Prescrição antecipada ou virtual: seu reconhecimento e aplicação no direito penal

Prescrição antecipada ou virtual: seu reconhecimento e aplicação no direito penal

Trata da prescrição antecipada, que é o reconhecimento da prescrição do "ius puniendi" do Estado, antes do término da ação penal. Pois, ante uma projeção lógica a condenação não produziria efeito algum, motivo que vale para não onerar os cofres públicos.

É importante ao advogado criminal, diga-se, é mesmo imperativo e imprescindível a este profissional, conhecer e fazer uso correto do instituto da prescrição, como um instrumento de evidente importância na defesa de seus clientes.

Decerto, a prescrição virtual ou antecipada passou a ser aceita recentemente em nosso direito. Por ora, entendida como um novo instituto, capaz de antecipar-se no tempo; trazendo ao presente situações futuras, obviamente, situações que serão acauteladas pela observação de todos os critérios já previstos em lei e de acordo com os preceitos necessários à sua análise. Sua projeção ficta no tempo, não visa descaracterizar, nem mesmo alterar o resultado fático que se alcançaria, caso, não foi declarada neste tempo hábil. De tal modo, no tempo serve-nos tão-somente, para demonstrar que, o direito de punir em perspectiva se desintegra em razão do decurso do tempo, vindo o estado a carecer de interesse de agir, onde o processamento evolutivo e progressivo do feito, deixa de produzir o resultado quisto ou esperado, noutras palavras, não produziria efeito algum.

Em razão disto, deve o feito ser extinto sem julgamento do mérito por ser carecedor de condição fundamental da ação penal. O que na fase de Inquérito, resulta em arquivamento, com a ressalva contida do artigo 18, do CPP.

Nota-se que, a prescrição antecipada, trata-se na verdade de um caso de falta de interesse de agir ou justa causa para continuidade da ação.

Por isto, esta prescrição pode ser definida como a declaração antecipada de prescrição retroativa, trazendo a vantagem de não permitir a onerosidade dos cofres públicos, pois, nesta, todo o custo dispendioso da ação penal, que será poupado, em face do resultado previsto, que nada mais é, senão o prognóstico de um desfecho insatisfatório, ou seja, em desacordo com a pretensão estatal punitiva.

E o interesse de agir ou a justa causa à propositura da ação penal, que sugere sempre que o processo vislumbre-se como um instrumento dual. De um lado, é exercício de cidadania, e de outro, um comprometimento do Estado-Juiz no exercício de sua função de dizer-nos o direito. O processo criminal como instrumento exige resultado útil e eficaz e, não teria razão de ser, se o somatório de todas as suas fases instrutórias e dispendiosa composição de seus atos, ao final, não se justificassem. Seria isto, conceber a validade existencial de um procedimento ‘custoso’ sob todos os aspectos, porém, desprovido de finalidade, haja vista ser estimulado e impulsionado mesmo ante uma razão inócua, e que não fundamenta sua propositura ou desempenho.

Portanto, mesmo após ter sido afirmada a ação penal e viabilizado seu trâmite, pela inutilidade superveniente da situação processual, é de ser extinto o processo crime. Neste sentido, temos o julgado proferido pela Sétima Câmara Criminal, do Tribunal do Rio de Janeiro, no Hábeas Corpus sob nº 2006.059.04422, relatado pelo Desembargador Gilmar Augusto Teixeira, datado de 29/08/2006:


Assim, decretada a prisão preventiva com afirmação de que o paciente estava furtando-se à aplicação da lei penal e ao processo, sem que tenha sido realizado o ato citatório e tendo ele comparecido ao interrogatório, tudo isto somado à possível ocorrência de prescrição pela pena futura e virtual, é de se conhecer a ordem, CONCEDENDO-SE, com expedição de Alvará de Soltura”.


Obviamente, compondo o nexo da finalidade adstrito a todas as atuações jurisdicionais; mais estreitamente ligada àquelas em que se suscita o reconhecimento da prescrição antecipada, temos que a entrega da tutela estatal, assim como as demais funções da administração pública, têm em seu escopo a égide teleológica da eficiência e eficácia, nos termos do “caput”, do artigo 37, da Constituição Federal, o que implica no resultado desta atuação jurisdicional com um desfecho justo, e, o desfecho justo por nós mencionado, pode significar o reconhecimento antecipado, através da projeção pena, de sua inaplicabilidade.

E, neste sentido, mesmo não sendo questão pacífica em nossos Tribunais, a prescrição antecipada vem ganhando espaço e a inteligência interpretativa, tornando-se uma aplicação diferenciada de um instituto, cuja existência já está contemplada em nossa legislação.


