Direito de acesso à saúde

Direito de acesso à saúde

Retrata estudos feitos com o objetivo de se concluir o direito do cidadão brasileiro de ter acesso à saúde e o seus limites, assim como os intrumentos de direito material e processual necessários para sua efetivação.

1.0 – Das fontes materiais assecuratórias de acesso universal à saúde pelo Brasileiro

Incessante e aparentemente sem fim próximo é a discussão estabelecida nos tribunais brasileiros acerca do direito universal a saúde do brasileiro, tendo o Estado como garantidor universal.

Hoje tem sido comum a enxurrada de ações na justiça, em que os autores buscam o fornecimento de determinado tratamento médico, de forma a ser fornecido ou custeado pelo Estado, onde alegam precipuamente a falta de recursos e a obrigação do Estado em garantir o acesso universal à saúde.

Face a enorme quantidade de processos que tramitam na justiça, comuns tem sido as decisões proferidas, sendo que alguns magistrados tem decidido no sentido de obrigar o Estado em fornecer ao paciente o tratamento necessário, enquanto que outros vêem limites que o impedem de tal prestação.

Como base para o direito material tem-se o disposto no art. 196 da CRFB/88, assim vejamos:

Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. (Grifo meu)

Ora, a redação dada ao art. 196 da Constituição é clara, sendo obrigação do Estado garantir a todo brasileiro o seu acesso à saúde, sendo, no entanto omisso quanto a extensão desta garantia, o que nos leva a algumas reflexões que serão ditas a seguir.

No mesmo sentido, a Constituição em seu art. 6º assegurou o direito à saúde como sendo um dos direitos sociais a que todo cidadão faz jus, assim vejamos:

Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (grifo meu)

O legislador à época da constituinte, visando evitar conflitos de competência criou o art. 24, XII da CRFB/88, onde estende a obrigação de prestar os serviços inerentes à saúde à União, Estado, Municípios e Distrito Federal. Assim vejamos:

Art. 24. Compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre:

(...)

XII - previdência social, proteção e defesa da saúde;

Por esta razão, as demandas são comumente movidas em face de ambos ou apenas de um deles, tudo conforme for a análise do advogado, defensor público ou promotor de justiça.

No entanto se engana quem vê apenas na CRFB/88 os subsídios legais necessários para se ter acesso à saúde, uma vez que o serviço de saúde no Brasil é regulamentado pela lei 8.080 de 1990.

Esta lei trás de forma ainda mais clara a obrigação do Estado em assegurar a todo brasileiro o direito universal de acesso à saúde, principalmente na redação dada pelo legislados em seu art. 2º:

Art. 2º A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício.

§ 1º O dever do Estado de garantir a saúde consiste na formulação e execução de políticas econômicas e sociais que visem à redução de riscos de doenças e de outros agravos e no estabelecimento de condições que assegurem acesso universal e igualitário às ações e aos serviços para a sua promoção, proteção e recuperação.

§ 2º O dever do Estado não exclui o das pessoas, da família, das empresas e da sociedade.(grifo meu)

Ora, a saúde além de representar uma garantia fundamental posta na CRFB/88, também está assegurada em face das disposições acima e por estas razões é auto aplicável, ou pelo menos deveria ser.

2.0 – Dos instrumentos necessários à efetivação do direito á saúde

Velho jargão utilizado no convívio social pode ser basilar para se compreender esta parte, qual seja, “todo cuidado é pouco”.

Para que se obtenha o tratamento médico indispensável a vida ou à sobrevivência, é necessário o ingresso com a demanda processual cabível, ou seja, ingressar com a ação correta.

Para que o interessado possa demandar são necessários três elementos indispensáveis, as partes, que no caso em tela é o proponente e o Estado (União, Estado, Distrito Federal e Municipios), a causa de pedir, que seria a existência de um problema de saúde, onde o paciente necessita de alguma tratamento, mas além de não ter condições de pagá-lo o poder publico não o disponibiliza e por fim o pedido, que seria a concessão ou fornecimento do tratamento médico necessário (Cirurgia, remédios ou qualquer outro necessário).

Dentre as ações mais adequadas ao caso em tela temos a Ação Cominatória de Obrigação de Fazer e o Mandado de Segurança. Vamos estudar o primeiro.

A Ação Cominatória é aquela a ser utilizada quando o autor pode pedir ao juiz que determine ao réu fazer ou deixar de fazer algo.

A doutrina traz com perfeição o conceito desta demanda, qual seja:

"Ação cabível nas obrigações de fazer ou de não fazer, sendo encontrada sua origem no interdictium prohibitorium do Direito Romano, ingressando no Direito brasileiro mediante o antigo processo lusitano. Esta ação era também chamada ação de embargos à primeira, porque o réu devia trazer seus embargos na primeira audiência após a citação. O adjetivo cominatória deriva do fato de que, nesta ação, sempre se pede uma cominação ou pena, seja esta derivada de contrato, da lei ou daquilo que o autor estimar. Tal cominação é um pedido subsidiário, para o caso de o réu não concretizar a pretensão do autor. O CPC vigente aboliu esta espécie de ação" ¹

Tendo em vista o nosso estudo, esta ação se presta a compelir o Estado a cumprir uma obrigação de fazer, qual seja, fornecer medicamentos, pagar para realização de determinada cirurgia, fornecer insumos para tratamento médicos diversos, dentre outros.

Esta ação se dá pelo procedimento ordinário previsto no CPC – Código De Processo Civil, não havendo nenhum regramento especifico.

