Meios de execução indireta dependem do esgotamento das vias típicas para satisfação do crédito

Meios de execução indireta dependem do esgotamento das vias típicas para satisfação do crédito

Para a adoção dos chamados meios executivos atípicos, previstos no inciso IV do artigo 139 do Código de Processo Civil de 2015, o juiz deve estar atento a alguns pressupostos, como a existência de indícios de que o devedor possui o patrimônio necessário para cumprir a obrigação e o esgotamento dos meios típicos estabelecidos em lei para a satisfação do crédito – pois essas medidas indiretas só devem ser aplicadas de forma subsidiária.

O entendimento foi reafirmado pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao reformar acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP). Na execução que deu origem ao recurso, o devedor não pagou o débito voluntariamente, e os atos típicos de execução se mostraram infrutíferos, mas o TJSP entendeu não ser viável a adoção de meios indiretos para a cobrança da dívida, pois não teria sido demonstrada a correlação entre essas medidas e a satisfação do crédito.

Relatora do recurso especial do credor, a ministra Nancy Andrighi explicou que, com a previsão dos meios executivos atípicos pelo CPC/2015, o juiz passou a ter o poder-dever de determinar medidas de apoio com o objetivo de assegurar o cumprimento da ordem judicial. Essa possibilidade – ponderou a ministra – não significa que qualquer modalidade executiva possa ser determinada de forma indiscriminada, independentemente de balizas ou meios de controle efetivos.

Decisão fundamentada

Para evitar a restrição de direitos de forma indevida, com risco de violação a princípios constitucionais, Nancy Andrighi destacou que, previamente à adoção de qualquer medida executiva atípica, o magistrado deve intimar o executado para pagar o débito ou apresentar bens destinados a saldá-lo.

No caso de utilização de medidas coercitivas indiretas – prosseguiu a ministra –, a decisão judicial deve ser devidamente fundamentada, a partir das circunstâncias específicas do processo, não sendo suficiente a mera menção ao texto do inciso IV do artigo 139 do CPC/2015, ou a indicação de conceitos jurídicos indeterminados.

Segundo ela, é preciso observar também se houve o esgotamento prévio dos meios típicos de satisfação do crédito, sob pena de se burlar a sistemática longamente disciplinada na lei processual.

Premissa lógica

Cumpridos esses requisitos, a relatora ressaltou que o juiz está autorizado a adotar as medidas que entenda adequadas, necessárias e razoáveis para efetivar o direito do credor contra o devedor que, apesar de demonstrar possuir patrimônio para saldar a dívida, busca frustrar o processo executivo.

De acordo com Nancy Andrighi, a existência de indícios mínimos de que o executado possui bens suficientes para cobrir a dívida é uma premissa lógica, "pois não haveria razão apta a justificar a imposição de medidas de pressão na hipótese de restar provada a inexistência de patrimônio hábil a cobrir o débito".

RECURSO ESPECIAL Nº 1.864.190 - SP (2020/0049139-6)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : PEARSON EDUCATION DO BRASIL LTDA
ADVOGADOS : SUSETE GOMES - SP163760
MAURÍCIO BELLUCCI - SP161891
GABRIELA DE ALMEIDA POLI - SP276176
MIRELLE LATTARO VEGETTE - SP272172
ROBERTO DE FARIA MIRANDA - SP249111
RECORRIDO : VINICIUS DE MATTOS
ADVOGADO : MAURA DA SILVA LEITZKE - RS066833
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. RESCISÃO DE CONTRATO DE FRANQUIA. CONDENÇÃO
AO PAGAMENTO DE MULTA CONTRATUAL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA.
ART. 536, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC/15. PREQUESTIONAMENTO.
AUSÊNCIA. MEDIDAS EXECUTIVAS ATÍPICAS. ART. 139, IV, DO CPC/15.
CABIMENTO, EM TESE. DELINEAMENTO DE DIRETRIZES A SEREM
OBSERVADAS PARA SUA APLICAÇÃO.
1. Cumprimento de sentença iniciado em 15/2/2018. Recurso especial
interposto em 14/10/2019. Autos conclusos à Relatora em 7/5/2020.
2. O propósito recursal é definir se as medidas executivas atípicas postuladas
pelo exequente são passíveis de adoção pelo juiz condutor do processo.
3. O acórdão recorrido não se manifestou acerca do conteúdo normativo do
art. 536, parágrafo único, do CPC/15, circunstância que impede a
apreciação da insurgência quanto ao ponto.
4. O Código de Processo Civil de 2015, a fim de garantir maior celeridade e
efetividade ao processo, positivou regra segundo a qual incumbe ao juiz
determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou
sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial,
inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária (art. 139,
IV).
5. A interpretação sistemática do ordenamento jurídico revela, todavia, que
tal previsão legal não autoriza a adoção indiscriminada de qualquer medida
executiva, independentemente de balizas ou meios de controle efetivos.
6. De acordo com o entendimento do STJ, as modernas regras de processo,
ainda respaldadas pela busca da efetividade jurisdicional, em nenhuma
circunstância poderão se distanciar dos ditames constitucionais, apenas
sendo possível a implementação de comandos não discricionários ou que
restrinjam direitos individuais de forma razoável. Precedente específico.
7. A adoção de meios executivos atípicos é cabível desde que, verificando-se
a existência de indícios de que o devedor possua patrimônio expropriável,
tais medidas sejam adotadas de modo subsidiário, por meio de decisão que
contenha fundamentação adequada às especificidades da hipótese concreta,
com observância do contraditório substancial e do postulado da
proporcionalidade.
8. Situação concreta em que as circunstâncias definidas neste julgamento
não foram devidamente sopesadas pelos juízos de origem, sendo de rigor –
à vista da impossibilidade de serem revolvidas questões fático-probatórias
em recurso especial – o retorno dos autos ao juízo de primeiro grau para
que se proceda a novo exame da matéria.
RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial
nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Paulo de Tarso
Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram
com a Sra. Ministra Relatora.
Brasília (DF), 16 de junho de 2020(Data do Julgamento)
MINISTRA NANCY ANDRIGHI
Relatora

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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