Mantida prisão preventiva do prefeito de Mauá (SP)
O ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Rogerio Schietti Cruz negou liminar em habeas corpus ao atual prefeito de Mauá (SP), Atila Jacomussi, e manteve prisão preventiva decretada pelo Tribunal Federal da 3ª Região (TRF3).
Inicialmente, ele foi preso em maio deste ano, no âmbito da Operação Prato Feito, da Polícia Federal, que apura a prática de desvio de verbas públicas em contratos firmados com o município. A defesa impetrou habeas corpus no Supremo Tribunal Federal (STF), obtendo liminar que facultou ao TRF3 a fixação de medidas cautelares.
Foram determinadas, dentre outras, medidas como pagamento de fiança, proibição de sair do país e afastamento das funções de prefeito – esta última revogada por outra liminar do STF –, o que possibilitou a Jacomussi retornar ao cargo, em 11 de setembro de 2018.
Em novembro deste ano, o TRF3 decretou nova prisão preventiva contra Atila Jacomussi, agora no âmbito de um desdobramento, denominado Operação Trato Feito, fundamentado em suposto descumprimento das medidas cautelares, que não teriam sido suficientes para impedir o prefeito de cometer novos crimes, a exemplo de licitação aparentemente fraudulenta realizada quando ele ainda estava afastado de suas funções no município.
Fundamentos
No habeas corpus dirigido ao STJ, Jacomussi alega, preliminarmente, a incompetência da Justiça Federal para o processamento e julgamento da ação, afirmando não haver prova de que os valores supostamente desviados teriam origem federal. Sustenta, ainda, que o novo pedido de prisão preventiva não se justifica, uma vez que seus fundamentos são idênticos aos que foram rechaçados pelo STF. O prefeito também nega ter havido descumprimento das medidas cautelares.
Ao indeferir o pedido de liminar, o ministro Rogerio Schietti afastou a alegada incompetência da Justiça Federal, porque documentos juntados ao processo demonstram que há ao menos um contrato envolvendo verba federal.
Quanto à alegada falta de fundamentação para o atual decreto de prisão, o ministro não verificou o constrangimento ilegal apontado pelo prefeito, e realçou o trecho do mandado de prisão que aponta a concreta possibilidade de reiteração criminosa de Jacomussi.
“Como se observa, a decisão impugnada apontou, ao menos em princípio, nova situação concreta que justifica a constrição cautelar, isto é, mesmo após a imposição de medidas cautelares, o paciente, pelo que se deduz do referido decisum, continuou a delinquir”, conclui Schietti.
Sobre o novo decreto ser uma afronta das decisões do STF que colocaram o investigado em liberdade anteriormente, o ministro observou que o habeas corpus ao STJ não é o instrumento processual adequado para suscitar tal hipótese. Segundo o ministro, a eventual reclamação quanto a descumprimento de decisão da Corte Suprema deve ser endereçada àquele tribunal.
O mérito do habeas corpus será analisado pela Sexta Turma do STJ.
HABEAS CORPUS Nº 485.556 - SP (2018/0341194-7)
RELATOR : MINISTRO ROGERIO SCHIETTI CRUZ
IMPETRANTE : ATILA CESAR MONTEIRO JACOMUSSI
ADVOGADO : DANIEL LEON BIALSKI - SP125000
RECLAMADO : TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL 3 REGIAO
PACIENTE : ATILA CESAR MONTEIRO JACOMUSSI (PRESO)
DECISÃO
ATILA CESAR MONTEIRO JACOMUSSI alega sofrer
constrangimento ilegal em decorrência de decisão proferida pela Juíza Federal
convocada do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, que decretou a sua
prisão preventiva, no âmbito de investigação que apura a prática de desvio de
verbas públicas.
Alega o impetrante, preliminarmente, a incompetência da
Justiça Federal para o processamento e julgamento do feito, na medida em que
"não há qualquer prova de que algum recurso supostamente desviado teria
origem federal" (fl. 8). Por isso, almeja o reconhecimento de nulidade dos atos
praticados, com a remessa dos autos para a Justiça estadual.
Sustenta, ainda, a desnecessidade da medida cautelar extrema,
sobretudo porque os fundamentos externados na origem, assemelham-se aos que
foram rechaçados pela Suprema Corte. Afirma que "a Autoridade Coatora –
afrontou as decisões proferidas pelo Ministro Gilmar Mendes, nos autos dos
Habeas Corpus nº 157.094 e 161.633 – ambos referentes à Operação
Trato-Feito – decretando uma vez mais a prisão cautelar do Paciente – se
reafirmando que a decisão é carente de fundamento válidos e fatos novo [s]" (fl.
12).
Assere que "afora o 'copia e cola' realizado, para justificar o
injustificável, ou seja, o novo pedido de prisão, a Autoridade Policial, data
maxima venia, 'requentando' os fatos já conhecidos, forçando uma nova
roupagem, de forma até de inegável má-fé, aduziu existirem eventos novos que a
justificassem" (fl. 17).
