Crédito resultante de honorários advocatícios não tem preferência em relação ao crédito do próprio cliente

Crédito resultante de honorários advocatícios não tem preferência em relação ao crédito do próprio cliente

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que o crédito decorrente de honorários sucumbenciais do advogado não tem preferência diante do crédito principal titularizado por seu cliente. Para o colegiado, não é possível opor ao titular do direito material – ou do crédito principal – a existência de crédito privilegiado instituído, como acessório daquele, na mesma relação processual.

O recurso analisado teve origem em ação de execução de título executivo extrajudicial ajuizada pela Petrobras contra um posto de combustível, no valor de quase R$ 2 milhões.

Após o leilão de bem de propriedade do devedor, estimado em R$ 340 mil, a Petrobras revogou o mandato da sociedade de advogados que a representava, tendo sido definido que os patronos teriam direito a 80% do valor dos honorários fixados na execução. Assim, a sociedade pleiteou a sua admissão nos autos para a execução dos honorários, pedido que foi deferido pelo juízo.

Posteriormente, a sociedade advocatícia pediu a declaração de preferência de seu crédito para que o seu pagamento fosse feito em primeiro lugar – antes, inclusive, da satisfação do crédito da Petrobras. 

Crédito advocatício tem caráter acessório em relação ao principal

Em primeira instância, o juízo negou o pedido por entender que, tendo em vista o caráter acessório do crédito dos advogados em relação ao crédito principal, o seu levantamento não poderia se dar de forma integral – mesmo que houvesse dinheiro suficiente para isso –, mas deveria ser proporcional ao valor recuperado pelo exequente. A decisão foi mantida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo.

Por meio de recurso especial, a sociedade de advogados alegou que, tendo sido instalado concurso de credores e em razão da natureza privilegiada do crédito correspondente a honorários, deveria ser observada a sua preferência na distribuição do produto da arrematação. 

Advogado e cliente não formam concurso singular de credores

A ministra Nancy Andrighi explicou que, de fato, os créditos advocatícios, além de possuírem natureza alimentar, são considerados créditos privilegiados – equiparados aos créditos oriundos da legislação trabalhista, para efeitos de habilitação em falência, concurso de credores e insolvência civil, entre outros.

Entretanto, com base na doutrina, a relatora apontou que não é possível falar em concurso singular de credores entre o advogado titular dos honorários e o credor vencedor que foi representado por ele no mesmo processo.

Essa impossibilidade ocorre, segundo a magistrada, "seja porque, na hipótese, havia relação jurídica de direito material entre os credores que atuaram conjuntamente no mesmo processo, em face do devedor vencido comum, seja porque o crédito a que faz jus o advogado foi constituído justamente nessa mesma relação processual, de maneira acessória e dependente da condenação principal a que faz jus o vencedor".

Crédito de honorários segue a sorte da condenação principal

Além disso, de acordo com Nancy Andrighi, a relação acessória entre os honorários sucumbenciais e a condenação principal a ser recebida pela parte é determinante para que se reconheça que os honorários, quando houver concorrência com a condenação principal, deverão seguir "a sorte e a natureza" do crédito titularizado pelo vencedor.