Nesta hipótese, para melhor demonstrar o seu direito, deve o Autor procurar primeiro pelo poder publico e fazer o requerimento pelas vias administrativas do fornecimento do tratamento médico necessário, demonstrando a sua necessidade e impossibilidade em arcar com as despesas. Após, obtendo a resposta negativa, o paciente a leva ao seu advogado para que ele possa melhor instruir a demanda, demonstrando ao poder judiciário a inércia do poder executivo em cumprir com sua obrigação de permitir ao cidadão acesso universal à saúde.

Na esfera processual, o advogado utilizará do direito material acima descrito e também do procedimento ordinário previsto no CPC – Código de Processo Civil, além do art. 273 do CPC para se obter uma tutela antecipada em sede liminar. Assim vejamos

Art. 273. O juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e:

I - haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou

II - fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu.

(...)

Este requerimento de tutela antecipada é o que comumente a população chama de “liminar”. Este instituto serve para que o demandante não precise esperar até o fim do processo para obter provisoriamente a pretensão que almeja. No caso dos tratamentos médicos, que na maioria são urgentes, pede-se esta tutela antecipada para se salvar a vida dos doentes.

Deve-se observar os requisitos exigidos pela lei para que o juiz conceda esta tutela antecipada. Deverá o paciente provar a necessidade de obter com urgência a tutela antecipada (tratamento), ao ponto de não poder esperar o fim do processo, o que pode se dar por mero laudo expedido pelo médico particular expondo os riscos a que se está exposto o paciente pelo simples fato de esperar o demorado andamento processual, além da inobservância da lei pelo poder público, que no caso em tela seria a negatória do requerimento administrativo para fornecimento do tratamento médico.

Provados estes dois pontos dificilmente a autoridade judicial, no caso o juiz, negará a tutela antecipada (liminar) para se obter o tratamento médico, e mesmo que negue a decisão estará sujeita recurso, a ser interposto pelo advogado no prazo máximo de dez dias após a publicação da decisão, recurso este denominado Agravo de Instrumento, cuja previsão legal está no art. 522 e seguintes do CPC – Código de Processo Civil.

Além da ação cominatória acima explicada o demandante pode se valer do Mandado de Segurança, que possui regramento especial previsto na lei 12.016 de 2009.

O Mandado de Segurança pode ser utilizado quando o paciente, no caso de tratamento médico, precisar assegurar direito liquido e certo, cujas ações de Habeas Corpus e Habeas Data não sejam competentes para solucioná-lo. Assim dispõe o art. 1º da lei retro mencionada:

Art. 1º Conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, sempre que, ilegalmente ou com abuso de poder, qualquer pessoa física ou jurídica sofrer violação ou houver justo receio de sofrê-la por parte de autoridade, seja de que categoria for e sejam quais forem as funções que exerça.

Como descrito neste dispositivo, o interessado tem de ter sofrido alguma violação ou haver justo receio de que isso ocorra, o que no caso em tela é quando o Estado nega administrativamente o tratamento médico quando deveria prestá-lo.

Deve-se observar que no caso da Ação Cominatória o advogado pode optar por ingressar contra União, Estado, Distrito Federal ou Municípios, enquanto que no Mandado de Segurança só será possível ingressar contra a autoridade coatora, que é quem negou o pedido feito pelas vias administrativas, ou seja, se o requerimento administrativo negado tiver sido feito apenas à secretaria municipal do município onde viver o paciente, o Mandado de Segurança só poderá ser impetrado contra o Secretario Municipal de Saúde.

No caso do Mandado de Segurança a parte impetrante poderá requerer a Medida Antecipatória de Tutela (liminar) assim como na ação Cominatória, devendo observar ainda que o prazo para ingresso com esta ordem é de 120 dias contados da data em que o interessado teve ciência da negatória de seu pedido.

3.0 Conclusão

Face ao exposto no curto estudo realizado pode-se concluir que a saúde é direito de todos e sua prestação é dever do Estado. Para tanto, o interessado deverá valer-se de qualquer um dos instrumentos acima, devendo para tanto montar o melhor conjunto probatório possível.

Quanto a distinguir qual dos dois procedimentos acima seria o melhor, isso vai de acordo com as condições do interessado. Caso este tenha a necessidade de comprovar a necessidade de seu tratamento ainda no decorrer do processo, como por exemplo a realização de uma perícia pelo médico, recomenda-se o uso da Ação Cominatória, assim como no caso de se ter ultrapassado os 120 dias da negatória do direito de acesso à saúde, e ainda no caso de não serem as provas absolutamente comprovadoras.

A Ação Cominatória por ser de procedimento ordinário demandará mais tempo do que o Mandado de Segurança que tem prioridade em sua tramitação.

Desta forma, os pacientes de doenças ou enfermidades graves de qualquer natureza (câncer, AIDS, diabetes, doenças degenerativas, acidentes de qualquer natureza e qualquer outra patologia grave), que não tenham acesso à saúde, seja por insubsistência de recursos ou por negatória do Estado, devem procurar por um advogado ou defensor público, para que este possa junto ao poder judiciário pleitear o tratamento necessário para salvar a vida do paciente.

4.0 – Fonte bibliográfica utilizada

1 - MONTENEGRO, Cesar, Proponha uma ação no procedimento ordinário, p. 191


Sobre o(a) autor(a)
Roberto Augusto Resende Magalhães Toledo
Roberto Augusto Resende Magalhães Toledo, advogado. Me formei em direito em 2008 pela Faculdade Pitágoras em Belo Horizonte, cursei pós-graduação em Direito e Processo Civil em 2009 pela ANAMAGES, Pós-graduação em Direitos...
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