Responsabilidade civil hospitalar no erro médico

Responsabilidade civil hospitalar no erro médico

Análise das hipóteses de ocorrência de erro médico e da comprovação do dano causado ao paciente, bem como a quem caberá a responsabilização civil, se somente ao médico, somente ao hospital ou a ambos solidariamente.

1. INTRODUÇÃO

Com aumento exagerado de ações por reparação civil no judiciário que envolvam médicos, hospitais e pacientes, faz de suma importância para a sociedade o estudo acerca do tema, devido à sua relevância social e jurídica. Lembrando que o direito deve refletir os interesses da coletividade, e o mesmo se transforma com o tempo, contudo, tem o dever de estar sempre atualizado conforme os interesses da sociedade.

As atividades prestadas pela sociedade empresária hospitalar, sejam elas desempenhadas pelos enfermeiros, pelos médicos ou pelos operadores das máquinas de tecnologia avançada, em prol dos tratamentos complexos, podem resultar em terapias de sucesso, no entanto, podem suceder em resultados insatisfatórios e quiçá irreversíveis ao paciente. Em caso de erro médico, e da comprovação do dano causado ao paciente, caberá a responsabilização civil somente do médico, somente do hospital, ou de ambos de maneira solidária?

Com o presente trabalho, busca-se estabelecer o escopo da responsabilidade civil da sociedade empresária hospitalar diante do erro médico, vez que ao analisar as atividades prestadas pelo hospital à comunidade depara-se com nítida relação de consumo, sendo a mesma regida e respaldada pelo Código de Defesa do Consumidor.

A presente pesquisa trata, em caso de erro médico, e da comprovação do dano causado ao paciente, a quem caberá a responsabilização civil, se somente ao médico, se somente ao hospital, ou se caberá a ambos solidariamente. Perpassa pelas situações em há falhas na prestação de serviços pelo hospital, também por situações em que os médicos em questão sejam profissionais liberais e não mantenham relação empregatícia com a sociedade empresária hospitalar, bem como aquelas também em que os médicos se encaixem como empregados da sociedade empresária. Elucida cada caso e sua respectiva responsabilização civil à reparação do dano ao paciente, também as situações onde há excludente da responsabilidade do dever de indenizar.

2. ERRO MÉDICO

Para melhor compreensão do presente artigo, traz-se a definição de erro médico.
A definição de erro médico encontra-se no Manual de Orientação Ética Disciplinar do Conselho Federal de Medicina:

Erro médico é a falha do médico no exercício da profissão. É o mau resultado ou resultado adverso decorrente da ação ou da omissão do médico, por inobservância de conduta técnica, estando o profissional no pleno exercício de suas faculdades mentais. Excluem-se as limitações impostas pela própria natureza da doença, bem como as lesões produzidas deliberadamente pelo médico para tratar um mal maior. Observa-se que todos os casos de erro médico julgados nos Conselhos de Medicina ou na Justiça, em que o médico foi condenado, o foi por erro culposo.

Logo, a falha do médico se desdobra em um ato ilícito no exercício da sua função, que pode ser em uma das modalidades de culpa: imprudência, negligência e imperícia, logicamente nos casos em que for comprovada a culpa e nexo de causalidade.

Ainda, outra definição dada a erro médico, é a de Júlio Meirelles Gomes e de Genival Veloso França (1999, p.25) "Erro Médico é a conduta profissional inadequada que supõe uma inobservância técnica, capaz de produzir um dano à vida ou à saúde de outrem, caracterizada por imperícia, imprudência ou negligência".

Tais modalidades de culpa: imperícia, imprudência e negligência podem ser demonstradas com seguintes exemplos. No que tange a imperícia pode ser o médico não especializado denominado generalista que se propõe a realizar uma cirurgia cardíaca, neste caso a falta de expertise poderá trazer danos ao paciente; Já quando se fala de imprudência, pode ser o caso do médico anestesista que realiza duas cirurgias ao mesmo tempo; Por fim, a negligência, pode ser o médico que não realiza os procedimentos de pré-operatório no paciente e ainda assim o opera, podendo ocasionar danos irreversíveis pela conduta negligente.

