A videoconferência no Processo Penal (Lei n° 11.900/09)

A videoconferência no Processo Penal (Lei n° 11.900/09)

Principais aspectos da Lei que incluiu e alterou dispositivos do Código de Processo Penal brasileiro adequando a videoconferência, na fase interrogatorial ou na inquirição das testemunhas, quando esta se mostrar indispensável.

Considerações Iniciais

Em linhas gerais, “a videoconferência consiste em uma discussão em grupo ou pessoa-a-pessoa nos quais os participantes estão em locais diferentes, mas podem ver e ouvir uns aos outros como se estivessem reunidos em um só local” (What Is, 1998 apud Maria Lúcia Fernandes Carneiro, sem data, introdução) [1].

Essa mesma citação mencionada acima foi utilizada por este autor em sua própria defesa de Tese para Conclusão de Curso para a obtenção do Diploma de Graduação em Direito pela Universidade de Sorocaba, que já em 2007 defendia a adoção da videoconferência em todos os processos, não tão somente no Processo Penal (na época, houve resistência por parte de alguns sobre a ideia).

O artigo 185 do Código de Processo Penal – Interrogatório do Acusado

O interrogatório do acusado se dá em de três formas distintas:

a) Pessoalmente no presídio (art. 185, §1°, CPP);

b) Pessoalmente no fórum (art. 185, §1°, CPP, desde que a segurança do ato não esteja garantida);

c) Por videoconferência.

As garantias trazidas pelo §1° do art. 185 (interrogatório pessoal)

a) Deve ser realizado em sala própria.Não será permitida a realização do ato na própria cela, assim, o estabelecimento prisional deve dispor de uma sala apropriada para o feito, que de ser equivalente a uma sala de audiências no Fórum.

b) Segurança.Todos devem ser amparados por tal medida, inclusive os agentes penitenciários, policiais e os oficiais de Justiça, ou seja, todos envolvidos no procedimento.

c) Presença do Defensor do acusado é obrigatória.Respeito aos princípios do contraditório e da ampla defesa.

d) Publicidade.O local deve ter acesso ao Público em geral que queira acompanhar tal procedimento. Não precisa ter qualificação especial, ou seja, qualquer um do povo pode assistir o interrogatório onde quer que seja realizado.

e) O réu tem o direito de entrevista prévia e reservada com o seu defensor.Não está expressa esta garantia no §1°, mas no §5°. Por se tratar de uma garantia expressa do acusado no interrogatório, inclui-se neste rol.

Este benefício do réu encontra respaldo em dois sentidos: primeiro no direito do acusado se confidenciar com o seu defensor, segundo no direito da advocacia em poder manter o seu sigilo profissional, já que se trata de prerrogativa do advogado.

Em se tratando de interrogatório por videoconferência, será disponibilizada uma linha telefônica exclusiva para que o réu e o advogado/defensor possam se comunicar. Como a linha é exclusiva, é impossível qualquer mandado de interceptação telefônica, esta linha tem que ser, digamos, incorrompível (assim como a entrevista prévia mencionada acima).

O regramento da Videoconferência (§2° do art. 185, CPP)

O dispositivo é expresso ao afirmar que o procedimento a ser realizado por videoconferência é excepcional, ou seja, a regra é do interrogatório pessoal.

  • Quando será possível o interrogatório por meio da videoconferência?

Será possível desde que preencha um dos incisos (requisitos) do artigo 185, §2° do CPP:

I – Risco à segurança pública quando exista fundada suspeita de que o preso integre organização criminosa (exemplo clássico é a do conhecido Fernandinho Beira-Mar) ou que exista um risco de fuga;

II – Para viabilizar a participação do réu no ato (ocorre quando existir relevante dificuldade no seu comparecimento, por enfermidade ou outra circunstância pessoal);

III – Quando o réu possa influenciar a testemunha ou a vítima, causando, assim, uma tumultuação no processo.

IV – Questão de ordem pública.

A expressão “ordem pública” é extremamente extensa e deste modo o juiz terá uma considerável gama de hipóteses enquadráveis neste último requisito, bastará fomentar tal causa em sua decisão.

Na prática, o que tem ocorrido é que o réu não tem ido às audiências por falta de escolta (consequentemente, por falta de segurança). A solução que vinha sendo adotada pelo magistrado era a do adiamento da audiência. Agora, fomentando-se com o inciso IV supra, será possível a adoção da videoconferência assegurando a realização do ato.

O direito do réu ser processado adequadamente também estaria sendo resguardado – os princípios do Devido Processo Legal, da identidade física do juiz, do juiz natural, do acesso à Justiça (ampla defesa e contraditório) e do julgamento em um prazo razoável estarão sendo da mesma forma respeitados.

