Notificação prévia é obrigatória para validade da ação de despejo imotivada
Apesar de não haver previsão legal expressa, a notificação prévia ao locatário sobre o encerramento do contrato de locação por denúncia vazia (ou imotivada) é elemento obrigatório para a validade da posterior ação de despejo. A única exceção à necessidade de notificação premonitória é o ajuizamento da ação de despejo nos 30 dias subsequentes ao término do prazo do contrato de locação.
O entendimento foi fixado pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao manter acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) que, em razão da não comprovação de notificação prévia ao locatário, declarou extinta uma ação de despejo.
Na ação, a proprietária afirmou que não tinha mais interesse no aluguel e, diante da resistência do locatário em desocupar o imóvel, pedia que ele fosse condenado a sair.
O juiz decretou a rescisão do contrato e deu 30 dias para a desocupação voluntária do imóvel, mas o TJMG extinguiu a ação por falta de notificação do locatário.
Interpretação legal
Em recurso ao STJ, a locadora alegou que não há previsão legal expressa de que a notificação prévia seja indispensável para o ajuizamento da ação de despejo. Segundo a recorrente, a notificação premonitória é suprida pela citação do réu na ação judicial, momento a partir do qual ele pode desocupar o imóvel ou, dentro do prazo legal, apresentar defesa.
A ministra Nancy Andrighi, relatora, explicou que a controvérsia diz respeito à interpretação do parágrafo 2º do artigo 46 da Lei 8.245/1991. De acordo com o dispositivo, ocorrendo a prorrogação da relação locatícia, o locador poderá denunciar o contrato a qualquer tempo, concedido o prazo de 30 dias para desocupação.
Segundo a ministra, a jurisprudência do STJ sobre essa questão já apontava, ainda que de forma indireta, para o caráter indispensável da notificação premonitória ao locatário, inclusive com o uso de expressões como "necessária" e "obrigatória" em tais hipóteses.
Motivos sociais
A relatora também mencionou entendimentos da doutrina no sentido da necessidade da notificação prévia na denúncia vazia do contrato com prazo indeterminado.
"Como corretamente apontado pela doutrina, a necessidade de notificação premonitória, previamente ao ajuizamento da ação de despejo, encontra fundamentos em uma série de motivos práticos e sociais, e tem a finalidade precípua de reduzir os impactos negativos que necessariamente surgem com a efetivação do despejo", afirmou a ministra, lembrando que a própria doutrina excepciona a necessidade de notificação caso a ação de despejo seja ajuizada nos 30 dias subsequentes ao fim do prazo do contrato.
Ainda de acordo com Nancy Andrighi, a moderna doutrina do direito civil tem considerado a existência de um princípio – ou subprincípio – do aviso prévio a uma sanção, baseado na boa-fé objetiva, no contraditório e na ideia de vedação da surpresa.
"Sob essa perspectiva, também é obrigatória a ocorrência da notificação premonitória considerando os aspectos negativos que a ação de despejo pode implicar sobre aquele que deve ser retirado do imóvel", finalizou a ministra.
RECURSO ESPECIAL Nº 1.812.465 - MG (2018/0315577-3)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : PAULA HERMIDA GOMES FERREIRA
ADVOGADOS : RODRIGO OTAVIO VALLADÃO NOGUEIRA - MG066675
ELISABETH FRANÇA DA SILVA E OUTRO(S) - MG135946
RECORRIDO : MARIA APARECIDA ALEZANDRE
RECORRIDO : MÁRCIO DINIZ LEMES
ADVOGADO : MÔNICA APARECIDA ARANTES - MG059636
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. CIVIL. LOCAÇÃO RESIDENCIAL.
PREQUESTIONAMENTO. AUSÊNCIA. AÇÃO DE DESPEJO. DENÚNCIA
VAZIA. NOTIFICAÇÃO PREMONITÓRIA. AUSÊNCIA. OBRIGATORIEDADE.
EXTINÇÃO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO.
1. Ação ajuizada em 11/04/2016. Recurso especial interposto em
23/05/2018 e atribuído a este gabinete em 31/11/2018.
2. O propósito recursal diz respeito à necessidade de notificação
premonitória como pressuposto de constituição e desenvolvimento
válido e regular do processo.
3. A ausência de decisão acerca dos dispositivos legais indicados
como violados, não obstante a interposição de embargos de
declaração, impede o conhecimento nessa parte do recurso especial.
4. Mesmo de forma indireta, o STJ já apontava para a
obrigatoriedade da ocorrência da notificação premonitória, ao
denominá-la de “necessária” ou mesmo de “obrigatória”.
5. A necessidade de notificação premonitória, previamente ao
ajuizamento da ação de despejo, encontra fundamentos em uma
série de motivos práticos e sociais, e tem a finalidade precípua de
reduzir os impactos negativos que necessariamente surgem com a
efetivação do despejo.
6. “Caso a ação de despejo seja ajuizada sem a prévia notificação,
deverá ser extinto o processo, sem a resolução do mérito, por falta
de condição essencial ao seu normal desenvolvimento”.
7. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, não
provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer em parte do recurso
especial e, nesta parte, negar-lhe provimento, nos termos do voto da Sra. Ministra
Relatora. Os Srs. Ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco
Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora.
Brasília (DF), 12 de maio de 2020(Data do Julgamento)
MINISTRA NANCY ANDRIGHI
Relatora