Conforme o exposto acima, resta claro que o profissional médico deve sempre ter consciência dos seus deveres éticos para que não lhe sobrevenha efeitos jurídicos decorrentes de tais falhas, para isso seus atos devem se configurar isentos de omissão, e o mesmo, ater-se sempre em desempenhar a sua função utilizando da melhor maneira a expertise associada ao bom senso.

3. RESPONSABILIDADE CIVIL DO MÉDICO

A natureza jurídica da responsabilidade civil dos médicos enquanto profissionais liberais, pode ser subjetiva, quando possuir fundamento na teoria da culpa. Neste caso, para que o médico responda civilmente, é necessário que a vítima comprove que o dano causado pelo mesmo é decorrente da sua conduta culposa.

Para Maria Helena Diniz na responsabilidade subjetiva o ilícito é o ato causador, sendo que o imputado deve indenizar o prejuízo, se ficar demonstrado que houve dolo ou culpa na ação.

Ainda por Fabrício Zamprogna Matielo (1998, p.66):

No que concerne à responsabilidade civil dos médicos, segue-se a regra geral da imprescindibilidade da demonstração da culpa do agente, amenizadas as exigências quanto à prova inarredável e profunda de sua ocorrência ante os termos consignados na legislação, quando a natureza da demanda ou as circunstâncias concretas apontarem para a responsabilidade mediante a produção de elementos de convicção mais singelos. (...) Em princípio, a contratação não engloba qualquer obrigação de curar o doente ou de fazer melhorar a qualidade de vida desfrutada, porque ao profissional incumbe a tarefa de empregar todos os cuidados possíveis para a finalidade última - e acima de tudo moral - de todo tratamento, ou seja, a cura seja alcançada. Todavia, a pura e simples falta de concretização do desiderato inicial de levar à cura não induz a existência da responsabilidade jurídica, que não dispensa a verificação da culpa do médico apontado como causador do resultado nocivo.

Logo, o paciente prejudicado deve atestar o erro médico através do dano provocado pelo médico que o atendeu, e provar que o referido dano provém do ato do médico em seu atendimento onde o mesmo agiu com culpa, podendo ser em qualquer uma de suas modalidades, sob a forma de negligência, imprudência ou imperícia. Tão logo ficar evidenciado o nexo causal entre o dano e o prejuízo experimentado pelo paciente, este tem direito ao ressarcimento de seu prejuízo, seja este material ou moral. O atual Código Civil dispõe a respeito dessa modalidade de responsabilidade no art.951:

O disposto nos arts. 948, 949 e 950 aplica-se ainda no caso de indenização devida por aquele que, no exercício de atividade profissional, por negligência, imprudência ou imperícia, causar a morte do paciente, agravar-lhe o mal, causar-lhe lesão, ou inabilitá-lo para o trabalho. (BRASIL, 2015)

O Manual de orientação Ética e Disciplinar do CRM do Estado de Santa Catarina nos informa as diferentes modalidades de culpa:

a) Imperícia decorrente da falta de observação das normas técnicas, por despreparo prático ou por insuficiência de conhecimentos. Considerar um médico imperito é discutível, tratando-se de um profissional longamente treinado nas escolas médicas e nos programas de residência médica, com um mínimo de 6 a 8 até um máximo de 11 anos de estudos e prática, esta premissa, não sendo aceita, torna-se um agravante;
b) Imprudência quando o médico assume riscos para o paciente sem respaldo científico para seu procedimento;
c) Negligência, é a forma mais frequente de erro médico nos hospitais do governo, onde o doente é um matriculado na instituição e não um paciente do médico, e este negligencia os cuidados por falta de uma relação médico-paciente-família estreita.

Ainda, conclui Sérgio Cavalieri Filho (2010, p.404):

Disso resulta que a responsabilidade médica, embora contratual, é subjetiva e com culpa provada. Não decorre do mero insucesso no diagnóstico ou no tratamento, seja clínico ou cirúrgico. Caberá ao paciente, ou aos seus herdeiros, demonstrar que o resultado funesto do tratamento teve por causa a negligência, imprudência ou imperícia do médico.

