Extensão da antecipação para o cônjuge supérstite em precatório

Extensão da antecipação para o cônjuge supérstite em precatório

Dispõe sobre a extensão, para o cônjuge supérstite, do pagamento antecipado de parte do crédito constante em precatório nos moldes do artigo 10, § 4º, da Resolução nº 115/2010 - CNJ c/c 100 § 2º da Constituição Federal.

Os precatórios originados de crédito de natureza alimentícia, assim definidos no artigo 100 § 1º da Constituição Federal, serão pagos antecipadamente até o valor do triplo do limite estabelecido para pagamento por RPV, se os credores comprovarem ter 60 anos de idade, ser portadores de doença grave ou deficientes.

De acordo com o artigo 10 § 4º da Resolução nº 115/2010 – CNJ, “apenas no caso de morte do credor após o protocolo do requerimento, a preferência por idade ou doença estende-se em favor do cônjuge supérstite, companheiro ou companheira, em união estável, nos termos do art. 1.211-C do CPC”.

Não há previsão constitucional sobre o tema, pois o artigo 100 da CF nada previa e a emenda constitucional nº 94/2016 nada acrescentou, salientando-se que o artigo 97 do ADCT, declarado integralmente inconstitucional pelo STF no julgamento da Adin nº 4357, também não regulou a matéria.

A EC nº 94/2016, na verdade, acrescentou a possibilidade de os sucessores poderem requerer em nome próprio o benefício da antecipação se comprovarem ter 60 anos de idade, ser portadores de doença grave ou deficientes, nos termos do artigo 100 § 2º da CF.

Tecnicamente, artigo 10 § 4º da Resolução nº 115/2010 – CNJ padece de constitucionalidade, uma vez que, ao tratar de direito sucessório, favorece o (a) cônjuge supérstite quanto à extensão do pedido de antecipação, excluindo tal possibilidade em relação aos demais herdeiros necessários, o que fere, inclusive, o princípio da isonomia.

Nos termos do artigo 22, inciso I da Constituição Federal, compete privativamente à União legislar sobre direito civil, de forma que o direito sucessório deve ser regulado por meio de lei em sentido estrito, emanada do Poder Legislativo da União e não por meio de Resolução, ainda mais editada pelo Conselho Nacional de Justiça, o qual não detém competência legislativa, limitando-se o artigo 103-B § 4º, inciso I da Constituição Federal a atribuir ao CNJ competência somente para expedir atos regulamentares.

Dessa forma, a Resolução nº 115/2010 – CNJ deve se limitar a apenas regulamentar o procedimento atinente ao precatório sem inovações jurídicas legislativas.

Nesse toar, diante da notória inconstitucionalidade do artigo 10 § 4º da Resolução nº 115/2010 – CNJ, o correto e lógico a se fazer em caso de pedido de antecipação formulado em vida pelo credor que veio a falecer posteriormente é pagar o valor da antecipação aos herdeiros nos moldes estabelecidos no formal de partilha apresentado no precatório, ou, inexistindo formal de partilha, mas existindo notícia de herdeiros, colocar o valor da antecipação à disposição do Juízo da execução ou inventário, ressaltando que, cabe ao Juiz do precatório, conjuntamente com o Advogado do credor diligenciarem sobre a existência de inventário e herdeiros.

Da leitura do artigo 10 § 4º da Resolução nº 115/2010 – CNJ, denota-se que a preferência pode ser estendida ao (à) cônjuge supérstite, porém, não há menção expressa ao limite do valor a que teria direito o(a) cônjuge do(a) credor(a) falecido(a), justamente porque ao (à) cônjuge supérstite deve ser garantida a percepção do valor da antecipação até o limite da sua quota-parte apurada na partilha de bens determinada pelo Juízo do inventário ou por escritura pública.

Logo, para aqueles que admitirem a constitucionalidade do artigo 10 § 4º da Resolução nº 115/2010 – CNJ, é importante observar que a quota-parte do(a) cônjuge supérstite deve ser apurada de acordo com o regime de bens adotado no casamento civil.

No regime de comunhão parcial de bens é apurada através da fixação da meação, a qual decorre da metade dos bens adquiridos na constância do casamento, abatidas as dívidas contraídas pelo casal, e existe concorrência na herança com os descendentes. Se existirem bens particulares do falecido, o(a) cônjuge supérstite não terá direito à meação, mas terá direito ao mesmo percentual da herança dos descendentes em relação a esses bens.

Exemplo: Falecido deixou cônjuge e 2 descendentes, além de precatório no valor de R$10.000,00 (dez mil reais) = cônjuge supérstite terá direito a apenas R$ 5.000,00 (cinco mil reais) se o valor do precatório for constituído a partir de um direito material surgido na constância do casamento. Por outro lado, terá direito a apenas R$ 3.300,00 (três mil e trezentos reais) se o valor do precatório for constituído a partir de um direito material surgido antes do casamento, por força do art. 1829 do Código Civil, que trata de sucessões por regime de bens.

Logo, deve-se analisar se existem dívidas do casal a serem abatidas do espólio para se chegar ao valor da meação; bem como analisar a data do surgimento do direito material que originou o precatório, pois, se originado na constância do casamento, haverá meação independentemente da data de reconhecimento judicial desse direito; se originado antes do casamento, não haverá meação.

Se o surgimento do direito material que originou o precatório se deu antes do casamento, deve ser feito o abatimento dos débitos existentes em nome do falecido, e também é importante conhecer todos os descendentes do falecido para dividir o valor do precatório em percentuais idênticos entre cônjuge e descendentes, já que não existirá meação.

Quanto ao Regime de comunhão universal de bens, existe somente a meação, a qual decorre da metade dos bens adquiridos antes ou na constância do casamento, abatidas as dívidas contraídas pelo casal.

