Fazendeiro do Pará que fornecia curral como alojamento é condenado por dano moral coletivo
O proprietário da Fazenda Vale Verde, no Pará, deverá pagar R$ 200 mil a título de dano moral coletivo em razão da submissão de 11 trabalhadores rurais a condições degradantes. No julgamento do recurso de revista do fazendeiro, a Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho manteve o reconhecimento de que a situação justifica a condenação por dano moral coletivo, mas reajustou de R$ 3 milhões para R$ 200 mil, por entender que a manutenção do valor anteriormente fixado é desproporcional, por se tratar de pessoa física.
Resgate
Os 11 trabalhadores rurais foram resgatados pelo Batalhão de Polícia Ambiental e pelo Grupo de Fiscalização Rural do extinto Ministério do Trabalho. Eles atuavam na construção de cercas e no roço e, segundo a fiscalização, o local usado como alojamento era um curral sem quaisquer instalações sanitárias e elétricas, e o grupo foi encontrado sem alimentos.
Prefeito
Como resultado da operação, o Ministério Público do Trabalho (MPT) ajuizou ação civil pública, pedindo a condenação do dono da fazenda ao pagamento de indenização por dano moral coletivo. Segundo o MPT, o proprietário, então prefeito do Município de Abel Figueiredo (PA), responde a processo-crime por ter sido flagrado em operação realizada em outra fazenda ao submeter 22 trabalhadores a situação análoga à escravidão. Por esse motivo, chegou a integrar a “lista suja” elaborada pelo extinto Ministério do Trabalho.
Curral
No processo, ficou demonstrado que os empregados dormiam no mesmo curral destinado aos bois, expostos a toda sorte de intempéries (chuva, sol, vento, acidentes, ataques de animais silvestres e picadas de insetos, entre outras) e ao convívio direto com o gado, em permanente contato com fezes, urina, lama e poeira. Com base nessa constatação, o juízo da 2ª Vara do Trabalho de Marabá (PA) condenou a pessoa física responsável pela fazenda ao pagamento de indenização por dano moral coletivo no valor de R$ 3 milhões.
Na sentença, o juiz decidiu destinar o valor da indenização à comunidade diretamente lesada, por meio de projetos “derivados de políticas públicas de defesa e promoção dos direitos humanos do trabalhador”.
Reincidência
A decisão foi integralmente mantida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região (PA), que considerou como parâmetros a quantidade de trabalhadores, os valores das rescisões contratuais, a reincidência da prática ilegal pelo fazendeiro e a sua condição econômica, assinalando que se trata de grande produtor e proprietário de várias fazendas.
Conduta ilegal
Ao examinar o recurso de revista do proprietário contra a condenação, a Primeira Turma do TST entendeu caracterizado o dano moral coletivo e ressaltou que a conduta ilegal deve ser reprimida pelo Poder Judiciário, como está sendo, diante da provocação do Ministério Público do Trabalho, na sua atuação como fiscal da lei.
Razoabilidade e proporcionalidade
Em relação ao valor da condenação, entretanto, o relator, ministro Hugo Carlos Scheuermann, observou que, em processos em que se tratava de dano moral coletivo por desrespeito a direitos trabalhistas e que envolviam grandes empresas, como a American Airlines e a América Latina Logística, as condenações foram mantidas ou fixadas em patamares muito inferiores ao desse caso. “Não obstante a caracterização do dano moral coletivo, o valor da condenação, fixado em R$ 3 milhões, na hipótese em que o réu é uma pessoa física, ainda que se trate de grande produtor rural e que tenha conduta reincidente, mostra-se desarrazoado e desproporcional, sob pena de inviabilização da atividade econômica”, explicou.
O ministro lembrou, ainda, que o entendimento do TST é que a revisão do montante arbitrado na origem só deve ocorrer nos casos em que é nítido o caráter irrisório ou exorbitante da condenação. “A indenização não pode ser excessiva à parte que indeniza e também não pode ser fixada em valores irrisórios e apenas simbólicos”, assinalou.
