Resolução CFM 2.336/2023: a nova publicidade médica (2024)

Resolução CFM 2.336/2023: a nova publicidade médica (2024)

Não podemos esquecer que o principal norte da publicidade médica é a ÉTICA, independente da eventual desatualização das regras vigentes.

 A atuação dos profissionais precisa se ajustar aos critérios éticos, e não o contrário. 

O Conselho Federal de Medicina – CFM anunciou através de seu presidente, Dr. José Hiran Gallo, a aprovação de uma Resolução com novas regras e limites éticos da publicidade médica. O anúncio gerou grandes expectativas, não só para a classe médica, mas para todo o mercado da saúde, que será diretamente impactado pelas mudanças.

A expectativa geral é de uma grande flexibilização das regras, inclusive com a liberação do uso das fotos de “antes e depois”. A ansiedade é maior entre os profissionais da medicina estética, área que sem dúvidas é a mais presente nas redes sociais. 

Segundo o último censo da SBCP, mais de 80% dos cirurgiões plásticos utilizam as redes sociais para a publicidade médica, e pelo menos 60% preferem o Instagram, uma rede social essencialmente visual.

Embora seja difícil prever o que será determinado pelo CFM, creio que teremos somente a modernização das regras para realidade atual, devido à evolução da medicina e da sociedade, impactadas pela tecnologia e pelas redes sociais. Quem espera uma revolução nas regras éticas e a liberação de condutas polêmicas, provavelmente irá se frustrar. 

Contudo, uma mera atualização não resolve o problema atual, pois as regras em vigor são amplas e subjetivas, criando margem para um contorcionismo interpretativo que nem sempre é feito de forma ética. Além da atualização, é preciso estabelecer critérios claros e objetivos para a publicidade médica.

A Resolução CFM 1974/2011, que traça as regras atualmente vigentes da publicidade médica, se limitou a instituir conceitos subjetivos e definições básicas sobre o tema, 12 anos atrás. 

Foi elaborada seguindo as diretrizes do antigo Código de Ética Médica (revogado em 2019). Um breve complemento às regras foi editado 8 anos atrás, através da Resolução CFM 2126/2015 que veio para ajustar as regras ao ambiente digital e às rede sociais, mas não o fez adequadamente. 

Em linhas gerais, proibiu expressamente o uso do “antes e depois”, condenou o compartilhamento reiterado de postagens de terceiros, e vedou até mesmo selfies com pacientes (proibição absurda, diga-se de passagem). Mas deixou de estabelecer critérios objetivos e específicos para as infrações, não cumprindo com sua função.

O novo Código de Ética Médica entrou em vigência em 2019, prometendo ajustes em função das inovações tecnológicas no setor da saúde, e o reforço das regras relativas à publicidade médica. 

O diploma reafirmou como princípio fundamental o impedimento do exercício da medicina como comércio. No art. 58 vedou o exercício mercantilista da medicina, e no art. 51 a concorrência desleal. No art. 37, § 2º formalizou a obrigatoriedade do uso ético das redes sociais. No art. 75 proibiu o uso de imagens de pacientes, mesmo mediante autorização. 

No art. 111, reafirmou o caráter informativo da publicidade médica. No art. 112 vedou o sensacionalismo. E no art. 115, proibiu a participação em anúncios comerciais.

É notável a convergência entre as diretrizes subjetivas do novo Código de Ética Médica, e as Resoluções atualmente em vigor. Portanto, não acreditamos ser coerente que a nova Resolução contrarie estas regras, cassando normas há pouco estabelecidas pelo CFM no novo Código de Ética Médica.

Contudo, é preciso reconhecer que o novo Código de Ética Médica não resolveu o problema, pois as vedações nele previstas continuam subjetivas e genéricas. 

Com isso, não proíbem expressamente algumas condutas antiéticas, mas vedam condutas claramente éticas e inofensivas, como o simples compartilhamento de uma selfie postada por um paciente, ou uma eventual postagem da imagem de um paciente e seu caso clínico nas redes sociais, o que pode ser ético e cumprir com a função informativa.

A proibição genérica e ampla de condutas claramente éticas causou a rejeição às regras vigentes por grande parte da classe médica, normalizando seu reiterado desatendimento. 

Contudo, muitos profissionais aproveitaram este efeito manada para praticar as mesmas condutas, mas de forma antiética e mercantilista. E como as normas não diferenciam adequadamente as condutas, o desatendimento às regras acabou se tornando “a regra”.

Dificilmente veremos a liberação das fotos de “antes e depois” pelo CFM, pois sua proibição possui base sólida em diversos princípios éticos, e flexibilizar a ética em relação a condutas tão sensíveis é um grande risco. A atuação dos profissionais precisa se ajustar aos critérios éticos, e não o contrário. 

A publicidade médica deve ser ética e informativa, precisa ser leal ao paciente, para que o médico não precise o convencer do contrário do que diz a publicidade, ao recebê-lo no consultório.

Contudo, é preciso reconhecer que o uso do “antes e depois” é um excelente recurso para a publicidade médica, quando utilizado com ética e finalidade informativa. 

O comparativo das fotos é uma excelente forma de demonstrar ao paciente as possibilidades e os resultados (bons ou ruins) abordando visualmente diferentes evoluções clínicas. Mas infelizmente, o mal comportamento de alguns reforça a vedação da prática a todos, o que dificilmente será revisto pelo CFM.

Independente da orientação do CFM as fotos seguem sendo largamente utilizadas, muitas vezes de maneira antiética visando a atração de pacientes em abordagens sem qualquer caráter informativo, totalmente mercantilistas. 

Segundo o CREMESP, a especialidade médica com maior número de sindicâncias instauradas por problemas na publicidade médica em 2022, com 30% do total, foi a Cirurgia Plástica. Por estes motivos, acreditamos ser mais factível que o CFM mantenha a atual posição.

O uso antiético da publicidade médica nas redes sociais é o motivo graves consequências que afetam a toda a classe médica no Poder Judiciário, conforme abordado no artigo científico que apresentei no último dia 04/08, no Congresso Mundial de Direito Médico realizado pel.

Neste sentido, não podemos esquecer que o principal norte da publicidade médica é a ÉTICA, independente da eventual desatualização das regras vigentes. Conforme abordado, as redes sociais são um ambiente mais do que adequado para a Publicidade Médica, e o papel de influenciar a sociedade neste campo é do próprio médico, sem sombra de dúvidas. Contudo, este processo informacional deve ser conduzido com ética e foco na saúde do paciente.

Contudo, cabe ao CFM delimitar estas regras com clareza e objetividade, para que os médicos não tenham dúvidas (ou desculpas) entre escolher o caminho da ética, ou das infrações. 

É preciso dar crédito ao CFM por finalmente enfrentar este tema, sinalizando o abandono da “visão romântica” da medicina imposta aos médicos através das regras atuais, que não se encaixam na era da saúde digital, da quarta revolução industrial e das redes sociais. 

Sobre o(a) autor(a)
Renato de Assis Pinheiro
Advogado, professor, escritor, palestrante, debatedor, conferencista; Graduado em Direito pela Universidade FUMEC-MG; Pós-graduado em Direito Processual pela PUC-MG; Pós-graduado em Direito Médico pela Universidade de...
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