Cabe à Justiça Federal julgar homicídio contra PM durante roubo a empresa da União

Cabe à Justiça Federal julgar homicídio contra PM durante roubo a empresa da União

No caso de crime contra a vida, na forma consumada ou tentada, que tenha como vítima agente estatal, em contexto de roubo armado contra órgãos, autarquias ou empresas públicas da União, a competência para julgamento da ação penal é da Justiça Federal. Nessas hipóteses, a conexão entre os crimes ocorre em virtude da íntima relação entre a violência, elementar do delito de roubo, e o objetivo final de atingir o patrimônio da instituição pública federal.

O entendimento foi firmado pela Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao declarar a competência da 11ª Vara Federal do Rio Grande do Sul para analisar ação cujos réus teriam atirado contra policiais militares durante uma tentativa de roubo à agência dos Correios em Taquari (RS).

Após o oferecimento da denúncia por homicídio qualificado tentado, o juiz da vara federal declinou da competência para a Justiça estadual, considerando que não seria o caso de júri federal. Por sua vez, o juiz estadual, com base na Súmula 122 do STJ, entendeu que o processo deveria ser julgado na Justiça Federal, pois os crimes de roubo e homicídio seriam conexos.

Diferenciação

Relator do conflito de competência, o ministro Ribeiro Dantas apontou que o Supremo Tribunal Federal, interpretando o artigo 109 da Constituição, fixou o entendimento de que a competência da Justiça Federal em matéria penal só ocorre quando o crime é praticado em detrimento de bens, serviços ou interesses da União, ou de seu interesse direto e específico.

O ministro também lembrou que a Terceira Seção concluiu pela competência da Justiça comum estadual para julgar crimes de homicídio praticados contra policiais estaduais no exercício de suas funções, mesmo quando ocorridos no contexto federal de contrabando.

Entretanto, Ribeiro Dantas propôs uma diferenciação entre essas hipóteses anteriormente analisadas. O relator trouxe posicionamento da doutrina no sentido de que, quando um crime ocorre para garantir a impunidade ou a vantagem de outro, tem-se o caso da conexão objetiva consequencial ou sequencial.

Conexão consequencial

Segundo o ministro, no caso de roubo praticado em detrimento de empresa pública federal – como os Correios ou a Caixa Econômica Federal –, havendo a imediata perseguição com troca de tiros, o eventual homicídio, consumado ou tentado, implicará conexão consequencial entre os dois delitos.

"O crime contra a vida, nessa hipótese, só existe em razão do delito contra a empresa federal, e seu objetivo último é o exaurimento da infração patrimonial. Em outros termos, no mundo fenomenológico, esse homicídio orbita em torno do roubo em detrimento da empresa pública federal em total dependência deste", afirmou o relator.

Para Ribeiro Dantas, mesmo que o homicídio seja cometido contra policial estadual, o agente público está atuando na defesa da esfera jurídico-patrimonial da empresa pública federal.

Ao declarar a competência da Justiça Federal para o caso em análise, o ministro afirmou que não é possível distinguir "a linha tênue" entre os disparos integrantes do crime de roubo, com o fim de intimidar (caracterizadores da violência ou da grave ameaça), e aqueles efetuados com a intenção de matar o policial estadual.

CONFLITO DE COMPETÊNCIA Nº 165.117 - RS (2019/0104739-9)
RELATOR : MINISTRO RIBEIRO DANTAS
SUSCITANTE : JUÍZO DE DIREITO DA 1A VARA JUDICIAL DE TAQUARI - RS
SUSCITADO : JUÍZO FEDERAL DA 11A VARA DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DO
ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
INTERES. : JUSTIÇA PÚBLICA
INTERES. : ANDERSON PADILHA DA SILVA
ADVOGADOS : MARISTELA CELESTE DE ARAÚJO RODRIGUES - RS057472
LUANA PONTES HUBNER - RS103226
INTERES. : ALEX SIDINEI SCHUL PINHEIRO
ADVOGADO : MARISTELA CELESTE DE ARAÚJO RODRIGUES - RS057472
EMENTA
CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. ROUBO ARMADO A
AGÊNCIA DOS CORREIOS. TENTATIVA DE HOMICÍDIO CONTRA
POLICIAIS MILITARES ESTADUAIS. CONEXÃO. OCORRÊNCIA.
COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. COMPETÊNCIA DO JUÍZO
SUSCITADO.
1. Há precedentes desta Corte reconhecendo a competência da Justiça comum
Estadual para julgar o crime de homicídio praticado contra policiais militares
estaduais, ainda que no contexto do delito federal de contrabando. (CC
153.306/RS, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, Rel. p/ Acórdão
Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, TERCEIRA SEÇÃO,
julgado em 22/11/2017, DJe 29/11/2017.)
2. Situação diversa, entretanto, é aquela em que o crime contra a vida em
desfavor de agentes estatais, consumado ou tentado, é praticado no contexto de
crime de roubo armado contra órgãos, autarquias ou empresas públicas da União.
Isso porque, nesta hipótese, a íntima relação entre a violência, elementar do crime
de roubo, e o crime federal (roubo armado) atrai a conexão.
3. Conflito conhecido para declarar a competência do Juízo Federal da 11ª Vara
da Seção Judiciária do Estado do Rio Grande do Sul, o suscitado.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas,
acordam os Ministros da Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade,
conhecer do conflito e declarar competente o suscitado, Juízo Federal da 11ª Vara da Seção
Judiciária do Estado do Rio Grande do Sul, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Antonio Saldanha Palheiro, Joel Ilan Paciornik, Leopoldo de
Arruda Raposo (Desembargador convocado do TJ/PE), Laurita Vaz, Jorge Mussi, Sebastião
Reis Júnior, Rogerio Schietti Cruz e Reynaldo Soares da Fonseca votaram com o Sr. Ministro
Relator.
Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Nefi Cordeiro.
Brasília (DF), 23 de outubro de 2019 (data do julgamento)
MINISTRO RIBEIRO DANTAS
Relator

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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