Realidade do sistema prisional brasileiro
A história tratou o condenado, num longo tempo, somente como um objeto de execução penal, e ultimamente houve o reconhecimento dos direitos que a pessoa humana, mesmo estando condenada, possui.
As raízes deste tipo de proteção, diga-se de passagem, direito penitenciário, surgiram no século XVIII, com trabalhos de C. BECCARIA e J. HOWARD.
Este termo dado, “Direito Penitenciário”, é uma disciplina normativa, ou seja, é um unido de normas jurídicas para que consiga disciplinar o tratamento dado ao sentenciado. Este nome foi eleito pelo artigo 24, I da Constituição Federal.
A história tratou o condenado num longo tempo, somente como um objeto de execução penal, e ultimamente houve o reconhecimento dos direitos que a pessoa humana mesmo estando condenada possui, e isso ocorreu justamente pelo fato de surgir a relação de Direito publico entre Estado e o condenado.
Giovanni Tessitore afirma que uma rápida aceleração do processo evolutivo dos métodos de tratamento dos reclusos verificou-se quando veio para a ribalta o filantropo Quaker John Howard, cujo empenho mostrou-se ser decisivo para o declínio das penas corporais e para a sua substituição, no espaço de poucas décadas, pela prisão [1].
No nosso país, por intermédio da chegada do 1º Código Penal (1830 – Código Criminal - primeiro código penal brasileiro, sancionado poucos meses antes da abdicação de D. Pedro I) foi que ocorreu a individualização das penas. Entretanto, somente em 1892, com o 2º Código Penal, foi abolida a pena de morte e fiz-se com que surgisse o regime penitenciário, ressaltando que, este tipo de regime tem intuito de ressocializar e reeducar o detento, ou seja, regime de caráter correcional.
Portanto, “para que toda a pena não seja uma violência de um ou de muitos contra um cidadão particular, deve ser essencialmente publica, pronta, necessária, a mais pequena possível nas circunstancias dadas, proporcional aos delitos, fixada pelas leis”. [2]
Além de que apenas estas “podem fixar as penas correspondentes aos delitos, e este poder só ao legislador pode pertencer, ele que representa toda a sociedade unida por um contrato social” [3].
Consequentemente, por meio destes pensamentos filosóficos jurídicos, desde 1988 quando foi promulgada a Constituição, “é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral”.
Ou seja, “as pessoas privadas de liberdade não podem ser sujeitas à tortura ou outro meio cruel, desumano ou degradante de tratamento ou punição. O tratamento e o respeito devem ser iguais aos das pessoas que se encontram livres.” [4]
E, sobre este respeito, Cesare Beccaria defende e muito bem que um dos maiores freios dos delitos, não é a crueldade das penas, mas a sua infalibilidade.
Mas, como é de conhecimento da sociedade brasileira, o que existe é a falta de respeito com os presidiários. O maior e mais claro exemplo disto, é a superlotação dos sistemas prisionais e as deficiências com o processo de recuperação que deveria ser feito com os detentos.
Para Fernando Salla, pesquisador do Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo, os candidatos têm de enfrentar a sociedade que cobra por meios de medidas mais punitivas que levariam a um aumento da população carcerária. Segundo o pesquisador, medidas como implementação de penas alternativas e de reintegração dos presos não tem boa aceitação pela sociedade. Tendo consigo que,
A melhor solução, acho que seria reduzir essa massa de pessoas [nos presídios], mas o medo e a insegurança são sentimentos disseminados na sociedade. É difícil fazer a aprovação dessas medidas num ambiente social e político que não é favorável a isso [5].
Ao ser submetido no mês de maio de 2012 a Revisão Periódica Universal – instrumento de fiscalização do Alto Comissariado de Direitos Humanos da ONU -, o Brasil recebeu como recomendação “melhorar as condições das prisões e enfrentar o problema da superlotação” [6].
De acordo com a organização não governamental Centro Internacional para Estudos Prisionais, o Brasil só fica atrás em número de presos para os Estados Unidos, China e Rússia. Frente aos dados mais recentes do Depen de 2010, o Brasil tem um número de presos 66% superior à sua capacidade de abrigá-los.
Segundo o deputado federal Domingos Dutra, que já foi relator da CPI do Sistema Carcerário, a lei brasileira define que para cada preso, é necessário no mínimo seis metros quadrados de espaço. Entretanto, foram encontrados casos em que cada presidiário tinha apenas 70 cm quadrados para si.
Sabe-se que, além da deficiência com a superlotação, existem a falta de assistência jurídica e as péssimas condições de vida às quais estão os presos submetidos. E, mesmo se os estados recebessem recursos federais para investimentos de novos presídios, de nada adiantaria, afinal, o que precisa é melhoria na qualidade do sistema.
Assis escreve que a superlotação das celas, sua precariedade e sua insalubridade tornam as prisões num ambiente propicio à proliferação de epidemias e ao contagio de doenças. Todos esses fatores estruturais aliados ainda a má alimentação dos presos, seu sedentarismo, o uso e drogas, falta de higiene e toda a lugubridade da prisão, fazem com que um preso que adentrou lá numa condição sadia, de lá não saia sem ser acometido de uma doença ou com sua resistência física e saúde fragilizados (..). Também pode ser constatado o descumprimento dos dispositivos da Lei de Execução Penal, a qual prevê no inciso VII do artigo 40 o direito ‘a saúde por parte do preso, como uma obrigação do Estado. ASSIS (2007, p.1) [7]
Alguns profissionais do direito relatam que o que ocorre é a necessidade de pensar numa elaboração política criminal de intervenção mínima, o que envolveria não somente mudanças legislativas, mas também facilitação de regime, junto com redução de pena.
