Desaposentação e suas principais características
Descrição pontual do Instituto da Desaposentação em seus caracteres, que acabam por afirmá-lo no cenário jurídico pátrio como um verdadeiro instituto jurídico.
Crescente como verdadeiro instrumental de abrigo previdenciário, o instituto da Desaposentação ganha formato próprio e abrangente, amoldando-se cada vez mais no cenário jurídico na realidade diária dos segurados tutelados.
De fato, sua justificação está inserida dentro do
conceito de valor social, pois, o âmago previdenciário encontra na
dignidade humana um de seus principais aspectos propulsores.
Acerca da construção fática desse objetivo,
Epaminondas de Carvalho1,
em singular artigo científico sobre o tema, aborda que:
“O instituto da desaposentação objetiva uma melhor aposentadoria
do cidadão para que este elo previdenciário se aproxime, ao máximo,
dos princípios da dignidade da pessoa humana e do mínimo
existencial, refletindo o bem estar social.”
Por sua vez, o Professor Theodoro Vicente Agostinho2
com especial maestria leciona acerca desse novel
instituto:
“Urge ainda mencionar que a Desaposentação visa autenticamente o
aprimoramento e concretização da proteção individual, não tendo
o condão de afetar qualquer preceito constitucional, pois, jamais
deve ser utilizada para a desvantagem econômica de quem quer que
seja. Também é fato, que, por meio da Desaposentação, o
indivíduo, diante de realidades sociais e econômicas divergentes,
almeja em si, tentar superar as dificuldades encontradas, pugnando
pela busca incessante por uma condição de vida mais digna”.
Percebe-se então, que esse incontroverso instrumental,
de extrema atualidade no momento jurídico atual, detém vários
caracteres que o coloca na condição de um autêntico instituto de
direito, ainda mais por se tratar de uma ferramenta de acesso ao
sistema protetivo.
Neste ângulo, o estudo conceitual da Desaposentação,
por si só, retrata suas nuanças diretivas e comprovadoras de sua
absoluta legitimidade hodierna, ainda que contestada por alguns.
Sendo, pois, ferramenta do abrigo previdenciário,
importante conhecer seus modulados caracteres, valendo destacar,
pontualmente, os seguintes:
Ato Jurídico por excelência,
já que, de fato, a manifestação da Desaposentação, reflete
essencialmente na ordem jurídica, sobretudo pelo fato que uma
relação constitucional é invocada, como exercício de adequação
de suas finalidades, onde a vontade hipotética ganha terreno, no
plano fenomênico, além, de que a aludida característica insere o
instrumental dentro do ordenamento pátrio, mitigado por um
específico ramo da ciência jurídica;
Ato Deliberativo Voluntário,
sendo plenamente inviável dissociar tal fato jurídico à
incontroversa deliberação voluntária do sujeito de direito,
abrangido pela proteção previdenciária, onde o destinatário do
pacote previdenciário é que manifesta seu interesse jurídico em
desfazer uma situação jurídica existente, almejando uma correta
adequação futura, tendo, o direito social da aposentadoria
aprimorado, como finalidade direta justificadora;
Ato Temporal: como
conceitualmente explicitado, o que se vê, realmente é a alteração
temporal de um ato jurídico do presente, constituído no passado,
mas, com fim colimado de mudança para o futuro, isto é, com efeitos
jurídicos a serem sentidos a partir da alteração perpetrada;
Ato Personalíssimo:
já que o objeto da pretensão a ser desfeito, quer seja, a
aposentadoria, também encontra individualidade do sujeito de
direito, pois, esse interessado, manifesta o manejo de sua pretensão
conexa à sua personalidade jurídica;
Ato Subjetivo: na
Desaposentação se perquiri as condições subjetivas do indivíduo
protegido, suas necessidades, especificidades, deliberações,
condições de vida, enfim, ao contrário do objetivismo, perpetra
manifestação de vontade oriunda de condições subjetivas por
