Falta de informação sobre preço, por si só, não caracteriza propaganda enganosa

Falta de informação sobre preço, por si só, não caracteriza propaganda enganosa

A condenação de uma empresa pela prática de propaganda enganosa por omissão exige a comprovação de que foi sonegada informação essencial sobre a qualidade do produto ou serviço, ou sobre suas reais condições de contratação – análise que deve levar em conta o público-alvo do anúncio publicitário.

Com esse entendimento, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento a um recurso da Vivo S.A. e determinou que o Tribunal de Justiça do Maranhão (TJMA) analise novamente os pressupostos objetivos e subjetivos da substancialidade da informação omitida em uma campanha da empresa, para só então concluir pela caracterização ou não de publicidade enganosa.

A ação foi proposta pelo Ministério Público do Maranhão (MPMA) após a denúncia de consumidores sobre panfletos de propaganda de aparelhos celulares distribuídos em uma loja. Segundo o MP, houve propaganda enganosa por omissão, pois a peça publicitária não informava os preços dos aparelhos.

Em primeira instância, a Vivo e a loja onde houve a distribuição do material foram condenadas a pagar indenização de R$ 10 mil por dano coletivo aos consumidores. O TJMA manteve a sentença, reconhecendo violação dos artigos 31 e 37 do Código de Defesa do Consumidor (CDC).

No recurso especial, a Vivo alegou que não se exige no anúncio publicitário o esgotamento de todas as informações sobre o produto, como origem e prazo de validade.

Escolha consciente

O ministro Antonio Carlos Ferreira, relator do recurso, lembrou que o conceito de publicidade enganosa está intimamente ligado à falta de veracidade da peça publicitária, que pode decorrer tanto da informação falsa quanto da omissão de dado essencial.

Ele destacou que a informação tem por finalidade garantir o exercício da escolha consciente pelo consumidor, diminuindo riscos e permitindo que ele alcance suas legítimas expectativas. A preocupação do CDC é com o dever de informação e o princípio da veracidade.

"Isso porque a publicidade comercial, ao promover o consumo, irá vincular o fornecedor e integrar um futuro contrato com o consumidor, razão da importância de que a oferta e a apresentação de produtos ou serviços propiciem 'informações corretas, claras, precisas, ostensivas" – afirmou Antonio Carlos Ferreira, reportando-se às exigências do artigo 31 do código.

Citando o jurista Sérgio Cavalieri Filho, o ministro disse que a informação é um dever do contrato, calcada na adequação, suficiência e veracidade das informações para formar o consentimento informado do consumidor.

"No entanto, o artigo 31 do CDC não traz uma relação exaustiva nem determinante a todos os tipos de publicidade, mas meramente exemplificativa; portanto, pode ser necessário, no caso concreto, inserir outra informação não constante do dispositivo legal, assim como não há obrigação de que, no anúncio publicitário, estejam inclusos todos os dados informativos descritos no rol do citado artigo", declarou o relator.

Limitações

Segundo o ministro Antonio Carlos, o CDC não exige a veiculação de todas as informações de um produto, até porque isso seria impossível, devido à limitação de tempo e espaço das peças publicitárias.

"Não é qualquer omissão informativa que configura o ilícito. Para a caracterização da ilegalidade, a ocultação necessita ser de uma qualidade essencial do produto, do serviço ou de suas reais condições de contratação, de forma a impedir o consentimento esclarecido do consumidor", concluiu.

Apenas a análise do caso concreto, segundo o ministro, permite determinar os dados essenciais que deveriam constar da publicidade e foram levianamente omitidos. Ele ressaltou que o preço pode ou não ser uma informação essencial, "a depender de diversos elementos para exame do potencial enganoso, especificamente o uso ou a finalidade a que se destina o produto ou serviço e qual é seu público-alvo".

