Estabilidade das gestantes nos contratos de trabalho
Apresentação do panorama dos entendimentos dos Tribunais acerca da estabilidade das gestantes, propondo medidas para redução do impacto financeiro.
Em nosso ordenamento jurídico estão presentes as figuras de duas modalidades de contratos de trabalho, sendo os mesmos: contrato por prazo indeterminado e por prazo determinado. Dentre os quais, a garantia à licença-maternidade[1] da empregada gestante bem como daquela que adotar uma criança[2], somente era conferida para as empregadas cujos contratos de trabalho fossem estipulados por prazo indeterminado.
Tal entendimento tinha como escopo a premissa de que a relação laboral era de natureza contínua, tendo, portanto, após o parto, contrato de trabalho para que fosse dada continuidade dessa relação.
No entanto, no decorrer dos anos, em nosso país, ocorreram transformações sociais advindas das conquistas femininas, dentre as quais, a mais notável foi a extensão da estabilidade para os contratos por prazo determinado de acordo com a reformulação no mês de setembro de 2012 da Súmula n. 244[3] do Tribunal Superior do Trabalho (TST), especificamente em seu inciso III, o qual passou a conter a seguinte redação: A empregada gestante tem direito à estabilidade provisória prevista no art. 10, inciso II, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, mesmo na hipótese de admissão mediante contrato por tempo determinado.
RECURSO DE REVISTA - GESTANTE - ESTABILIDADE PROVISÓRIA - CONTRATO DE EXPERIÊNCIA. Estabelece o art. 10, II, "b", do ADCT/88 que é vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa da empregada gestante, desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto, não impondo nenhuma restrição à modalidade de contrato de trabalho, mesmo porque a garantia visa, em última análise, à tutela do nascituro. O entendimento vertido na Súmula nº 244, III, do TST encontra-se superado pela atual jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, no sentido de que as empregadas gestantes, inclusive as contratadas a título precário, independentemente do regime de trabalho, têm direito à licença maternidade de 120 dias e à estabilidade provisória desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto. Dessa orientação dissentiu o acórdão recorrido, em afronta ao art. 10, II, -b-, do ADCT/88. Recurso de revista conhecido e provido. (RR - 1520-32.2010.5.04.0511, Relator Ministro: Luiz Philippe Vieira de Mello Filho, Data de Julgamento: 27/06/2012, 4ª Turma, Data de Publicação: 03/08/2012)
Vale ressaltar que no intuito de evitar a ocorrência de dispensa arbitrária tanto no contrato por prazo indeterminado e também determinado, evidenciou-se a prática de algumas empresas a solicitação de exames de gravidez seja para aquisição de uma oportunidade de emprego seja pela manutenção deste, constitui crime previsto na Lei nº 9.029 de 1995[4], conhecida popularmente por “Lei Benedita da Silva”.
Entretanto, há decisões judiciais que vislumbram a possibilidade das empresas realizarem os exames de gravidez especificamente juntamente com o demissional desde que precedido de aceitação pela empregada que está sendo dispensada e ressaltado à mesma que a prática visa evitar a dispensa arbitrária, sendo oferecido, inclusive, a manutenção de seu posto de trabalho, na hipótese de constatação de gravidez. Nesse sentido, destaca-se o julgado proferido pelo Desembargador Ricardo Peel Furtado de Oliveira, do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo (TRT-SP), o qual ressaltou na decisão que "há que se ter em mente que o exame demissional deve conter atestado acerca do estado gestacional da trabalhadora mulher, a fim de sepultar qualquer dúvida quanto à validade da terminação contratual".
O desembargador ainda afirma na decisão que o artigo 373-A da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) veda apenas que seja exigido atestado ou exame gestacional como condição de contratação ou manutenção de emprego. Segundo o desembargador, o legislador não inseriu de propósito nesse artigo a proibição do teste de gravidez no exame demissional. Até porque a empresa tem a obrigação de fazer exames demissionais, conforme o inciso II, artigo 168, da CLT. Devendo ser observados o sigilo do resultado do exame mantido entre empresa e empregada, o caráter opcional da realização do referido exame e, por fim, a extensão desta modalidade de exame a todas as empregadas da empresa.
