida, é importante que a decisão judicial esteja embasada em critérios objetivos e específicos que justifiquem a restrição da liberdade do indivíduo e em conformidade com os princípios constitucionais e legais aplicáveis.
Diante da análise dos julgados apresentados, observa-se que os tribunais brasileiros adotam diferentes fundamentações ao aplicar a prisão preventiva, levando em conta fatores como a garantia da ordem pública, da ordem econômica e da instrução criminal. No entanto, é crucial que as decisões estejam baseadas em critérios objetivos e específicos, respeitando os princípios da proporcionalidade, subsidiariedade e presunção de inocência. A prisão preventiva deve ser aplicada como medida excepcional, garantindo a proteção dos direitos fundamentais dos acusados e a segurança jurídica.
Em síntese, o entendimento dos tribunais brasileiros em relação à prisão preventiva demonstra a necessidade de uniformização da jurisprudência sobre o tema, de modo a garantir maior segurança jurídica e respeito aos direitos fundamentais dos acusados. A análise da jurisprudência revela a importância de se questionar a aplicação da prisão preventiva baseada apenas em maus antecedentes e reiteração delitiva, sem uma fundamentação concreta que demonstre a necessidade da medida cautelar. A decisão judicial deve estar embasada em critérios objetivos e específicos que justifiquem a restrição da liberdade do indivíduo, sempre respeitando os princípios constitucionais e legais aplicáveis.
Conclusão
Através da realização do presente estudo, foi possível analisar o impacto da prisão preventiva na garantia dos direitos fundamentais, em especial a liberdade, a presunção de inocência e o devido processo legal. A pesquisa evidenciou a utilização abusiva da prisão preventiva no Brasil, afetando principalmente as populações mais vulneráveis e contribuindo para a superlotação dos presídios, a criminalização da pobreza e a perpetuação da desigualdade social.
Ao identificar os critérios adequados para a aplicação da prisão preventiva e analisar o entendimento dos tribunais brasileiros em relação ao tema, foi possível verificar a necessidade de maior uniformização da jurisprudência e a importância de decisões fundamentadas em critérios objetivos e específicos. Isso é essencial para garantir o respeito aos princípios da proporcionalidade, subsidiariedade e presunção de inocência.
A análise da jurisprudência revelou que, em muitos casos, a prisão preventiva é decretada com base em fundamentos insuficientes ou genéricos, como a garantia da ordem pública, a ordem econômica e a instrução criminal, sem que haja uma análise concreta dos requisitos legais e dos riscos apresentados pelo acusado. Essa prática pode resultar em violações de direitos fundamentais e perpetuar a injustiça no sistema penal brasileiro.
Diante dos resultados obtidos, conclui-se que é fundamental o aprimoramento dos critérios para a aplicação da prisão preventiva no Brasil, de modo a evitar sua utilização abusiva e garantir a efetiva proteção dos direitos fundamentais dos acusados. Além disso, é importante a capacitação e sensibilização dos operadores do direito, como magistrados e promotores, para que sejam capazes de analisar os casos de prisão preventiva com base nos princípios constitucionais e legais aplicáveis, garantindo decisões justas e proporcionais.
Por fim, sugere-se a realização de estudos futuros que analisem o impacto de medidas alternativas à prisão preventiva, como a monitoração eletrônica, a fiança e as medidas cautelares diversas da prisão, na garantia dos direitos fundamentais e na redução da superlotação dos presídios. Essas alternativas podem ser mais efetivas na promoção da justiça e na proteção dos direitos humanos, contribuindo para a construção de um sistema penal mais justo e equitativo.
Referências
ALMEIDA, Marcius Alexandros Antunes de. Críticas e alternativas à prisão preventiva. 2010. Dissertação de Mestrado. Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. 2010.
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: Parte Geral. 22. ed. São Paulo: Saraiva, 2016.
BRASIL. Habeas Corpus Criminal nº 2056266-41.2021.8.26.0000. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, Rel. Des. Guilherme de Souza Nucci, 16ª Câmara de Direito Criminal, DJe 17 abr. 2021.
BRASIL. Habeas Corpus nº 0036947-87.2007.4.03.0000. Tribunal Regional Federal da 3ª Região, Rel. Juiz Fed. Con. Márcio Mesquita, 1ª Turma, DJe 05 jun. 2007.
CAPEZ, Fernando. Curso de processo penal. 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2017.
COSTA, Marina Bartlewski Moreira da. Análise do Princípio da Proporcionalidade na prisão preventiva à luz da Corte Interamericana de Direitos Humanos. TCC (Graduação)-Curso de Direito, Faculdade Nacional de Direito, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2017.
FERREIRA, Carolina Figueiredo Pinto. A prisão preventiva e o princípio da presunção de inocência. Revista de Ciências Jurídicas e Empresariais, v. 5, n. 1, 2004.
FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA (FBSP). Anuário Brasileiro de Segurança Pública: edição 2022. São Paulo: FBSP, 2022.
GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: Parte Geral. 18. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2016.
GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: parte geral. 20. ed. Niterói, RJ: Impetus, 2017.
GROSKREUTZ, Hugo Rogério. A prisão preventiva após a Lei nº. 12.403/2011 e o princípio da legalidade na Jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul. In: Direito Constitucional: estudo interdisciplinar ibero-americano, 2019.
LOPES JR, Aury. Direito Processual Penal. Saraiva Educação SA, 2018.
MENEZES, Gustavo Lelles; BORGES, Paulo Cesar Correa. Prisão preventiva e o estado de coisas inconstitucional: a (in) eficácia da Lei 12.403/2011. Revista de Iniciação Científica e Extensão da Faculdade de Direito de Franca, v. 4, n. 2, p. 69-74, 2019.
NUCCI, Guilherme de Souza. Prisões cautelares: doutrina e prática. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2018.
OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de. Curso de Processo Penal. 18ª ed. São Paulo: Atlas, 2014.
RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 16. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2019.
SANTOS, Isabella Borges. A banalização da prisão preventiva e seus reflexos na crise do sistema carcerário brasileiro. 200. 18 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Direito) - Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, 2021.
TAVARES, Juarez. Parecer Sistema Carcerário. 2015. Disponível em: https://pt.scribd.com/document/267050676/Parecer-Sistema-Carcera-rio-Versao-Final. Acesso em: 10 abr. 2023.
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2019.