Diversamente dos outros profissionais, o médico tem obrigação de meio e não de resultado. Vale ressaltar a diferenciação entre obrigação de meio e obrigação de resultado. Sendo a obrigação de meio aquela na qual o médico não assume o risco de determinado resultado (a cura do paciente, por exemplo), mas sim, o dever de agir com diligência e prudência, de acordo com as técnicas usuais, comprometendo-se a tratar do paciente com zelo. Cabe menção aos ensinamentos de Melo:

A natureza jurídica da prestação de serviços médicos, embora sui generis, é contratual, porem o profissional não se compromete com a obtenção de um determinado resultado, mas sim com prestar um serviço consciencioso, atento e de acordo com as técnicas científicas disponíveis, sendo assim uma típica obrigação de meios. (2008, p. 78).

Neste caso, os médicos, serão responsabilizados, somente, quando for provada qualquer modalidade de culpa: negligência, imprudência e imperícia. A prova de que o profissional agiu com culpa caberá, em princípio, aos prejudicados, sendo facultativo ao juiz a inversão do ônus da prova em favor do consumidor conforme art. 6º, inciso VIII, do CDC.
O acórdão publicado na RT 694/84 traz um texto muito esclarecedor do desembargador Sousa Lima:
"(...) a responsabilidade civil do médico não é idêntica à dos outros profissionais, já que a sua obrigação é de meio e não de resultado, exceção feita à cirurgia plástica. Se isso é assim não é porque o médico deva ser considerado um privilegiado em relação aos outros profissionais, mas porque lida ele com a vida e a saúde humanas, que são ditadas por conceitos não exatos, alguns até mesmo não explicados pela Ciência. Nestes termos, cabe ao médico tratar o doente com zelo e diligência, com todos os recursos de sua profissão para curar o mal, mas sem se obrigar a fazê-lo, de tal modo que o resultado final não pode ser cobrado, ou exigido." (RT 694/84).

Lado outro, há a obrigação de resultado, aquela em que há um compromisso do contratado com um resultado específico, como por exemplos nas cirurgias plásticas de caráter embelezador. O contratado se compromete a atingir um resultado certo, para atender ao que se obrigou com o contratante. Cabe ensinamentos de Stoco, que nos informa a hipótese de a obrigação do médico que geralmente é de meio, poder ser também de resultado, como por exemplo quando o paciente faz um raio X, um check up, onde é aplicado ondas de calor, ou no caso da aplicação de remédios injetáveis, uma transfusão de sangue, ou no caso de uma cirurgia plástica com finalidade estética. Nesses casos expostos, há a obrigação de resultado, pois o mesmo assume expressamente a garantia da cura.

No contexto da obrigação de resultado, inverte-se o ônus da prova, cabendo ao contratado provar que não agiu com culpa e que o resultado esperado e prometido não ocorreu por razões alheias à sua atuação, por força de qualquer causa excludente da responsabilidade. Não se pode, porém, presumir-se a culpa só porque estamos diante de um contrato. O que se deve levar em conta é o tipo de obrigação assumida. Em se tratando de obrigação de resultado, o contratado, caso não atinja o acordado, será presumidamente culpado.

Não obstante, o Código de Defesa do Consumidor, Lei nº 8078/90, trata da relação jurídica de consumo entre as partes, médico e paciente e as hipóteses de responsabilidade civil, desta decorrentes. Para Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald, na área médica, a responsabilidade civil de modo geral é regida pelo Código de Defesa do Consumidor. Tão logo, o artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor clarifica:

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. [...]
[...] § 4° A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa.

Conforme o dispositivo legal acima mencionado constata-se que, cabe ao paciente afetado provar o dano e o nexo causal, vez que, a regra adotada é a da teoria objetiva, onde não se discute a existência de culpa, e tão somente a presença dos elementos: dano e nexo de causalidade.  

Verifica-se que o §4º do referido dispositivo que traz a exceção à teoria objetiva, no que tange a responsabilidade dos profissionais liberais, a qual deve ser investigada mediante a verificação de culpa, sendo neste caso empregada a teoria da responsabilidade subjetiva.

Dado o exposto, conclui-se que em se tratando do dano ocasionado pelo médico no exercício do seu labor, vez que empregada a teoria da responsabilidade subjetiva, a demanda terá solução com respaldo na legislação consumerista.

4. A RELAÇÃO DE CONSUMO E A SOCIEDADE EMPRESÁRIA HOSPITALAR

No contexto deste trabalho, para melhor compreensão oportuno se faz a definição de sociedade empresária. A Sociedade Empresária tem por objeto o exercício de atividade própria de empresário sujeito ao registro, inclusive a sociedade por ações, independentemente de seu objeto, devendo inscrever-se na Junta Comercial do respectivo Estado. Isto é, Sociedade Empresária é aquela que exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou circulação de bens ou de serviços, constituindo elemento de empresa. A sociedade empresária é considerada pessoa jurídica.