Exemplo: Falecido deixou cônjuge e 2 descendentes, além de precatório no valor de R$10.000,00 (dez mil reais) = cônjuge supérstite terá direito a apenas R$ 5.000,00 (cinco mil reais) independentemente se esse valor do precatório foi constituído a partir de um direito material surgido antes ou durante o casamento, por força do art. 1829 do Código Civil, que trata de sucessões por regime de bens.

Logo, deve-se analisar se existem dívidas do casal a serem abatidas do espólio para se chegar ao valor da meação.

Já no Regime de separação de bens não existe meação, mas existe concorrência na herança com os descendentes.

Exemplo: Falecido deixou cônjuge e 2 descendentes, além de precatório no valor de R$10.000,00 (dez mil reais) = cônjuge supérstite terá direito a apenas R$ 3.300,00 (três mil e trezentos reais) independentemente se esse valor do precatório foi constituído a partir de um direito material surgido antes ou durante o casamento, por força do art. 1829 do Código Civil, que trata de sucessões por regime de bens.

Logo, independentemente da data do surgimento do direito material que originou o precatório, deve ser feito o abatimento dos débitos existentes em nome do falecido, e também é importante conhecer todos os descendentes do falecido para dividir o valor do precatório em percentuais idênticos entre cônjuge e descendentes, já que não existirá meação.

Já em relação ao Regime de participação final nos aquestos, haveria concorrência do(a) cônjuge supérstite com os descendentes se o valor a ser partilhado fosse decorrente de patrimônio próprio adquirido a qualquer título antes do casamento ou adquirido depois do casamento a título gratuito, cabendo somente a meação ao (à) cônjuge supérstite em caso de bem adquirido a título oneroso na constância do casamento.

Há ainda a possibilidade de concorrência do (da) cônjuge supérstite com os ascendentes na falta dos descendentes, conforme estabelecido no artigo 1836 do Código Civil.

Diante da problemática acima traçada, e da possibilidade de pagamento de valores de forma equivocada tanto a título de antecipação quanto a título de pagamento em ordem cronológica, torna-se inviável a liberação de quantia referente a precatório para a cônjuge supérstite ou até mesmo para os demais sucessores sem que haja a comprovação da partilha.

O artigo 610 § 1º do CPC admite que “se todos forem capazes e concordes, o inventário e a partilha poderão ser feitos por escritura pública, a qual constituirá documento hábil para qualquer ato de registro, bem como para levantamento de importância depositada em instituições financeiras”.

In casu, deve ser juntada aos autos do precatório a escritura pública do inventário.

Ainda que o CPC tenha previsto a possibilidade de o inventário ser feito extrajudicialmente, a este foi conferido efeito jurídico na medida em que há presença do Poder Público por meio de delegação à Serventia Extrajudicial, nos termos do artigo 236 da CF.

O Código de Processo Civil estabelece ainda, em seu artigo 610 caput, que, “havendo testamento ou interessado incapaz, proceder-se-á ao inventário judicial”.

Nesse toar, à vista do que dispõe o CPC, então, a partilha ficou a cargo dos próprios herdeiros através de inventário extrajudicial consubstanciado em escritura pública, ou a cargo do Juiz com competência judicial mediante sentença judicial, o que afasta a possibilidade de o Presidente do Tribunal ou do Juiz Gestor de Precatórios realizar partilha de bens, destituídos que foram desta competência.

Nos termos da súmula nº 311 do Superior Tribunal de Justiça, "os atos do Presidente do Tribunal que disponham sobre processamento e pagamento de precatório não têm caráter jurisdicional", logo, nem o Presidente do Tribunal e nem o Juiz Gestor de Precatórios dispõem de competência judicial e nem suas decisões são dotadas de efeito jurídico para se reconhecer meação e realizar a partilha de um bem caracterizado por precatório quando configuradas as hipóteses do caput e § 1º do artigo 610 do CPC.

Há que se fazer uma interpretação sistemática das normas, (Resolução nº 115/2010 – CNJ e CPC) de forma a possibilitar a liberação do valor constante de precatório para a cônjuge supérstite, porém, de forma segura, a fim de evitar pagamentos incorretos e consequentes enriquecimento sem causa do credor e prejuízo aos cofres públicos.

Portanto, em que pese o art.10 § 4º da Resolução nº 115/2010 possibilite a extensão da preferência ao(à) cônjuge supérstite no caso de morte do credor após o protocolo do requerimento, é necessária a comprovação da partilha do valor referente ao precatório seja por sentença judicial ou por escritura pública, vez que, com o falecimento do credor, tal quantia assume a condição de herança, a qual constitui universalidade não divisível, sendo necessária ao seu recebimento a individualização do montante a que cada herdeiro terá direito.

Não havendo juntada aos autos do formal de partilha, o valor deverá ser transferido para uma conta judicial vinculada ao processo de execução, à disposição daquele Juízo, ou vinculada ao processo de inventário, se houver ação de inventário judicial em andamento, e o precatório deverá ser extinto pela quitação se o valor da antecipação englobar o valor total daquele precatório, sendo vedada aos Tribunais em sede de precatório, por uma interpretação lógica e sistemática do ordenamento jurídico pátrio, a liberação de valores a herdeiros em geral sem que haja partilha formalizada por sentença judicial ou escritura pública.

Sobre o(a) autor(a)
Raquel Santos de Santana
Bacharela em Direito pela Universidade Tiradentes em Sergipe desde 2006. Aprovada na OAB-SE/ em 2006. Especialista em Direito Público pela UNIDERP desde 2010. Servidora Pública Estadual (TJ/SE).
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