Cooperativa central e conselheiros fiscais não respondem solidariamente por obrigações de cooperativa singular

Cooperativa central e conselheiros fiscais não respondem solidariamente por obrigações de cooperativa singular

Por unanimidade, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu não haver responsabilidade solidária de cooperativa central na hipótese de liquidação de uma cooperativa singular a ela filiada. Ao reformar acórdão do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT), o colegiado também decidiu que os membros do conselho fiscal da cooperativa singular liquidada não são responsáveis pelos prejuízos suportados pelo cooperado.

O recurso julgado se originou de ação de indenização por danos materiais e morais ajuizada por um cooperado contra a Central das Cooperativas de Crédito dos Estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul (Sicoob Central MT/MS), a Cooperativa de Crédito Rural do Pantanal Ltda. e os administradores e integrantes do conselho fiscal desta última.

Segundo o processo, o cooperado fez aplicação financeira na Cooperativa Rural do Pantanal. Antes da data prevista para o resgate, a cooperativa encerrou suas atividades, e o dinheiro investido ficou bloqueado. A sentença condenou os administradores, a cooperativa central e a cooperativa singular, solidariamente, a restituir o valor aplicado e a pagar indenização por danos morais. O TJMT reformou parcialmente a sentença, para reconhecer a responsabilidade solidária dos demais réus, membros do Conselho Fiscal.

No recurso especial submetido ao STJ, a Sicoob Central MT/MS sustentou que os negócios firmados pela cooperativa singular são de sua exclusiva responsabilidade, não havendo solidariedade com a cooperativa central. Os integrantes do conselho fiscal da Cooperativa do Pantanal também apresentaram recurso especial requerendo a exclusão de sua responsabilidade.

Independência

Segundo a relatora, ministra Nancy Andrighi, o sistema cooperativo de crédito tem a finalidade de permitir acesso ao crédito e a realização de determinadas operações financeiras no âmbito de uma cooperativa, a fim de beneficiar seus associados. Ela afirmou que, ao longo de sua evolução normativa, foram privilegiadas a independência e a autonomia das cooperativas singulares, das centrais e das confederações.

Nos termos da regulamentação vigente – ressaltou Nancy Andrighi –, as cooperativas centrais do sistema cooperativo de crédito devem, entre outras funções, supervisionar o funcionamento das cooperativas singulares, em especial o cumprimento das normas que regem esse sistema.

"No entanto, sua atuação encontra um limite máximo, que é a impossibilidade de substituir a administração da cooperativa de crédito singular que apresenta problemas de gestão", completou.

De acordo com a magistrada, não há na legislação nenhum dispositivo que estabeleça responsabilidade solidária entre os diferentes órgãos que compõem o sistema de crédito cooperativo. "Eventuais responsabilidades de cooperativas centrais e de bancos cooperativos devem ser apuradas nos limites de suas atribuições legais e regulamentares", acrescentou.

Culpa ou dolo

A ministra destacou que o artigo 39 da Lei 6.024/1974 trata, única e exclusivamente, de responsabilidade subjetiva dos administradores e dos conselheiros fiscais da instituição financeira por seus atos ou omissões em que houver culpa ou dolo.

Segundo Nancy Andrighi, a melhor interpretação para a lei que trata da intervenção e da liquidação extrajudicial de instituições financeiras exclui os membros do conselho fiscal da responsabilidade solidária prevista para os administradores no artigo 40, restando, em relação aos conselheiros, apenas o disposto no artigo 39.

"Na hipótese em julgamento, tal conclusão implica a impossibilidade de se declarar a solidariedade dos membros do conselho fiscal pelos prejuízos causados com a liquidação da cooperativa singular, especialmente porque fundamentada apenas em uma suposta demora em sua atuação", disse a relatora.

