A MP das Domésticas

A MP das Domésticas

Análise da MP 284/06, comentando sua alteração ao tramitar no Congresso Nacional e a decisão do Governo Federal em vetar parcialmente essa medida, que se transformou na Lei nº 11.324/2006.

Após a discussão da constituição de uma Comissão Especial sobre Trabalho e Emprego Doméstico na Câmara Federal em novembro de 2005 que criou um ambiente de debate sobre o emprego doméstico, foi editada pelo Governo Federal em março deste ano a Medida Provisória 284/06, com o objetivo de reduzir os custos da classe média e estimular o trabalho com carteira assinada, porém, a medida foi bastante alterada pelo Congresso, com a ampliação dos direitos trabalhistas da categoria, gerando mobilização da classe e da imprensa nacional.

Inicialmente a MP 284 dava apenas o benefício fiscal para empregadores com o objetivo de estimular a formalização do trabalho doméstico, ou seja, permitir à pessoa física descontar na declaração de ajuste anual do Imposto de Renda, a contribuição patronal paga à Previdência Social, equivalente a 12% sobre um salário-mínimo, relativa ao empregado doméstico.

Quando a MP 284 se encontrava em tramitação no Congresso Nacional, acabou sendo desvirtuada com a aprovação de emendas, com o objetivo de ampliar os direitos para as trabalhadoras domésticas.

Assim, as mudanças da MP dos domésticos, foram aprovadas pela Câmara, no dia 28/06/2006, trazendo os seguintes benefícios:

  • O recolhimento pelo empregador do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), a uma alíquota de 8%, e o pagamento de multa de 40% do FGTS em caso de demissão sem justa causa;

Principalmente esse benefício, trouxe muita polêmica e algumas divergências, pois, o recolhimento de FGTS significaria para o empregador que assina um salário mínimo na carteira, um custo mensal adicional de R$ 28,00 e levando em conta o salário-mínimo no valor de R$ 350,00, para o patrão que assina dois salários, o custo mensal do FGTS será de R$ 56,00. Dessa forma essa medida beneficiaria o empregador que assina um salário-mínimo e onerar aquele que assina dois ou mais salários. Já para quem é isento do IR ou tem menos de R$ 560 a descontar de imposto, a medida seria prejudicial. Já a multa de 40% no caso de demissão por justa causa seria vantajosa, em qualquer caso, apenas para o empregado.

E segundo o Ministro do planejamento Paulo Bernardo, “a elevação do custo para o empregador aumentaria a informalidade, justamente o que o governo queria evitar com o benefício fiscal do IR. De acordo com cálculos do governo, o incentivo que o patrão teria para assinar a carteira de trabalho do empregado, da ordem de R$ 560,00 por ano (dedução dos 12% sobre 12 meses de salário mínimo, mais 13% e 1/3 das férias) seria praticamente anulado pelo gasto a mais com o FGTS e multa, equivalente a R$ 522,67. O benefício cairia, portanto, para apenas R$ 37,33.”

  • No caso das férias, o direito sobe de 20 dias úteis para 30 dias corridos, com o pagamento de um terço sobre o salário (fica mantida a obrigatoriedade);
  • Cria-se o salário-família:

Para Ministra Nilcéia Freire [1], o salário-família para as domésticas é inconstitucional e de acordo com dados apresentados pelo Ministro da Previdência Social, Nelson Machado, o custo adicional por ano para a concessão do salário-família às empregadas domésticas é da ordem de R$ 266,6 milhões. Esse cálculo leva em conta apenas o atual número de trabalhadores da categoria com carteira assinada.

  • Estabilidade no emprego desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto;
  • Fica proibido o desconto do salário dos gastos com alimentação, higiene, vestuário e moradia;
  • Descanso remunerado obrigatório de 24 horas, preferencialmente aos domingos, bem como nos feriados civis e religiosos.

Quanto ao empregador, fica obrigado:

  • A Dedução da contribuição previdenciária patronal, equivalente a 12% sobre um salário-mínimo, do Imposto de Renda (um empregado por declaração de IR) nos seguintes casos:

- Salário mensal;

- 13º salário;

- Férias;

- Adicional de férias.

Diante dessas informações, para alguns especialistas, a medida com o objetivo inicial de estimular a formalidade nessa relação de emprego, poderia ter efeito contrário, levando à demissões de muitas domésticas que hoje tem carteira assinada.

De acordo com Mário Avelino [2], a estimativa de demissões poderia chegar a 700 mil com essas emendas, citando também o caso de um administrador que demitiu a empregada após cinco anos de serviço, alegando se tratar de uma medida preventiva, pois, sancionada, a lei o obrigaria a pagar multa de 40% sobre o depósito de FGTS em caso de demissão”.

Veto do Governo

Com toda essa polêmica que girou em torno da chamada MP das domésticas, no dia 19/06/2006, o Governo decidiu vetar parcialmente essa Medida Provisória, retirando do texto os direitos ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e ao salário-família.

