STJ reconhece estabilidade de servidor que tomou posse por liminar há mais de 20 anos

STJ reconhece estabilidade de servidor que tomou posse por liminar há mais de 20 anos

A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento ao recurso de um policial rodoviário federal que tomou posse em 1999, amparado em decisão liminar, e reconheceu que ele tem direito a permanecer no cargo.

Para o colegiado, embora o Supremo Tribunal Federal (STF) tenha definido, com repercussão geral, que não é possível aplicar a teoria do fato consumado para manter um servidor no cargo, é preciso distinguir a situação excepcional do caso analisado, cujas peculiaridades o afastam dos precedentes.

O ministro Napoleão Nunes Maia Filho, relator, destacou que a solução padronizada ocasionaria mais danos sociais do que a manutenção do servidor no cargo, justificando-se o provimento do recurso.

Teste de direção

O então candidato entrou com mandado de segurança após ter sido reprovado em uma das fases do concurso, relativa à habilidade para dirigir. Ele alegou que passou por uma prova diferente da dos demais candidatos, o que teria gerado a reprovação. Disse ainda que era policial rodoviário estadual e que nunca teve problemas para dirigir os veículos necessários ao exercício da função.

Uma decisão liminar assegurou a posse do candidato em 1999. Em 2009, o Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) deu provimento a recurso da União para considerar legítimo o exame realizado, e o policial recorreu ao STJ.

Após decisão favorável ao servidor na Primeira Turma, a União entrou com recurso extraordinário invocando a jurisprudência do STF que não admite a teoria do fato consumado.

Distinção

Ao analisar a admissibilidade do recurso extraordinário, a vice-presidência do STJ devolveu o caso à Primeira Turma para eventual juízo de retratação, tendo em vista o entendimento do STF segundo o qual a teoria do fato consumado não é válida para manter no cargo um servidor que tomou posse em razão de liminar posteriormente revogada, pois isso violaria a exigência de concurso público.

Napoleão Nunes Maia Filho afirmou que a orientação do STF se aplica à situação dos servidores que tomam posse por força de liminar e depois buscam aplicar a teoria do fato consumado.

Entretanto, ressaltou, é necessário fazer uma distinção entre os precedentes que levaram a esse entendimento do STF e a situação em análise, na qual "há a solidificação de situações fáticas ocasionada em razão do excessivo decurso de tempo entre a liminar concedida e os dias atuais". Para o relator, a reversão desse quadro traria "danos desnecessários e irreparáveis" ao servidor.

O ministro lembrou que o policial já atua no cargo há mais de 20 anos. Ele disse que, após a decisão do STF sobre a aplicação da teoria do fato consumado, a Primeira Turma passou a considerar que existem situações excepcionais capazes de justificar a flexibilização do entendimento e a contagem do tempo de serviço prestado por força de liminar para efeito de estabilidade.

AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 883.574 - MS (2016/0066963-3)
RELATOR : MINISTRO NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO
AGRAVANTE : ELSON RODRIGUES
ADVOGADOS : ALEXANDRE CADEU BERNARDES - SP125204
EVELYN LAIS RISSO E OUTRO(S) - SP310158
AGRAVADO : UNIÃO
EMENTA
AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ADMINISTRATIVO. JUÍZO DE
RETRATAÇÃO. CONCURSO PÚBLICO PARA PROVIMENTO DE CARGO DE
POLICIAL RODOVIÁRIO FEDERAL. EXIGÊNCIA DE APROVAÇÃO EM EXAME
DE MOTORISMO. POSSE NO CARGO CONCEDIDA POR LIMINAR EM 1999.
DECURSO DE MAIS DE 20 ANOS DESDE A CONCESSÃO DA LIMINAR.
DISTINGUISHING. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL DO SERVIDOR
CONHECIDO PARA DAR PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL DO
PARTICULAR.
1. A Vice-presidência desta Corte entendeu que o
entendimento firmado por esta Corte, em princípio, destoa da manifestação
exarada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE-RG 608.482, cuja
tese firmada em repercussão geral consagra que "não é compatível com o regime
constitucional de acesso aos cargos públicos a manutenção no cargo, sob
fundamento de fato consumado, de candidato não aprovado que nele tomou
posse em decorrência de execução provisória de medida liminar ou outro
provimento judicial de natureza precária, supervenientemente revogado ou
modificado" (Tema 476/STF). Por este motivo, encaminhou os autos para eventual
juízo de retratação. A despeito do douto entendimento da Vice-Presidente, entendo
que a esta Turma não divergiu do Tema 476/STF.
2. De fato, a Primeira Turma, seguindo a orientação firmada
pelo Supremo Tribunal Federal em repercussão geral (RE 608.482/RN, Rel. Min.
Teori Zavascki, DJe de 30.10.2014), entendia inaplicável a Teoria do Fato
Consumado aos concurso público, não sendo possível o aproveitamento do tempo
de serviço prestado por força de decisão judicial pelo militar temporário, para efeito
de estabilidade.
3. Contudo, a Primeira Turma passou a entender que existem
situações excepcionais, como a dos autos, nas quais a solução padronizada
ocasionaria mais danos sociais do que a manutenção da situação consolidada,
impondo-se o distinguishing, e possibilitando a contagem do tempo de serviço
prestado por força de decisão liminar para efeito de estabilidade, em necessária
flexibilização da regra (REsp. 1.673.591/RS, Rel. Min. REGINA HELENA COSTA,
DJe 20.8.2018); caso dos autos, em que a liminar que deu posse ao
recorrente no cargo de Policial Rodoviário Federal foi deferida em 1999 e
desde então o recorrente está no cargo, ou seja, há 20 anos.
4. Agravo conhecido para dar provimento ao Recurso Especial
do Servidor a fim de assegurar sua manutenção definitiva no cargo de Policial
Rodoviário Federal.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da
Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das
notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, rejeitar o juízo de retratação,
mantendo a decisão anterior de conhecer do Agravo para dar provimento ao
Recurso Especial do Servidor, a fim de assegurar sua manutenção definitiva no
cargo de Policial Rodoviário Federal, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Benedito Gonçalves, Sérgio Kukina, Regina
Helena Costa e Gurgel de Faria (Presidente) votaram com o Sr. Ministro Relator.
Dr. MÁRCIO PEREIRA DE ANDRADE, pela parte AGRAVADA:
UNIÃO
Brasília/DF, 20 de fevereiro de 2020 (Data do Julgamento).
NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO
MINISTRO RELATOR

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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