Acusada de tentar vender gerador cedido pela Eletronorte a comunidade do Pará permanece presa

Acusada de tentar vender gerador cedido pela Eletronorte a comunidade do Pará permanece presa

Uma líder comunitária presa em flagrante por supostamente tentar vender um gerador cedido pela Eletronorte à comunidade do Chipaiá, em Cachoeira do Arari (PA), teve pedido de liberdade indeferido pela presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministra Laurita Vaz. À época da prisão, junho de 2018, a mulher era presidente da Associação dos Pescadores Artesanais, Agricultores Familiares e Povos Tradicionais de Chipaiá.

Segundo o auto da prisão em flagrante – posteriormente convertida em preventiva –, o motor gerador foi anunciado em um portal de vendas de produtos na internet. Ainda de acordo com o auto de prisão, a presidente da associação e outro associado teriam confessado que, quando colocaram o gerador à venda, não entraram em contato com a Eletronorte nem pediram autorização para alienar o bem.

Por meio de habeas corpus, a defesa da líder comunitária alega que o decreto de prisão não foi devidamente fundamentado. A defesa também questiona a legalidade da prisão em virtude da não realização de audiência de custódia.

Bem público

Na decisão em que indeferiu o pedido de liminar, a ministra Laurita Vaz destacou que, ao converter a prisão em flagrante em preventiva, o magistrado apontou que os membros da associação utilizaram suas funções para se desfazer do gerador cedido pela Eletronorte em benefício da comunidade rural. A presidente do STJ também ressaltou que o Tribunal de Justiça do Pará rejeitou pedido liminar de liberdade por considerar devidamente fundamentado o decreto prisional.

Diante desses fundamentos, a ministra afirmou que não se observa, ao menos à primeira vista, “nenhuma teratologia – até porque concretamente fundamentada a decisão –, em especial por se tratar de Paciente que, em princípio, se apropriou de bem público com a intenção de vendê-lo, obtendo vantagem ilícita em detrimento do patrimônio de sociedade de economia mista federal”.

O mérito do habeas corpus será julgado pela Sexta Turma do STJ, sob relatoria do ministro Rogerio Schietti Cruz. 

HABEAS CORPUS Nº 457.005 - PA (2018/0161004-2)
RELATOR : MINISTRO ROGERIO SCHIETTI CRUZ
IMPETRANTE : EWERTON FREITAS TRINDADE
ADVOGADO : EWERTON FREITAS TRINDADE - PA009102
IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ
PACIENTE : SUZETE DA LUZ SILVA (PRESO)
DECISÃO
Vistos, etc.
Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado em favor de
SUZETE DA LUZ SILVA, em face de decisão indeferitória de pedido de urgência proferida
por Desembargadora do Tribunal de Justiça do Estado do Pará (HC n.º
0805074-11.2018.8.14.0000).
Consta dos autos que a Paciente foi presa em flagrante delito em 27/06/2018,
tendo sido convertida em custódia preventiva no dia 28/6/2018, pela suposta prática dos
delitos tipificados nos arts. 168 e 171, ambos do Código Penal, pois, "[...] no dia 26.06.2018,
por volta de 21h11min, os flagranteados, estariam anunciando no site OLX a venda de 01
(um) MOTOR (GERADOR) MARCA STEMAC, que supostamente teria sido cedido pela
empresa ELETRONORTE à Comunidade do Chipaiá " (fl. 39).
Irresignada, a Defesa impetrou habeas corpus na origem, ficando indeferido o
pedido liminar.
No presente writ, o Impetrante sustenta que o decreto prisional não foi
devidamente fundamentado e que não estão presentes os requisitos para a decretação da
prisão preventiva. Também alega que "[...] a paciente é, atualmente, submetida a prisão
ilegal, uma vez que não foi realizada audiência de custódia " (fl. 5).
Assevera que o óbice da Súmula n.º 691/STF deve ser superado em virtude da
manifesta ilegalidade do decisum impugnado.
Requer, inclusive liminarmente, a imediata soltura da Paciente.
É o relatório inicial.
Decido o pedido urgente.
Consoante posicionamento firmado pelo Supremo Tribunal Federal e por esta
Corte, não se admite habeas corpus contra decisão negativa de liminar proferida em outro
writ na instância de origem, sob pena de indevida supressão de instância.
É o que está sedimentado na Súmula n.º 691/STF ("[n]ão compete ao Supremo
Tribunal Federal conhecer de habeas corpus impetrado contra decisão do Relator que, em
habeas corpus requerido a tribunal superior, indefere a liminar "), aplicável, mutatis

