Devolução de bem público subtraído não elimina ato de improbidade administrativa

Devolução de bem público subtraído não elimina ato de improbidade administrativa

O ressarcimento ou a restituição dos bens à administração pública pela pessoa que praticou a conduta ímproba pode ter efeitos para a verificação da responsabilidade pela reparação integral do prejuízo, todavia não faz desaparecer o ato de improbidade que gerou o dano ao erário.

O entendimento foi aplicado, por maioria de votos, pela Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao manter acórdão do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5) que condenou ex-funcionário dos Correios por improbidade administrativa após ele e outros réus subtraírem 40 caixas de papel da empresa. O valor estimado do material desviado era de R$ 4,8 mil, mas as resmas foram recuperadas pela Polícia Federal.

De acordo com os autos, o então funcionário dos Correios e outras duas pessoas estranhas aos quadros da empresa organizaram a retirada ilegal das caixas de papel, que continham, ao todo, 400 resmas. Para facilitar a operação, os réus disfarçaram um veículo particular com a logomarca dos Correios, e levaram o material furtado até uma papelaria. Eles foram presos em flagrante.

Condutas

Em primeiro grau, o juiz julgou improcedente a ação de improbidade, por considerar que não houve a demonstração, pelo Ministério Público Federal, de qualquer ato punível pela Lei 8.429/1992, especialmente porque os réus foram presos em flagrante, com a consequente apreensão e devolução do material aos Correios.

A sentença foi, entretanto, reformada pelo TRF5. Para o tribunal, ainda que as resmas tenham sido recuperadas, a situação não afasta a incidência das condutas descritas pelo artigo 10 da Lei de Improbidade Administrativa; apenas limita a punição dos réus. Assim, o tribunal condenou o funcionário dos Correios ao pagamento de multa de duas vezes a remuneração recebida à época – a demissão dele foi decretada em outro processo, na esfera penal.

No recurso especial, o ex-funcionário reiterou o argumento de que os atos praticados não poderiam ser enquadrados em nenhum dos artigos da Lei de Improbidade, o que afastaria a possibilidade de condenação. A defesa também destacou que não havia dano econômico a ser reparado pelo ex-funcionário.

Dano ao erário

No voto – que foi acompanhado pela maioria do colegiado –, o ministro Benedito Gonçalves lembrou que é inquestionável que o ex-agente participou da subtração das caixas de papel, fato que causou prejuízo ao patrimônio público a partir do momento em que o bem foi retirado da empresa e esteve sob a posse dos réus.

"Assim, o instante em que o dano à Administração Pública ocorreu está devidamente determinado. No caso, houve a posse tranquila do bem público por parte dos agentes, ainda que por breve período de tempo, pois a recuperação se deu no mesmo dia, em um estabelecimento comercial da cidade", disse o ministro.

Segundo Benedito Gonçalves, o fato de a recuperação do bem público ter sido feita em outro local, por intervenção da PF, não afasta a ocorrência do dano ao erário. A recuperação do material – lembrou – está associada ao ato de ressarcimento integral, "mas não apaga do mundo dos fatos o seu antecedente lógico, qual seja, o dano ao erário, como de fato ocorrido".

"É dizer, o ressarcimento ou a restituição dos bens à Administração Pública por ato daquele que praticou a conduta ímproba ou por ato de terceiro, como no caso, pode devolver o estado anterior das coisas para fins de aferição da responsabilidade pela reparação integral do prejuízo, todavia não faz desaparecer o ato de improbidade que gerou inicialmente o dano ao erário", concluiu o ministro ao manter a condenação determinada pelo TRF5.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.579.678 - PE (2016/0016095-4)
RELATOR : MINISTRO BENEDITO GONÇALVES
RECORRENTE : JOSE SIQUEIRA DIAS JUNIOR
ADVOGADO : CLETO ARLINDO DA COSTA ALBUQUERQUE - PE014568
RECORRIDO : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
INTERES. : ADRIANO MEDEIROS DA SILVA
ADVOGADO : DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO
INTERES. : EDISON COELHO DE LIMA
ADVOGADO : ODIRLEY PRADO DE ARRUDA - PE028421
EMENTA
DIREITO ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. ATO DE
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA FUNDAMENTADO NO ART. 10, I,
DA LEI DE IMPROBIDADE. DANO AO ERÁRIO. DANO CONSUMADO
NO INSTANTE EM QUE INVERTIDA A POSSE DO BEM SUBTRAÍDO DA
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA PELO AGENTE. RECURSO ESPECIAL NÃO
PROVIDO, DIVERGINDO DO MINISTRO RELATOR.
1. Na origem, o Ministério Público Federal ajuizou ação civil pública por improbidade
administrativa em razão da subtração de 40 (quarenta) caixas de papel offset, tamanho
A-4, do acervo da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – ECT. O material
subtraído foi restituído à Administração Pública, após apreensão pela Polícia Federal em
estabelecimento comercial, tendo sido o réu, ora recorrente, condenado com
fundamento no art. 10, I, da Lei n. 8.429/1992 (Lei de Improbidade Administrativa).
2. É inquestionável que o recorrente e os demais réus, cada um com determinado
comportamento, concorreram para a subtração de 40 caixas de papel offset
pertencentes à ECT, o que, inequivocamente, causou prejuízo ao patrimônio público a
partir do momento em que o bem foi retirado da empresa e esteve sob a posse dos réus.
A subtração das caixas de papel gerou efetiva e ilícita diminuição de patrimônio da
Administração Pública e a recuperação dos bens não apaga do mundo dos fatos seu
antecedente lógico, o dano ao erário, que de fato ocorreu.
3. O ressarcimento ou restituição dos bens à Administração Pública por ato daquele que
praticou a conduta ímproba ou por ato de terceiro, como no caso, pode devolver o
estado anterior das coisas para fins de aferição da responsabilidade pela reparação
integral do prejuízo, todavia não faz desaparecer o ato de improbidade que gerou
inicialmente o dano ao erário.
4. Recurso especial não provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os
Ministros da Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por maioria, vencidos os Srs. Ministros
Napoleão Nunes Maia Filho e Regina Helena Costa (Presidente), negou provimento ao recurso
especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Benedito Gonçalves, que lavrará o acórdão. Votaram
com o Sr. Ministro Benedito Gonçalves os Srs. Ministros Sérgio Kukina e Gurgel de Faria.
Brasília (DF), 25 de abril de 2019(Data do Julgamento)

MINISTRO BENEDITO GONÇALVES

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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