Para o relator, o provimento do recurso se justifica porque o TJMA, no julgamento da apelação, restringiu-se a afirmar, de forma genérica e abstrata, que o preço é um dado imprescindível na publicidade, sem aprofundar o exame das circunstâncias do caso concreto.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.705.278 - MA (2011/0132015-8)
RELATOR : MINISTRO ANTONIO CARLOS FERREIRA
RECORRENTE : VIVO S/A
ADVOGADOS : GUTEMBERG SILVA BRAGA JUNIOR E OUTRO(S) - MA006456
RENATO CALDEIRA GRAVA BRAZIL E OUTRO(S) - SP305379
RECORRIDO : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO MARANHÃO
INTERES. : C E A MODAS LTDA
ADVOGADO : ROBERTO TRIGUEIRO FONTES E OUTRO(S) - CE013058A
INTERES. : NORTE BRASIL TELECOM S/A - NBT
EMENTA
CONSUMIDOR E PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL
PÚBLICA. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO
OCORRÊNCIA. FUNDAMENTAÇÃO DEFICIENTE. SÚMULA N. 284 DO STF.
AÇÃO COLETIVA DE CONSUMO. DIREITOS E INTERESSES INDIVIDUAIS
HOMOGÊNEOS. MINISTÉRIO PÚBLICO. LEGITIMIDADE ATIVA.
PUBLICIDADE ENGANOSA. OMISSÃO. PREÇO. INFORMAÇÃO ESSENCIAL.
PRODUTO OU SERVIÇO. ANÁLISE CASUÍSTICA. EMBARGOS COM
PROPÓSITO DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA N. 98 DO STJ. MULTA
AFASTADA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
1. Considera-se deficiente a fundamentação de recurso especial que alega
violação do art. 535 do CPC/1973 e não demonstra, clara e objetivamente,
qual ponto omisso, contraditório ou obscuro do acórdão recorrido não foi
sanado no julgamento dos embargos de declaração. Incidência da Súmula
n. 284 do STF.
2. Na linha da jurisprudência desta Corte, o Ministério Público tem
legitimidade ativa para propor ação civil pública com o propósito de zelar
tanto pelos direitos difusos quanto pelos individuais homogêneos dos
consumidores, ainda que disponíveis.
3. É considerada publicidade enganosa a que contém informação total ou
parcialmente falsa, ou que, mesmo por omissão, é capaz de induzir o
consumidor a erro (art. 37, §§ 1º e 3º, do CDC).
4. O art. 31 do CDC traz relação meramente exemplificativa de algumas
informações que devem constar na publicidade de um produto ou serviço,
tais como "características, qualidades, quantidade, composição, preço,
garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre
os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores".
5. No entanto, para a caracterização da ilegalidade omissiva, a ocultação
deve ser de qualidade essencial do produto, do serviço ou de suas reais
condições de contratação, considerando, na análise do caso concreto, o
público alvo do anúncio publicitário.
6. Assim, a Corte Estadual, ao entender pela publicidade enganosa em
razão da omissão do "preço" no encarte publicitário, sem verificar os
pressupostos objetivos e subjetivos da substancialidade do dado omitido,
viola o disposto nos arts. 31 e 37, § 1º, do CDC.
7. "Embargos de declaração manifestados com notório propósito de
prequestionamento não têm caráter protelatório" (Súmula n. 98/STJ).
8. Recurso especial parcialmente provido para determinar o retorno dos
autos ao Tribunal de origem, a fim de que analise a essencialidade do dado
omitido "preço" no encarte publicitário, e para afastar a multa prevista no
parágrafo único do art. 538 do CPC/1973.
ACÓRDÃO
A Quarta Turma, por unanimidade, deu parcial provimento ao recurso
especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Marco Buzzi
(Presidente), Raul Araújo e Maria Isabel Gallotti votaram com o Sr. Ministro Relator.
Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Luis Felipe Salomão.
Brasília-DF, 19 de novembro de 2019 (Data do Julgamento)
Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA
Relator

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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