mutandis, ao Superior Tribunal de Justiça (HC 323.373/AgRg-PR, Rel. Min. REYNALDO
SOARES DA FONSECA, 5.ª Turma, DJe de 17/06/2015; HC 274.058/AgRg-RJ, 6.ª Turma,
Rel. Min. ROGÉRIO SCHIETTI, DJe de 19/12/2013; HC 274.845/SP, 4.ª Turma, Rel. Min.
NANCY ANDRIGHI, DJe de 29/11/2013; HC 260.126/SE, 4.ª Turma, Rel. Min. MARIA
ISABEL GALLOTTI, DJe de 29/11/2013, v.g.).
A despeito de tal óbice processual, tem-se entendido que, em casos
excepcionais, deve preponderar a necessidade de se garantir a efetividade da prestação da
tutela jurisdicional de urgência para que flagrante constrangimento ilegal ao direito de
liberdade possa ser cessado – tarefa a ser desempenhada caso a caso.
Todavia, esse atalho não pode ser ordinariamente admitido, salvo nas hipóteses
em que se evidenciar situação absolutamente teratológica e desprovida de qualquer
razoabilidade, mormente por forçar o pronunciamento adiantado da instância superior,
suprimindo a competência da inferior, subvertendo a regular ordem do processo.
Em exame prelibatório, não constato excepcionalidade que pudesse ensejar a
superação do óbice sumular acima referido.
Confira-se, por oportuno, os seguintes trechos da decisão impugnada (fls.
36-38, grifou-se):
"[...]
Segundo o auto do flagrante, obtido sem o contraditório e a ampla
defesa, a paciente, no dia 26/06/2018, por volta de 21h11m, estaria
anunciando no site OLX a venda de 01 (um) motor (gerador), marca
STEMAC, que supostamente teria sido cedido pela Empresa Eletronorte à
Comunidade do Chipaiá, localidade da zona rural do município de
Cachoeira do Arari/PA . [...]
Examinando atentamente os autos, não vislumbro presentes os
requisitos indispensáveis à concessão da liminar requerida, quais sejam, o
fumus boni juris e o periculum in mora, razão pela qual, a indefiro . Da análise da decisão que homologou o flagrante e o converteu em
prisão preventiva, datada de 28/06/2018, e dos demais documentos juntados
ao writ no Processo Judicial Eletrônico (PJE), observa-se, em um juízo
perfunctório, a existência de fundamentos e motivos aptos à decretação da
prisão cautelar da paciente, acusada da prática dos crimes de apropriação
indébita (art. 168 do CP) e estelionato, constante no art. 171 do CPB.
Segundo o magistrado singular, 'verifica-se a presença do requisito
relativo à garantia da ordem pública, tendo em vista que, uma vez posto em
liberdade, há sério e concreto risco de reiteração delituosa por parte dos
investigados, considerando que o bem fora cedido para a comunidade e se
utilizaram de suas funções na associação para se desfazer do gerador que
nunca foi utilizado com a devida finalidade como os próprios depoimentos
dos flagranteados acusam. (...) Presentes, portanto, os requisitos legais da
prisão preventiva, mostrando-se apta e necessária para o devido acautelamento

dos suspeitos da referida trama delituosa (...)'. Mostra-se inviável acolher a pretensão sumária, porquanto se
observa a existência de fundamentação apta à manutenção da prisão cautelar
da paciente, o que justifica, ao menos, por ora, a preservação da segregação
preventiva, devendo ser ouvida a autoridade coatora a respeito do alegado na
impetração ".
Diante dos fundamentos supratranscritos, em que não se observa, ao menos
primo ictu oculi, nenhuma teratologia – até porque concretamente fundamentada a decisão –,
em especial por se tratar de Paciente que, em princípio, se apropriou de bem público com a
intenção de vendê-lo, obtendo vantagem ilícita em detrimento do patrimônio de sociedade de
economia mista federal, não há como se reconhecer, de plano, ilegalidade patente que
autorize a mitigação da Súmula n.º 691 do Supremo Tribunal Federal, cuja essência vem
sendo reiteradamente ratificada por julgados do Pretório Excelso e deste Superior Tribunal de
Justiça.
De outra parte, "[...] A posterior conversão do flagrante em prisão preventiva - por constituir novo título a legitimar a constrição cautelar - torna superada a alegação de
nulidade decorrente da ausência de audiência de custódia " (RHC 82.754/RS, Rel. Ministro
ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 22/05/2018, DJe 06/06/2018).
Destaque-se que, não havendo notícia de que o Tribunal a quo tenha procedido
ao exame meritório, reserva-se primeiramente àquele órgão a apreciação da matéria ventilada
no habeas corpus originário, sendo defeso ao Superior Tribunal de Justiça adiantar-se nesse
exame, sobrepujando a competência da Corte Estadual, mormente se o writ está sendo
regularmente processado.
Nesse diapasão, os seguintes precedentes: AgRg no HC 305.277/SP, Rel.
Ministro GURGEL DE FARIA, QUINTA TURMA, DJe de 27/11/2014; AgRg no HC
238.461/SP, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, DJe de 23/10/2012.
Ante o exposto, INDEFIRO o pedido liminar. Solicitem-se informações ao Tribunal de Justiça do Estado do Pará.
Após, remetam-se os autos ao Ministério Público Federal para o parecer.
Publique-se. Intimem-se.
Brasília (DF), 04 de julho de 2018.
MINISTRA LAURITA VAZ
Presidente

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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