Lei de Locação regula cláusulas sobre aluguel em contratos que incluem pactos de outra natureza

Lei de Locação regula cláusulas sobre aluguel em contratos que incluem pactos de outra natureza

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que, por se tratar de um contrato coligado, a Lei de Locação (Lei 8.245/1991) se aplica ao contrato de locação comercial que possui pactos adjacentes ao aluguel do imóvel. Com esse entendimento, o colegiado deu provimento ao recurso de uma distribuidora de combustíveis para permitir a rescisão do contrato de sublocação de um posto revendedor.

Na ação, a distribuidora também pediu a desocupação do imóvel e a condenação dos locadores ao pagamento dos aluguéis em atraso. Em primeiro grau, o pedido foi julgado procedente, mas o Tribunal de Justiça de Minas Gerais acolheu a preliminar de carência de ação e extinguiu o processo sem resolução do mérito.

O tribunal estadual entendeu que a ação de despejo seria inadequada, uma vez que o negócio entre as partes não era apenas de locação, mas se tratava, majoritariamente, de uma relação comercial que envolvia compra e venda exclusiva de produtos da marca da distribuidora.

Contratos mistos e coligados

O relator no STJ, ministro Marco Aurélio Bellizze, afirmou que novas classificações de contratos têm surgido, além daquelas já estabelecidas pela doutrina clássica, sendo importante relembrar a que diferencia os contratos mistos e os contratos coligados.

Segundo o ministro, os contratos mistos podem ser definidos como aqueles resultantes da junção de elementos específicos de contratos diversos, levando à criação de um contrato singular, com características próprias e inconfundíveis em relação aos contratos reunidos – ou seja, os elementos dos contratos distintos se unem, perdendo sua autonomia, para formar um contrato novo.

Por sua vez – explicou –, nos contratos coligados ou conexos, ocorre uma justaposição de modalidades diversas de contratos, de tal forma que cada um deles mantém sua autonomia, preservando as características próprias. Há, nesse caso, a mera combinação de contratos completos para possibilitar uma atividade econômica específica.

"Diversamente dos contratos mistos, a coligação de contratos não implica, em regra, muitas dificuldades no que tange ao direito aplicável à espécie, exatamente por não perderem sua individualidade", disse.

Contrato de sublocação com outros pactos

No caso em análise, o ministro concluiu que o contrato firmado entre as partes pode ser classificado como coligado, pois – de acordo com os fatos reconhecidos pelas instâncias ordinárias – foi firmado um acordo de sublocação com diversos outros pactos de natureza obrigacional, inerentes à locação, tal como a compra e venda de produtos mediante uma cota mínima de aquisição.

Para Bellizze, a coligação dos contratos foi uma forma de materializar os interesses das partes, sendo que a eficácia de um contrato repercute nos demais, embora cada uma das espécies contratuais conexas tenha características e efeitos próprios.

"Assim, o contrato de sublocação não perde a sua autonomia e não se desnaturaliza, mesmo nas hipóteses em que a convenção firmada pelas partes anexar outras espécies contratuais com o único objetivo de concretizar e viabilizar sua finalidade econômica", declarou.

Na avaliação do ministro, não se pode afastar a incidência da Lei 8.245/1991 ao caso dos autos, pois há apenas uma justaposição dos contratos coligados, aplicando-se a norma de cada um deles de forma harmônica. Portanto, diante do não pagamento dos aluguéis, abre-se a possibilidade de a locadora ajuizar ação de despejo, da mesma forma como, se houvesse atraso no pagamento dos produtos, poderia ser proposta ação de cobrança.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.475.477 - MG (2014/0129218-5)
RELATOR : MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE
RECORRENTE : IPIRANGA PRODUTOS DE PETRÓLEO S/A - SUCESSOR
ADVOGADOS : ANDRÉ MYSSIOR E OUTRO(S) - MG091357
RICARDO ZAMARIOLA JUNIOR - SP224324
HENRIQUE ABI-ACKEL TORRES E OUTRO(S) - MG102343
LOYANNA DE ANDRADE MIRANDA E OUTRO(S) - MG111202
LUCIANO DE SOUZA GODOY - SP258957 _ : CHEVRON BRASIL LTDA
ADVOGADOS : ANDRÉ MYSSIOR E OUTRO(S) - MG091357
MARCONNI CHIANCA TOSCANO DA FRANCA E OUTRO(S) - DF020772
LEANDRO ANTÔNIO DE LIMA E SOUSA E OUTRO(S) - MG067372
HENRIQUE ABI-ACKEL TORRES E OUTRO(S) - MG102343
LOYANNA DE ANDRADE MIRANDA E OUTRO(S) - MG111202
ÉRICO DA GAMA TORRES E OUTRO(S) - MG133513
BÁRBARA DE CASTRO SEDA E OUTRO(S) - MG139369
RECORRIDO : POSTO MORADA LTDA
ADVOGADOS : FERNANDO AUGUSTO PEREIRA CAETANO E OUTRO(S) - MG073162
IGOR RESENDE MACHADO E OUTRO(S) - GO022261
CRISTINA GARCIA RODRIGUES AZEVEDO E OUTRO(S) - MG131413
CAMILA ANIELLE SILVA DE ANDRADE - MG139565
INTERES. : JOÃO BATISTA SANTANA
INTERES. : DARCY VIEIRA SANTANA
INTERES. : AGNALDO JOSÉ SANTANA
INTERES. : LEONICE MOREIRA SANTANA
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. CONTRATO DE SUBLOCAÇÃO FIRMADO ENTRE
DISTRIBUIDORA DE COMBUSTÍVEIS E POSTO DE REVENDA. CONTRATOS COLIGADOS.
MANUTENÇÃO DA NATUREZA JURÍDICA. APLICAÇÃO DA LEI N. 8.245/1991. INTERESSE
DE AGIR RECONHECIDO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. Nos contratos coligados ou conexos há uma justaposição de modalidades diversas de
contratos, de maneira que cada um destes mantém sua autonomia, preservando suas
características próprias, haja vista que o objetivo da junção de tais contratos é possibilitar
uma atividade econômica específica.
2. O fato de o contrato de sublocação possuir outros pactos adjacentes não retira sua
autonomia nem o desnatura, notadamente quando as outras espécies contratuais a ele se
coligam com o único objetivo de concretizar e viabilizar sua finalidade econômica, de modo
que as relações jurídicas dele decorrentes serão regidas pela Lei n. 8.245/1991. Interesse
de agir reconhecido, no caso vertente.
3. Recurso especial provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, acordam
os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, dar
provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Moura Ribeiro, Nancy Andrighi, Paulo de Tarso Sanseverino
(Presidente) e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília, 18 de maio de 2021 (data do julgamento).
Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Relator

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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