Cooperativa em liquidação extrajudicial não pode ter ações contra si suspensas por mais de dois anos

Cooperativa em liquidação extrajudicial não pode ter ações contra si suspensas por mais de dois anos

O prazo de suspensão dos processos contra cooperativa em liquidação extrajudicial – de um ano, prorrogável por mais um, conforme o artigo 76 da Lei 5.764/1971 – não admite extensões, sendo inaplicável a analogia com a possibilidade de prorrogação do chamado stay period da recuperação judicial das empresas, tendo em vista as diferentes leis que regulam o tema e o âmbito em que ocorrem a liquidação das cooperativas (via extrajudicial) e a recuperação empresarial (via judicial).  

O entendimento foi fixado pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao reformar acórdão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT), o qual, dando interpretação extensiva ao artigo 76 da Lei 5.764/1971, admitiu a prorrogação da suspensão das ações contra uma cooperativa por prazo superior a dois anos, especialmente por entender que o prosseguimento desses processos poderia violar a isonomia entre os credores.

Na ação de cumprimento de sentença que deu origem ao recurso – decorrente de pedido de restituição do valor pago por unidade habitacional não entregue pela cooperativa –, o juiz decidiu suspender a execução para aguardar a conclusão da liquidação extrajudicial da cooperativa. A decisão foi mantida pelo TJDFT.

Liquidação antiga

Relator do recurso dos credores, o ministro Paulo de Tarso Sanseverino reconheceu a preocupação das instâncias ordinárias em preservar a igualdade de condições entre os credores, mas lembrou que a Lei 5.764/1971 estabeleceu um limite de dois anos para que esse objetivo fosse alcançado pela via extrajudicial – prazo que, no caso dos autos, já foi ultrapassado há muito tempo, tendo em vista que a liquidação foi aprovada em 2011.

O ministro observou que, nos casos de recuperação judicial, o STJ tem permitido a prorrogação do prazo de suspensão de 180 dias (stay period) previsto na Lei 11.101/2005. Entretanto, o relator entendeu não haver analogia entre a liquidação extrajudicial e a recuperação judicial das empresas.

"A interpretação analógica poderia ser estabelecida com recuperação extrajudicial, a qual, no entanto, não conta com o benefício do stay period", afirmou.

Longa suspensão

Segundo o ministro Sanseverino, a Lei das Cooperativas, ao prever a suspensão de até dois anos, fixou prazo muito superior ao atualmente previsto para a recuperação judicial. Além disso, ressaltou que esse prazo tem início com a simples deliberação da assembleia, sem a exigência da supervisão judicial, como ocorre nas recuperações.

"Essa particularidade da liquidação das cooperativas, por tangenciar o direito fundamental à inafastabilidade da jurisdição (artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição), merece ser aplicada com toda a deferência ao referido direito fundamental, razão pela qual tenho dificuldade em acompanhar o tribunal de origem na interpretação ampliativa do prazo de suspensão em comento", concluiu o ministro, ao reformar o acórdão do TJDFT e determinar o prosseguimento do cumprimento de sentença.

RECURSO ESPECIAL Nº 1833613 - DF (2019/0250811-9)
RELATOR : MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO
RECORRENTE : FRANCISCA FERREIRA BOTO
RECORRENTE : IVANI CARLOS PEREIRA
ADVOGADOS : ANNA MARIA DA TRINDADE DOS REIS - DF006811
GUSTAVO PERSCH HOLZBACH - DF021403
GABRIELA NAZARETH VELOSO RIBEIRO - DF050185
RECORRIDO : COOPERATIVA HABITACIONAL COOPERFENIX LTDA
ADVOGADOS : RAUL CANAL - DF010308
JOSE ANTONIO GONÇALVES LIRA - DF028504
TAMMY GUIMARAES RESENDE SANTOS - DF049480
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL.
LIQUIDAÇÃO EXTRAJUDICIAL DE SOCIEDADE COOPERATIVA.
SUSPENSÃO DAS AÇÕES EM ANDAMENTO. PRAZO DE UM ANO
DO ART. 76 DA LEI 5.764/1971. PRORROGAÇÕES SUCESSIVAS.
DESCABIMENTO. CARÁTER EXCEPCIONAL DA REGRA EM
COMENTO. INVIABILIDADE DE INTERPRETAÇÃO
ANALÓGICA COM O 'STAY PERIOD' DA RECUPERAÇÃO
JUDICIAL. DESCABIMENTO.
1. Controvérsia em torno da suspensão de um cumprimento de sentença
contra uma cooperativa em regime de liquidação extrajudicial para
além do prazo de um ano, prorrogável por mais um ano, previsto no art.
76 da Lei 5.764/1971.
2. Nos termos do art. 76 da Lei 5.764/1971, a aprovação da liquidação
extrajudicial pela assembleia geral implica a suspensão das ações
judiciais contra a cooperativa pelo prazo de um ano, prorrogável por
no máximo mais um ano.
3. Inviabilidade de aplicação ao caso das razões de decidir dos
precedentes relativos à prorrogação do 'stay period' da recuperação
judicial de empresas, pois a recuperação judicial de empresas, por se
submeter à supervisão judicial, não guarda semelhança com a
liquidação extrajudicial da cooperativa.
4. Caráter excepcional da regra do art. 76 da Lei 5.764/1971 por
atribuir a uma deliberação privada o condão de suspender a prestação
da atividade jurisdicional. Doutrina sobre o tema.
5. Inviabilidade de interpretação analógica ou extensiva da regra legal
'sub examine', em respeito ao princípio fundamental da inafastabilidade
da jurisdição (art. 5º, inciso XXXV, da CF).
6. Caso concreto em que a liquidação extrajudicial foi aprovada em
2011, estando há muito superado o prazo legal de suspensão das ações
judiciais.
7. Reforma do acórdão recorrido para se determinar o prosseguimento
do cumprimento de sentença.
8. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas,
acordam os Ministros da TERCEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça,
por unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do(a)
Sr(a) Ministro(a) Relator(a).
Os Srs. Ministros Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e
Moura Ribeiro votaram com o Sr. Ministro Relator.
Impedida a Sra. Ministra Nancy Andrighi.
Brasília, 17 de novembro de 2020.
Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO
Relator

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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