Habeas corpus não é meio legítimo para defesa de visitas íntimas em presídio

Habeas corpus não é meio legítimo para defesa de visitas íntimas em presídio

A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve entendimento do ministro Reynaldo Soares da Fonseca segundo o qual o habeas corpus não é meio legítimo para a reivindicação do direito de visitas íntimas para presos.

O habeas corpus discutido pela turma foi impetrado em virtude de portaria do ministro da Justiça que restringiu o direito a visitas íntimas em presídios federais.

No fim de fevereiro, em decisão monocrática, o ministro Reynaldo Soares da Fonseca havia negado seguimento ao pedido da defesa, ao fundamento de que o habeas corpus é “voltado ao combate de constrangimento ilegal específico, de ato ou decisão que afete, potencial ou efetivamente, direito líquido e certo do cidadão, com reflexo direto em sua liberdade de locomoção”.

Segundo ele, “não se presta o mandamus à discussão acerca do direito de visitas íntimas do apenado, pois, ao que me parece, procura a impetração proteger o direito à intimidade da pessoa humana e não seu direito ambulatorial”.

Laços prejudicados

No agravo regimental interposto contra a decisão do ministro, a defesa sustentou que a privação do contato físico e íntimo por longo período, “sem que haja notícia de descumprimento das obrigações legais ligadas ao regime prisional e fundamentado na presunção de utilização da visita para difusão de mensagens repassadas por líderes de organizações criminosas, fere os direitos individuais do preso, prejudica a manutenção dos laços afetivos e a sua reinserção social”.

Alegou também que o réu possui boa conduta e que o seu direito não poderia ser restringido por “mera presunção”.

Ao apreciar o recurso, o relator confirmou a posição de que o habeas corpus não se presta à proteção do direito à intimidade. Acrescentou ainda que o agravante não impugnou “o único fundamento da decisão agravada”, ou seja, “o não cabimento do habeas corpus para discutir o direito de visita íntima”, aplicando o entendimento previsto na Súmula 182 do STJ. A decisão da turma foi unânime.

HABEAS CORPUS Nº 425.115 - DF (2017/0297376-1)
RELATOR : MINISTRO REYNALDO SOARES DA FONSECA
IMPETRANTE : MARCIO SANTOS NEPOMUCENO
ADVOGADO : PALOMA GURGEL DE OLIVEIRA CERQUEIRA - RN009654
IMPETRADO : TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5A REGIÃO
PACIENTE : MARCIO SANTOS NEPOMUCENO (PRESO)
DECISÃO
Trata-se de habeas corpus, com pedido liminar, impetrado por
MARCIO SANTOS NEPOMUCENO, em favor próprio, contra acórdão do Tribunal
Regional Federal da 5ª Região.
O impetrante/paciente identifica-se como oriundo do sistema
carcerário do Rio de Janeiro, mas atualmente cumprindo pena na penitenciária federal
de Mossoró/RN.
Insurge-se contra portaria do Ministro da Justiça, que restringe o
direito a visitas íntimas, nos presídios federais, apenas para delatores premiados.
Requer: 1) Que seja declarada inconstitucional a referida portaria; 2)
"Ultrapassado o primeiro pleito, independente do deferimento ou indeferimento, que
seja restituída a visita íntima, ao impetrante, da sua esposa Márcia Gama Santos
Nepomuceno".
Indeferido o pleito liminar (e-STJ fls. 100/101) e prestadas as
informações solicitadas (e-STJ fls. 107/147), opinou o Ministério Público Federal
"pelo não conhecimento da ordem" (e-STJ fls. 178/181).
É o relatório. Decido.
A liberdade de locomoção do indivíduo, independentemente dos
transtornos dos procedimentos, da gravidade dos fatos criminosos, há muito ocupa
lugar de destaque na escala de valores tutelados pelo Direito, razão pela qual sempre
mereceu especial tratamento nos ordenamentos jurídicos das sociedades civilizadas.
Entre nós, com os parâmetros que lhe dá a Constituição e o Código de

Processo Penal, é reconhecida a garantia constitucional do habeas corpus, criado com
o objetivo de evitar ou fazer cessar violência ou coação à liberdade de locomoção
decorrente de ilegalidade ou abuso de poder. Nesse contexto, ressaltou Pontes de
Miranda "que a liberdade pessoal é a liberdade física: ius manendi ambulandi, eundi
ultro citroque ; e sua extensão coincide com a aplicabilidade do habeas corpus, remédio extraordinário, que se instituíra para fazer cessar, de pronto e imediatamente,
a prisão ou o constrangimento ilegal" (MIRANDA. Pontes de. Comentários à
Constituição de 1967. São Paulo. Revista dos Tribunais. 1967).
A Constituição Federal de 1988 manteve a garantia do habeas corpus
em seu texto, ao destacar no inciso LXVIII do art. 5º que: "conceder-se-á habeas
corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação
em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder". O Código de
Processo Penal, no mesmo sentido, dispõe no art. 647, que: "dar-se-á habeas corpus
sempre que alguém sofrer ou se achar na iminência de sofrer violência ou coação
ilegal na sua liberdade de ir e vir, salvo nos casos de punição disciplinar".
Sendo assim, o habeas corpus é o remédio constitucional voltado
ao combate de constrangimento ilegal específico, de ato ou decisão que afete,
potencial ou efetivamente, direito líquido e certo do cidadão, com reflexo direto
em sua liberdade de locomoção.
Dessa forma, não se presta o mandamus à discussão acerca do direito
de visitas íntimas do apenado, pois, ao que me parece, procura a impetração proteger o
direito à intimidade da pessoa humana e não seu direito ambulatorial.
Em casos semelhantes, assim decidiu o Superior Tribunal de Justiça:
PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. ART. 12 E 14 DA LEI Nº
6.368/76 (ANTIGA LEI DE TÓXICOS). TESE DE NULIDADE DA
DILIGÊNCIA POLICIAL. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO
ESPECÍFICA DAS FORMALIDADES LEGAIS QUE DEIXARAM DE
SER CUMPRIDAS. INÉPCIA DA INICIAL. DOSIMETRIA DA PENA.
PENA-BASE FIXADA MUITO ACIMA DO MÍNIMO LEGAL.
FUNDAMENTAÇÃO SUFICIENTE APENAS EM RELAÇÃO À
DUAS CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DESFAVORÁVEIS.
PERDIMENTO DE BENS. SUPOSTA ILEGALIDADE QUE NÃO

