Fundações públicas de direito privado não estão isentas de custas processuais

Fundações públicas de direito privado não estão isentas de custas processuais

As fundações públicas de direito privado, cuja criação é autorizada por lei, não são equiparadas à Fazenda Pública e não fazem jus a isenção de custas processuais. Com esse entendimento, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reformou acórdão do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) para afastar o benefício concedido a uma fundação municipal condenada por descumprimento contratual.

O recurso teve origem em ação ajuizada por uma empresa alemã para cobrar da fundação parcelas não pagas de um contrato de compra de equipamentos hospitalares. Em primeiro grau, a fundação foi condenada a pagar mais de R$ 2 milhões, além do valor das despesas processuais e dos honorários advocatícios de 1% sobre o valor da condenação.

No entanto, o TJSC determinou a isenção das custas processuais para a fundação, ao entendimento de que ela seria subsidiada pelo poder público e, por isso, deveria ser equiparada à Fazenda Pública. Ao STJ, a empresa alegou que o acórdão recorrido partiu de premissa equivocada, uma vez que a fundação, a despeito de ter recebido doação municipal, não seria subsidiada pelo município.

Três tipos

O relator do recurso, ministro Luis Felipe Salomão, explicou que, no ordenamento jurídico brasileiro, existem três tipos de fundação: fundações privadas, instituídas por particulares e regidas pelo direito privado; fundações públicas de direito privado, instituídas pelo poder público; e as fundações públicas de direito público, que possuem natureza jurídica de autarquia.

Segundo o ministro, a existência de dois tipos de fundações públicas – com personalidade jurídica de direito público ou de direito privado – é defendida pela corrente dominante da doutrina na interpretação do artigo 5º, IV, do Decreto-Lei 200/1967.

Salomão lembrou que essa também é a posição adotada pelo Supremo Tribunal Federal, bem como pelo STJ, que já se pronunciou no sentido da coexistência, no ordenamento jurídico, de fundações públicas de direito público e de direito privado.

"Diante desse cenário, conclui-se que fundação pública é toda fundação instituída pelo Estado, podendo sujeitar-se ao regime público ou privado, a depender do seu estatuto e das atividades por ela prestada", disse.

Lei autorizativa

O ministro lembrou que, enquanto as fundações públicas de direito público são criadas por lei específica, sendo uma espécie de autarquia – por isso são chamadas de "fundações autárquicas" –, a criação das fundações públicas de direito privado é autorizada por lei.

No caso dos autos, o relator verificou que a entidade fundacional é de direito privado, filantrópica e de utilidade pública, e que foi editada uma lei municipal para autorizar a sua criação e a doação a ela de um imóvel público. "Assim, depreende-se que se equivocou o tribunal de origem ao conferir à recorrida tratamento especial – devido tão somente às entidades com personalidade de direito público", afirmou.

"As fundações públicas, para receberem tratamento semelhante ao conferido aos entes da administração direta, necessária e obviamente devem possuir natureza jurídica de direito público, que se adquire no momento de sua criação, decorrente da própria lei", concluiu.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.409.199 - SC (2013/0333310-9)
RELATOR : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO
RECORRENTE : SIEMENS AKTIENGELLSCHAFT BEREICH MEDIZINISCHE TECHNIK
ADVOGADOS : PAULO DE ABREU LEME FILHO E OUTRO(S) - SP151810
PRISCILA SANDA NAGAO CARDOSO - SP182612
RECORRIDO : FUNDAÇÃO DE SAÚDE DO ALTO VALE DO ITAJAÍ FUSAVI
ADVOGADO : MARCOS SAVIO ZANELLA E OUTRO(S) - SC008707
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. FUNDAÇÕES. FUNDAÇÕES PRIVADAS.
INSTITUIÇÃO POR PARTICULAR. FUNDAÇÕES PÚBLICAS DE
NATUREZA PÚBLICA. LEI CRIADORA. FUNDAÇÕES AUTÁRQUICAS.
FUNDAÇÕES DE NATUREZA PRIVADA. LEI AUTORIZADORA DA
CRIAÇÃO. SUPERVISÃO A CARGO DO MINISTRO DE ESTADO.
1. Convivem no ordenamento jurídico brasileiro três tipos de fundação:
fundação de direito privado, instituída por particulares; fundações públicas
de direito privado, instituídas pelo Poder Público; e fundações públicas de
direito público, que possuem natureza jurídica de autarquia.
2. As fundações privadas são pessoas jurídicas instituídas por particular,
por ato unilateral e irrevogável, por meio de escritura pública ou
testamento, com dotação especial de bens livres para determinada
finalidade, sendo regidas exclusivamente pelo Direito Civil.
3. Nos termos da jurisprudência do STF e do STJ, fundação pública é toda
fundação instituída pelo Estado, podendo sujeitar-se ao regime público ou
privado, a depender do estatuto da fundação e das atividades por ela
exercidas. As fundações públicas de direito público são criadas por lei
específica, também chamadas de fundações autárquicas. No caso das
fundações públicas de direito privado, uma lei específica é editada
autorizando sua criação.
4. No caso dos autos, a entidade fundacional é de direito privado,
filantrópica e de utilidade pública, cuja criação se deu por lei municipal
autorizativa de doação de bem imóvel público, não se aplicando à
hipótese, portanto, os critérios utilizados pelo acórdão recorrido para o
arbitramento dos honorários advocatícios, nem mesmo a isenção de
custas processuais.
5. As fundações públicas de direito público (Administração Indireta) e as
fundações públicas de direito privado, cuja instituição ocorre por
autorização legislativa, submetem-se à supervisão determinada pelo
Ministro de Estado competente, por motivo de interesse público, nos
termos do Decreto n. 200/1967 (art. 26, parágrafo único, "i"), prescindindo,
portanto, da manifestação do órgão do Ministério Público nas ações em
que são parte.
6. Recurso especial provido para restaurar o arbitramento dos honorários
e das custas tal como realizado pela sentença.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, os Ministros da Quarta Turma do
Superior Tribunal de Justiça acordam, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial,
nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Raul Araújo, Maria Isabel
Gallotti, Antonio Carlos Ferreira e Marco Buzzi (Presidente) votaram com o Sr. Ministro
Relator.
Brasília (DF), 10 de março de 2020(Data do Julgamento)
MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO
Relator

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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