TST reconhece dano existencial em jornada excessiva de instalador de linhas telefônicas

TST reconhece dano existencial em jornada excessiva de instalador de linhas telefônicas

A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho proveu recurso de um instalador de linhas telefônicas e condenou a Serviços de Rede S.A – Serede e a Oi S.A ao pagamento de indenização de R$ 5 mil. A decisão considerou que sua jornada de 14 horas diárias, com 30 minutos de intervalo e finais de semana alternados, configura dano existencial, que consiste em lesão ao tempo razoável e proporcional assegurado ao trabalhador para que possa se dedicar às atividades sociais inerentes a todos. 

Como instalador de linhas telefônicas na Serede, prestadora de serviços para a Oi no Vale do Itajaí (SC), o trabalhador disse que sua jornada se iniciava às 7h30 e ia até 21h, de segunda a sexta-feira, com folgas em fins de semana alternados e em regime de plantão, das 22h às 5h de domingo para segunda-feira. Segundo ele, quando houve a troca de empresas de prestação de serviços para a Oi, com a demissão de dois mil trabalhadores em SC, a Serede assumiu o contrato sem estrutura e mão-de-obra suficiente, levando os empregados ao estresse físico e emocional.

A Serede, em sua defesa, alegou que o instalador realiza serviço externo, não sujeito a controle de jornada, e que era dele o ônus de provar este trabalho extraordinário.

O Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (SC) verificou nas fichas financeiras anexadas pela empresa pagamentos de horas extras e trabalho em plantão, comprovando o controle de jornada. O preposto confirmou que o controle era feito por ordem de serviço, onde o instalador registrava horário do início e fim das atividades, gravado no sistema. Uma testemunha, com jornada idêntica, também ratificou esse procedimento. Assim, deferiu as horas extras, mas não a indenização, entendendo que a jornada excessiva não é conduta ilícita a justificar o dever de reparação.

Dano existencial

Segundo o relator do recurso do trabalhador ao TST, ministro Maurício Godinho Delgado, a gestão empregatícia que submete o indivíduo a reiterada jornada extenuante, muito acima dos limites legais, com frequente supressão do repouso semanal, agride alguns princípios constitucionais e “a própria noção estruturante de Estado Democrático de Direito”, por afastar o tempo destinado à vida particular. A situação, a seu ver, caracteriza o dano existencial, possibilitando a indenização prevista no artigo 5º, incisos V e X, da Constituição Federal, e 186 do Código Civil. 

PROCESSO Nº TST-RR-1355-21.2015.5.12.0047

A) AGRAVO DE INTRUMENTO. RECURSO DE
REVISTA. PROCESSO SOB A ÉGIDE DA LEI
13.015/2014. CONDENAÇÃO EM VERBAS DE
TRATO SUCESSIVO. LIMITAÇÃO TEMPORAL.
PARCELAS VINCENDAS. Demonstrado no
agravo de instrumento que o recurso de
revista preenchia os requisitos do art.
896 da CLT, dá-se provimento ao agravo
de instrumento, para melhor análise da
arguição de violação do art. 290 do
CPC/1973 (art. 323 do CPC/2015),
suscitada no recurso de revista. Agravo
de instrumento provido.
B) RECURSO DE REVISTA. PROCESSO SOB A
ÉGIDE DA LEI 13.015/2014. 1. DEVOLUÇÃO
DE DESCONTOS. PREVISÃO EM ACT. MATÉRIA
FÁTICA MATÉRIA FÁTICA. SÚMULA 126/TST.
2. VALE-ALIMENTAÇÃO. DIFERENÇAS.
MATÉRIA FÁTICA. SÚMULA 126/TST. 3.
ALUGUEL DE VEÍCULO. PREVISÃO EM NORMA
COLETIVA. NATUREZA INDENIZATÓRIA. 4.
MULTA CONVENCIONAL. NÃO CONFIGURAÇÃO DO
DESCUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER.
Recurso de natureza extraordinária,
como o recurso de revista, não se presta
a reexaminar o conjunto
fático-probatório produzido nos autos,
porquanto, nesse aspecto, os Tribunais
Regionais do Trabalho revelam-se
soberanos. Inadmissível, assim,
recurso de revista em que, para se
chegar a conclusão diversa, seria
imprescindível o revolvimento de fatos
e provas, nos termos da Súmula 126 desta
Corte. Recurso de revista não conhecido
quanto ao tema. 5. DANO EXISTENCIAL.
PRESTAÇÃO EXCESSIVA, CONTÍNUA E
DEZARRAZOADA DE HORAS EXTRAS.
CONFIGURAÇÃO. O excesso de jornada
extraordinária, para muito além das
duas horas previstas na Constituição e
na CLT, cumprido de forma habitual e por
longo período, tipifica, em tese, o dano
existencial, por configurar manifesto

