O agravo regimental no direito processual civil vigente

O agravo regimental no direito processual civil vigente

Faz um reflexão sobre a vedação do agravo regimental nos regimentos internos de Tribunais de segundo grau.

A s periódicas alterações realizadas no Código de Processo Civil, em especial, no vasto e complexo sistema recursal que, no entendimento da maioria, eterniza o andamento dos processos, demonstram, ao contrário do que se pensa, a constante preocupação do Poder Legislativo com a celeridade e eficiência da tutela jurisdicional prestadas pelo Poder Judiciário.

Dentre os diversos instrumentos recursais à disposição das partes para impugnação dos atos judiciais com o objetivo de solucionar questões incidentes, destacamos o recurso de agravo, mais especificamente o agravo regimental (ou qualquer outra denominação convencionada), o qual é interposto contra decisões singulares proferidas pelos magistrados em sede de Tribunal, sejam elas interlocutórias, terminativas ou definitivas.

O agravo regimental, expressão convencionada no meio jurídico, enfrenta, desde logo, uma problemática terminológica, posto que se trata de um recurso com previsão legal [1] e, portanto, sem qualquer razão para utilização da denominação “regimental”.

Logo, entre as inúmeras expressões utilizadas para o agravo regimental, alguns doutrinadores acreditam que o termo “agravo interno” transcenderia a barreira da contradição técnica, revelando que o seu processamento seria dentro do próprio Tribunal onde o recurso foi interposto, transformando-se num termo mais apropriado à sua função jurídica.

Regra geral, os regimentos internos dos Tribunais dispõem expressamente que as decisões monocráticas proferidas pelo Presidente do Tribunal, de Seção, de Turma ou pelo relator, causadoras de gravames às partes, podem sujeitar-se ao reexame ou revisão pelos respectivos órgãos colegiados, mediante a interposição de agravo regimental ou interno.

Entretanto, nas últimas reformulações do Regimento Interno do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (a exemplo de outros Tribunais), constatamos que as decisões que conferem ou negam efeito suspensivo em agravo de instrumento ou que deferem ou indeferem liminar em mandado de segurança não são consideradas ensejadoras de agravo interno (art. 293, § 1º).

Nada mais absurdo, uma vez que a instituição e o cabimento do recurso de agravo é matéria exclusivamente de direito processual, o que simplesmente veda qualquer regulamentação por regimento interno de Tribunal, cabendo a este, apenas e tão somente, reproduzir o texto legal, sob pena de desrespeitar os limites constitucionais estabelecidos nos artigos 22, inciso I, e 96, inciso I, alínea “a”, da Carta Magna de 1988.

Os regimentos internos, dentro da estrutura normativa baseada na estrutura kelseniana, sobrepõem-se apenas aos atos normativos, ou seja, as disposições regimentais não podem contrariar a lei, nem criar direitos, impor obrigações, proibições ou penalidades que nela não sejam previstos, sob pena de infringir o princípio da legalidade, previsto no inciso “II”, do artigo 5º e no “caput” do artigo 37, da Constituição Federal vigente.

Desse modo, percebemos que os regimentos internos dos Tribunais não podem ser considerados como uma via legislativa idônea restritiva do cabimento de qualquer recurso, pois ultrapassam as raias da legislação processual.

Note-se que à luz do sistema judiciário vigente, nenhuma decisão de Presidente ou Vice-presidente de Tribunal, de Seção, de Turma ou de relator pode ser considerada irrecorrível, ou seja, deverá sempre haver a possibilidade de recorrermos, no vasto e complexo sistema recursal vigente, a um instrumento processual que preencha tal lacuna.

Logo, considerando o agravo interno como um recurso inadequado contra decisões que conferem ou negam efeito suspensivo em agravo de instrumento, reputamos perfeitamente cabível apenas a impetração de mandado de segurança, sem qualquer restrição como sucedâneo recursal. É certo que a natureza jurídica do mandado de segurança não é a de um recurso em sentido estrito, porém é o único instrumento (remédio constitucional) do qual a parte pode se valer para impugnar tal decisão monocrática.

De fato, o sistema recursal pátrio preconiza que o órgão originalmente competente para apreciar o agravo de instrumento ou o mandado de segurança interposto em sede de Tribunal é o colegiado, sendo facultado ao relator decidir questões incidentais ou que já tenham sido pacificadas pelo respectivo órgão.

Com efeito, vedar a interposição de agravo interno em face das decisões que conferem ou negam efeito suspensivo em agravo de instrumento ou que deferem ou indeferem liminar em mandado de segurança, significa obstruir completamente a possibilidade de que os mesmos sejam julgados pelos órgãos originalmente competentes, ferindo frontalmente o princípio do juiz natural, além de impedir que a decisão sofra o controle das partes.

O Superior Tribunal de Justiça entende que as decisões monocráticas proferidas em Tribunais de segundo grau sujeitam-se a agravo interno [2]. Entretanto, o Supremo Tribunal Federal já está em processo de aprovação de súmula que veda o cabimento de agravo interno contra decisão do relator que concede ou indefere liminar em mandado de segurança, reforçando a tese defendida pelos Tribunais de segundo grau.

Diante de todo o exposto, entendemos que a questão deverá ser dirimida somente quando levada a apreciação do Superior Tribunal de Justiça nos casos concretos, entretanto, chamamos a atenção de todos para uma reflexão sobre as ilegalidades de tais vedações regimentais, posto que demonstram um profundo equívoco dos Tribunais a sedimentação desta tese, contrariando, desse modo, a intenção do legislador que reformou todo o sistema recursal do agravo.



[1] cf. artigos 120, parágrafo único, 532, 545 e 557, parágrafo 1º, do Estatuto Processual Civil, artigo 4º da Lei nº 4.348/64, artigo 12, parágrafo 1º, da Lei nº 7.347/85, artigo 39 da Lei nº 8.038/90, artigo 4º, parágrafo 3º, da Lei nº 8.437/92, artigo 4º, parágrafo único, e 15, parágrafo único, da Lei nº 9.868/99, e artigo 4º, parágrafo 2º, da Lei nº 9.882/99.

[2] Recurso Ordinário em Mandado de Segurança nº 11.320, Ministro Sálvio de Figueiredo; Embargos de Declaração em Agravo Regimento em Agravo de Instrumento nº 125.746, Ministro Adhemar Maciel.

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Elias de Souza
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