IMPLICA EM CONSTRANGIMENTO AO DIREITO DE
LOCOMOÇÃO DO PACIENTE. INVIABILIDADE DE
APRECIAÇÃO NO WRIT.
I - In casu, a genérica alegação do impetrante, de que a diligência
policial que teria culminado na prisão dos pacientes seria nula, sem a
respectiva e concreta demonstração de quais seriam as formalidades
legais desrespeitadas, não permite o conhecimento da impetração
(v.g.: HC 43079/RJ, 5ª Turma, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJ de
05/12/2005) II - A pena deve ser fixada com fundamentação concreta
e vinculada, tal como exige o próprio princípio do livre
convencimento fundamentado (arts. 157, 381 e 387 do CPP c/c o art.
93, inciso IX, segunda parte da CF/88). Ela não pode ser estabelecida
acima do mínimo legal com supedâneo em referências vagas ou
dados integrantes da própria conduta tipificada. (Precedentes do STF
e STJ).
III - In casu, verifica-se que a r. decisão de primeiro grau apresenta
em sua fundamentação incerteza denotativa ou vagueza, carecendo,
na fixação da resposta penal, de fundamentação objetiva
imprescindível quanto ao aumento de pena em razão da
culpabilidade, conduta social, personalidade, motivos e
conseqüências do crime.
IV - Destarte, há fundamentação concreta para elevar a pena-base
acima do mínimo legal no que tange às circunstâncias em que o crime
foi perpetrado, - haja vista a grande quantidade de entorpecente
apreendido -, e quanto aos maus antecedentes dos pacientes,
consoante admitido pela própria defesa.
V - Não se mostra compatível com a via do habeas corpus a análise
de alegação concernente ao perdimento de bens, pois eventuais
ilegalidades do decisum objurgado não acarretam qualquer ameaça
ao direito de locomoção do paciente.
Habeas corpus parcialmente conhecido e, nesta parte, parcialmente
concedido para anular a r. decisão condenatória, unicamente quanto
à dosimetria da pena.
(HC 114.358/MS, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA,
julgado em 01/10/2009, DJe 07/12/2009)
AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO
PENAL. BOLETIM INFORMATIVO DO PACIENTE DE QUE ELE
SERIA INTEGRANTE DE ORGANIZAÇÃO/FACÇÃO CRIMINOSA.
PEDIDO DE EXCLUSÃO. VIOLAÇÃO OU AMEAÇA DO DIREITO
DE LOCOMOÇÃO. AUSÊNCIA. HABEAS CORPUS. VIA
INADEQUADA.
1. A Constituição Federal, em seu art. 5º, inciso LXVIII, estabelece
que conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se
achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de
locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder

2. No caso dos autos, busca-se seja excluído do boletim de
informações do paciente a notícia de que ele pertenceria a uma
organização/facção criminosa, não se verificando, portanto,
violação direta e imediata no seu direito de locomoção/liberdade, o
que impede o exame da controvérsia na via eleita do habeas corpus.
3. Agravo regimental improvido.
(AgRg no HC 401.771/SP, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA
FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 24/10/2017, DJe
31/10/2017)
AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. PENAL. PEDIDO
DE CANCELAMENTO DE ANOTAÇÃO CRIMINAL.
INEXISTÊNCIA DE CERCEAMENTO AO DIREITO DE
LOCOMOÇÃO. IMPROPRIEDADE ABSOLUTA DA VIA
ELEITA. PRECEDENTES.
1. Na esteira do entendimento adotado por esta Corte, é inviável a
utilização do remédio constitucional do habeas corpus para se
pleitear o cancelamento de registros criminais, ante a inexistência
de perigo ou restrição à liberdade de locomoção do Paciente.
2. Agravo desprovido.
(AgRg no HC 145.676/RJ, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA
TURMA, julgado em 03/08/2010, DJe 23/08/2010)
PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. PEDIDO DE
CANCELAMENTO DE REGISTROS CRIMINAIS
INFORMATIZADOS NO INSTITUTO DE IDENTIFICAÇÃO
RICARDO GUMBLETON DAUNT. INEXISTÊNCIA DE
ILEGALIDADE OU ABUSO DE PODER SANÁVEL PELA VIA
DO HABEAS CORPUS.
1. Não se vislumbrando, in casu, qualquer restrição ao direito de ir
e vir do paciente, não há que se falar em ilegalidade e abuso de
poder sanável pela via do habeas corpus. (Precedentes do STJ e do
STF).
2. Writ não conhecido.
(HC 106.417/SP, Rel. Ministra ALDERITA RAMOS DE OLIVEIRA
(DESEMBARGADORA CONVOCADA DO TJ/PE), SEXTA TURMA,
julgado em 18/06/2013, DJe 01/07/2013)

Ante o exposto, nego seguimento ao presente habeas corpus (art. 34,
XX, do RISTJ).
Publique-se. Intime-se.
Brasília (DF), 26 de fevereiro de 2018.
Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA
Relator

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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