Não se pode obrigar plano de saúde a cobrir transplantes se há cláusula expressa excluindo

Não se pode obrigar plano de saúde a cobrir transplantes se há cláusula expressa excluindo

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) concluiu julgamento em que se discute uma questão até então inédita no STJ: a obrigação de as empresas de seguro-saúde custearem transplantes de órgãos. Segundo o entendimento vencedor da Turma, não há – ainda que se deva, em princípio, dar interpretação favorável ao adquirente de plano de saúde – como se impor responsabilidade por cobertura que tenha sido excluída do contrato por cláusula expressa e de fácil verificação.

A questão estava sendo discutida em um recurso cuja relatora é a ministra Nancy Andrighi. Na ação, as filhas de uma segurada da Golden Cross pedem reembolso dos gastos com procedimentos médicos feitos com o objetivo de curar hepatite causada por infecção medicamentosa após submeter-se a uma cirurgia plástica mamária, principalmente o transplante de fígado, realizado no Hospital Albert Einstein, em São Paulo (SP). Priscila e Pamela Andrade alegaram que havia obrigação contratual do plano de saúde em custear o tratamento, uma vez que o transplante foi indicado pelos médicos como necessário e não havia hospital credenciado da Golden Cross apto a realizá-lo.

A primeira instância da Justiça paulista julgou improcedente a ação, entendendo haver cláusula contratual excluindo expressamente da cobertura os transplantes, implantes e diálise. Decisão mantida em segundo grau. Diante da derrota nas duas instâncias, as irmãs recorreram ao STJ, sustentando que a decisão ofendeu o Código de Processo Civil e o antigo Código Civil, além de divergir de entendimentos firmados em outros tribunais, que consideram devida a indenização securitária quando o atendimento médico é prestado em hospital descredenciado em razão de ser o único apto a fazê-lo.

Em seu voto, a ministra Nancy Andrighi afirmou que a finalidade do seguro-saúde é indenizar o segurado pelos custos com tratamento médico adequado desde que sobrevenha a doença, por isso o contrato é aleatório, já que o cumprimento da obrigação do segurador depende de se e quando ocorre o evento danoso. "Assim sendo, a exclusão da cobertura, a priori, de determinado procedimento médico, ferirá a finalidade básica do contrato se, no caso concreto, este for justamente o essencial para garantir a saúde e, algumas vezes, a vida do segurado", afirmou. Para ela, a cláusula restritiva de cobertura, além de ferir o fim primordial do seguro-saúde, acarreta desvantagem excessiva ao segurado, pois este celebra o contrato justamente por ser imprevisível a doença que poderá acometê-lo e por recear não ter acesso ao procedimento médico necessário para curar-se. Nancy Andrighi afirmou que, sob a ótica do Código de Defesa do Consumidor, a exclusão de cobertura restringe direitos e obrigações inerentes à natureza do contrato (art.51, §1º, inciso II) e coloca o segurado em desvantagem exagerada em relação à seguradora (art.51, §1º, inciso IV).

"Existem, portanto, direitos subjetivos, de parte a parte: de um lado o direito à saúde, garantida pela assunção dos riscos pela seguradora, e, de outro, o direito ao lucro através da manutenção do equilíbrio econômico do contrato. Ambos devem ser sopesados, para que se lhes possa garantir efetividade, observada a relevância de cada um para o ordenamento jurídico e para a sociedade", ressaltou Andrighi. A ministra lembrou que, apesar de a saúde ser um direito constitucionalmente assegurado, a assistência à saúde é permitida à iniciativa privada, que pode explorá-la com objetivo de lucro, porém, oferecendo-se, em contra partida, serviço adequado, que assegure a saúde daquele que contrata o serviço, respeitados seus direitos, nos moldes constitucionais.

Para Nancy Andrighi, a garantia à saúde requer atendimento a qualquer mal que a prejudique, independente se será obtida a cura, mas se conferindo àquele que realiza um contrato para se assegurar de riscos à saúde, o acesso a todo o tratamento necessário a tanto.

O julgamento havia sido interrompido pelo pedido de vista do ministro Castro Filho, segundo a votar. Ao retomar a análise da questão, o ministro discordou da relatora. O ministro ressaltou que o recurso em questão – recurso especial – é uma modalidade de recurso extraordinário destinado a preservar a unidade e a autoridade do direito federal, sob a inspiração de que nele o interesse público deve prevalecer sobre o interesse das partes. E, a seu ver, não há como o processo ser analisado pelo STJ, pois não vislumbrou ofensa a lei federal nem divergência quanto à jurisprudência sobre o tema.

Castro Filho entende que os contratos de adesão são permitidos pela lei, prevendo o parágrafo 4º do artigo 54 do CDC tão-somente que "as cláusulas que implicarem limitação de direito do consumidor deverão ser redigidas com destaque, permitindo sua imediata e fácil compreensão". Como não há cópia da apólice de seguros em que estão previstas as limitações à cobertura e, por outro lado, sua previsão não foi atacada pelas autoras (as irmãs), apenas sua validade, o ministro levou em consideração que a cláusula excludente de transplantes estava expressamente prevista e destacada no contrato e, assim, considerou não haver nenhuma afronta à lei. Manteve dessa forma a decisão do tribunal de origem, sem apreciar o mérito da questão.

Terceiro a votar sobre o assunto, o ministro Antônio de Pádua Ribeiro acompanhou o entendimento da relatora. Para ele, as doenças não podem ser fracionadas; uma vez feito o seguro, isso envolve todas as formas de tratamento, sejam elas cirúrgicas ou terapêuticas. Os dois últimos a votar – Ari Pargendler e Carlos Alberto Direito – acompanharam o entendimento de Castro Filho, concluindo que o recurso especial não reunia condições de ser apreciado pelo STJ, até porque o CDC impõe apenas que as cláusulas do contrato que limitem direito sejam destacadas. Dessa forma, não é possível impor ao plano de saúde responsabilidade por uma cobertura que é vedada expressamente em cláusula do contrato.

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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