A partir da publicação da Lei 11.324 em 20 de julho de 2006, passa a valer a possibilidade de patrões deduzirem, na declaração de Imposto de Renda anual, a contribuição previdenciária de 12% paga em favor das domésticas. Também ficou garantido à categoria direito a 30 dias corridos de férias, com pagamento de um terço sobre o salário, estabilidade em caso de gravidez até cinco meses após o parto e proibição de desconto referente a vestuário, moradia e alimentação.

Ao anunciar o veto do Governo o Ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, argumentou que o Presidente Lula vetou parte desta MP, por terem sido incluídos através do Congresso Nacional, benefícios adicionais, não previstos no texto original da Medida, que tem como princípio, valorizar o trabalho doméstico no Brasil, diminuindo sua informalidade e não o de penalizar os empregadores. Pois, de acordo com levantamento do governo, o Brasil tem 6,7 milhões de empregados domésticos. Desses, somente 1,6 milhões têm carteira assinada.

Pela MP 284, o abatimento do Imposto de Renda, que se limita à alíquota de 12%, recolhida sobre, no máximo um salário mínimo (R$350,00), e válida para apenas uma doméstica por empregador, vai vigorar até 2012, beneficiando os patrões que fazem a declaração completa do IR.

Com esse entendimento, segundo especialistas, caso o Governo tornasse o Fundo de Garantia obrigatório, o benefício de desconto do IR seria completamente anulado e o empregador perderia a cada mês com o depósito do FGTS e recuperaria praticamente o mesmo valor total, no ano seguinte. Desta forma, a MP não alcançaria seu objetivo principal, de estimular a contratação de domésticas com carteira assinada, tendo a minoria delas vínculo empregatício formal.

Ao vetar o salário-família, o governo avalia que a instituição, sem uma fonte de receita para custeá-lo, é inconstitucional. O salário-família é pago pela Previdência Social.

Segundo o consultor Mário Avelino,  o governo ainda não adotou uma medida de impacto para aumentar o número de domésticos registrados. Essa medida seria reduzir a alíquota da contribuição ao INSS do doméstico e do patrão para 6% cada um. Atualmente, o doméstico paga de 7,65% a 11%, conforme o salário; o patrão, 12%. Só que, em geral, o patrão paga as duas contribuições, o que resulta em gasto mensal de 20%, em média, sobre o salário.

Em decorrência do atual desgaste causado pelo veto, o Executivo decidiu, no entanto, formar uma comissão para elaborar um projeto de lei com todas as reivindicações das domésticas e enviar ao Congresso, instituindo o FGTS sem a multa de 40% em caso de demissão sem justa causa e o seguro-desemprego automático para os empregados domésticos.

Para o Ministro da Previdência, Nelson Machado, os empregadores não perderiam com a decisão do governo de obrigar o recolhimento do FGTS para quem assinar a carteira das empregadas domésticas. "A dedução no Imposto de Renda é de 12% sobre quem paga um salário mínimo. O recolhimento do FGTS é de 8%. Como a grande maioria paga um salário mínimo para os trabalhadores, ainda há 4% de ganho. Para quem paga mais, os benefícios empatam"

Porém, por não possuir caráter de urgência, é provável que essa proposta leve meses para ser aprovada. Diante disso ao ser questionado por que o Executivo não editou outra MP para criar o FGTS diferenciado e garantir a aplicação imediata da regra, o Ministro Marinho respondeu: "Decidimos enviar um PL para que o debate não seja influenciado pelo momento eleitoral. Depois da eleição, se o Congresso fizer corpo mole, podemos enviar uma MP".

Enquanto o projeto de lei não for aprovado, os empregadores que já recolhem FGTS das domésticas e, porventura, optarem pela demissão, terão de pagar a multa rescisória, de acordo com a legislação atual do Fundo de Garantia. "Evidentemente haverá um período de transição para a nova legislação", acrescentou o ministro do Trabalho.

  [1] Ministra da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres

[2] Especialista em conflitos patrão-empregado e presidente do Instituto FGTS Fácil

Sobre o(a) autor(a)
Equipe DireitoNet
Conteúdo produzido pela equipe do DireitoNet.
Ver perfil completo
O conteúdo deste artigo é de responsabilidade do autor e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
Lista de leitura
Adicione este artigo à sua lista de itens para ler depois
Adicionar à lista

Artigos relacionados

Leia mais artigos sobre o tema publicados no DN

Notícias relacionadas

Veja novidades e decisões judiciais sobre este tema

Termos do Dicionário Jurídico

Veja a definição legal de termos relacionados

Modelos de Contratos relacionados Exclusivo para assinantes

Crie seus contratos com base nos modelos do DN

Roteiros relacionados Exclusivo para assinantes

Visualize os caminhos que um processo segue na prática

Testes relacionados Exclusivo para assinantes

Responda questões de múltipla escolha e veja o gabarito comentado

Economize tempo e aumente sua produtividade com o DN PRO Seja um assinante DN PRO e tenha acesso ilimitado a todo o conteúdo que agiliza seu processo de elaboração de peças e mantém você sempre atualizado sobre o mundo jurídico. 7.530 modelos e documentos essenciais para o seu dia a dia Atualizados regularmente por especialistas em Direito Ideal para advogados e profissionais da área jurídica Apenas R$ 24,90 por mês Veja exemplos gratuitos