Mantida condenação de advogado que emitiu parecer favorável à contratação de escritório do qual era sócio

Mantida condenação de advogado que emitiu parecer favorável à contratação de escritório do qual era sócio

Com base na amplitude do conceito de agente público para efeito de responsabilização por atos contra a administração, prevista tanto na Lei de Improbidade Administrativa quanto na Lei de Licitações, a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve a condenação por improbidade de advogado contratado pelo município de Cruz Machado (PR), por ter emitido parecer favorável, em procedimento licitatório, para a contratação do escritório de advocacia do qual era sócio administrador. A decisão foi unânime.

A contratação, feita sem licitação, embora se destinasse a atender necessidades permanentes da administração, foi apontada como irregular pelo Ministério Público do Paraná também porque o advogado não poderia tomar parte em procedimento no qual tinha interesse direto.

O juiz de primeira instância, além de declarar a nulidade do contrato de prestação de serviços jurídicos, condenou o então prefeito da cidade e o advogado por improbidade administrativa, fixando como sanções a suspensão dos direitos políticos por três anos, o pagamento de multa civil equivalente a 50% da média das remunerações recebidas pelo advogado no período de seu contrato, além da proibição de contratação com o poder público pelo período de três anos.

O Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) manteve as condenações por improbidade, mas deu parcial provimento ao recurso do ex-prefeito para reduzir a multa civil para 5% das médias das remunerações recebidas pelo escritório durante a vigência do contrato.

Legitimidade

Por meio de recurso especial, o advogado alegou que não possuiria legitimidade para figurar no polo passivo da ação, tendo em vista que o município firmou contrato com o escritório de advocacia, pessoa jurídica, e não com a pessoa física do sócio, não tendo sido processado nem sequer o incidente de desconsideração da personalidade jurídica.

Além disso, o advogado alegou que não poderia ser enquadrado como servidor público, pois a Lei de Licitações não traria definição tão ampla de agente público como a Lei de Improbidade Administrativa. Sustentou que seu vínculo com o município era apenas contratual, de prestação de serviços.

Participação direta

O ministro Francisco Falcão, relator do caso no STJ, apontou que a regra do artigo 9º, inciso III, da Lei 8.666/1993 – segundo o qual não poderá participar de licitação servidor ou dirigente de órgão contratante ou responsável pelo certame – compreende todo o grupo de pessoas que, integrando a qualquer título o corpo pessoal encarregado de promover o procedimento licitatório, encontre-se em posição de frustrar a competitividade em benefício próprio ou de terceiro.

Com base nas informações do acórdão do TJPR, o ministro também enfatizou que o advogado participou pessoal e diretamente do processo de escolha da sociedade de advogados vencedora, inclusive emitindo pareceres – ou seja, segundo o relator, não há evidência de que o profissional tenha participado da licitação simplesmente na condição de representante da sociedade de advogados.

"Se praticou a conduta em nome próprio, não há necessidade de responsabilização principal da pessoa jurídica. Em outras palavras, não há necessidade de instauração de incidente de desconsideração da personalidade jurídica (Código de Processo Civil, artigo 133), com a demonstração da presença dos requisitos do artigo 50 do Código Civil, muito menos se exige o prévio esgotamento patrimonial da sociedade de advogados (Estatuto da Advocacia, artigo 17)", concluiu o ministro.

AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1.535.119 - PR (2019/0193509-0)
RELATOR : MINISTRO FRANCISCO FALCÃO
AGRAVANTE : MARTIM FRANCISCO RIBAS
ADVOGADOS : DANIEL WUNDER HACHEM E OUTRO(S) - PR050558
FELIPE KLEIN GUSSOLI - PR075081
LUZARDO FARIA - PR086431
AGRAVADO : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ
INTERES. : EUCLIDES PASA
ADVOGADO : ÂNGELA ANDREA HORBATIUK E OUTRO(S) - PR047664
EMENTA
AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. IMPROBIDADE
ADMINISTRATIVA. ADVOGADO CONTRATADO PELO MUNICÍPIO
QUE, SIMULTANEAMENTE, DEU PARECER EM PROCEDIMENTO
LICITATÓRIO E FORMULOU PROPOSTA COMO REPRESENTANTE
DE SOCIEDADE DE ADVOGADOS. SOCIEDADE QUE SE SAGROU
VENCEDORA NA LICITAÇÃO. VIOLAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA
LEGALIDADE, MORALIDADE E ISONOMIA. POTENCIAL
FRUSTRAÇÃO DA CONCORRÊNCIA. IMPROBIDADE
ADMINISTRATIVA CARACTERIZADA.
I - Trata-se, na origem, de ação de anulação de contrato
administrativo, reparação de danos ao erário e responsabilização por
improbidade administrativa ajuizada pelo Ministério Público do Estado do
Paraná. Sustenta-se, em síntese, que, após apuração em inquérito civil,
constatou-se que um dos réus, contratado pela Prefeitura do Município Cruz
Machado à época dos fatos, emitiu parecer favorável em procedimento
licitatório para a contratação de escritório de advocacia do qual é sócio
administrador.
II - Em sentença, os pedidos formulados na inicial foram julgados
procedentes. Os réus interpuseram recurso de apelação, desprovido um e
provido parcialmente o outro, apenas para fins de redução da multa civil e de
ajuste da aplicação dos juros de mora e correção monetária. Inconformado, um
dos réu interpôs recurso especial, sustentando violação de dispositivos legais
infraconstitucionais e alegando a existência de dissídio jurisprudencial.
III - A referência a servidor público no art. 9º, III, da Lei n.
8.666/93 não tem o propósito de reduzir o alcance da vedação à participação
em licitações. A regra do art. 9º, III compreende todo o grupo de pessoas que,
integrando a qualquer título o corpo pessoal encarregado de promover o
procedimento licitatório, encontre-se em posição de frustrar a competitividade
em benefício próprio ou de terceiro.
IV - Segundo os acórdãos, os atos ilícitos, imorais e iníquos
imputados ao agente foram pessoal e diretamente realizados. Não se deram
na condição de representante da pessoa jurídica. Ora, se praticou a conduta
em nome próprio, não há necessidade de responsabilização principal da pessoa
jurídica. Em outras palavras, não há necessidade de instauração de incidente de
desconsideração da personalidade jurídica (CPC/15, art. 133), com a
demonstração da presença dos requisitos do art. 50 do CC, muito menos se
exige o prévio esgotamento patrimonial da sociedade de advogados (Estatuto
da Advocacia, art. 17) . V - No tocante à parcela recursal fundada no dissídio
jurisprudencial (CF, art. 105, III, c), o art. 1.029, § 1º, do CPC/15 e o art. 255
do RISTJ impõem a demonstração das circunstâncias que identifiquem ou
assemelhem os casos confrontados". Trata-se de pressuposto recursal formal
específico do recurso especial fundado na divergência jurisprudencial. Na
espécie, não se capta a existência de identidade ou similitude entre as
circunstâncias fático-jurídicas dos casos confrontados. Ao passo que o caso
sob julgamento versa sobre prática direta de ato por advogado integrante da
sociedade de advogados (sociedade simples) vencedora da licitação, o
acórdão paradigma cuida de hipótese de prática de ato ímprobo por pessoa
jurídica (sociedade empresária) representada por pessoa natural. Veja-se
que as situações são distintas, inexistindo dissídio jurisprudencial a reclamar
composição.
VI - Agravo conhecido para conhecer parcialmente do recurso
especial e, na parte conhecida, negar-lhe provimento.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas,
acordam os Ministros da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade,
conhecer do agravo para conhecer em parte do recurso especial e, nessa parte, negar-lhe
provimento, nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a)-Relator(a)." Os Srs. Ministros
Herman Benjamin, Og Fernandes, Mauro Campbell Marques e Assusete Magalhães votaram
com o Sr. Ministro RelatorBrasília (DF), 10 de março de 2020(Data do Julgamento)
MINISTRO FRANCISCO FALCÃO
Relator

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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