Isto posto, pode-se definir como estabelecimento hospitalar aquele que tem por finalidade atendimento e internação a paciente, com ao menos 5 leitos, com atendimento médico básico prestado por especialistas, podendo ser prestadas também outras especialidades, disponível 24 horas, Conselho Federal de Medicina - CFM.

Considerando que o hospital é sociedade empresária, por conseguinte também é pessoa jurídica de direito privado, de forma que sua responsabilidade está baseada legalmente no artigo 14 do Código do Consumidor (BRASIL, 2015a).

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

Conforme o texto da legislação consumerista pátria acima citado, independente de a vítima que sofreu o dano provar ou não, o hospital prestador dos serviços responderá pela prestação dos serviços e também por informações não suficientes aos pacientes.

Não obstante, no que tange à responsabilidade civil hospitalar, ocorre que, se provado que o dano decorre dos serviços nos quais o hospital se obrigou a prestar diretamente ao paciente, como instalações, aparelhos e instrumentos, cabe a este o dever de reparar de forma objetiva o prejuízo causado ao paciente.

Dessa forma, ocorre também que, o profissional da medicina quando estiver no exercício de seu ofício e deste provier o erro médico, caso ele possua vínculo empregatício com a empresa hospitalar em questão, responderá subjetivamente mediante a comprovação de sua culpa, enquanto que a responsabilidade do fornecedor, neste caso o hospital será objetiva, sem que haja necessidade de o paciente comprovar a culpa do Hospital. Há, neste caso, que se falar em solidariedade na reparação dos danos causados.

Contudo, o Hospital não tem de indenizar o paciente por erro praticado por médico sem vínculo de emprego ou subordinação com o estabelecimento, que apenas utiliza suas dependências para operações e exames, segundo a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça.

A decisão unânime sem precedente da 2ª Seção do STJ REsp 908.359, que afastou a responsabilidade objetiva dos hospitais pela prestação de serviços defeituosos prestados por profissionais que atuam na instituição sem vínculo trabalhista ou de subordinação.

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL. ERRO MÉDICO. NEGLIGÊNCIA. INDENIZAÇÃO. RECURSO ESPECIAL. 1. A doutrina tem afirmado que a responsabilidade médica empresarial, no caso de hospitais, é objetiva, indicando o parágrafo primeiro do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor como a norma sustentadora de tal entendimento. Contudo, a responsabilidade do hospital somente tem espaço quando o dano decorrer de falha de serviços cuja atribuição é afeta única e exclusivamente ao hospital. Nas hipóteses de dano decorrente de falha técnica restrita ao profissional médico, mormente quando este não tem nenhum vínculo com o hospital seja de emprego ou de mera preposição, não cabe atribuir ao nosocômio a obrigação de indenizar. [...] 4. Recurso especial do Hospital e Maternidade São Lourenço Ltda. provido. (STJ - REsp: 908359 SC 2006/0256989-8, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 27/08/2008, S2 - SEGUNDA SEÇÃO.   Data de Publicação: --> DJe 17/12/2008). (BRASÍLIA, Superior Tribunal de Justiça, 2017).

Dessa forma resta claro o entendimento atual da jurisprudência pátria, acerca da responsabilização civil dos hospitais em caso de danos causados aos pacientes em decorrência de falha do respectivo nosocômio, adotando a teoria da responsabilidade objetiva, baseando-se no artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor.

Corrobora o entendimento de Sérgio Cavalieri Filho (2010, p.382):

[...]. Os estabelecimentos hospitalares são fornecedores de serviços, e, como tais, respondem objetivamente pelos danos causados aos seus pacientes. É o que o código chama de fato de serviço, entendendo-se como tal o acontecimento externo, ocorrido no mundo físico, que causa danos matérias ou morais ao consumidor, mas decorrem de um defeito do serviço. Essa responsabilidade, como trata o próprio texto legal, tem por fundamento ou fato gerador o defeito do serviço, que, fornecido ao mercado, vem a dar causa a um acidente de consumo.

