Ação que discute se MT emitiu nota técnica para beneficiar empreiteiras será julgada pela Justiça Federal

Ação que discute se MT emitiu nota técnica para beneficiar empreiteiras será julgada pela Justiça Federal

A Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho manteve a declaração de incompetência da Justiça do Trabalho para julgar ação civil pública na qual o Ministério Público do Trabalho (MPT) sustenta que o Ministério do Trabalho (MT), por motivação política, teria emitido nota técnica para isentar empreiteiras de cumprir instrução normativa do próprio órgão relativa ao recrutamento e ao transporte de trabalhadores para atuarem em grandes obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e dos eventos esportivos que seriam sediados pelo Brasil (Copa do Mundo de 2014 e Olimpíadas de 2016). Segundo a Turma, a questão é de natureza administrativa, pois trata de suposto conflito entre normas de proteção do trabalho editadas pelo órgão competente.

Entenda o caso

Em ação civil pública (ACP) ajuizada na Vara do Trabalho de Nossa Senhora da Glória (SE), o MPT sustentava que a Construções e Comércio Camargo Corrêa S/A estaria recrutando pessoas no sertão do estado para atuar em suas obras sem observar os procedimentos previstos na Instrução Normativa 90/2011 do Ministério do Trabalho, que visa à proteção de trabalhadores em situações de deslocamentos maciços e de permanência por longo período em locais distantes de sua origem. O documento, segundo o MPT, “representa grande avanço social e facilita a atividade fiscalizatória do Estado”, pois permite ao MT monitorar as condições de trabalho nessas condições.

Na audiência dessa primeira ACP, a empreiteira apresentou em sua defesa a Nota Técnica 162/2012 do Ministério do Trabalho, que afastava a aplicação da IN 90 às construtoras signatárias do Compromisso Nacional para Aperfeiçoar as Condições de Trabalho na Indústria da Construção. O compromisso teve vigência de 2012 a 2014 e foi firmado entre a Presidência da República e representantes de empresas e de empregados.

Em nova ação civil pública, desta vez contra a União, o MPT pretendia que o Ministério do Trabalho passasse a aplicar a Instrução Normativa 90/2011 a todas as empresas que recrutassem empregados para trabalhar em localidade diversa da sua origem e se abstivesse de aplicar a Nota Técnica 162/2012 ou o entendimento nela contido. Como principal argumento, apontou que a nota “é de natureza estritamente política, e não jurídica” e viola diversos princípios e regras do Estado Democrático de Direito, como a segurança jurídica dos trabalhadores recrutados, a isonomia entre empregadores e a livre concorrência. “Alguns empregadores poderão ser alvo dos rigores da IN 90/2011, enquanto os signatários do Compromisso Nacional para Aperfeiçoar as Condições de Trabalho na Indústria da Construção não precisam se preocupar, pois a inspeção do trabalho não vai exigir o seu cumprimento”, sustentou.

Ainda segundo o MPT, o recrutamento informal de empregados, à margem da IN 90/2011, “pode descambar (e geralmente descamba) para o aliciamento de trabalhadores, tipo penal previsto no artigo 207 do Código Penal”. Este, por sua vez, “é porta de entrada para outro crime, o da redução de trabalhadores a condições análogas à de escravos”.

Competência

O juízo da 5ª Vara do Trabalho de Aracaju (SE) julgou procedente o pedido formulado pelo MPT. Em recurso ordinário, a União questionou a competência da Justiça do Trabalho e sustentou que o Compromisso Nacional para Aperfeiçoar as Condições de Trabalho na Indústria da Construção concedeu mais garantias aos trabalhadores recrutados em relação às previstas na IN 90.

O Tribunal Regional do Trabalho da 20ª Região (SE) acolheu a arguição de incompetência. “Não cabe à Justiça do Trabalho imiscuir-se, abstratamente, na competência normativa dos órgãos executivos”, registrou o acórdão. O TRT, no entanto, extinguiu o processo em razão da incompatibilidade dos sistemas de tramitação dos processos eletrônicos da Justiça do Trabalho e da Justiça Federal.

No recurso de revista ao TST, o MPT sustentou que a ação dizia respeito às penalidades administrativas previstas no texto constitucional e à atuação omissiva dos órgãos de fiscalização das relações de trabalho, que, de acordo com o artigo 114, inciso VII, da Constituição da República, se inserem na competência da Justiça do Trabalho.

A relatora, ministra Cristina Peduzzi, manteve o entendimento de que a competência é da Justiça Federal. Ela frisou que a competência da Justiça do Trabalho se restringe a demandas em que haja atos concretos de polícia administrativa frente a um empregador (ou vários) no contexto de fiscalização das relações de trabalho, o que não era o caso da ACP.

Incompatibilidade de sistemas

A relatora ressaltou, no entanto, que a extinção do processo por incompatibilidade técnica dos sistemas eletrônicos pode trazer prejuízos ao jurisdicionado e observou que o artigo 12, parágrafo 2º, da Lei 11.419/2006 determina que os processos eletrônicos que tiverem de ser remetidos a outro juízo ou instância superior que não disponha de sistema compatível deverão ser impressos em papel, “mesmo que sejam de natureza criminal, trabalhista ou pertinente a juizado especial”.

Por unanimidade, a Turma deu provimento ao recurso para, mantida a declaração de incompetência da Justiça do Trabalho, determinar a remessa da ação civil pública à Justiça Federal.

Processo: RR-20298-98.2012.5.20.0005

RECURSO DE REVISTA – INCOMPETÊNCIA
ABSOLUTA DA JUSTIÇA DO TRABALHO EM RAZÃO
DA MATÉRIA – OBRIGAÇÃO DE FAZER E NÃO
FAZER IMPOSTA AO MINISTÉRIO DO TRABALHO
E EMPREGO – APLICABILIDADE DE NORMAS DE
PROTEÇÃO AO TRABALHO EDITADAS PELO
MESMO ÓRGÃO EM APARENTE CONFLITO –
MATÉRIA DE NATUREZA ADMINISTRATIVA -
REMESSA DOS AUTOS AO JUÍZO COMPETENTE
1. A competência da Justiça do Trabalho,
nos termos do art. 114, VII, da
Constituição da República,
restringe-se a ações em que haja atos
concretos de polícia administrativa
frente a um empregador (ou uma
pluralidade destes) no contexto de
fiscalização das relações de trabalho,
o que não é a hipótese da presente Ação
Civil Pública.
2. No caso dos autos, a questão posta é
nitidamente de natureza
administrativa, pois concernente a
suposto conflito, em abstrato, entre
normas de proteção do trabalho,
editadas pelo órgão competente
(SIT/MTE). Mantém-se o reconhecimento
da competência da JF para a apreciação
e julgamento da presente ação
3. O art. 113, § 2º, do CPC de 1973 (art.
64, § 3º, do NCPC) determina que,
declarada a incompetência absoluta,
devem ser os autos remetidos ao juiz
competente. Eventual incompatibilidade
técnica entre os sistemas de tramitação
dos processos eletrônicos das Justiças
do Trabalho e Federal é solucionável
pela observância do art. 12, § 2º, da Lei
nº 11.419/2006.
Recurso de Revista conhecido
parcialmente e provido.

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (TST - Tribunal Superior do Trabalho) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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