A dificuldade em provar a alienação parental nos processos judiciais
Para o acusado dessa prática, o ônus da prova é extremamente difícil, custoso e muitas vezes impossível de ser contestado. Isso cria um desequilíbrio na relação jurídica e processual, violando os artigos 5º, LV, da Constituição de 1988; 7º e 373, II, do Código de Processo Civil.
INTRODUÇÃO
A população do Brasil está sendo informada, por diversos canais de comunicação, sobre o aumento dos casos de alienação parental direcionados a crianças e jovens. A alienação parental acontece quando pais, avós, tios, padrastos ou madrastas, ou qualquer outra pessoa responsável pela criança ou adolescente (seja de fato ou legalmente), adotam atitudes com o objetivo de prejudicar o vínculo afetivo existente com o outro genitor ou algum parente.
Essa conduta traz sérias consequências para o desenvolvimento das crianças e jovens, afetando negativamente sua formação psicológica e dificultando suas relações sociais ao longo da vida. Provar a ocorrência e os impactos negativos na vida desses jovens muitas vezes é complicado e desafiador.
ONEROSIDADE DO ÔNUS PROBATÓRIO NOS CASOS DE ALIENAÇÃO PARENTAL
As crianças e os jovens são amparados por diferentes leis no sistema jurídico brasileiro, buscando sempre protegê-los e evitar que a dignidade da pessoa em crescimento seja desrespeitada.
É possível destacar a importância do Estatuto da Criança e do Adolescente e da Convenção sobre os Direitos das Crianças, que surgiram a partir da Constituição de 1988 e mudaram o conceito de situação irregular para a teoria da proteção completa.
Conforme discutido por Okuma, Bonassa, Cortez e Massi, é crucial reconhecer que as crianças e adolescentes são detentores de direitos individuais e não devem ser tratados como meros alvos de intervenção estatal ou assistencial.
Independentemente de sua condição social, é essencial garantir que todas as crianças e adolescentes estejam protegidos caso seus direitos fundamentais sejam violados. É preciso respeitar o estado peculiar em que se encontram, ainda em desenvolvimento e em busca de conhecimento para sua formação completa (BONASSA; OKUMA; CORTEZ; MASSI, 2021, p.285).
Portanto, ratifica-se a importância de analisar as bases constitucionais, principalmente relacionadas aos direitos humanos, principalmente para examinar os direitos individuais, incluindo a proteção das crianças e dos adolescentes, a fim de refletir sobre as repercussões legais e sociais nos casos de alienação parental.
Na Carta Magna, já em seu primeiro artigo, III, a dignidade da pessoa humana é um dos princípios fundamentais do Estado brasileiro. O artigo 227 aborda a garantia à entidade familiar, que representa o principal núcleo social que orienta as práticas, os cuidados, a proteção, entre outros, conferidos à criança e ao adolescente.
Nathalia Masson corrobora com essa ideia. O nosso documento legal declara, em seu artigo 227, que é responsabilidade da família, da sociedade e do Estado garantir, de forma prioritária, os direitos à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária para as crianças, adolescentes e jovens, além de protegê-los de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. Esses direitos essenciais são específicos para os indivíduos amparados pela lei, visando assegurar o seu pleno crescimento, e devem ser garantidos por todos (MASSON, 2016, p. 1.361).
É responsabilidade conjunta dos pais, da família, do Estado e da sociedade em geral o compromisso de garantir todos esses direitos básicos que são garantidos às crianças e aos adolescentes, pois eles estão em fase de crescimento e desenvolvimento (artigos 1º a 6º do Estatuto da Criança e do Adolescente), visando prevenir danos físicos e, em especial, psicológicos.
Com essa orientação de que a família é responsável pelo contato inicial entre o indivíduo e a sociedade, surgiu a necessidade de regulamentar práticas que possam prejudicar o desenvolvimento saudável das crianças e dos jovens. A Lei nº 12.318/2010 trata da alienação parental.
O texto da referida lei estabelece de forma resumida que a alienação parental ocorre quando o responsável legal ou de fato da criança ou adolescente interfere em seu desenvolvimento intelectual e emocional com o objetivo de denegrir a imagem do(s) genitor(es) que não possuem a guarda (BRASIL, 2010, online).
Apresenta uma lista exemplificativa, não limitativa, de ações que configuram alienação parental, o que significa que, no âmbito do Direito de Família, especialmente baseado em casos específicos, deve-se considerar situações únicas como possíveis sinais desse prejudicial fenômeno. Ana Carolina Carpes Madaleno e Rolf Madaleno explicam que o processo conhecido como alienação parental se refere a uma iniciativa liderada pelo genitor que detém a guarda dos filhos, com o propósito de influenciar a criança a sentir aversão e repúdio injustificado em relação ao outro genitor.