Dessa forma, os danos causados aos pacientes são danos decorrentes de defeitos do serviço, causando acidentes de consumo. Faz-se nítido a relação consumerista constituída, para tanto, pressuposto perfeitamente cabível para a aplicação do Código de Defesa do Consumidor.

5. EXCLUDENTES DA RESPONSABILIDADE CIVIL

Faz relevante saber que responsabilidade civil objetiva do hospital não é absoluta, e pode ser afastada com fundamentação nas excludentes constantes no § 3º do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor, são elas: inexistência de defeito, a culpa exclusiva da vítima ou o fato exclusivo de terceiro. Nos seguintes termos:

§ 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar:
I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;
II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

Relevante também se faz pontuar neste momento as hipóteses em que ocorrem as excludentes de responsabilidade civil subjetiva, nas quais tanto o médico quanto o hospital podem se eximir do dever de indenizar o paciente, desde que demonstrem a sua ausência do pressuposto "culpa" ou a ruptura do nexo de causalidade. São excludentes de responsabilidade, que impedem que se concretize o nexo causal, a culpa da vítima, o fato de terceiro, o caso fortuito e a força maior. À luz dos ensinamentos de Venosa (2004, p.46):

A culpa exclusiva da vítima desobriga ao dever de indenizar, vez que impede o nexo causal. Tal hipótese não consta expressamente no Código Civil, mas a doutrina e a jurisprudência, em consonância com a legislação extravagante, firmaram essa excludente de responsabilidade.

Como exemplo da referida hipótese tem-se o paciente que intencionalmente deixa seu tratamento de maneira displicente, não tomando seus remédios conforme o tratamento prescrito, dessa maneira causando o agravamento de seu quadro clínico. Neste caso há a culpa exclusiva da vitima, e não há que se falar em responsabilidade de indenizar por parte do médico.

Conforme os preceitua Venosa (2004, p.46) se a culpa for concorrente da vítima e do médico causador do dano, a responsabilidade e, consequentemente a indenização serão repartidas, podendo as frações de responsabilidade serem desiguais, na medida da intensidade da culpa.

Ao abordar o fato de terceiro como excludente da responsabilidade civil, tem-se por terceiro, alguém além da vítima e do causador do dano. Conforme os ensinamentos de Sérgio Cavalieri filho (2010, p.67), terceiro é uma outra pessoa alheia que aparentemente não esta ligada à vítima tampouco ao causador, ocorre que em muitos casos, o ato deste terceiro é o causador exclusivo do acontecimento, e afasta assim a relação de causalidade entre o ato do autor e o paciente. Tal assunto vem regulado de forma indireta pelos artigos 929, 930 do Código Civil:

Art. 929. Se a pessoa lesada, ou o dono da coisa, no caso do inciso II do art. 188, não forem culpados do perigo, assistir-lhes-á direito à indenização do prejuízo que sofreram.
Art. 930. No caso do inciso II do art. 188, se o perigo ocorrer por culpa de terceiro, contra este terá o autor do dano ação regressiva para haver a importância que tiver ressarcido ao lesado. (BRASIL, 2015).

Os referidos artigos, não se referem expressamente à culpa exclusiva de terceiro, contudo, de forma indireta, aceitam a possibilidade de reconhecimento de culpa e responsabilidade do terceiro. Possibilita o autor causador do dano que está sendo responsabilizado entrar com ação de regresso contra o verdadeiro culpado do referido dano, e até mesmo a própria vítima tendo conhecimento do culpado, ingressar com ação de responsabilização contra esse terceiro.

Na responsabilidade civil, o caso fortuito decorre de forças da natureza, tais como terremoto, inundação, incêndio não provocado, tempestade, enquanto a força maior decorre de atos humanos como guerra, greves, revoluções. Todas citadas equivalem para afastar o nexo de causalidade. Conforme entendimento de Flávio Tartuce (2011, p.467):

[...] O nexo de causalidade constitui o elemento imaterial da responsabilidade civil, constituído pela relação de causa e efeito a conduta e o dano. Também se afirmou que o nexo é formado pela culpa (responsabilidade subjetiva), pela previsão de responsabilidade sem culpa relacionada com a conduta ou pela atividade de risco (na responsabilidade objetiva).

Tartuce (2011, p.469) esclarece que o caso fortuito não pode decorrer de ato culposo do obrigado, porque a imprevisibilidade do acontecimento da natureza exclui essa hipótese, como por exemplo pode-se citar as enchentes, raios incêndios não provados entre outros.

