Uma breve análise da nova Lei de Abuso de Autoridade
Uma breve análise da nova Lei de Abuso de Autoridade, seus principais aspectos penais e processuais, e rol dos 45 (quarenta e cinco) tipos penais trazidos por esta lei.
A Nova Lei de Abuso de Autoridade (nº 13.869), que começou a vigorar no dia 03 de janeiro de 2020, chegou, e com força, impondo 45 tipos de condutas abusivas contra os agentes públicos de todo o país.
Muito se tem visto relacionar-se esta lei com o momento atual de grandes investigações, onde obviamente se encontra a Lava Jato, e um possível oportunismo em sua promulgação, ao argumento de que seria uma forma de frear os órgãos de persecução penal. Mas antes é preciso dizer que o seu texto foi aprovado depois de 02 (dois) anos de debates do Congresso Nacional, e veio substituir uma já existente, de 1965, exclusiva para o poder Executivo. Teorias de conspirações à parte, a Nova Lei do Abuso de Autoridade esta em vigor, e cabe ao operador do direito conhece-la.
O novo texto normativo trouxe mudanças e novas tipificações penais de impacto, especificando condutas que devem ser consideradas abuso de autoridade e prevendo suas respectivas punições.
A nova lei amplia tanto as condutas descritas como abusivas na legislação anterior, como a quem essas se aplicam, abrangendo servidores públicos e autoridades, tanto civis quanto militares, dos três Poderes - Executivo, Legislativo e Judiciário-, como também dos membros do Ministério Público, sejam federais ou estaduais.
Dentre as medidas da nova lei estão a punição de agentes por decretar condução coercitiva de testemunha ou investigado antes de intimação judicial; promover escuta ou quebrar segredo de justiça sem autorização judicial; divulgar gravação sem relação com a prova que se pretenda produzir; continuar interrogando suspeito que tenha decidido permanecer calado ou que tenha solicitado a assistência de um advogado; interrogar à noite quando não é flagrante; e procrastinar investigação sem justificativa (veja a íntegra abaixo).
O atual chefe do Poder Executivo Nacional tentou vetar 23 (vinte e três) condutas definidas pela nova lei como abuso de autoridade, porém destas, 15 (quinze) acabaram retornando ao texto por determinação do Senado Federal.
De 53 (cinquenta e três) condutas que vieram originalmente com o texto proposto, 45 (quarenta e cinco) tornaram-se efetivas, e as punições por abuso de autoridade podem chegar agora a 4 (quatro) anos de detenção, multa e indenização de natureza cível.
Ponto forte da nova lei é a punição que mexe até mesmo no “sagrado direito de estabilidade do servidor público”, prevendo que em caso de reincidência poderá haver a perda do cargo do serventuário ou autoridade, e a inabilitação para a retomada ao serviço público por um prazo de até 5 (cinco) anos.
Entretanto, a mera divergência interpretativa de fatos e normas legais, segundo a lei, não é suficiente para configurar qualquer conduta criminosa, devendo, para tanto, ficar comprovado que o abuso se deu para benefício pessoal do autor, ou na intenção de prejudicar terceiro. No Capítulo VI – Dos Crimes e das Penas, que vai do art. 9º ao 38º, a lei estipulou os seguintes tipos penais:
1-Não comunicar prisão em flagrante ou temporária ao juiz;
2-Não comunicar prisão à família do preso;
3-Não entregar ao preso, em 24 (vinte e quatro) horas, a nota de culpa;
4- Prolongar prisão sem motivo, não executando o alvará de soltura ou desrespeitando o prazo legal;
5-Não se identificar como policial durante uma captura;
6-Não se identificar como policial durante um interrogatório;
7-Interrogar à noite (exceções: flagrante ou consentimento);
8-Impedir encontro do preso com seu advogado;
9-Impedir que preso, réu ou investigado tenha seu advogado presente durante uma audiência e se comunique com ele;
10-Instaurar investigação de ação penal ou administrativa sem indício (exceção: investigação preliminar sumária devidamente justificada);
11-Prestar informação falsa sobre investigação para prejudicar o investigado;
12-Procrastinar investigação ou procedimento de investigação;
13-Negar ao investigado acesso a documentos relativos a etapas vencidas da investigação;
14-Exigir informação ou cumprimento de obrigação formal sem amparo legal;
15-Usar cargo para se eximir de obrigação ou obter vantagem;
16-Pedir vista de processo judicial para retardar o seu andamento;
17-Atribuir culpa publicamente antes de formalizar uma acusação;
18-Decretar prisão fora das hipóteses legais;
19-Não relaxar prisão ilegal;
20- Não substituir prisão preventiva por outra medida cautelar, quando couber;
21-Não conceder liberdade provisória, quando couber;
22-Não deferir habeas corpus cabível;
23- Decretar a condução coercitiva sem intimação prévia;
24-Constranger um preso a se exibir para a curiosidade pública;
25-Constranger um preso a se submeter a situação vexatória;
26- Constranger o preso a produzir provas contra si ou contra outros;
27- Constranger a depor a pessoa que tem dever funcional de sigilo;
28- Insistir em interrogatório de quem optou por se manter calado;
29-Insistir em interrogatório de quem exigiu a presença de um advogado, enquanto não houver advogado presente;
30-Impedir ou retardar um pleito do preso à autoridade judiciária;
31-Manter presos de diferentes sexos na mesma cela;
32-Manter criança/adolescente em cela com maiores de idade;
33-Entrar ou permanecer em imóvel sem autorização judicial (exceções: flagrante e socorro);
34-Coagir alguém a franquear acesso a um imóvel;
35-Cumprir mandado de busca e apreensão entre 21h e 5h;
36-Forjar flagrante;
37-Alterar cena de ocorrência;
38-Eximir-se de responsabilidade por excesso cometido em investigação;
39-Constranger um hospital a admitir uma pessoa já morta para alterar a hora ou o local do crime;
40-Obter prova por meio ilícito;
41- Deixar de substituir a prisão preventiva por medida cautelar diversa ou de conceder liberdade provisória, quando manifestamente cabível;
42-Usar prova mesmo tendo conhecimento de sua ilicitude;
43- Divulgar material gravado que não tenha relação com a investigação que o produziu, expondo a intimidade e/ou ferindo a honra do investigado;
44-Iniciar investigação contra pessoa sabidamente inocente;
45- Bloquear bens além do necessário para pagar dívidas.
Todos os crimes previstos na nova lei são de ação penal pública incondicionada.