"A parte, titular do direito material, não pode deixar de obter a satisfação de seu crédito em razão de crédito constituído por acessoriedade ao principal e titularizado por quem apenas a representou em juízo no processo em que reconhecido o direito, ainda que tenha havido a revogação do mandato após a penhora do bem alienado", concluiu a ministra.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.890.615 - SP (2019/0141164-7)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : FAVALLE, MIRANDA E OLIVEIRA SOCIEDADE DE ADVOGADOS
REPR. POR : VANESSA BUENO FAVALLE TERASSI
ADVOGADOS : FLÁVIO DOS SANTOS OLIVEIRA - SP143479
VANESSA BUENO FAVALLE TERASSI - SP143690
RECORRIDO : PETROBRÁS DISTRIBUIDORA S/A
ADVOGADO : FÁBIO IZIQUE CHEBABI - SP184668
EMENTA
CIVIL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXECUTIVO
EXTRAJUDICIAL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU
OBSCURIDADE. INOCORRÊNCIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. DIREITO DO
ADVOGADO, NATUREZA ALIMENTAR E CRÉDITO PRIVILEGIADO.
PREFERÊNCIA EM RELAÇÃO AO CRÉDITO TITULARIZADO PELO SEU CLIENTE
VENCEDOR NA EXECUÇÃO. CIRCUNSTÂNCIA RELEVANTE E ESPECÍFICA.
CONCURSO SINGULAR DE CREDORES. INOCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE
RELAÇÃO JURÍDICA MATERIAL ENTRE OS CREDORES CONCORRENTES.
PRESSUPOSTO DO CONCURSO AUSENTE NA HIPÓTESE. NECESSIDADE DE
INDEPENDÊNCIA E AUTONOMIA ENTRE AS EXECUÇÕES.
INDISPENSABILIDADE DO INGRESSO APENAS POSTERIOR DO CREDOR
CONCORRENTE, APÓS A OBTENÇÃO DE VALOR HÁBIL A SATISFAÇÃO, TOTAL
OU PARCIAL, DO CRÉDITO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS.
RELAÇÃO DE ACESSORIEDADE COM O CRÉDITO PRINCIPAL TITULARIZADO
PELA PARTE VENCEDORA. IMPOSSIBILIDADE DE PREFERÊNCIA DO
ACESSÓRIO SOBRE O PRINCIPAL. INEXISTÊNCIA DE PREFERÊNCIA DOS
HONORÁRIOS, QUE SEGUIRÃO A NATUREZA DO CRÉDITO PRINCIPAL.
TITULAR DO DIREITO MATERIAL A QUEM NÃO SE PODE OPOR A EXISTÊNCIA
DE CRÉDITO PRIVILEGIADO INSTITUÍDO POR ACESSORIEDADE NA MESMA
RELAÇÃO PROCESSUAL EM QUE SE SAGROU VENCEDORA. PROCESSO QUE
DEVE DAR À PARTE TUDO AQUILO E EXATAMENTE AQUILO QUE TEM O
DIREITO DE CONSEGUIR. IMPOSSIBILIDADE DE DISTRIBUIÇÃO DO PRODUTO
DA ALIENAÇÃO A PARTIR DA REGRA TEMPORAL DE ANTERIORIDADE DA
PENHORA. CONCOMITÂNCIA DA PENHORA PARA SATISFAÇÃO DE AMBOS OS
CRÉDITOS. DISTRIBUIÇÃO PROPORCIONAL DO PRODUTO DA ALIENAÇÃO.
POSSIBILIDADE.
1- Recurso especial interposto em 27/09/2018 e atribuído à Relatora em
21/06/2019.
2- Os propósitos recursais consistem em definir: (i) se houve contradição ou
omissão relevante no acórdão recorrido; (ii) se o crédito decorrente de
honorários advocatícios sucumbenciais, de titularidade de sociedade de
advogados que patrocinou os interesses da exequente vencedora, tem
preferência na distribuição do produto da arrematação do imóvel
penhorado no bojo desta execução, inclusive em relação ao crédito a ser
recebido pela própria exequente.
3- Inexiste contradição no acórdão que, a despeito de reconhecer que a
verba honorária é autônoma e dotada de privilégio legal, estabelece
também que essa autonomia e preferência não são absolutas, a ponto de se
sobrepor ao próprio crédito a ser recebido pela exequente.
4- Inexiste omissão relevante no acórdão que, resolvendo embargos de
declaração opostos pela parte, examina a questão e afasta a existência de
concurso de credores entre o advogado e seu cliente.
5- Os honorários advocatícios sucumbenciais constituem direito do
advogado, possuem natureza alimentar e são considerados créditos
privilegiados, equiparados aos créditos oriundos da legislação trabalhista
para efeito de habilitação em falência, concordata, concurso de credores,
insolvência civil e liquidação extrajudicial. Precedentes.
6- A despeito disso, é de particular relevância e especificidade a questão
relacionada à possibilidade de o crédito decorrente dos honorários
advocatícios sucumbenciais preferir o crédito titularizado pela parte
vencedora e que foi representada, no processo, ainda que por determinado
período, pela sociedade de advogados credora.
7- Não há concurso singular de credores entre o advogado titular da verba
honorária sucumbencial e o seu cliente titular da condenação principal, uma
vez que é elemento essencial do concurso a ausência de relação jurídica
material entre os credores, exigindo-se, ao revés, que haja independência e
autonomia entre as execuções até o momento em que um deles obtenha
valor hábil a satisfazê-la, no todo ou em parte, quando os demais credores
poderão ingressar no processo alheio e estabelecer concorrência com
aquele que havia obtido êxito na perseguição do patrimônio do devedor.
Doutrina.
8- De outro lado, não pode o advogado, que atuou na defesa dos interesses
da parte vencedora, preferir ao crédito principal por ela obtido porque a
relação de acessoriedade entre os honorários sucumbenciais e a
condenação principal a ser recebida pela parte é determinante para que se
reconheça que os honorários sucumbenciais, nessa específica hipótese em
que há concorrência com a condenação principal, deverão, em verdade,
seguir a sorte e a natureza do crédito titularizado pela parte vencedora.
9- Em suma, o crédito decorrente de honorários advocatícios sucumbenciais
titularizado pelo advogado não é capaz de estabelecer relação de
preferência ou de exclusão em relação ao crédito principal titularizado por
seu cliente porque, segundo a máxima chiovendiana, o processo deve dar,
na medida do possível, a quem tem um direito, tudo aquilo e exatamente
aquilo que tem direito de conseguir, de modo que a parte, titular do direito
material, não pode deixar de obter a satisfação de seu crédito em razão de
crédito constituído por acessoriedade ao principal e titularizado por quem
apenas a representou em juízo no processo em que reconhecido o direito.
10- Hipótese em que, inclusive, é inaplicável a regra do art. 908, §2º, do
CPC/15, pois a perseguição dos valores devidos pelo executado, que
culminou com a penhora e posterior alienação judicial do bem cujo produto
se disputa, iniciou-se conjuntamente pela vencedora e pelo advogado, tendo
sido a penhora para a satisfação de ambos os créditos sido realizada na
constância da atuação do recorrente como representante processual do
recorrido.
11- Recurso especial conhecido e não provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, negar provimento ao recurso
especial nos termos do voto do(a) Sr(a). Ministro(a) Relator(a). Os Srs. Ministros Paulo de
Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro
votaram com a Sra. Ministra Relatora.
Dr. FLÁVIO DOS SANTOS OLIVEIRA, pela parte RECORRENTE: FAVALLE,
MIRANDA E OLIVEIRA SOCIEDADE DE ADVOGADOS
Brasília (DF), 17 de agosto de 2021(Data do Julgamento)
MINISTRA NANCY ANDRIGHI
Relatora

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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