Direito de preferência não pode ser reconhecido mais de uma vez no mesmo precatório

Direito de preferência não pode ser reconhecido mais de uma vez no mesmo precatório

O direito de preferência previsto no artigo 100, parágrafo 2º, da Constituição Federal não pode ser deferido mais de uma vez no mesmo precatório, ainda que o beneficiário atenda a mais de uma das hipóteses constitucionais de preferência, pois o múltiplo reconhecimento resultaria, por via oblíqua, na extrapolação do limite de valor estabelecido na própria norma constitucional.

O entendimento foi reafirmado pela Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao confirmar decisão do ministro Benedito Gonçalves que reformou acórdão no qual o Tribunal de Justiça de Rondônia (TJRO) havia reconhecido a preferência de um cidadão, em razão da idade, para receber o saldo remanescente de precatório. O credor já havia exercido a preferência, em razão de doença grave, ao receber a primeira parcela do mesmo precatório.

De acordo com a norma constitucional, os débitos de natureza alimentícia cujos titulares – originários ou por sucessão hereditária – tenham 60 anos ou mais ou sejam portadores de doença grave ou deficiência serão pagos com preferência sobre todos os demais, até o triplo do montante fixado em lei para requisições de pequeno valor.

Para atender esse limite, a Constituição admite o fracionamento do valor do débito, estipulando, porém, que o restante deve ser pago na ordem cronológica de apresentação do precatório. Em mandado de segurança, o Estado de Rondônia considerou que o reconhecimento da preferência por duas vezes no mesmo precatório caracteriza burla ao limite de valor previsto no dispositivo constitucional.

Jurisprudência pacífica

No recurso apresentado ao STJ, o cidadão alegou que, como o mandado de segurança impetrado pelo Estado de Rondônia havia sido negado pelo TJRO, a Justiça fez o pagamento residual com base no direito de preferência. Além de sustentar a perda de objeto da ação, em razão do fato consumado, ele pleiteou o provimento do recurso para que fosse reconhecida a possibilidade do exercício do direito de antecipação no mesmo precatório.

O ministro Benedito Gonçalves apontou que o Supremo Tribunal Federal e o STJ têm entendimento pacífico em relação à possibilidade de haver, em precatórios distintos, o reconhecimento do direito à preferência constitucional, ainda que no mesmo exercício financeiro, desde que observado o limite estabelecido pelo artigo 100, parágrafo 2º, da Constituição em cada um dos precatórios.

Ordem cronológica

Entretanto, o relator ponderou que a própria norma constitucional estabelece que, após o fracionamento para fins de preferência, eventual saldo existente deverá ser pago na ordem cronológica de apresentação do precatório.

"Portanto, as hipóteses autorizadoras da preferência (idade, doença grave ou deficiência) devem ser consideradas, isoladamente, a cada precatório, ainda que tenham como destinatário um mesmo credor", concluiu o ministro.

Com a reforma da decisão do TJRO, a Primeira Turma determinou o retorno dos autos à origem para análise do pedido do Estado de Rondônia quanto à devolução do valor pago de forma indevida ao credor.

AgInt no RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA Nº 61014 - RO
(2019/0161880-1)
RELATOR : MINISTRO BENEDITO GONÇALVES
AGRAVANTE : REINALDO FIRMINO DE LIMA
ADVOGADOS : HÉLIO VIEIRA DA COSTA - RO000640
ZÊNIA LUCIANA CERNOV DE OLIVEIRA - RO000641
MARIA DE LOURDES DE LIMA CARDOSO SILVA -
RO004114
AGRAVADO : ESTADO DE RONDÔNIA
PROCURADOR : IGOR ALMEIDA DA SILVA MARINHO E OUTRO(S) -
RO006153
EMENTA
ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. AGRAVO INTERNO
NO RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA.
PRECATÓRIO. DIREITO DE PREFERÊNCIA (ART. 100, § 2º, DA
CF/1988). RECONHECIMENTO, MAIS DE UMA DE VEZ, EM UM
MESMO PRECATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. SALDO
REMANESCENTE. ORDEM CRONOLÓGICA. OBSERVÂNCIA
OBRIGATÓRIA. DEVOLUÇÃO DOS VALORES. PEDIDO
SUBSIDIÁRIO. RETORNO DOS AUTOS.
1. Na linha do entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal, este
Tribunal Superior tem pacífico entendimento pela possibilidade de haver o
reconhecimento ao credor, mais de uma vez, do direito à preferência
constitucional do § 2º do art. 100 da Constituição Federal.
2. Contudo, a preferência autorizada pela Constituição não pode ser
reconhecida duas vezes em um mesmo precatório, porquanto, por via
oblíqua, implicaria a extrapolação do limite previsto na norma constitucional.
Aliás, o próprio § 2º do art. 100 da CF/1988 revela que, após o
fracionamento para fins de preferência, eventual saldo remanescente deverá
ser pago na ordem cronológica de apresentação do precatório. Portanto, as
hipóteses autorizadoras da preferência (idade, doença grave ou deficiência)
devem ser consideradas, isoladamente, a cada precatório, ainda que tenha
como destinatário um mesmo credor.
3. No caso dos autos, ao credor foi concedida a preferência no pagamento de
precatório em razão de doença grave até o limite estabelecido pelo § 2º do
art. 100 da CF/1988 (triplo do fixado em lei para pagamento de RPV);
contudo, foi invocado novamente o direito de preferência quanto ao saldo
remanescente do mesmo precatório, por motivo da idade, o que foi deferido
pelo Desembargador Presidente do TJ/RO (ato coator).
4. O recurso ordinário do Estado foi provido, com determinação de retorno
dos autos para julgamento do pedido subsidiário de devolução dos valores
eventualmente recebidos.
5. Agravo interno não provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas,
acordam os Ministros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por
unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Napoleão Nunes Maia Filho, Sérgio Kukina, Regina
Helena Costa e Gurgel de Faria votaram com o Sr. Ministro Relator. Presidiu o
julgamento o Sr. Ministro Gurgel de Faria.
Brasília, 20 de abril de 2020 (Data do Julgamento)
Ministro Benedito Gonçalves
Relator

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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