Breves considerações acerca do desarmamento

Breves considerações acerca do desarmamento

Procura analisar criticamente os argumentos favoráveis e contrários à adoção do desarmamento no Brasil. Sua abordagem primou pelo aspecto político-social da questão, afastando-se do essencialmente jurídico, sendo uma fonte de reflexão sobre o tema.

Um dos assuntos de maior relevo na atualidade é o que diz respeito ao Referendo sobre a comercialização de armas de fogo no Brasil.

Mesmo não possuindo posicionamento definitivo sobre a questão, acredito que os argumentos até então utilizados - que dariam respaldo à necessidade de desarmar a população - são facilmente refutáveis, ainda que eu admita a possibilidade de votar favoravelmente ao desarmamento...

Na verdade, grande parte das estatísticas e pesquisas até então apresentadas, tanto as favoráveis como as contrárias ao desarmamento, são de origem duvidosa... é um jogo de interesses... Muitas delas são meramente falaciosas: não apresentam o instituto que fez as pesquisas, as bases de dados (quantas pessoas foram ouvidas; classe social destas pessoas; sexo; idade; quais instituições públicas ou privadas contribuíram...), nem o campo de incidência de tais pesquisas (todo o território nacional ou em determinados Estados-membros), etc.

Diante disso, optei por confrontar, racionalmente, os argumentos mais freqüentes, utilizados pelos cidadãos favoráveis ao desarmamento, numa tentativa de aproximação e descoberta da “verdade real”, e do melhor posicionamento a ser escolhido na questão proposta: desarmar ou não desarmar a sociedade?

O primeiro argumento a ser analisado, utilizado em larga escala pelos defensores do desarmamento, é: "as armas que circulam hoje nas mãos de bandidos, um dia foram legais, em mãos de pessoas de bem, mas ou por furto, ou por falecimento, com o tempo, foram parar nas mãos de pessoas mal
intencionadas".

Não questiono o fato de que muitas das armas que vão parar nas mãos dos criminosos já tenham pertencido a cidadãos "de bem" (se é que a pessoa pode ser assim considerada, pois, caso ela fosse, realmente, de bem, não possuiria arma). Acontece que, no meu entender, esta não é a maior fonte de “abastecimento” no armamento dos “bandidos”.

O cidadão que possui arma em casa, geralmente possui uma de baixo calibre... Menos desamparada estaria a população se todos os bandidos utilizassem este tipo de arma, oriunda de furto ou roubo da população civil. A polícia poderia enfrentar de igual pra igual a criminalidade; não haveria receio para polícia subir a “favela”, quando se fizesse necessário; haveria um maior “estado de segurança”. Porém, não é isso o que se vê... todos os dias, em todos os noticiários, vemos o armamento utilizado pelos criminosos... são metralhadoras, fuzis, pistolas 380 e 9 milímetros, granadas e até bazucas! Não acredito que a pessoa chamada "de bem" possua este tipo de arma em casa. Portanto, a arma que o “fora-da-lei” possui é oriunda de tráfico de armas, de desvio de armas destinadas às forças armadas ou às forças especiais da policia e contrabando... As armas anteriormente mencionadas já não são livremente comercializadas nas lojas, o que leva a crer que o desarmamento não irá impedir tal uso...

Outro argumento construído é aquele que defende o desarmamento como uma forma de impedir que os “usuários de drogas, que eventualmente utilizem o crime como uma forma de obter dinheiro para ´bancar´ seu vício, adquiram armas muito facilmente, a qualquer custo, para matar não só a fissura".

No meu entendimento não será o desarmamento que irá impedir estas condutas... A arma poderá virar artigo de venda na “favela” (tal prática apenas se intensificará, pois isso já ocorre), tanto quanto os entorpecentes... exagerando, podemos pensar que o traficante poderá fazer o seguinte pacote: “compre 20 gramas de cocaína e ganhe um ´3 oitão´”!

Nada impedirá que o contrabandista vá a algum país fronteiriço, compre armas e munição (como faz com cigarros, eletrodomésticos e etc.) e venda a preços acessíveis...

É fato: a lei não impede o usuário, apenas a conscientização e a educação... Caso haja demanda de armas (ilegais), estas estarão facilmente disponíveis à compra.

Quando houver crime, o trabalho da polícia pode ser ainda mais dificultado, pois o fato destas armas não serem registradas, fará com que não haja nenhum indício sobre seu dono... atualmente, sendo as armas registradas e legais, quem tem e usa pode ser identificado, ainda que precariamente...

Cito como exemplo o consumo do cigarro... apenas com campanhas maciças, conscientização e educação diminuiu-se, em muito, o consumo.

Não creio que tal resultado teria sido atingido caso optassem pela simples proibição do consumo de cigarro... muito pelo contrário, a proibição gera fascinação, instiga, principalmente os jovens, que ainda não possuem uma personalidade completamente formada...

Sendo os jovens contestadores por natureza, e, considerando que por pura ousadia, gostam de viver à margem da lei, não me impressionaria se, com a proibição do uso de armas, um adolescente que tivesse contatos com o “mundo do crime”, levasse uma arma para a sala de aula, para mostrar o seu “poder” e sua “superioridade” aos colegas... “Olha, é proibido, mas eu tenho!”... o que não ocorre hoje em dia.

