A usucapião de bens móveis segundo o STJ

A usucapião de bens móveis segundo o STJ

Uma abordagem ao instituto jurídico da usucapião, voltado para os bens móveis.

O Superior Tribunal de Justiça, em sede de Recurso Especial: Resp 000.1211-93.2007.8.19.0043RJ, de relatoria da Ministra Nancy Andrighi, decidiu em favor da autora da demanda que buscava judicialmente a propriedade do bem móvel através da Usucapião Extraordinária.

O instituto da usucapião de bem móvel é prevista nos três artigos da Seção I do Capítulo III do Código Civil de 2002, vejamos.

Seção I Da Usucapião Art. 1.260. Aquele que possuir coisa móvel como sua, contínua e incontestadamente durante três anos, com justo título e boa-fé, adquirir-lhe-á a propriedade. Art. 1.261. Se a posse da coisa móvel se prolongar por cinco anos, produzirá usucapião, independentemente de título ou boa-fé. Art. 1.262. Aplica-se à usucapião das coisas móveis o disposto nos arts. 1.243 e 1.244.

No artigo 1.260 encontramos o que se chama Usucapião Ordinária, sendo aquela onde o prazo é menor, no entanto, é necessário justo título e a boa-fé ao adquirir a propriedade do bem móvel.

Neste caso o justo título poderia se tratar de qualquer instrumento particular, recibo, ata, promissórias, ou até mesmo o CRV (Certificado de Registro do Veículo) para o caso dos veículos. Já a boa-fé trata-se da legalidade do ato transacional em que o bem esteve envolvido, ou seja, não deve ser fruto de ato ilícito.

Já no artigo 1.261 temos a figura da Usucapião Extraordinária, para sua constituição o prazo é de cinco anos, no entanto não é necessário justo título ou até mesmo boa-fé. Ou seja, basta que se comprove a posse mansa e pacífica do bem pelo período estipulado.

O artigo 1.262 traz ainda a possibilidade de somar o tempo dos possuidores anteriores ao do possuidor atual para a propositura da demanda judicial.

Então, para aqueles casos clássicos onde o bem móvel é transacionado incontáveis vezes, mesmo estando em nome de terceiro junto aos órgãos administrativos, é possível que se utilize este tempo, o que faz com que a espera para propositura da demanda seja ainda menor.

Neste ponto é onde várias dúvidas pipocam na mente do leitor sobre os casos de restrições judiciai, alienações fiduciárias, os bens que estão arrolados em inventário judicial, dentre tantas outras.

Para sanar as dúvidas é importante ter em relembrar e interpretar o que rezam os artigos.

Restrições judiciais e alienações fiduciárias caracterizariam uma posse de má-fé, o que inviabilizaria a ação de Usucapião Ordinária, porém, em tese, não inviabiliza a ação de Usucapião Extraordinária, desde que cumprido o requisito temporal e a posse mansa e pacífica.

Uma ação judicial onde o bem móvel é objeto da lide descaracterizaria a posse mansa e pacífica, no entanto, uma ação onde o bem é restrito para satisfação de crédito judicial não teria o condão de descaracterizar a posse, visto que o cerne da questão não seria a propriedade do bem.

A demanda foi impetrada inicialmente face a um espólio, o juízo de primeiro grau entendeu que se tratava de inadequação da via eleita, bem como carência no interesse de agir, alegou-se também que a propriedade do bem móvel se efetiva com a tradição da coisa. 

Em sede de Apelação ao Tribunal do Estado do Rio de Janeiro foi mantida a sentença pelos seus termos, o que ensejou o recurso da autora ao Superior Tribunal de Justiça.

Em suma, tanto o juízo inicial quanto o Tribunal entenderam que a autora não era a pessoa correta para propor a demanda e que na realidade não havia mais o que se tratar sobre a propriedade do veículo em questão já que no mundo jurídico a transferência da propriedade de bem móvel ocorre no momento de sua entrega.

É sabido que a transmissão da posse do bem móvel se efetiva com a tradição, ou seja, com a entrega do bem, no entanto, quando se trata de veículos automotores (carros, motos e etc.), existe a necessidade de transferência de propriedade junto ao respectivo órgão administrativo.

Mesmo comprando um veículo, é possível ainda não ser seu dono e exercer sobre ele a plenitude da propriedade quando o seu registro junto aos referidos órgãos não está atualizado.

Foi este o entendimento que embasou a decisão da Corte que, por unanimidade, reconheceu o direito de agir da autora e determinou a reforma das decisões anteriores.

A decisão do STJ é de extrema importância pois pavimenta o caminho para a consolidação de um direito previsto há quase duas décadas e pouco utilizado pelos possuidores de bens que se não conseguem usufruir plenamente daquilo que lhe pertence pois não possui a propriedade plena.

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Wanderson Pereira Milhorance
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