No entanto, tal prática quedou-se inócua, quando que, recentemente, abrangeu-se a extensão da estabilidade para o curso do aviso prévio quando da confirmação da gravidez, contrariando o convencimento do Ilustríssimo Ministro Maurício Godinho Delgado[5] do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, onde o posicionamento do mesmo era de que não incidiria direito à estabilidade provisória à empregada que confirmasse sua gravidez durante o curso do aviso prévio, já que teria sido manifestada e consentida pela empregada a rescisão de seu contrato de trabalho, implicando, portanto, em perda de objeto, uma vez que, não haveria contrato de trabalho em vigência que possibilitasse o retorno da mesma após o parto.
Não corroborando, também, a 3ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho com aludido Ministro, valendo-se da argumentação veemente em seu entendimento de que o pré-aviso não significa o fim da relação empregatícia, mas apenas a manifestação formal de uma vontade que se pretende concretizar adiante, razão por que o contrato de trabalho continua a emanar seus efeitos legais.
Sendo considerada somente como manifestação formal de vontade e não a certeza de que naquele momento há a rescisão do contrato de trabalho, indagamos qual seria a função do aviso prévio que não a inequívoca recusa em dar continuidade aquela relação laboral?
Ora, se a empregada já havia sido desligada da empresa e cumpria o aviso prévio, conceder-lhe estabilidade não parece ser a medida mais acertada. Acertada sim a decisão do Tribunal Regional do Trabalho, o qual considerou de forma até mesmo lógica que no ato de rescisão contratual a obreira não estava grávida.
O que se pode denotar é que o Tribunal Superior do Trabalho ao conceder estabilidade à empregada que engravida durante o aviso prévio, não somente desconsidera a legislação, e sim agrava ainda mais o pesado fardo que nossos empreendedores brasileiros têm de carregar. Há evidentemente transferência de ônus do Poder Público aos empregadores privados!
E nesta análise, a preocupação principal reside no impacto financeiro direto para as empresas no que diz respeito às futuras contratações de funcionários. Resultando, por conseguinte, na diminuição de contratações de empregados do sexo feminino.
Todavia, há julgamentos divergentes à modificação da Súmula nº 244 do TST, onde são aplicados pelos magistrados os posicionamentos anteriormente adotados, onde o inciso III da referida súmula é confirmado, negando, outrossim, o direito à estabilidade gestacional quando a contratação se der por intermédio de contrato de experiência, conforme se pode vislumbrar pelo recente julgamento abaixo destacado:
Proc. RTOrd 1452-58.2012.5.12.0004
Reclamante: Regiane Agostini
Reclamada: RH Brasil Serviços Temporários Ltda. e Wetzel S.A.
“(...) ciência do empregado/empregador. Não havendo controvérsia sobre a gravidez da Autora, mesmo porque demonstrado pelo documento juntado (marcador 3.8), há questão relevante a ser apreciada, que é a prevalência dessa garantia nos contratos a termos. O Tribunal Superior do Trabalho, alterando entendimento anterior, alterou a redação do verbete sumular anterior que tratava da matéria (1). No entanto, mesmo diante dessa nova súmula, entendo, por ora, por manter entendimento anterior no sentido de que não prevalece a garantia prevista no art.10, II, “b” do ADCT, quando se trata de contrato a termo, no caso trabalho temporário. É que entendo que, no caso, não há dispensa arbitrária ou sem justa causa, hipóteses vedadas na gravidez pela norma citada. Com efeito, nessa forma de contratação, o que se verifica é simplesmente o término do contrato por ter atingido seu termo, já previamente estabelecido entre as partes. Diante da fundamentação supra, é que rejeito os os pedidos formulados nas alíneas “a” a “f” da petição inicial (...)” Julgamento datado de 19/11/2012. (grifo nosso)
Constituem entendimentos jurisprudenciais como o supracitado, um alento aos empregadores brasileiros, porque, se preocupam em aplicar a decisão mais sensata e consciente aos contratos de trabalho firmados, garantindo, fundamentalmente, a manutenção dos empregos e reduzindo o possível acréscimo da ocorrência de trabalho informal.