Eu concordo com a expressão: "cidadão não precisa de armas". Mas o sujeito que deseja, desnecessariamente, ter uma arma (ainda que de forma "legal"); que tem disposição para se deslocar até uma loja, escolher e gastar uma alta quantia para adquirir uma arma; será capaz de compra-la no "mercado negro", se isso for necessário... Para mim, isso é evidente.

Outra afirmação freqüentemente utilizada é: "O bandido tem a seu favor sempre o elemento surpresa. Se ele entra na sua casa, ele já investigou o alvo e vai pegá-lo de surpresa".

Acredito que esta surpresa exista quando o bandido comete o crime na rua, realmente pegando a vítima despreparada...

Mas na rua, o “cidadão” já é proibido de portar armas... Quando o bandido invade uma casa, geralmente o faz nos horários em não há ninguém (o que poderia fazer com que ele furtasse, além dos bens pretendidos, a arma...), resguardadas as exceções....

Tendo alguém em casa, sabendo da possibilidade de existir uma arma na casa, acredito que o criminoso sinta-se inibido com a invasão... ele não sabe que armas podem existir ou quantas...

Agora, tendo CERTEZA que não há armas em NENHUMA residência, em virtude do desarmamento, ele sentir-se-á estimulado à invasão...

Além disso, deve-se levar em consideração as pessoas que moram em locais descampados, em zonas rurais ou pequenos municípios, distantes de qualquer proteção do Estado, onde não há a mínima assistência policial (e isso não é raro no Brasil!)... Quem defenderá estas pessoas, senão elas próprias?!

Relembrando um pouco a história de nosso país: Por que Lampião (Virgulino Ferreira) “dominou” durante tanto tempo o sertão nordestino, transformando-se no maior criminoso de sua época?! Ele e os cangaceiros tinham armas, os habitantes dos vilarejos não... a assistência militar era escassa, despreparada e desaparelhada... ele virou o Rei do Cangaço!

Há, ainda, o seguinte argumento: “Existem muitos homicídios decorrentes de motivos fúteis... desavenças no trânsito, por exemplo. São chefes de família, que por algum motivo, e por terem acesso a uma arma, acabam cometendo um crime".

Eu contesto tal afirmação: o sujeito que se dispõe a portar uma arma, habitualmente, sem licença, já está cometendo um crime. O fato de atirar em alguém, por qualquer motivo alegado, apenas potencializa e agrava sua conduta. Este sujeito não é "chefe de família" (no bom sentido da palavra), é um criminoso, tanto quanto os demais... uma pessoa com este perfil não exitará em adquirir uma arma ilegalmente, independente da vigência do desarmamento...

A conclusão simplista para o dilema é: "Só diminuindo o número de armas em circulação é que diminuiremos a violência. Com a proibição deve-se pegar quem possui armas e prender."

Já o meu entendimento é diverso: somente com educação, campanhas nas escolas e nos meios de comunicação, maior repressão, fiscalização de fronteiras, polícia melhor preparada e aparelhada, o uso de armas de fogo e, conseqüentemente, a violência diminuirão...

Concordo com a prisão daqueles que portam e utilizam armas de fogo nas ruas. Mas não acredito, ainda (uma vez que não me posicionei definitivamente), que a proibição seja o caminho mais eficiente...

A classe política no Brasil, respeitadas as exceções, vive de imediatismos... combatem as conseqüências, ao invés de combaterem as causas, o que quase nunca resolve os problemas... são atitudes meramente eleitoreiras e populistas...

Um exemplo recente disso é a criação de cotas para negros em universidades... O correto, no meu entender, seria fortalecer o ensino fundamental e o ensino médio, para que o estudante de baixa renda (negros, brancos ou de qualquer etnia) pudesse disputar - em IGUALDADE (assegurada constitucionalmente) - um lugar no ensino superior gratuito... mas esta medida demandaria recursos (na verdade, investimentos!), tempo, qualificação de profissionais e melhoria nas infra-estruturas das escolas públicas...

Ao invés disso, asseguram cotas e colocam um estudante, infelizmente despreparado, para cursar uma faculdade para a qual não está devidamente habilitado (em termos de conteúdo científico)... Torço para que estes estudantes consigam vencer as adversidades, se formem e sejam bons profissionais (mesmo acreditando que aqueles que atingirão estas metas serão exceção dentre os demais)...

A segurança é uma garantia constitucionalmente assegurada ao cidadão... enquanto o Estado não tiver condições de proporcioná-la à população, de forma real e eficaz, entendo precipitado o fato de se retirar o direito à auto-defesa, legalmente praticada...

Bem, esta é a minha opinião... tirem suas próprias conclusões!

Sobre o(a) autor(a)
Rodrigo Ribeiro Figueirôa
Graduado em Direito, UFJF; Especialista em Direito Público, Centro Universitário Newton Paiva; Discente de disciplinas do Mestrado em Ciências Sociais, UFJF;
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