Aduz, diante disso, que "os requisitos utilizados para decretação
da preventiva, com todo o respeito devido, não se demonstram pertinentes, já
que não é lícito nem permitido realizar qualquer presunção de periculosidade e
tal dedução não pode servir de sustentáculo à castração da liberdade, sendo esta,
via de consequência, a regra e aquela a exceção" (fls. 22-23).
Destaca o impetrante, por fim, que o "ora Paciente não
descumpriu qualquer das medidas impostas; o ora Suplicante não cometera
qualquer ilicitude, não podendo fatos pretéritos, apurados quando da deflagração
da pretérita operação, servir de escopo e motivação da a renovação da prisão
revogada e reconhecida como ilegal" (fl. 23).
Requer a defesa, por todo o exposto, "presentes os requisitos
necessários [...] seja concedida a medida liminar para restabelecer a liberdade ao
ora paciente, permitindo que possa aguardar solto o final julgamento deste
remédio heróico, retornando-se a situação anterior determinada pelo Supremo
Tribunal Federal" (fl. 29).
Decido.
A despeito da alegada incompetência da Justiça Federal, que, em
princípio, não encontra respaldo nos elementos documentais juntados aos autos
– sobretudo diante da afirmação contida no decreto constritivo de que "há pelo
menos um contrato que envolve verba federal (fl. 154, destaquei) –, observo
que os argumentos externados pelo impetrante ganham contornos que melhor se
adequariam a outro instrumento processual que não a presente via mandamental.
Deveras, sob o fundamento de que não houve a indicação de
elementos novos e concretos que justificassem a prisão preventiva, o impetrante
assinala que os fatos externados pelo decisum seriam os mesmos que
subsidiaram anterior decreto constritivo, posteriormente substituído por
cautelares diversas pelo STF – Habeas Corpus ns. 157.094/SP e 161.633/SP –, a
indicar que a prisão preventiva seria uma afronta a decisão proferida pela
Suprema Corte.
No particular, além de haver traçado um quadro comparativo das
decisões – daquela que foi substituída por cautelares diversas pelo STF e o novo
decreto –, afirmou o impetrante (fl. 12): "E basta uma simplória leitura do
anterior decreto e deste novo para se verificar a similitude de colocações, aliás, a
sua grande maioria repetidas, o que mostra uma escandalosa afronta à própria
decisão liberatória vigente".
Tal situação, ao menos como colocada nesta oportunidade,
implica, por via transversa, na alegação de possível descumprimento de decisões
proferidas pelo STF em ao menos duas oportunidades – com assinala na inicial
–, a ensejar, por isso mesmo, a utilização do instrumento processual adequado,
isto é, a reclamação. Não há como esta Corte, se colocada a questão sob o
prisma delineado pelo impetrante, imiscuir-se em juízo que está atrelado à
autoridade de decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal.
Sob diversa perspectiva, mesmo que não considerada a direção
argumentativa traçada pela defesa, não verifico, ao menos initio litis, no que
tange aos próprios fundamentos para a preventiva, a existência do aventado
constrangimento ilegal por ausência de motivação idônea, na medida em que
o decisum realçou o seguinte (fl. 165, grifei):
É evidente que a conduta de Atila coloca em risco concretamente
a ordem pública, uma vez que este investigado demonstrou
descaso com a Justiça, atuando em contrariedade com os
princípios constitucionais que regem a Administração Pública.
A concreta possibilidade de reiteração criminosa é evidenciada
pela clara intenção do investigado em manter as atividades
criminosas, uma vez que, mesmo já tendo sido preso
anteriormente e mesmo tendo sido afastado de suas funções
como Prefeito Municipal, Átila não deixou de delinquir e
continuava no comando do esquema criminoso.
Aliás, as medidas diversas da prisão anteriormente impostas
a Atila não foram suficientes para impedir que o investigado
voltasse a praticar crimes.
Note-se, por exemplo, que Átila foi reconduzido ao cargo de
Prefeito Municipal em 11/09/2018. Contudo, ainda afastado de
suas funções junto à municipalidade, os delitos continuaram
sendo perpetrados, a exemplo da realização, em 26/07/2018,
do pregão relativo ao procedimento licitatório n° 73/2018,
nitidamente fraudado.
Como se observa, a decisão impugnada apontou, ao menos em
princípio, nova situação concreta que justifica a constrição cautelar, isto é,
mesmo após a imposição de medidas cautelares pelo STF, o paciente, pelo que
se deduz do referido decisum, continuou a delinquir. Segundo a orientação desta
Corte, "evidenciada na reiteração delitiva, tendo em vista que já haviam sido
aplicadas medidas cautelares em outro processo, mas foram ineficazes para
evitar novo envolvimento com crime [...], não há que se falar em ilegalidade do
decreto de prisão preventiva" (RHC n. 98.609/MG, Rel. Ministro Nefi
Cordeiro, DJe 16/11/2018).
À vista do exposto, indefiro a liminar.
Solicitem-se informações ao Tribunal de origem.
Depois, encaminhem-se os autos ao Ministério Público Federal.
Publique-se e intimem-se.
Brasília (DF), 19 de dezembro de 2018.
Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ
Relator