Isso é feito por meio de diferentes estratégias para minar, interromper ou até mesmo destruir os laços entre a criança e o pai ou mãe não guardião. Como resultado, surgem diversos sintomas que criam uma forte dependência e submissão da criança ao genitor alienante. Uma vez que o processo de alienação se estabelece, a própria criança passa a reforçá-lo (MADALENO; MADALENO, 2015, p. 42).
Caso haja suspeitas de alienação parental, o magistrado deve, mediante solicitação da parte interessada ou do Ministério Público, adotar todas as providências indispensáveis para proteger o bem-estar psicológico da criança e do adolescente. Isso está em conformidade com os artigos 4 e 6 da Lei nº 12.318 de 2010 e o artigo 139, inciso IV, do Código de Processo Civil.
Quando se trata da realidade probatória, a alienação parental não pode ser demonstrada apenas por meio de documentos.
Mesmo que existam indícios materiais, é evidente que a prova oral é mais relevante nesse contexto. No entanto, a principal forma de prova é a perícia, que consiste na realização de um estudo biopsicossocial com a criança e o adolescente, os pais e outras partes interessadas, por meio da equipe técnica designada pelo Juiz (psicólogos, assistentes sociais, etc.).
A disputa gira em torno da veracidade das informações fornecidas. O adolescente, influenciado por interesses ou pressões daqueles que têm sua tutela, pode fornecer dados falsos. No caso das crianças, como suas mentes ainda estão em desenvolvimento e não retêm completamente o que é processado, elas podem inventar histórias sem pensar nas consequências.
Para o acusado dessa prática, o ônus da prova é extremamente difícil, custoso e muitas vezes impossível de ser contestado. Isso cria um desequilíbrio na relação jurídica e processual, violando os artigos 5º, LV, da Constituição de 1988; 7º e 373, II, do Código de Processo Civil.
Com o intuito de garantir a paridade de armas processuais, é permitida a produção de provas testemunhal (com depoimentos das partes e escuta de testemunhas), documental, prova pericial e até mesmo realização de diligências para averiguar a veracidade das alegações presentes no processo, seja a pedido das partes, do Ministério Público ou de ofício. Isso está previsto nos artigos 178, II, 369 a 372, 481 a 484 e 698 do Código de Processo Civil.
CONCLUSÃO
É evidente que a Lei número 12.318/2010 é extremamente importante para assegurar a proteção e o bem-estar psicológico e moral de crianças e adolescentes, com o objetivo de preservar sua dignidade como indivíduos em crescimento.
Seu propósito principal é evitar que os pais ou responsáveis legais, em meio a conflitos pessoais, utilizem os jovens como instrumento de retaliação contra o outro genitor ou guardião.
Os menores são usados como peões para prejudicar os relacionamentos familiares. Como consequência, ocorrem danos psicológicos que afetam o crescimento familiar, social, afetivo, profissional e em diversas outras áreas da vida. direito de defesa das partes, garantindo-se o contraditório e a ampla defesa em todos os casos, mesmo quando o juiz decide pela dispensa de determinada prova. acusado, possibilitando a obtenção de novos elementos para garantir o acesso ao Judiciário e a busca pela verdade dos fatos.
REFERÊNCIAS
BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 6 out. 2022.
BRASIL. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Brasília: DF, Presidência da República. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm. Acesso em: 7 out. 2022.
BRASIL. Lei nº 12.318, de 26 de agosto de 2010. Dispõe sobre a alienação parental e altera o art. 236 da Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990. Brasília: DF, Presidência da República. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2010/Lei/L12318.htm. Acesso em: 7 out. 2022.
BRASIL. Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Código de Processo Civil. Brasília: DF, Presidência da República. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015- 2018/2015/lei/l13105.htm. Acesso em: 12 out. 2022.
MADALENO, Ana Carolina Carpes; MADALENO, Rolf. Síndrome de Alienação Parental: importância de sua detecção com seus aspectos legais e processuais. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2015.
MASSON, Nathalia. Manual de Direito Constitucional. 4. ed. Salvador: Juspodivm, 2016.
OKUMA, Cristina Maiko Oishi do Amaral Campos; BONASSA, Daniela; CORTEZ, Gabriel Cavalcante; MASSI, Clarissa Gaspar. O princípio do peculiar estado da pessoa em desenvolvimento e o caráter pedagógico das medidas socioeducativas em face da redução da maioridade penal. Atuação: Revista Jurídica do Ministério Público Catarinense, Florianópolis, v. 16, n. 34, p. 277- 312, jun./nov. 2021. Disponível em: https://seer.mpsc.mp.br/index.php/atuacao/article/view/153. Acesso em: 7 out. 2022. ISSN: 2595-3966.