Portanto, pode-se concluir que o caso fortuito se ligaria aos critérios de imprevisibilidade e irresistibilidade, seria aquela situação que é normalmente previsível. Enquanto que força maior, seria determinada por algo também natural ou humano, mas que não se poderia resistir, mesmo que possa prever sua ocorrência. Ambas as figuras são equivalentes no que toca à exclusão do nexo de causalidade entre a conduta do agente e o dano que possa vir a ocorrer.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O estudo do presente trabalho, teve como meta o entendimento do alcance da indenização na responsabilidade civil, nos casos de erro médico. Procurou trabalhar de forma ampla, abrangendo a figura do médico e dos hospitais que figuram no polo ativo da relação consumerista, levando em consideração também as possíveis falhas advindas do exercício de seu ofício, bem como a ocorrência de situações que possa vir a comprometer a prestação de serviços ao qual obrigou-se o hospital.

Em principio, fez-se necessário o esclarecimento acerca da definição do erro médico, de forma técnica, conforme entende o Conselho Federal de Medicina e ainda o jurista, especialista no assunto suscitado, Genival Veloso França.

Adiante, foi iniciado o estudo acerca do tema central do trabalho, a responsabilidade civil. Neste primeiro momento, tratou-se da relação médico-paciente, e da natureza da responsabilidade civil dos médicos enquanto profissionais liberais, os quais não tenham vínculo de emprego com a sociedade empresária hospitalar. Desta feita, à luz do 14 § 4º do Código de Defesa do Consumidor fez se compreendido que tal natureza em regra está baseada na teoria da culpa, onde, para que o autor do dano responda pelo ato cometido, é necessário que a vítima comprove que ele agiu culposamente. Ainda, nesta etapa, foi investigada a diferenciação entre a obrigação de meio e a obrigação de resultado, e constado foi que diversamente de outros profissionais, o médico em geral, tem obrigação de meio e não de resultado.

Em seguida, foi discorrido sobre a relação de consumo e a sociedade empresária, onde foi exposto sobre a caracterização de sociedade empresária, bem como a definição de hospitais, segundo o Conselho Federal de Medicina. Compreendido se fez que os hospitais, possuem sua responsabilidade baseada legalmente no artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor, e a mesma possui natureza objetiva. Ainda, durante a pesquisa, foi entendido que, caso o médico que possui vínculo com o hospital, venha a cometer alguma falha e esta for comprovada, responderá o mesmo pelo dano de forma subjetiva, e o hospital de forma objetiva solidariamente, segundo os moldes

Posteriormente, foi mencionado as excludentes que afastam a responsabilidade civil nos casos de falhas dos serviços prestados pelos hospitais, constatamos que são elas: inexistência de defeito, a culpa exclusiva da vítima ou o fato exclusivo de terceiro. Lado outro também foi constatado as excludentes que afastam a responsabilidade nos casos de responsabilidade subjetiva dos médicos não vinculados a hospitais, que são elas: o fato de terceiro, o caso fortuito e a força maior.

Logo, foram apresentadas jurisprudências do Superior Tribunal de Justiça, com a finalidade de ratificar todo o teor do conteúdo analisado neste trabalho.

Por fim, em vista de todos os aspectos analisados, compreendi que, a relação médico-paciente e a relação hospital-paciente, estão ambas disciplinadas nos moldes do CDC, vez que, o paciente, se posiciona na condição de vulnerável, e passa a ser considerado consumidor e então a ser inserido no conceito estabelecido pelo artigo 2º do CDC.

Em virtude de toda pesquisa e estudo realizados, conclui-se que, nos casos de falhas advindas de serviços prestados pelos hospitais estes respondem pelos danos causados independente de comprovação de culpa, objetivamente. Enquanto que, os médicos em caso de falha no exercício da profissão, responderão pelos danos causados mediante a comprovação de culpa em alguma das modalidades: imperícia, imprudência ou negligência, subjetivamente. Contudo, sendo o médico vinculado a sociedade empresária hospitalar, em caso de dano ao paciente, este responderá mediante comprovação de culpa de forma subjetiva, e o hospital em questão responderá objetivamente, de forma solidária pelo ocorrido.

7. REFERÊNCIAS

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