Citação postal recebida por terceiro não comprova que réu pessoa física teve ciência do processo

Citação postal recebida por terceiro não comprova que réu pessoa física teve ciência do processo

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento a recurso especial para reconhecer a nulidade de uma citação postal de pessoa física recebida por terceiro estranho aos autos e, em consequência, anular todos os atos processuais subsequentes. 

Para o colegiado, a citação de pessoa física pelo correio se dá com a entrega da carta citatória diretamente à parte ré, cuja assinatura deverá constar do respectivo aviso de recebimento, sob pena de nulidade do ato, nos termos dos artigos 248, parágrafo 1º, e 280 do Código de Processo Civil de 2015.

A controvérsia teve origem em ação monitória ajuizada por uma empresa para receber cerca de R$ 151 mil decorrentes de emissão de cheque sem fundos. Segundo os autos, após algumas tentativas de citação do réu, foi determinada a expedição de mandado com aviso de recebimento para o endereço da empresa da qual ele era sócio administrador, mas a carta de citação foi assinada por terceiro.

Revelia

Em primeiro grau, em virtude do recebimento da citação por pessoa estranha ao processo, o juiz determinou que a empresa autora efetuasse o pagamento de diligência a ser realizada por oficial de Justiça, como forma de evitar alegação futura de nulidade. Contudo, a empresa respondeu que o endereço informado nos autos era o do estabelecimento comercial do réu, o que afastaria a configuração de nulidade.

Certificada a realização da citação nos autos, iniciou-se o prazo para apresentação de embargos monitórios, o qual transcorreu à revelia do réu. Na sentença, o juiz acatou o argumento de validade da citação e julgou procedente o pedido monitório.

Alegando só ter sabido da existência do processo após a sentença, o réu, em exceção de pré-executividade, pediu a declaração de nulidade da citação e dos atos processuais posteriores, bem como a reabertura do prazo para oferecimento dos embargos monitórios.

O juiz rejeitou a exceção de pré-executividade por entender que a citação postal foi enviada ao endereço da empresa da qual o executado era sócio administrador; por isso, seria aplicável a teoria da aparência. A decisão foi mantida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo.

Certeza impossível

Segundo o relator do caso no STJ, ministro Marco Aurélio Bellizze, o fato de a citação postal ter sido enviada ao estabelecimento comercial do réu não é suficiente para afastar norma processual expressa, especialmente porque não é possível haver a certeza de que ele tenha, de fato, tomado ciência da ação.

Para Bellizze, como a parte destinatária do mandado de citação é pessoa física, "não tem incidência o parágrafo 2º do artigo 248 do CPC/2015, tampouco é possível falar em aplicação da teoria da aparência".

O ministro afirmou que a legislação prevê que a carta de citação pode ser recebida por terceiro somente quando o citando for pessoa jurídica ou, sendo pessoa física, morar em condomínio ou loteamento com controle de acesso – caso em que o mandado deve ser entregue a funcionário da portaria responsável pelo recebimento da correspondência (parágrafo 4º do artigo 248).

"Ocorre que, no caso, a citação não foi encaminhada a 'condomínio edilício' ou 'loteamento com controle de acesso', tampouco há qualquer informação de que quem tenha recebido o mandado era 'funcionário da portaria responsável pelo recebimento de correspondência'. Logo, a hipótese em julgamento não trata da exceção disposta no parágrafo 4º do artigo 248 do CPC/2015, mas sim da regra prevista no parágrafo 1º do mesmo dispositivo legal, a qual exige que a carta de citação seja entregue ao próprio citando, sob pena de nulidade", concluiu o ministro.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.840.466 - SP (2019/0032450-9)
RELATOR : MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE
RECORRENTE : GIOVANI LASTE
ADVOGADO : DANILO MARTELLI JUNIOR - SC030989
RECORRIDO : PAVAN FAMILY ADMINISTRACAO E PARTICIPACAO DE BENS LTDA
ADVOGADO : ANACLETO JORGE GELESCO E OUTRO(S) - SP033111
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO MONITÓRIA. REVELIA. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA.
EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. CITAÇÃO POSTAL. MANDADO CITATÓRIO
RECEBIDO POR TERCEIRO. IMPOSSIBILIDADE. RÉU PESSOA FÍSICA. NECESSIDADE DE
RECEBIMENTO E ASSINATURA PELO PRÓPRIO CITANDO, SOB PENA DE NULIDADE DO
ATO, NOS TERMOS DO QUE DISPÕEM OS ARTS. 248, § 1º, E 280 DO CPC/2015. TEORIA
DA APARÊNCIA QUE NÃO SE APLICA AO CASO. NULIDADE DA CITAÇÃO RECONHECIDA.
RECURSO PROVIDO.
1. A citação de pessoa física pelo correio se dá com a entrega da carta citatória diretamente
ao citando, cuja assinatura deverá constar no respectivo aviso de recebimento, sob pena de
nulidade do ato, nos termos do que dispõem os arts. 248, § 1º, e 280 do CPC/2015.
2. Na hipótese, a carta citatória não foi entregue ao citando, ora recorrente, mas sim à
pessoa estranha ao feito, em clara violação aos referidos dispositivos legais.
3. Vale ressaltar que o fato de a citação postal ter sido enviada ao estabelecimento comercial
onde o recorrente exerce suas atividades como sócio administrador não é suficiente para
afastar norma processual expressa, sobretudo porque não há como se ter certeza de que o
réu tenha efetivamente tomado ciência da ação monitória contra si ajuizada, não se podendo
olvidar que o feito correu à sua revelia.
4. A possibilidade da carta de citação ser recebida por terceira pessoa somente ocorre
quando o citando for pessoa jurídica, nos termos do disposto no § 2º do art. 248 do
CPC/2015, ou nos casos em que, nos condomínios edilícios ou loteamentos com controle de
acesso, a entrega do mandado for feita a funcionário da portaria responsável pelo
recebimento da correspondência, conforme estabelece o § 4º do referido dispositivo legal,
hipóteses, contudo, que não se subsumem ao presente caso.
5. Recurso especial provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, acordam
os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, dar
provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Moura Ribeiro (Presidente), Nancy Andrighi, Paulo de Tarso
Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília, 16 de junho de 2020 (data do julgamento).
MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Relator

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
Lista de leitura
Adicione esta notícia à sua lista de itens para ler depois
Adicionar à lista

Notícias relacionadas

Veja novidades e decisões judiciais sobre este tema

Resumos relacionados Exclusivo para assinantes

Mantenha-se atualizado com os resumos sobre este tema

Termos do Dicionário Jurídico

Veja a definição legal de termos relacionados

Economize tempo e aumente sua produtividade com o DN PRO Seja um assinante DN PRO e tenha acesso ilimitado a todo o conteúdo que agiliza seu processo de elaboração de peças e mantém você sempre atualizado sobre o mundo jurídico. 7.530 modelos e documentos essenciais para o seu dia a dia Atualizados regularmente por especialistas em Direito Ideal para advogados e profissionais da área jurídica Apenas R$ 24,90 por mês Veja exemplos gratuitos