comprometimento do tempo útil de
disponibilidade que todo indivíduo
livre, inclusive o empregado, ostenta
para usufruir de suas atividades
pessoais, familiares e sociais. A esse
respeito é preciso compreender o
sentido da ordem jurídica criada no País
em cinco de outubro de 1988 (CF/88). É
que a Constituição da República
determinou a instauração, no Brasil, de
um Estado Democrático de Direito (art.
1º da CF), composto, segundo a doutrina,
de um tripé conceitual: a pessoa humana,
com sua dignidade; a sociedade
política, necessariamente democrática
e inclusiva; e a sociedade civil, também
necessariamente democrática e
inclusiva (Constituição da República e
Direitos Fundamentais – dignidade da
pessoa humana, justiça social e Direito
do Trabalho. 3ª ed. São Paulo: LTr,
2015, Capítulo II). Ora, a realização
dos princípios constitucionais
humanísticos e sociais
(inviolabilidade física e psíquica do
indivíduo; bem-estar individual e
social; segurança das pessoas humanas,
ao invés de apenas da propriedade e das
empresas, como no passado; valorização
do trabalho e do emprego; justiça
social; subordinação da propriedade à
sua função social, entre outros
princípios) é instrumento importante de
garantia e cumprimento da centralidade
da pessoa humana na vida socioeconômica
e na ordem jurídica, concretizando sua
dignidade e o próprio princípio
correlato da dignidade do ser humano.
Essa realização tem de ocorrer também no
plano das relações humanas, sociais e
econômicas, inclusive no âmbito do
sistema produtivo, dentro da dinâmica
da economia capitalista, segundo a
Constituição da República Federativa do
Brasil. Dessa maneira, uma gestão
empregatícia que submeta o indivíduo a

reiterada e contínua jornada
extenuante, que se concretize muito
acima dos limites legais, em dias
sequenciais, agride todos os princípios
constitucionais acima explicitados e a
própria noção estruturante de Estado
Democrático de Direito. Se não
bastasse, essa jornada gravemente
excessiva reduz acentuadamente e de
modo injustificável, por longo período,
o direito à razoável disponibilidade
temporal inerente a todo indivíduo,
direito que é assegurado pelos
princípios constitucionais mencionados
e pelas regras constitucionais e legais
regentes da jornada de trabalho. Tal
situação anômala deflagra, assim, o
dano existencial, que consiste em lesão
ao tempo razoável e proporcional,
assegurado pela ordem jurídica, à
pessoa humana do trabalhador, para que
possa se dedicar às atividades
individuais, familiares e sociais
inerentes a todos os indivíduos, sem a
sobrecarga horária desproporcional,
desarrazoada e ilegal, de intensidade
repetida e contínua, em decorrência do
contrato de trabalho mantido com o
empregador. Logo, configurada essa
situação no caso dos autos, deve ser
restabelecida a sentença, que condenou
a Reclamada no pagamento de indenização
por danos morais no importe de R$
5.000,00. Recurso de revista conhecido
e provido no aspecto. 6. CONDENAÇÃO EM
VERBAS DE TRATO SUCESSIVO. LIMITAÇÃO
TEMPORAL. PARCELAS VINCENDAS.
Tratando-se de prestações sucessivas
por tempo indeterminado, a execução
compreenderá inicialmente as
prestações devidas até a data do
ingresso na execução, consoante dicção
do art. 892 da CLT. Por outro lado,
segundo estabelece o art. 290 do
CPC/1973, atual art. 323 do CPC/2015, se
o devedor deixar de pagar ou de

consignar, no curso do processo,
obrigações consistentes em prestações
periódicas, a sentença as incluirá na
condenação, enquanto durar a obrigação,
até mesmo no caso de ausência de pedido
expresso. É o caso das parcelas de horas
extras, vale-alimentação, adicional de
periculosidade, etc. Atente-se que,
sobrevindo alteração na situação fática
suscetível de modificação da decisão, a
Reclamada dispõe da ação revisional
(art. 471, I, do CPC/1973, atual 505, I,
do CPC/2015). Recurso de revista
conhecido e provido no aspecto.

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (TST - Tribunal Superior do Trabalho) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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