Viúva e filho de cobrador morto em assalto a ônibus têm direito a indenização

Viúva e filho de cobrador morto em assalto a ônibus têm direito a indenização

A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho reconheceu a responsabilidade civil da Viação Atalia Ltda., de Nossa Senhora do Socorro (SE), e condenou-a ao pagamento de indenização à viúva e ao filho de um empregado cobrador de ônibus que faleceu durante um assalto. Para o colegiado, a atividade implica um risco acentuado aos trabalhadores, caracterizando a responsabilidade objetiva do empregador.

Assalto e morte

O assalto ocorreu em julho de 2013. O cobrador, de 26 anos, trabalhava na linha Bugio/Atalaia, em Aracaju (SE), quando três homens entraram no ônibus e anunciaram o assalto. Como ele não tinha dinheiro no caixa, foi alvejado por um tiro e não resistiu. O caso teve cobertura da imprensa e motivou protestos da categoria durante o funeral do rapaz.

Na reclamação trabalhista, a viúva e o filho, então com seis anos, defenderam que a empresa tinha a obrigação de zelar pela segurança e saúde dos empregados, que trabalham em constante exposição a riscos de vida. Segundo eles, os assaltos eram frequentes naquela linha.

A empresa, em sua defesa, sustentou que adota medidas para evitar assaltos, como uso de cofres “boca de lobo”, colocação de câmeras, rastreamento da frota e sistema de bilhetagem eletrônica e, por isso, eximiu-se da responsabilidade na tragédia ocorrida.

Risco previsível

O juízo da 5ª Vara do Trabalho de Aracaju (SE) reconheceu a responsabilidade da empresa. Segundo a sentença, a função de cobrador apresenta risco perfeitamente previsível e inerente à atividade empresarial, ainda que decorrente de ato ilícito praticado por terceiro. 

Com isso, condenou a empresa ao pagamento de pensão mensal ao filho do trabalhador, até a data em que este completaria 74,9 anos, e de indenização por dano moral no valor de R$ 100 mil.

Responsabilidade do Estado

O Tribunal Regional do Trabalho da 20ª Região (SE), contudo, excluiu a condenação. Para o TRT, o fato de o cobrador ter sido vítima de assalto, que culminou com a sua morte, não implica a responsabilização da empresa, pois não ficara comprovada a sua culpa. A decisão registra, ainda, que cabe ao Estado oferecer segurança a toda coletividade, e esse ônus não pode ser transferido à atividade empresarial.

Situação de vulnerabilidade

O relator do recurso de revista dos herdeiros, ministro Maurício Godinho Delgado, explicou que, nas atividades empresariais que representem risco para os trabalhadores envolvidos, a responsabilidade é objetiva, que independe da comprovação de culpa. “É do empregador, evidentemente, a responsabilidade pelas indenizações por dano moral, material ou estético decorrentes de lesões vinculadas à infortunística do trabalho”, afirmou.

No caso dos cobradores, o ministro observou que eles são, com relevante frequência, alvo de condutas criminosas, que os expõem a situações de vulnerabilidade.

A decisão foi unânime.

