Lei de drogas e a dosimetria da pena: agravamento do regime prisional com base na natureza e na quantidade do entorpecente

Lei de drogas e a dosimetria da pena: agravamento do regime prisional com base na natureza e na quantidade do entorpecente

Se o julgador deixou de utilizar a natureza e a quantidade da droga na fixação da pena basilar como circunstância negativa (art. 59 do CP), não pode fixar regime mais severo somente com base no art. 42 da Lei n. 11.343/2006.

Segundo o art. 5º, XLVI, da CF/1988, “a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes: a) privação ou restrição da liberdade; b) perda de bens; c) multa; d) prestação social alternativa; e) suspensão ou interdição de direitos”. 

Significa dizer que, havendo sentença penal condenatória, o julgador deve aplicar a pena de acordo com a lei, o caso concreto e as condições pessoais do acusado. 

Para tanto, existem regras que norteiam o juiz no momento da fixação da reprimenda, do regime prisional etc. 

Ao procurar estabelecer a pena do réu, deve o magistrado seguir a ordem prevista no art. 68 do Código Penal. 

Veja-se: 

Art. 68 - A pena-base será fixada atendendo-se ao critério do art. 59 deste Código; em seguida serão consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes; por último, as causas de diminuição e de aumento. 

Parágrafo único - No concurso de causas de aumento ou de diminuição previstas na parte especial, pode o juiz limitar-se a um só aumento ou a uma só diminuição, prevalecendo, todavia, a causa que mais aumente ou diminua. 

Na fase inicial, como se sabe, a pena-base é estabelecida de acordo com o art. 59, caput, do Código Penal, in verbis: 

Art. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime, bem como ao comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime.

Na primeira fase o juiz pode, ainda, de acordo com o caso concreto e dentro do seu poder discricionário, utilizar “com preponderância sobre o previsto no art. 59 do Código Penal, a natureza e a quantidade da substância ou do produto, a personalidade e a conduta social do agente” (art. 42 da Lei n. 11.343/2006). 

Superadas as fases seguintes, ou seja, a segunda e a terceira etapa da dosimetria da pena, em que são consideradas as circunstâncias atenuantes e agravantes e, por último, as causas de diminuição e de aumento, resta ao magistrado fixar o quantum de pena corporal e, também, o regime inicial para o resgate da reprimenda (art. 59, III, do CP). 

E, como norte, o juiz faz uso do art. 33 do CP, que prescreve o seguinte: 

Art. 33 - A pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado, semiaberto ou aberto. 

A de detenção, em regime semiaberto, ou aberto, salvo necessidade de transferência a regime fechado. 

§ 1º - Considera-se: 

a) regime fechado a execução da pena em estabelecimento de segurança máxima ou média; 

b) regime semiaberto a execução da pena em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar;

c) regime aberto a execução da pena em casa de albergado ou estabelecimento adequado. 

§ 2º - As penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva, segundo o mérito do condenado, observados os seguintes critérios e ressalvadas as hipóteses de transferência a regime mais rigoroso: 

a) o condenado a pena superior a 8 (oito) anos deverá começar a cumpri-la em regime fechado; 

b) o condenado não reincidente, cuja pena seja superior a 4 (quatro) anos e não exceda a 8 (oito), poderá, desde o princípio, cumpri-la em regime semiaberto; 

c) o condenado não reincidente, cuja pena seja igual ou inferior a 4 (quatro) anos, poderá, desde o início, cumpri-la em regime aberto. 

§ 3º - A determinação do regime inicial de cumprimento da pena far-se-á com observância dos critérios previstos no art. 59 deste Código.

Mas, existem casos em que o magistrado, mesmo na ausência de circunstâncias judiciais negativas e na ausência de agravantes, endurece o regime prisional somente com fundamento na natureza e na quantidade da droga. 

Em outras palavras, o acusado que, em razão da quantidade de pena corporal, poderia cumprir a reprimenda no regime aberto, é condenado ao cumprimento da pena no regime semiaberto e, o réu que poderia cumprir a pena no regime semiaberto, é condenado ao cumprimento da pena no regime fechado. 

Em que pese a jurisprudência dominante afirme que isso é possível, entendo que esse modo de proceder viola o princípio constitucional da legalidade (art. 5º, II, da CF/1988). Ora, devemos ter em mente que a lei não contém palavras inúteis e que a norma jurídica reflete a vontade do legislador. 

Assim, se o julgador deixou de utilizar a natureza e a quantidade da droga na fixação da pena basilar como circunstância negativa (art. 59 do CP), não pode fixar regime mais severo somente com base no art. 42 da Lei n. 11.343/2006, especialmente quando o quantum da pena corporal permite que o réu resgate a pena em regime mais brando. 

Sim, porque, caso as circunstâncias judiciais não sejam negativas, não existam agravantes e a pena seja, por exemplo, inferior a 4 anos de reclusão (regime aberto, via de regra), o regime prisional inicial não pode ser fixado no semiaberto nem no fechado, por haver violação ao disposto no art. 33, § 3º, do CP. 

É cediço que o magistrado possui poder discricionário, mas este não é absoluto e encontra limites. 

Se o legislador quisesse, de fato, autorizar a utilização do art. 42 da Lei n. 11.343/2006 para agravar o regime prisional, teria feito isso de forma expressa, de modo que é ilegal a fixação de regime mais severo somente com base na natureza e na quantidade da substância ilícita.

Sobre o(a) autor(a)
Fabiano Leniesky
Fabiano Leniesky, OAB/SC 54888. Formado na Unoesc. Advogado Criminalista. Pós-graduado em Direito Penal e Processo Penal. Pós-graduado em Advocacia Criminal. Pós-graduado em Ciências Criminais. Pós-graduado em Direito Probatório...
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