Prazo de prescrição não é suspenso durante o cumprimento de transação penal

Prazo de prescrição não é suspenso durante o cumprimento de transação penal

Durante o tempo transcorrido para o cumprimento das condições impostas em acordo de transação penal (artigo 76 da Lei 9.099/1995) não há, por falta de previsão legal, a suspensão do curso do prazo prescricional.

A tese foi fixada pela Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao dar provimento a recurso em habeas corpus para reconhecer a prescrição e declarar a extinção da punibilidade em um caso de lesão corporal no trânsito.

Segundo o processo, o acusado bateu o carro e causou graves lesões na passageira que estava ao seu lado. Fugiu sem prestar socorro e, em seguida, retornou à Argentina, onde estudava, sem dar esclarecimentos à polícia nem o devido auxílio à vítima.

Foi celebrado acordo de transação penal, consistente no pagamento de R$ 150 mil à vítima da lesão corporal, em 60 parcelas mensais. O acordo, porém, deixou de ser cumprido – o que levou o Ministério Público a pedir a instauração da ação penal. A defesa alegou que já teria ocorrido a prescrição da pretensão punitiva e pediu o trancamento da ação.

O Tribunal de Justiça do Ceará negou o pedido sob o argumento de que não se pode falar em prescrição durante período de prova e sem o cumprimento total da transação penal oferecida pelo Ministério Público.

No recurso em habeas corpus apresentado ao STJ, o recorrente alegou constrangimento ilegal por estar sendo indevidamente processado com base em pretensão punitiva já prescrita. Disse que já tinham transcorrido 12 anos desde o acidente e que não havia causa suspensiva ou interruptiva da prescrição, motivo pelo qual pediu o trancamento da ação penal.

Sem previsão

Segundo o relator do recurso, ministro Antonio Saldanha Palheiro, a orientação jurisprudencial do STJ considera que as causas suspensivas da prescrição exigem expressa previsão legal. 

O ministro explicou que, embora a transação penal implique o cumprimento de uma pena restritiva de direitos ou multa pelo acusado, não se pode falar em condenação, muito menos em período de prova, enquanto durar o cumprimento da medida imposta, razão pela qual não se revela adequada a aplicação do artigo 117, V, do Código Penal.

"A interrupção do curso da prescrição prevista no referido dispositivo legal deve ocorrer somente em relação às condenações impostas após o transcurso do processo, e não para os casos de transação penal, que justamente impede a sua instauração", afirmou.

Antonio Saldanha Palheiro destacou ainda que o regramento da transação penal prevê apenas que a aceitação da proposta não gera o efeito da reincidência, bem como impede a utilização do benefício novamente em um prazo de cinco anos.

Ele observou que, como disposto na Súmula Vinculante 35 do Supremo Tribunal Federal, se o acordo for descumprido, o Ministério Público poderá oferecer a denúncia, momento em que se dará início à persecução penal em juízo.

"Não há previsão legal de que, celebrado o acordo, e enquanto não cumprida integralmente a avença, ficará suspenso o curso do prazo prescricional", esclareceu.

Princípio da legalidade

De acordo com o relator, ao tratar de um instituto diverso, a suspensão condicional do processo, a Lei 9.099/1995 previu de forma expressa, diferentemente da transação penal, que não correrá a prescrição durante o prazo de suspensão. Semelhante previsão – destacou – consta do artigo 366 do Código de Processo Penal, que, ao cuidar da suspensão do processo, impõe, conjuntamente, a suspensão do curso do prazo prescricional.

"Assim, a permissão de suspensão do curso do prazo prescricional sem a existência de determinação legal consubstancia flagrante violação ao princípio da legalidade", concluiu.

Como, no caso analisado, o prazo prescricional é de oito anos, e entre a data do fato e a denúncia passaram-se mais de dez anos, a turma acompanhou o voto do relator e, de forma unânime, reconheceu a prescrição da pretensão punitiva.

RECURSO EM HABEAS CORPUS Nº 80.148 - CE (2017/0007084-6)
RELATOR : MINISTRO ANTONIO SALDANHA PALHEIRO
RECORRENTE : IGOR PINHEIRO LANDIM
ADVOGADO : JOÃO REGIS PONTES REGO - CE006105
RECORRIDO : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO CEARÁ
EMENTA
PENAL E PROCESSUAL PENAL. RECURSO EM HABEAS
CORPUS. LESÃO CORPORAL NO TRÂNSITO. TRANSAÇÃO
PENAL. ACORDO CELEBRADO. DESCUMPRIMENTO
PARCIAL. DENÚNCIA OFERECIDA. PRAZO PRESCRICIONAL
QUE NÃO SE SUSPENDE. RECURSO PROVIDO.
1. Conforme orientação desta Corte, as causas suspensivas da
prescrição demandam expressa previsão legal" (AgRg no
REsp n. 1.371.909/SC, relator Ministro JOEL ILAN PACIORNIK,
QUINTA TURMA, julgado em 23/8/2018, DJe de 3/9/2018).
2. Durante o prazo de cumprimento das condições impostas em
acordo de transação penal (art. 76 da Lei n. 9.099/1995) não há,
em razão da ausência de previsão legal, a suspensão do curso
do prazo prescricional.
3. No caso, embora o prazo prescricional seja de 8 anos, entre a
data do fato e a denúncia passaram-se mais de 10 anos, o que
evidencia o advento da prescrição da pretensão punitiva.
4. Recurso provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima
indicadas, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por
unanimidade, dar provimento ao recurso ordinário nos termos do voto do Sr. Ministro
Relator. Os Srs. Ministros Laurita Vaz, Sebastião Reis Júnior, Rogerio Schietti Cruz e
Nefi Cordeiro votaram com o Sr. Ministro Relator.
Brasília, 1º de outubro de 2019 (data do julgamento).
Ministro ANTONIO SALDANHA PALHEIRO
Relator

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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