Processo: ARR-1829-62.2016.5.20.0005

A) AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE
REVISTA. PROCESSO SOB A ÉGIDE DA LEI
13.015/2014 E ANTERIOR À LEI 13.467/2017.
INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 40 DO TST.
CABIMENTO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO
EM CASO DE ADMISSIBILIDADE PARCIAL DO
RECURSO DE REVISTA PELO TRT DE ORIGEM.
PRELIMINAR DE NULIDADE DO JULGADO POR
NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL.
NÃO CONFIGURAÇÃO. O Tribunal Pleno do
TST, considerando o cancelamento da Súmula
nº 285/TST e da Orientação Jurisprudencial nº
377/SBDI-1/TST, editou a Instrução Normativa
nº 40/TST, que, em seu art. 1º, dispõe: “Admitido
apenas parcialmente o recurso de revista,
constitui ônus da parte impugnar, mediante
agravo de instrumento, o capítulo denegatório da
decisão, sob pena de preclusão”. Na hipótese, o
TRT de origem recebeu o recurso de revista
interposto pela Parte Autora quanto ao tema
“responsabilidade civil da empregadora –
assalto – falecimento do trabalhador”, por
vislumbrar possível divergência jurisprudencial,
tendo denegado o processamento do apelo no
que concerne ao tema “preliminar de nulidade
– negativa de prestação jurisdicional”. Assim,
em razão da nova sistemática processual e da
edição da Instrução Normativa nº 40/TST - já
vigente quando da publicação da decisão do
TRT que admitiu parcialmente o presente
apelo-, cabia à Parte Autora impugnar,
mediante agravo de instrumento, o capítulo
denegatório da decisão, sob pena de preclusão,
ônus do qual se desincumbiu. Com efeito,
ultrapassada essa questão, em relação ao
mérito do agravo de instrumento interposto,
registre-se que o apelo não merece prosperar,
nos termos do art. 896 da CLT. Agravo de
instrumento desprovido.
B) RECURSO DE REVISTA. PROCESSO SOB A
ÉGIDE DA LEI 13.015/2014 E ANTERIOR À LEI
13.467/2017. COBRADOR DE ÔNIBUS.
INDENIZAÇÕES POR DANOS MORAIS E
MATERIAIS DECORRENTES DE ASSALTO
SOFRIDO DURANTE O TRABALHO. MORTE DO
EMPREGADO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO
EMPREGADOR. ATIVIDADE DE RISCO. ART.
927, PARÁGRAFO ÚNICO, CÓDIGO CIVIL DE
2002. A indenização por danos morais é devida
quando presentes os requisitos essenciais para
a responsabilização empresarial. É necessária,
de maneira geral, a configuração da culpa do
empregador ou de suas chefias pelo ato ou
situação que provocou o dano ao empregado.
É que a responsabilidade civil de particulares,
no Direito Brasileiro, ainda se funda,
predominantemente, no critério da culpa
(negligência, imprudência ou imperícia), nos
moldes do art. 186 do CCB, que dispõe: "Aquele
que, por ação ou omissão voluntária, negligência
ou imprudência, violar direito e causar dano a
outrem, ainda que exclusivamente moral, comete
ato ilícito". Contudo, por exceção, o art. 927 do
CCB, em seu parágrafo único, trata da
responsabilidade objetiva independentemente
de culpa - "quando a atividade normalmente
desenvolvida pelo autor do dano implicar, por
sua natureza, risco para os direitos de outrem".
Ora, tratando-se de atividade empresarial
fixadora de risco para os trabalhadores
envolvidos, desponta a exceção ressaltada pelo
parágrafo único do art. 927 do CCB, tornando
objetiva a responsabilidade empresarial por
danos acidentários (responsabilidade em face
do risco). Nessa hipótese excepcional, a regra
objetivadora do Código Civil também se aplica
ao Direito do Trabalho, uma vez que a
Constituição da República manifestamente
adota, no mesmo cenário normativo, o
princípio da norma mais favorável (art. 7º,
caput: “... além de outros que visem à melhoria de
sua condição social”), permitindo a incidência de
regras infraconstitucionais que aperfeiçoem a
condição social dos trabalhadores. A
Constituição Federal de 1988 assegura que
todos têm direito ao meio ambiente do
trabalho ecologicamente equilibrado, porque
essencial à sadia qualidade de vida, razão pela
qual incumbe ao Poder Público e à
coletividade, na qual se inclui o empregador, o
dever de defendê-lo e preservá-lo (arts. 200,
VII, e 225, caput). Não é por outra razão que
Raimundo Simão de Melo alerta que a
prevenção dos riscos ambientais e/ou
eliminação de riscos laborais, mediante adoção
de medidas coletivas e individuais, é
imprescindível para que o empregador evite
danos ao meio ambiente do trabalho e à saúde
do trabalhador. Acidentes do trabalho e/ou
doença profissional ou ocupacional, na maioria
das vezes, "são eventos perfeitamente previsíveis
e preveníveis, porquanto suas causas são
identificáveis e podem ser neutralizadas ou
mesmo eliminadas; são, porém, imprevistos
quanto ao momento e grau de agravo para a
vítima" (MELO, Raimundo Simão de. Direito
ambiental do trabalho e a saúde do
trabalhador. 5.ed. São Paulo: Ltr, 2013, p. 316).
Registre-se que tanto a higidez física como a
mental, inclusive emocional, do ser humano
são bens fundamentais de sua vida, privada e
pública, de sua intimidade, de sua autoestima e
afirmação social e, nesta medida, também de
sua honra. São bens, portanto,
inquestionavelmente tutelados, regra geral,
pela Constituição (art. 5º, V e X). Assim,
agredidos em face de circunstâncias
laborativas, passam a merecer tutela ainda
mais forte e específica da Constituição da
República, que se agrega à genérica anterior
(art. 7º, XXVIII, CF/88). Frise-se que é do
empregador, evidentemente, a
responsabilidade pelas indenizações por dano
moral, material ou estético decorrentes de
lesões vinculadas à infortunística do trabalho,
sem prejuízo do pagamento pelo INSS do
seguro social. Em razão de a atividade de
cobrador de ônibus implicar um risco
acentuado para os trabalhadores – haja vista
o quadro atual da profissão, que é, com
relevante frequência, alvo de condutas
criminosas, expondo os trabalhadores dessa
área a situações de vulnerabilidade -, incide a
responsabilidade objetiva fixada pelo Direito
(art. 927, parágrafo único, CCB/2002). A
jurisprudência do TST é nesse sentido e
considera objetiva a responsabilidade por
danos morais resultantes do evento "assalto" e
seus consectários, relativamente a empregados
que exerçam atividade de alto risco, tais como
bancários, motoristas de carga, motoristas de
transporte coletivo e outros (art. 927, parágrafo
único, CCB). Enquadrando-se a situação dos
autos nessa hipótese extensiva de
responsabilização – o empregado era cobrador
de ônibus e faleceu durante um assalto no
exercício de suas atividades -, deve ser
reconhecida a responsabilidade da Reclamada
pelo pagamento de indenização por danos
morais e materiais, em conformidade com os
arts. 1º, III, 5º, V e X, da CF e 927, parágrafo
único, do Código Civil. Recurso de revista
conhecido e provido.

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (TST - Tribunal Superior do Trabalho) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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