Ao dar provimento aos recursos, a turma afastou a responsabilidade da Sicoob Central MT/MS e dos integrantes do conselho fiscal da cooperativa singular pelos prejuízos causados ao cooperado.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.778.048 - MT (2018/0282031-5)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : CENTRAL DAS COOPERATIVAS DE CREDITO DOS ESTADOS DE MATO
GROSSO E MATO GROSSO DO SUL - SICOOB CENTRAL MT/MS
ADVOGADO : ROBERTO CAVALCANTI BATISTA E OUTRO(S) - MT005868A
ADVOGADA : ANDRESSA CALVOSO DE CARVALHO - MT006173
RECORRENTE : JOAO BATISTA NUNES RONDON FILHO
ADVOGADOS : FELIPE DE OLIVEIRA SANTOS - MT006745
RENATA DE SOUZA LEÃO - MT013511
LEONARDO MAIA MACEDO - MT020000
RECORRENTE : VICENTE MAMEDE DE ARRUDA
ADVOGADOS : DINARA DE ARRUDA OLIVEIRA E OUTRO(S) - MT004914
DILMAR DE ARRUDA CAMPOS - MT008195A
RECORRENTE : ANTONIO SEBASTIAO DA COSTA MARQUES
RECORRENTE : JANIO MARCIO RONDON
RECORRENTE : JORGE LUIS DE ARRUDA E SILVA
ADVOGADOS : JOÃO NORBERTO ALMEIDA BRITO - MT003688
PAULO COSME DE FREITAS E OUTRO(S) - MT003739
RECORRIDO : OS MESMOS
INTERES. : AIGO CUNHA DE MORAES
INTERES. : CELSO LUIZ DE FIGUEIREDO
INTERES. : FRANCISCO DE ASSIS E SILVA NETO
INTERES. : FRANCISCO JOSE DE ASSIS JUNIOR
INTERES. : MANOEL CRISTINO DE ARRUDA MARQUES
ADVOGADOS : JORGE AURÉLIO ZAMAR TAQUES E OUTRO(S) - MT004700
ALEXANDRE DIAS REBOUÇAS - MT009658
INTERES. : ROBERTO ANTONIO VAZ GUIMARAES
INTERES. : MANOEL EVARISTO DA SILVA
ADVOGADO : LUIS LAUREMBERG EUBANK DE ARRUDA - MT004493
INTERES. : CLAUDIO SEVERINO LEAL
INTERES. : COOPERATIVA DE CREDITO RURAL DO PANTANAL LTDA
ADVOGADO : SEM REPRESENTAÇÃO NOS AUTOS - SE000000M
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO DE DANOS MATERIAIS E
MORAIS. SISTEMA NACIONAL DE COOPERATIVAS DE CRÉDITO. NEGATIVA DE
PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. AUSÊNCIA. RESPONSABILIDADE DAS
COOPERATIVAS CENTRAIS E SINGULARES. INDEPENDÊNCIA E AUTONOMIA.
AUSÊNCIA DE PREVISÃO DE RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. MEMBROS DO
CONSELHO FISCAL. RESPONSABILIDADE. SOLIDARIEDADE. INEXISTÊNCIA.
1. Ação ajuizada em 15/02/2005, recurso especial interposto em 17/01/2017
e concluso a este gabinete em 27/11/2018.
2. O propósito recursal consiste em determinar a existência da
responsabilidade da cooperativa central, em razão da liquidação de uma
cooperativa singular a ela filiada. Além disso, também se analisa a
responsabilidade dos membros do conselho fiscal da cooperativa singular
liquidada pelos prejuízos suportados pelo cooperado.
3. Na ausência de omissão, contradição ou erro material, não há violação ao
art. 1.022 do CPC/2015.
4. O sistema cooperativo de crédito tem como maior finalidade permitir
acesso ao crédito e a realização de determinadas operações financeiras no
âmbito de uma cooperativa, a fim de beneficiar seus associados. Ao longo
de sua evolução normativa, privilegia-se a independência e autonomia de
cada um de seus três níveis (cooperativas singulares, centrais e
confederações).
5. Nos termos da regulamentação vigente, as cooperativas centrais do
sistema cooperativo de crédito devem, entre outras funções, supervisionar o
funcionamento das cooperativas singulares, em especial o cumprimento das
normas que regem esse sistema. No entanto, sua atuação encontra um
limite máximo, que é a impossibilidade de substituir a administração da
cooperativa de crédito singular que apresenta problemas de gestão.
6. Não há na legislação em vigor referente às cooperativas de crédito
dispositivo que atribua responsabilidade solidária entre os diferentes órgãos
que compõem o sistema cooperativo. Eventuais responsabilidades de
cooperativas centrais e de bancos cooperativos devem ser apuradas nos
limites de suas atribuições legais e regulamentares.
7. O art. 39 da Lei n. 6.024/1974 trata, única e exclusivamente, de
responsabilidade subjetiva dos administradores e dos conselheiros fiscais da
instituição financeira pelos atos praticados ou omissões em que houverem
incorrido com culpa ou dolo.
8. Na hipótese em julgamento, a melhor interpretação a ser conferida à
aplicação dos dispositivos mencionados (arts. 39 e 40 da Lei 6.024/74)
implica em afastar os membros do Conselho Fiscal do âmbito de aplicação
do art. 40, restando apenas o disposto no art. 39 ambos da mencionada lei.
Portanto, é impossível a declaração de solidariedade dos membros do
conselho fiscal pelos prejuízos suportados pela liquidação da cooperativa de
crédito singular.
9. Recurso especial de CENTRAL DAS COOPERATIVAS DE CRÉDITO DOS
ESTADOS DO MATO GROSSO E MATO GROSSO DO SUL – SICCOB CENTRAL
MT/MS conhecido e provido.
10. Recurso especial de JOÃO BATISTA NUNES RONDON FILHO conhecido e
provido.
11. Recurso especial de ANTONIO SEBASTIÃO DA COSTA MARQUES, JÂNIO
MÁRCIO RONDON e JORGE LUIZ DE ARRUDA E SILVA conhecido e provido.
12. Recurso especial adesivo de VICENTE MAMEDE DE ARRUDA prejudicado.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer e dar provimento aos
recursos especiais interpostos por CENTRAL DAS COOPERATIVAS DE CRÉDITO DOS
ESTADOS DO MATO GROSSO E MATO GROSSO DO SUL – SICCOB CENTRAL MT/MS, JOÃO
BATISTA NUNES RONDON FILHO, ANTONIO SEBASTIÃO DA COSTA MARQUES, JÂNIO
MÁRCIO RONDON e JORGE LUIZ DE ARRUDA E SILVA e julgar prejudicado o recurso
adesivo de VICENTE MAMEDE DE ARRUDA, nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora.
Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio
Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora.
Dra. DINARA DE ARRUDA OLIVEIRA, pela parte RECORRENTE: VICENTE
MAMEDE DE ARRUDA
Brasília (DF), 06 de outubro de 2020(Data do Julgamento)
MINISTRA NANCY ANDRIGHI
Relatora

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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