Prescrição da pretensão punitiva na ação penal não impede andamento de ação indenizatória no juízo cível

Prescrição da pretensão punitiva na ação penal não impede andamento de ação indenizatória no juízo cível

Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a prescrição da ação penal não afasta o interesse processual no exercício da pretensão indenizatória por meio de ação civil ex delicto (ação movida pela vítima na Justiça cível para ser indenizada pelo dano decorrente do crime).

Com base nesse entendimento, o colegiado negou provimento a recurso em que se questionava acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), o qual decidiu ser possível a tramitação de ação civil com pedido de indenização por danos morais e materiais causados a uma vítima de lesão corporal grave, mesmo tendo sido reconhecida a prescrição no juízo criminal.

Segundo os autos, a vítima sofreu agressões físicas em 2004. Em 2010, o agredido ajuizou a ação civil ex delicto contra seus agressores. Em 2014, porém, após sentença penal condenatória por lesão corporal grave, a pena dos réus foi extinta pela prescrição retroativa.

No recurso ao STJ, os supostos agressores alegaram que a ação indenizatória só poderia ter sido ajuizada se houvesse condenação criminal transitada em julgado. Sustentaram ainda que a pretensão reparatória estaria prescrita.

Independência relativa

"A decretação da prescrição da pretensão punitiva do Estado impede, tão somente, a formação do título executivo judicial na esfera penal, indispensável ao exercício da pretensão executória pelo ofendido, mas não fulmina o interesse processual no exercício da pretensão indenizatória a ser deduzida no juízo cível pelo mesmo fato", esclareceu a relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi.

De acordo com a ministra, o ordenamento jurídico brasileiro estabelece a existência de relativa independência entre as jurisdições cível e penal. Segundo ela, quem pretende pedir ressarcimento por danos sofridos com a prática de um delito pode escolher ajuizar ação cível de indenização ou aguardar o desfecho da ação penal, para, então, liquidar ou executar o título judicial eventualmente constituído pela sentença penal condenatória transitada em julgado.

A relatora explicou ainda que a pretensão da ação civil ex delicto "se vincula à ocorrência de um fato delituoso que causou danos, ainda que tal fato e sua autoria não tenham sido definitivamente apurados no juízo criminal".

Prescrição suspensa

Nancy Andrighi destacou que o Código Civil de 2002 dispõe que, quando a ação civil se originar de fato que deva ser apurado no juízo criminal, não correrá a prescrição antes da respectiva sentença definitiva.

Assim, afirmou a relatora, embora a ação de conhecimento possa ser ajuizada a partir do momento em que nasce a pretensão do ofendido, o prazo de prescrição da pretensão reparatória se suspende quando o mesmo fato começa a ser apurado na esfera criminal. Daí em diante, o ofendido passa a ter também a opção de liquidar ou executar eventual sentença penal condenatória.

Ao negar provimento ao recurso especial, por unanimidade, a turma observou que a pretensão da vítima da agressão não era de liquidação ou execução da sentença penal transitada em julgado.

Segundo Nancy Andrighi, a vítima quer somente ver reparados os danos que lhe foram causados pelos agressores, valendo-se, para ajuizar a ação civil ex delicto, apenas do fato de terem sido condenados em primeira instância.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.802.170 - SP (2019/0018238-6)
RELATORA : MINISTRA NANCY ANDRIGHI
RECORRENTE : CARLOS FABRICIO MATA PADOVAN
ADVOGADO : ALFREDO VASQUES DA GRAÇA JUNIOR E OUTRO(S) - SP126072
RECORRIDO : CARLOS ANTONIO GONCALVES DE SOUZA FILHO
ADVOGADOS : EDIBERTO DE MENDONÇA NAUFAL - SP084362
PABLO FELIPE SILVA E OUTRO(S) - SP168765
RECORRIDO : EDSON JUNIOR DANO
ADVOGADOS : FERNANDO FERRARI VIEIRA - SP164163
VIVIANE APARECIDA HENRIQUES E OUTRO(S) - SP140390
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL EX DELICTO. FUNDAMENTAÇÃO
DEFICIENTE. SÚM. 284/STF. AÇÃO PENAL. CONDENAÇÃO EM PRIMEIRO
GRAU PELO CRIME DE LESÕES CORPORAIS GRAVES. APELAÇÃO CRIMINAL.
EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE PELA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA
DO ESTADO. INDEPENDÊNCIA DAS JURISDIÇÕES CÍVEL E PENAL. PRETENSÃO
INDENIZATÓRIA. INTERESSE PROCESSUAL. PRESCRIÇÃO AFASTADA.
JULGAMENTO: CPC/15.
1. Ação civil ex delicto ajuizada em 09/12/2010, da qual foi extraído o
presente recurso especial, interposto em 16/11/2017 e atribuído ao
gabinete em 13/02/2019.
2. O propósito recursal consiste em decidir sobre o interesse processual do
recorrido para o ajuizamento de ação civil ex delicto, e, subsidiariamente,
sobre a prescrição da pretensão indenizatória deduzida na petição inicial.
3. Os argumentos invocados pela recorrente não demonstram como o
Tribunal de origem ofendeu os dispositivos legais indicados, o que importa
na inviabilidade do recurso especial (súm. 284/STF).
4. O ordenamento jurídico estabelece a relativa independência entre as
jurisdições cível e penal, de tal modo que quem pretende ser ressarcido dos
danos sofridos com a prática de um delito pode escolher, de duas, uma das
opções: ajuizar a correspondente ação cível de indenização ou aguardar o
desfecho da ação penal, para, então, liquidar ou executar o título judicial
eventualmente constituído pela sentença penal condenatória transitada em
julgado.
5. A decretação da prescrição da pretensão punitiva do Estado impede,
tão-somente, a formação do título executivo judicial na esfera penal,
indispensável ao exercício da pretensão executória pelo ofendido, mas não
fulmina o interesse processual no exercício da pretensão indenizatória a ser
deduzida no juízo cível pelo mesmo fato.
6. O art. 200 do CC/02 dispõe que, quando a ação se originar de fato que
deva ser apurado no juízo criminal, não correrá a prescrição antes da
respectiva sentença definitiva.
7. Hipótese em que se verifica que a pretensão deduzida pelo recorrido não
é de liquidação ou execução da sentença penal condenatória, senão a de se
ver reparado dos danos que lhe foram causados pelo recorrente e os demais
agressores, apenas se valendo, para tanto, do fato de terem sido eles
condenados em primeira instância pelo crime de lesões corporais graves.
8. Recurso especial conhecido em parte e, nessa extensão, desprovido, com
majoração dos honorários de sucumbência.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira
Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas
taquigráficas constantes dos autos, por unanimidade, conhecer em parte do recurso
especial e, nesta parte, negar-lhe provimento, com majoração de honorários, nos termos
do voto da Sra. Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco
Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro votaram com a Sra. Ministra Relatora. Ausente,
justificadamente, o Sr. Ministro Paulo de Tarso Sanseverino.
Brasília (DF), 20 de fevereiro de 2020(Data do Julgamento)
MINISTRA NANCY ANDRIGHI
Relatora

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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