excelência;
Ato Desconstitutivo:
visa a desconstituição jurídica de uma relação atual, a
modificação estrutural de um vínculo previdenciário para a
formação e constituição de outro, melhor, mais vantajoso e em
melhores condições econômicas;
Direito Patrimonial:
por certo, integrante do patrimônio jurídico do sujeito de direitos
tutelado pelo plano constitucional previdenciário, já que, seu fim,
objeto jurídico a ser desfeito representa verdadeiro direito social
que associa o patrimônio jurídico do trabalhador, razão de que, o
inverso, tratante do mesmo objeto jurídico, não pode ter
interpretação divergente. Oportuno, ressaltar que o Colendo
Tribunal Especial, confirma essa característica, ora apontada,
“PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. RENÚNCIA A BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. POSSIBILIDADE DIREITO DISPONÍVEL. ABDICAÇÃO DE APOSENTADORIA POR IDADE RURAL PARA CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR IDADE URBANA. 1. Tratando-se de direito patrimonial disponível, é cabível a renúncia aos benefícios previdenciários. 2. Faz jus o autor a renúncia da aposentadoria que atualmente percebe – aposentadoria por idade, na qualidade de rurícola – para o recebimento de outra mais vantajosa – aposentadoria por idade de natureza urbana. 3. Recurso especial conhecido e provido.”3
Ato de Renúncia Vinculado:
como antes explicitado, implica em uma verdadeira renúncia ao objeto
da aposentação, mas de maneira vinculada ou conexa, isto é, só se
justificando para a ocorrência de uma transmudação jurídica a dar
novos contornos a relação previdenciária a que o interessado se
encontra inserido, onde renuncia algo, mas, com projeção futura
para a transformação positiva do objeto da reversão, razão de
que, a renúncia por si só implicaria desta forma na desistência do
exercício de um direito, ao contrário da Desaposentação, que
ratifica o desejo por uma nova prestação previdenciária com novas
perspectivas sociais;
Direito Disponível:
indubitavelmente, o ato positivo da aposentação ganha contornos
jurídicos da disponibilidade, inserindo-se no patrimônio jurídico
do tutelado como de direito disponível, já que sua vontade,
justificada pelo seu fim, ganha relevo dentro da essência da tutela
previdenciária.
Qualificando o ato positivo da aposentação,
que resulta na aposentadoria, como um direito disponível, o
horizonte norteador da Desaposentação ganha os mesmos ares, já que
o titular de direitos, delibera, a seu exclusivo crivo exercer ou não
tal prerrogativa.
Em plena percepção acerca desta notória
disponibilidade da aposentadoria previdenciária, o Colendo Superior
Tribunal de Justiça já há alguns anos, através de suas ínclitas
duas Turmas Julgadoras da matéria, sedimentou acerca deste prisma,
onde, o guardião da Legislação Federal, englobando a análise de
todos os diplomas jurídicos previdenciários correlatos, através de
vários e reiterados julgados asseverou sobre a disponibilidade
jurídica da prestação previdenciária.
Neste ínterim, vale conferir a compreensão do ínclito
Tribunal,
“APOSENTADORIA PREVIDENCIÁRIA. RENUNCIA. TEMPO.
APOSENTADORIA ESTATUTÁRIA. A aposentadoria previdenciária, na
qualidade de direito disponível, pode sujeitar-se à renúncia, o
que possibilita a contagem do respectivo tempo de serviço para fins
de aposentadoria estatutária. Note-se não haver justificativa
plausível que demande devolverem-se os valores já percebidos àquele
título e, também, não se tratar de cumulação de benefícios,
pois uma se iniciará quando finda a outra.”4
Ato Instrumental: na
sua essência, a Desaposentação se revela como uma ferramenta, um
verdadeiro utilitário disponível ao sujeito de direitos, abrigado
pela tutela previdenciária, que tem ao seu dispor um mecanismo
válido de exercício de um direito social a ser aprimorado.