Além de que, outro problema que pode considerar no ápice desse sistema, é a tortura, que têm diversos relatórios da sociedade civil mostrando casos que se quer são investigados. Vale deixar claro que, a superlotação também causa tortura, seja ela física ou psicológica.
Luis Kawaguti deu entrevista à BBC Brasil, onde dizia que: "a superlotação provoca um quadro geral de escassez. Em São Paulo, por exemplo, o que mais faz falta é atendimento médico, mas também há (denúncias de) racionamento de produtos de higiene, roupas e remédios.
Rafael Damaceno de Assis relata em seu trabalho de 2007, ‘’A realidade atual do Sistema Penitenciário Brasileiro”, que a superlotação das celas é um dos problemas mais acentuados que possui nos presídios, chegando em media a 5 presos por cada vaga. [8]
Antemão, vale dizer que os abusos de direitos humanos não ocorrem apenas devido ao déficit enorme de vagas. Afinal, é possível encontrar por todo o país denuncias de agressões físicas ou psicológicas.
De tal modo, sendo totalmente desfavorável este tipo de ambiente para os direitos humanos, e tendo com isto, a possibilidade de surgir facções criminosas neste sistema.
Porém, não se pode jogar tudo contra o governo, dizer que todos os problemas causados neste sistema, são falhas únicas e exclusivas deste. E isso se afirma, por conta do perfil da maioria dos detentos; por meio de levantamentos, mostra-se que os presidiários, não possuíam empregos formais e ainda fazia usos de entorpecentes, assim como baixo nível de escolaridade.
Hoje em dia, é permitido que por cada três dias de trabalho um dia seja reduzido da pena total. No art. 1 da LEP, anota-se que os apenados tem previsto por lei direito ao trabalho, educação, assistência, “condições para a harmônica integração social do condenado e do internado”, todavia, não se vê cumprimento nesses quesitos, nem todos os governos estaduais exploram essa possibilidade.
Mas, como se observa, a solução não tem sido encontrada, as prisões, portanto vão ficando cada vez mais abarrotadas e consequentemente não tendo como fornecer o mínimo de dignidade humana.
A partir daí, a realidade encontrada. Onde o sistema se encontra falido, gerando diversas manifestações, melhor dizendo, rebeliões, com o intuito de buscar no Estado a dignidade que lhe são direitos.
As rebeliões, embora se constituam em levantes organizados pelos presos de forma violenta, nada mais são do que um grito de reivindicação de seus direitos e de uma forma de chamar a atenção das autoridades quanto à situação subumana na qual eles são submetidos dentro das prisões.[9]
Além do mais, devido à lotação, não há mais a existência de prisões destinadas exclusivamente aos presos que aguardam julgamento (lembrando que, existem diferentes tipos de estabelecimentos prisionais, entretanto ao que parece não é posto em prática essas diferenças, assim como acontece com os delinquentes, que não estão aprisionados em cada lugar destinado). Transformando “as cadeias públicas, delegacias, presídios, penitenciárias, em grandes depósitos de pessoas.
Portanto, com todos os problemas gerados dentro deste sistema, já se vê rebeliões como parte do dia a dia, rotineiro, e exatamente pela realidade caótica em que é levada.
FOUCAULT mostra que, nos últimos anos, houve revoltas em prisões em muitos lugares do mundo. Os objetivos que tinham suas palavras de ordem, seu desenrolar tinham certamente qualquer coisa paradoxal. Eram revoltas contra toda miséria física que dura há mais de um século [...]. [10]
e ainda afirma que essas manifestações, rebeliões, fazem parte de reivindicações muitas vezes não atendidas. Ou seja, todos esses fatores fazem com que não se passe um dia em nosso país sem termos noticia da ocorrência de uma rebelião de presos, mesmo que seja ela de pequenas proporções [11].
Referências
[1] GONÇALVES, Pedro Correia. A era do humanitarismo penitenciário: As obras de John Howard, Cesare Becc aria e Jeremy Bentham. 2009. p11.
[2] BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das Penas. 1 ed. São Paulo: Edipro, 1999. P.163
[3] Idem Ibidem p. 66
[4] CAMARGO, Virginia. Realidade do Sistema Prisional no Brasil. Disponível em http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=1299. Acessado em: 08 set. 2012.
[5] Apud: JINKINGS, Daniella. Disponível em http://global.org.br/programas/ag-brasil-para-melhorar-sistema-prisional-e-preciso-enfrentar-a-sociedade-afirmam-especialistas/. Acessado em 08 set. 2012.
[6]KAWAGUTI, Luis. Brasil tem 4ª maior população carcerária do mundo e deficit de 200 mil vagas. BBC Brasil. Disponível em http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2012/05/120529_presos_onu_lk.shtmlAcessado em 08 set. 2012
[7] ASSIS, Rafael Damaceno de. A realidade atual do sistema penitenciário Brasileiro. Disponível em: < http://br.monografias.com/trabalhos908/a-realidade-atual/a-realidade-atual.shtnl> Acesso em 20 set. 2013.
[8] Idem Ibidem
[9] ASSIS, 2007, p.2 – Disponível em www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigoid=10878. Acessado em 15 mar. 2013.
[10] FOLCAULT, Michel. Vigiar e Punir. 28 ed. Petrópolis.: Vozes, 2004. Capitulo I, p. 29
[11] ASSIS, 2007, p.1 - Disponível em www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigoid=10878
(Acesso em 20/05/2013)