A modificação da jurisprudência do STJ em relação à responsabilidade tributária do sócio

A modificação da jurisprudência do STJ em relação à responsabilidade tributária do sócio

O Superior Tribunal de Justiça modifica sua jurisprudência sobre a responsabilidade tributária dos sócios. Agora cabe ao sócio provar que não agiu com dolo, com excesso de poderes ou infringindo a lei, contrato social ou estatuto social.

Como é sabido o artigo 135 do Código Tributário Nacional prevê as hipóteses em que o sócio responderá pelos créditos correspondentes a obrigações tributárias. Seja quando pratica ato com excesso de poderes ou infringindo a lei, contrato social ou estatuto social.

Dessa forma, o Colendo Superior Tribunal de Justiça sempre interpretou o referido artigo da maneira como nele está escrito. Somente o sócio que praticar algum ato com excesso de poderes será responsabilizado pelo crédito tributário, cabendo as Fazendas Públicas provar que o sócio agiu daquela maneira.

Esse posicionamento sempre perdurou no Superior Tribunal de Justiça, última instância para apreciar essa matéria. Como se não bastasse a tamanha insegurança jurídica que todos nós vivemos, o próprio Colendo Superior Tribunal de Justiça, em decisão da Ministra Denise Arruda, Relatora no Recurso Especial nº 1.104.900/ES, deu mais uma amostra do total descompasso de suas decisões, modificando completamente o entendimento anterior sobre o tema e determinando que, doravante, o ônus de provar a sua inocência cabe ao próprio sócio, administrador ou gestor. Aplicou inclusive a sistemática do recurso repetitivo, valendo dizer que toda e qualquer discussão acerca do artigo 135 CTN terá que ter aquele acórdão como paradigma.

O ônus de provar a prática do ato excessivo, sempre foi da Fazenda Pública, através de fiscalização eficiente, pois fazer uma prova negativa ou probatio diabólica é a prova mais difícil dentro do ordenamento jurídico. Como provar que alguém deixou de fazer algo?

Com a nova orientação jurisprudencial que se avista, o quadro fica ainda mais grave. Dificilmente os responsáveis por uma sociedade sairão ilesos da injusta cobrança dos débitos tributários em atraso, pela grande dificuldade de fazer prova negativa quanto à prática de uma ilicitude que sequer chegou a lhe ser imputada.

Entretanto a referida decisão não pode ser interpretada como se todos os sócios fossem “sonegadores”. É sabido que ser empresário hoje no Brasil é algo quase impossível, pois o empresário luta contra o governo, que cada vez quer arrecadar mais.

Nunca é demais lembrar que a presunção de liquidez e certeza do crédito tributário é resultante de um procedimento administrativo fiscal onde é garantido ao sujeito passivo o contraditório e a ampla defesa. Em nosso ordenamento jurídico só é possível a Fazenda Pública constituir o seu próprio título executivo se este for extraído de um procedimento administrativo, submetido a todas as garantias constitucionais processuais, sob pena de lesão à cláusula pétrea da Constituição da República.

Entretanto se o nome do sócio já constava do lançamento, tendo-lhe sido facultada a defesa em relação não só à existência da dívida, mas também em relação à sujeição passiva, pode-se admitir a presunção de liquidez e certeza do crédito em relação a ele, sem que haja violação do contraditório e da ampla defesa.

No entanto, a prática nos mostra que o redirecionamento contra o sócio só se dá na fase de inscrição em dívida ativa, sem que o nome do responsável tributário tenha constado do lançamento, o que inviabiliza a sua participação no procedimento judicial futuro.

A Carta da República preceitua que todo cidadão será considerado inocente até que se prove o contrário. Deste modo, os sócios das empresas não podem ficar reféns das Fazendas Públicas. Para os sócios serem responsáveis é necessário que tenham praticado ato com excesso de poderes ou infringindo a lei, contrato social ou estatuto social, essa prova é exclusiva de quem alega, vale dizer, sempre da Fazenda Pública.

Ao exigir do suposto responsável tributário a prova negativa da inexistência de ilicitude, o STJ acaba por estabelecer uma responsabilização tributária objetiva sem amparo legal. Além disso, torna meramente retórico o seu posicionamento anterior, que consagrava as regras do Código Tributário Nacional que exigiam a prática de ato ilícito para a caracterização da responsabilidade tributária.

Assim, em nosso modesto entendimento, todos os responsáveis tributários são inocentes até que se prove o contrário, não podendo os mesmos serem taxados de culpados por simples prazer da administração pública, que não possui em seus quadros, agentes fiscais com capacidade técnica para dizer se o sócio ou administrador foi, é ou será responsável pelo débito tributário de uma empresa. A exceção não pode virar regra. Os princípios constitucionais teem que ser respeitados, não se podendo sopesar direitos constitucionais dos contribuintes, na simples ânsia de aumentar a arrecadação.

Sobre o(a) autor(a)
Marcelo Romanelli Cezar Fernandes
Graduado em Direito pela Faculdade Milton Campos em 2004. Profissional com experiência em análise da aplicação das normas de direito societário. Experiência nas áreas Cível, Trabalhista e Tributária, com ênfase em advocacia...
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