É que na Desaposentação ou desaposentadoria o que se
cogita é a modificação de um ato jurídico existente, inserido em
uma prestação previdenciária plenamente validade e usufruída,
razão de que para esta alteração há a necessidade de se percorrer
pelo caminho deste utilitário previdenciário, cuja
instrumentalidade demonstra, de outro lado, sua imprescindibilidade;
Ato Judicial: diante
do contexto vigente, ante a inexistência de uma regulamentação
expressa, cuja missão foi entregue constitucionalmente ao Poder
Legislativo, aludido instrumental tem sido proclamado tão somente
por intervenção do Poder Judiciário, razão de que postular no
cenário administrativo do gestor da prestação, seja pelo Regime
Geral, seja pelo Regime Próprio de Previdência, é esbarrar em
vários entraves jurídicos restritivos que na verdade, exclui o
interessado da própria proteção previdenciária.
Neste âmbito, importante e necessário se torna uma
análise mais acurada desta característica.
É que a dimensão adjetiva da Desaposentação tem sido
exaurida com todos os seus contornos pela tutela jurisdicional.
Essencialmente, ao que se percebe a Desaposentação
ganha oxigênio através da tutela jurisdicional, sendo inadimitida
perante o gestor autárquico.
Referida qualidade do instituto, demonstra, nada mais,
do que a complexidade do assunto, quando abordado em seu tecnicismo
jurídico, quando os personagens integrantes da relação
previdenciária, devedores da aplicação da tutela social fomentam
discussões meramente técnicas, dissociados dos fundamentos sociais
do texto constitucional.
Logo, o atuar judicante, como verdadeiro guardião de
direitos fundamentais e dirimidor de conflitos, contribui e muito
para o exercício dos até aqui explorados direitos sociais, pois, a
natureza social, existencial e substancial da aposentadoria é sempre
destacada pelos pronunciamentos judiciais que dão vida ao tema.
De outro lado, tal aspecto de atual visibilidade no
cenário jurídico vigente, também reflete a análise restrita e
fria dos gestores de Previdência, que, invocam tão somente o
equilíbrio atuarial como óbice a pretensão, além de vários
outros elementos.
Assim, sendo um ato exclusivo de atual pronunciamento
judicial, a Desaposentação, acaba ganhando mais força, coesão e
eficácia, onde o Poder Judiciário, por já reiteradas vezes,
consigna a plena viabilidade jurídica do instituto, reforçando a
tese de que a jurisprudência, como nobre fonte do direito e
resultante de interpretação judicante, contribui e muito para a
efetivação de direitos fundamentais.
Ao que se vê, como todo instituto da ciência jurídica,
a Desaposentação possui caracteres próprios, específicos, que o
legitimam no cenário hodierno, dando coesão aos seus fundamentos
originários, o que, por si só, já afasta qualquer tentativa
simplista e restritiva de sua atuação.
Portanto, mitigando a Desaposentação em seus
caracteres é aferir sua absoluta validade como utilitário jurídico
de concretização de um ideário constitucional, que, nas palavras
do Mestre e Doutor Miguel Horvath Júnior5 “consistem em clausulas pétreas implícitas
na categoria de normas intangíveis relativas aos direitos
fundamentais”.
1 CARVALHO, Felipe Epaminondas de. Desaposentação: Uma Luz no Fim. Disponível: httt//:forense.com.br/Artigos/Autor/Felipe Carvalho/desaposen-tacao.html.
2 AGOSTINHO, Theodoro Vicente/ SALVADOR, Sérgio Henrique. Desaposentação – Instrumento de Proteção Previdenciária. 1ª Ed. São Paulo: Conceito, 2011. pg.38/39.
3 STJ, REsp n.310884/RS. 5ª Turma. Relatora Ministra Laurita Vaz. DJ 26.09.05.
4 STJ, REsp n. 692.628-DF, Rel. Min. Nilson Naves, DJ 17.05.2005.
5 Revista de Direito Previdenciário da Escola Paulista de Direito. Ano II. Número 02. São Paulo: 2006. pg.247.