Quando o único resultado previsível levará, inevitavelmente, ao reconhecimento da ausência de pretensão punitiva. O interesse de agir exige da ação penal um resultado útil. Se não houver aplicação possível de sanção, inexistirá justa causa para a ação penal. Assim, só uma concepção teratológica do processo, concebido como autônomo, auto-suficiente e substancial, pode sustentar a indispensabilidade da ação penal, mesmo sabendo-se que levará ao nada jurídico, ao zero social. E a custas de desperdício de tempo e recursos materiais do Estado. Desta forma, demonstrado que a pena projetada, na hipótese de uma condenação, estará prescrita, deve-se declarar a prescrição, pois a submissão do acusado ao processo decorre do interesse estatal em proteger o inocente e não intimidá-lo, numa forma de adiantamento de pena. É a hipótese em julgamento”. DECISÃO: Apelo ministerial desprovido. Unânime. (Apelação Crime Nº 70018365668, Sétima Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sylvio Baptista Neto, Julgado em 29/03/2007).


Como é de conhecimento do advogado criminal, a prescrição é no universo prático um elemento de substancial importância, devendo ser conhecida e reconhecida, em qualquer uma de suas espécies ou modalidades. E mesmo para a escolha da melhor tese defensiva, deve-se ter em vista a prescrição. Às vezes, ante a vontade de uma solução absolutória, sem subsidio nos autos, chega-se a uma condenação com pena maior. Porém, se sustentada pela defesa tese desclassificatória, com a cominação de pena menor, está circunstancia pode, muitas vezes, levar à extinção da punibilidade pela prescrição. Inclusive, com sua observância, nesta nova modalidade.

Cumpre lembrar que, a prescrição é questão de direito material, e, assim sendo, para seu computo, aplicam-se os princípios previstos no artigo 10 do CP, o que significa dizer, não está sujeita à suspensão em razão de férias, recesso, finais de semana ou feriados.

Todavia, cabe lembrar que, a prescrição da pretensão punitiva, sobre a qual incide a antecipada, é a chamada de prescrição da ação, pois é assim denominada porque é como se tivesse sequer existido a ação penal. Os seus efeitos são extinguir a punibilidade sem julgamento do mérito, não devendo constar de Folha de Antecedentes, e obviamente, não podendo gerar reincidência.

De tal modo, para a verificação da ocorrência da prescrição virtual, ou seja, antes do recebimento da denúncia ou de prolatada a sentença, deve-se calcular o lapso prescricional considerando a pena máxima cominada ao delito que está sendo apurado.

Assim, concluímos convictos de que, a prescrição antecipada conclama seu reconhecimento em qualquer instância em que for invocada, ou verificada. Porque reiteramos ser passível de ser conhecida de ofício, estando dentre todas as demais questões de ordem pública. E finalizamos, com o expressivo julgamento proferido nos autos de Habeas Corpus, sob nº 70017025438, Relator: Nereu José Giacomolli, Sétima Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Julgado em 26/10/2006:


A prescrição penal que atinge o direito de punir do Estado, em face do transcurso do tempo, tem por base a ausência de resposta punitiva do Estado no prazo razoável, o que torna desnecessária a incidência do ius puniendi. Possível é o reconhecimento da prescrição, antecipadamente, sem necessidade de instrução do feito quando, dos autos, houver de demonstração inequívoca de que, mesmo havendo condenação, em face da pena aplicada, esta resultaria sem utilidade. Não há punibilidade concreta quando o processo é utilizado para instrumentalizar o nada, o vazio, o inócuo e para maquiar situações cujo resultado será ineficaz”.


Tem-se que, após a análise das circunstâncias processuais, pessoais do agente, mais observações às disposições legais pertinentes à aplicação da pena; seremos conhecedores dentre do caso concreto, os limites mínimos e máximos que deva encontrar nossa projeção, e sem margem de erro, será esta projeção capaz de anteceder o resultado fático, e noticiar com certeza que, ao final do processo, a punição restará fatalmente prescrita.

É assim, um exercício mental de caráter objetivo, pois, desde logo, se tem certo que, apurada a autoria e circunstâncias do fato, caso venha ser proposta a ação penal, ou, julgada procedente, a pretensão punitiva do estado estaria ao final fulminada pela prescrição. Então, há de se impor à prescrição antecipada.

Sobre o(a) autor(a)
Reinaldo Maio Teixeira
Advogado Criminalista, Pós-graduado em Direito Penal; Direito Processual Penal, e Psicanalista.
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