Tratados internacionais ratificados pelo Brasil exigem a presença física do acusado perante o Juiz. Assim, doutrinadores modernos consonantes com as inovações tecnológicas, destrincharam o princípio da presença física do réu em juízo, viabilizando o entendimento de que tal presença se dá de duas formas distintas:

  • A presencial ou direta (que são os casos do comparecimento pessoal);

  • A remota (que é o caso por meio da videoconferência).

Essas hipóteses asseguram a presença física do acusado perante o juiz, pois ambas estão temporalmente juntas (“ao vivo”).

Comentários sobre os demais parágrafos do artigo 185 do CPP (§3° ao §9°)

Conforme o §3°, as partes serão intimadas 10 (dez) dias antes da realização da videoconferência, assegurando o contraditório do ato, garantindo:

  • A ampla defesa do réu;

  • A ampla acusação do órgão acusador.

Será assegurado ao réu de que possa presenciar todos os atos anteriores ao interrogatório realizados na audiência única (§4°).

O §5° foi comentado quando abordamos o §1°, mas para ressaltar, o réu terá direito a uma entrevista prévia com o seu defensor, sendo que esta reunião será “incorrompível”.

As salas reservadas da videoconferência nos presídios serão fiscalizadas por corregedores e pelo juiz da causa, assegurando a lisura e a probidade do ato (§6°).

O §8° abrange a possibilidade da utilização da videoconferência, isto é, esse meio tecnológico não está restrito ao procedimento do interrogatório. Será possível, portanto, a realização de outros atos processuais (ex.: reconhecimento do acusado).

O §9° completa o entendimento do §8° afirmando que o defensor do réu sempre estará presente na realização de tais atos processuais (tal presença será a direta).

A inquirição das testemunhas por videoconferência (art. 222, §3° do CPP)

O artigo 222 do CPP que trata da inquirição das testemunhas pelo magistrado, sofreu também uma alteração. Na verdade, a lei n° 11.900/09 incluiu um novo parágrafo possibilitando a realização do ato por meio de videoconferência, desde que seja necessária a adoção desse sistema.

A hipótese provável do uso desse recurso é no caso daquelas testemunhas que moram em outra comarca, assim a adoção do sistema inovador contribuiria com a celeridade e a economia processual, além da facilidade do acesso e da segurança por parte da testemunha. Parte da doutrina, neste caso, afirmam que a tendência é de desaparecer as cartas precatórias e rogatórias.

No âmbito da carta rogatória, ou seja, a testemunha se encontra em outro país, a lei não diz expressamente se é possível a adoção da videoconferência, mas por meio de uma interpretação extensiva dos dispositivos, além das já reiteradas celeridade e economia processual, é possível considerar que o ato seja também realizável, mas será necessário um acordo judicial para evitar eventuais reclamações ou problemas.

Conclusão

A videoconferência é uma inovação tecnológica muito interessante e inteligente, uma vez que os acusados não serão prejudicados, pois os direitos da ampla defesa e do contraditório estariam mais que garantidos, inclusive, os custos do Estado serão reduzidos, assim como de todos aqueles envolvidos nessa operação. O Processo Penal brasileiro estará bem servido, bastando o Poder Executivo cumprir as novas exigências legais.

Nota-se, dessa forma, que tal sistema apresenta somente vantagens. Contraditoriamente, alguns ainda resistem aos avanços da era moderna e, por consequência, vão permanecer presos na ultrapassada ideologia do Século XX. É afirmável que tal realidade está finalmente mudando, mas apenas como observação, aquele pensamento retrogrado é o mesmo daquelas pessoas que protestavam quanto ao uso da máquina de escrever e, depois, do computador – Um absurdo!

Por nos encontrarmos na era da informação temos que adotar os meios mais recentes de tecnologia em nosso favor, caso contrário ficaremos antiquados e ultrapassados, já que estaríamos vivendo em desacordo com a nossa época.

Finalmente, não é apenas na videoconferência que temos que nos apoiar, mas também nos processos eletrônicos, assim como outros meios que custeiem menos o Estado (por conseguinte, menos os contribuintes!) e que sejam mais eficientes. Claro que todos os meios devem garantir a segurança e, principalmente, a integridade das informações.

Etapas não podem ser atropeladas nessa evolução tecnológica da Justiça brasileira, mas, no mesmo sentido, também se mostra indispensável o progresso ideológico da sociedade como um todo. Esta realidade está mudando, e, finalmente, o Brasil parece estar se adequando com a era vigente: a da informação/tecnologia.

Notas

[1] Disponível na internet em: http://penta.ufrgs.br/pgie/workshop/mara.htm. Acessado em 13 de novembro de 2007 e em 26 de março de 2009.

Sobre o(a) autor(a)
Lucas Tadeu Lourencette
Jurista, possui bacharelado em Ciências Jurídicas pela Universidade de Sorocaba (2007). Parceiro do DireitoNet desde 2006.
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