Por maioria, a Turma deu provimento ao recurso e considerou que o valor de R$ 200 mil está de acordo com a situação descrita nos autos para a compensação do dano moral coletivo.
Processo: RR-1811-68.2012.5.08.0117
AGRAVO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO EM
RECURSO DE REVISTA. DANOS MORAIS
COLETIVOS. QUANTUM. AÇÃO CIVIL PÚBLICA.
FISCALIZAÇÃO DO TRABALHO. TRABALHADOR
RURAL. CONTRATAÇÃO IRREGULAR. VÍNCULO
DE EMPREGO RECONHECIDO. CONDIÇÕES
DEGRADANTES. USO DE CURRAL COMO
ALOJAMENTO. DECISÃO AGRAVADA PROFERIDA
PELO RELATOR ORIGINÁRIO PAUTADA NA
APLICAÇÃO DO ART. 896, § 1º-A, I, DA CLT.
EQUÍVOCO. ÓBICE AFASTADO. Constatado
equívoco na análise dos pressupostos
intrínsecos do recurso de revista,
afasta-se o óbice oposto na decisão
agravada.
Agravo conhecido e provido.
AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE
REVISTA. DANOS MORAIS COLETIVOS.
QUANTUM. AÇÃO CIVIL PÚBLICA.
FISCALIZAÇÃO DO TRABALHO. TRABALHADOR
RURAL. CONTRATAÇÃO IRREGULAR. VÍNCULO
DE EMPREGO RECONHECIDO. CONDIÇÕES
DEGRADANTES. USO DE CURRAL COMO
ALOJAMENTO. DECISÃO AGRAVADA PAUTADA NA
APLICAÇÃO DO ART. 896, § 1º-A, I, DA CLT.
EQUÍVOCO. ÓBICE AFASTADO. Constatado
equívoco na análise dos pressupostos
intrínsecos do recurso de revista,
afasta-se o óbice oposto na decisão
agravada. Ante a aparente violação dos
arts. 944, caput e 5º, V, da CF, nos
moldes do art. 896, “c” da CLT, merece
processamento o recurso de revista, no
tema.
Agravo de instrumento conhecido e
provido.
RECURSO DE REVISTA. INTERPOSIÇÃO
ANTERIOR À LEI 13.015/2014. DANOS
MORAIS COLETIVOS. QUANTUM. AÇÃO CIVIL
PÚBLICA. FISCALIZAÇÃO DO TRABALHO.
TRABALHADOR RURAL. CONTRATAÇÃO
IRREGULAR. VÍNCULO DE EMPREGO
RECONHECIDO. CONDIÇÕES DEGRADANTES.
USO DE CURRAL COMO ALOJAMENTO.
RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE.
INOBSERVÂNCIA. 1. Hipótese em que o e.
Tribunal regional manteve a condenação
do reclamado, pessoa física, ao
pagamento de danos morais coletivos
fixados no valor de R$3.000.000,00
(três milhões de reais). 2. Em relação
ao valor dos danos morais, o
entendimento desta Corte é de que a
revisão do montante arbitrado na
origem, em compensação pelo dano moral
sofrido, dá-se, tão somente, em
hipóteses em que é nítido o caráter
irrisório ou exorbitante da condenação,
de modo tal que sequer seja capaz de
atender aos objetivos estabelecidos
pelo ordenamento para o dever de
indenizar. A indenização não pode ser
excessiva à parte que indeniza e também
não pode ser fixada em valores
irrisórios e apenas simbólicos. 3.
Assim, considerados os fatos descritos
no acórdão regional, no sentido de que
se trata de contratação irregular de
onze trabalhadores, que laboravam em
condições degradantes, decorrentes do
uso de curral como alojamento, sendo o
réu da presente ação civil pública
pessoa física, mostra-se
desproporcional o valor da compensação
por danos morais coletivos fixados nas
instâncias ordinárias, sob pena de
inviabilização da atividade econômica.
Recurso de Revista conhecido e provido.