Partindo-se do princípio de que a reformulação da Súmula nº 244 do TST trará demasiado ônus aos empregadores, como já pormenorizado aqui neste artigo, aos empregadores restará a adoção de medidas criativas.
Como alternativa à diminuição de contratações de funcionárias do sexo feminino, poderão as empresas adotar como prática recorrente a realização de palestras educativas cuja presença è facultada a todas empregadas da empresa, indiscriminadamente, em que sejam abordados temas como: saúde da mulher, doenças sexualmente transmissíveis, uso de métodos contraceptivos. Pois, orientação familiar e aconselhamento, desde que submetidas às normas contidas no Sistema único de Saúde, conforme interpretação da Lei nº 9.029 de 1995, em seu art. 2º, inciso II, b[6].
Outra possibilidade é a admissão de empregadas da terceira idade, que podem agregar a experiência profissional e de vida e vir a contribuir com a empresa no sentido de partilhar conhecimentos. Afora, o fato de que esta iniciativa corroborará para a imagem da empresa em termos de responsabilidade social e na inclusão de pessoas que se encontravam à margem do mercado de trabalho.
O que se tem como lição diante das seqüentes modificações dos entendimentos magistrais é que os empresários deverão exercitar sua capacidade de adaptação e a isso, uma boa dose de criatividade poderá ser um grande diferencial.
Notas
[1] Artigo 392 da CLT:
A empregada gestante tem direito à licença-maternidade de 120 (cento e vinte) dias, Sem prejuízo do emprego e do salário.
[2] Artigo 392-A da CLT:
À empregada que adotar ou obtiver guarda judicial para fins de adoção de criança será concedida licença-maternidade nos termos do art.392.
[3] GESTANTE. ESTABILIDADE PROVISÓRIA (incorporadas as Orientações Jurisprudenciais nºs 88 e 196 da SBDI-1) - Res. 129/2005, DJ 20, 22 e 25.04.2005
I - O desconhecimento do estado gravídico pelo empregador não afasta o direito ao pagamento da indenização decorrente da estabilidade (art. 10, II, "b" do ADCT). (ex-OJ nº 88 da SBDI-1 - DJ 16.04.2004 e republicada DJ 04.05.04)
II - A garantia de emprego à gestante só autoriza a reintegração se esta se der durante o período de estabilidade. Do contrário, a garantia restringe-se aos salários e demais direitos correspondentes ao período de estabilidade. (ex-Súmula nº 244 – alterada pela Res. 121/2003, DJ 21.11.2003)
III - Não há direito da empregada gestante à estabilidade provisória na hipótese de admissão mediante contrato de experiência, visto que a extinção da relação de emprego, em face do término do prazo, não constitui dispensa arbitrária ou sem justa causa. (ex-OJ nº 196 da SBDI-1 - inserida em 08.11.2000)
[4] Lei nº 9.029 de 1995
Art. 2º Constituem crime as seguintes práticas discriminatórias:
I - a exigência de teste, exame, perícia, laudo, atestado, declaração ou qualquer outro procedimento relativo à esterilização ou a estado de gravidez;
[5] DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 11ª Edição, São Paulo: LTR, 2012, p. 547
[6] Lei nº 9.029 de 1995
Art. 2º Constituem crime as seguintes práticas discriminatórias:
II - a adoção de quaisquer medidas, de iniciativa do empregador, que configurem;
b) promoção do controle de natalidade, assim não considerado o oferecimento de serviços e de aconselhamento ou planejamento familiar, realizados através de instituições públicas ou privadas, submetidas às normas do Sistema Único de Saúde (SUS). (grifo nosso)