Securitária sem férias por 17 anos receberá indenização por dano existencial

Securitária sem férias por 17 anos receberá indenização por dano existencial

A Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho condenou o Banco Bradesco S.A. e a Bradesco Vida e Previdência ao pagamento de indenização por danos existenciais de R$ 50 mil a uma vendedora de seguros que, durante 17 anos de prestação de serviços, nunca teve direito a usufruir férias. Na decisão, o colegiado destacou que a supressão integral das férias durante todo esse período dispensa a demonstração dos danos dela decorrentes.

Pessoa jurídica

Admitida em janeiro de 2001 como vendedora de planos de previdência privada, seguros, consórcio e outros produtos, a trabalhadora relatou que, meses depois, teve de constituir pessoa jurídica para continuar a prestação de serviço, com despesas pagas pelo banco. Assim permaneceu até que, em novembro de 2017, foi dispensada por não ter aceitado assinar um novo tipo de acordo. 

Na reclamação trabalhista, ela pedia o reconhecimento do vínculo de emprego e os direitos dele decorrentes, entre eles o pagamento em dobro das férias. Requereu, ainda, indenização por danos moral e existencial, com fundamento nos prejuízos causados pela não fruição de férias a sua convivência familiar e social.

Demonstração do prejuízo

O juízo de primeiro grau reconheceu o vínculo e condenou o banco a pagar R$ 6 mil de indenização por danos existenciais, mas a sentença foi reformada pelo Tribunal Regional do Trabalho da 24ª Região (MS), que afastou a condenação reconheceu o vínculo com a Bradesco Vida e Previdência. De acordo com o TRT, o desrespeito às férias, por si só, não caracterizaria o dano existencial: caberia à empregada demonstrar a ocorrência do efetivo prejuízo, não se podendo presumir que a conduta do empregador a tenha privado de manter uma relação saudável e digna em seu círculo familiar e social ou impedido projetos concretos para o futuro.

Limitação

Para a relatora do recurso de revista da securitária, ministra Kátia Arruda, o excesso, comprovadamente demonstrado, de exigir um regime de trabalho contínuo, com a supressão integral do direito às férias durante 17 anos, dispensa demonstração dos prejuízos ao descanso, ao lazer, ao convívio familiar e à recomposição física e mental da profissional. Ainda segundo a relatora, o TRT registrou que a situação à qual ela fora submetida configura “clara limitação às atividades de cunho familiar, cultural, social, recreativas, esportivas, afetivas ou quaisquer outras desenvolvidas em um contexto de interrupção contratual representado pelas férias anuais”.

A decisão foi unânime.

Processo: RR-25699-03.2017.5.24.0002

I - AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE
REVISTA. RECLAMANTE. LEI Nº 13.467/2017.
TRANSCENDÊNCIA. DANO EXISTENCIAL.
SUPRESSÃO DE DIREITOS TRABALHISTAS.
NÃO CONCESSÃO DE FÉRIAS DURANTE TODO
O PERÍODO LABORADO.
Deve ser reconhecida a transcendência jurídica
quando se mostra aconselhável o exame mais
detido da controvérsia devido às
peculiaridades do caso concreto. O enfoque
exegético da aferição dos indicadores de
transcendência em princípio deve ser positivo,
especialmente nos casos de alguma
complexidade, em que se torna aconselhável o
debate mais aprofundado da matéria.
Aconselhável o provimento do agravo de
instrumento para melhor exame do recurso de
revista quanto à alegada violação do art. 5º, X,
da Constituição Federal.
Agravo de instrumento a que se dá
provimento.
II - RECURSO DE REVISTA. RECLAMANTE. LEI
Nº 13.467/2017. DANO EXISTENCIAL.
SUPRESSÃO DE DIREITOS TRABALHISTAS.
NÃO CONCESSÃO DE FÉRIAS DURANTE TODO
O PERÍODO LABORADO.
1 - Importante destacar, preliminarmente, que
a reclamante almeja por meio da reclamação
trabalhista ajuizada, além de outras questões,
o reconhecimento do vínculo de emprego e o
pagamento de férias em dobro diante da não
concessão durante os 17 anos de prestação de
serviços. Tais pedidos foram devidamente
acolhidos nas instâncias ordinárias, com
incidência da prescrição quinquenal à
pretensão condenatória, não havendo
interposição de recurso de revista pelos
reclamados.
2 - O dano existencial, espécie de dano
imaterial, nas relações de trabalho, ocorre
quando o trabalhador sofre dano/limitações à
sua vida fora do ambiente de trabalho em
razão de condutas ilícitas praticadas pelo
empregador, impossibilitando-o de estabelecer
a prática de um conjunto de atividades
culturais, sociais, recreativas, esportivas,
afetivas, familiares ou de desenvolver seus
projetos de vida nos âmbitos profissional,
social e pessoal, dentre outros.
3 - O caso reclama reflexão sob a influência da
hermenêutica constitucional - que confere
sentido à ordem jurídica e investe os órgãos
jurisdicionais de amplos poderes para garantir
a efetividade dos direitos fundamentais,
inclusive daqueles que concernem à dignidade
humana, liberdade, saúde, honra – porquanto
o excesso comprovadamente havido ao se
exigir um regime de trabalho contínuo com a
supressão integral do direito às férias durante
17 (dezessete) anos de labor, dispensa
demonstração dos prejuízos advindos ao
descanso, lazer, convívio familiar e
recomposição física e mental da reclamante.
4 - No caso em apreço, o Tribunal Regional
consignou que “(...) mesmo se constatado o
desrespeito às férias, tal fato, por si só, não é
capaz de gerar o referido dano. No caso,
reputo que a autora não logrou demonstrar a
ocorrência desse efetivo prejuízo, a ponto de
ensejar tal reparação. Friso que, por mais que
se considere não tenha a autora usufruído
férias no decorrer do contrato, não se pode
presumir a existência de conduta ilícita do
empregador que tenha privado a autora de
manter uma relação saudável e digna em seu
círculo familiar e social ou obstaculizado
projetos concretos para o futuro”. Em síntese: o
contexto registrado no acórdão do TRT
demonstra de plano que a reclamante foi
submetida a um contexto laboral durante 17
(dezessete) anos no qual ficou configurada
clara limitação às atividades de cunho familiar,
cultural, social, recreativas, esportivas, afetivas
ou quaisquer outras desenvolvidas em um
contexto de interrupção contratual
representado pelas férias anuais.
5 - O direito às férias possui não apenas status
constitucional (art. 7º, XVII), encontrando-se
igualmente consagrado como direito humano
em diversos diplomas internacionais
(Convenção nº 132 da OIT e arts. 24 da
Declaração Universal dos Direitos Humanos, 7
do Pacto Internacional dos Direitos
Econômicos, Sociais e Culturais e 7 do
Protocolo de São Salvador, por exemplo), de
modo que visa não apenas a recomposição
físico-psíquica do trabalhador, mas também
oportunizar o convívio social e familiar em
momentos de lazer.
6 - A sua supressão ao longo de 17 (dezessete)
anos de labor, assim, enseja o reconhecimento
de evidentes danos de índole imaterial ao
trabalhador. Nesse contexto, deve ser
restabelecida a condenação ao pagamento de
indenização diante da configuração de danos
existenciais.
7 – Recurso de revista provido.

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (TST - Tribunal Superior do Trabalho) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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