Multa cominatória de R$ 2 milhões pode ser excluída se banco comprovar impossibilidade de cumprir obrigação

Multa cominatória de R$ 2 milhões pode ser excluída se banco comprovar impossibilidade de cumprir obrigação

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento a um recurso do Banco Santander para que o juízo de origem analise se houve justa causa no descumprimento da obrigação de transferir imediatamente ações a um cliente. O descumprimento da obrigação gerou multa cominatória (astreintes) superior a R$ 2 milhões. Segundo o banco, a obrigação não podia ser cumprida, razão pela qual não é devida a multa cominatória.

Na origem, foi estabelecida a multa de R$ 10 mil reais por dia de descumprimento da ordem judicial, reduzida posteriormente para R$ 500. Segundo o autor da ação que pleiteou a transferência das ações, o banco não cumpriu a obrigação por mais de seis anos.

O relator do recurso no STJ, ministro Villas Bôas Cueva, afirmou que a decisão que estabelece astreintes não preclui, motivo pelo qual o juízo de origem deverá apreciar as alegações apresentadas pelo banco quanto à suposta impossibilidade de cumprir com a obrigação. O relator destacou os argumentos da instituição financeira que poderiam justificar o não cumprimento da obrigação, ou a redução do valor da multa.

“A executada apontou fatos supervenientes ao acórdão que reduziu o montante da multa cominatória, os quais impossibilitariam o cumprimento, ao menos em parte, da obrigação de fazer e que não foram apreciados pelas instâncias ordinárias”, disse o ministro. Dessa forma, segundo ele, os fatos narrados são relevantes e devem ser apreciados pelo juízo competente.

Villas Bôas Cueva afirmou que a multa cominatória tem por finalidade constranger o devedor a cumprir a obrigação, mas, por não constituir coisa julgada, o valor arbitrado pode ser revisto, e uma das possibilidades de revisão é a justa causa para o descumprimento da obrigação principal, como alegou o banco.

Seguro judicial

O recurso também foi provido para que seja aceito o seguro garantia judicial oferecido pelo banco na causa. Segundo o relator, o seguro oferece forte proteção às duas partes do processo, sendo instrumento sólido para garantir a satisfação de crédito.

“Dentro do sistema de execução, a fiança bancária e o seguro garantia judicial produzem os mesmos efeitos jurídicos que o dinheiro para fins de garantir o juízo, não podendo o exequente rejeitar a indicação, salvo por insuficiência, defeito formal ou inidoneidade da salvaguarda oferecida”, declarou o relator.

Villas Bôas Cueva destacou que o seguro garantia judicial harmoniza o princípio da máxima eficácia da execução para o credor com o princípio da menor onerosidade para o executado, conferindo proporcionalidade aos meios de satisfação de crédito. O ministro lembrou ainda que, com o Código de Processo Civil de 2015, o seguro se equiparou a dinheiro, não havendo razão para a mera rejeição da garantia, como ocorreu no caso.

O provimento do recurso acarretou ainda o afastamento da multa protelatória aplicada em sede de embargos de declaração, bem como da multa de 10% pelo não adimplemento espontâneo da obrigação de pagar no cumprimento de sentença, dada a iliquidez do título.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.691.748 - PR (2017/0201940-6)
RELATOR : MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA
RECORRENTE : BANCO SANTANDER BRASIL S/A
ADVOGADOS : PAULO CÉZAR PINHEIRO CARNEIRO - RJ020200
CARLOS EDUARDO PIANOVSKI - PR029926
ADVOGADOS : MELINA GIRARDI FACHIN - PR040856
MARCOS ALBERTO ROCHA GONÇALVES - PR042330
FLAVIO MAIA FERNANDES DOS SANTOS E OUTRO(S) - SP270686
MARIANA MARQUES CALFAT - SP319517
RECORRIDO : MARIA AMÉLIA FORATORI BALLOTTO
ADVOGADOS : MERCIO DE MACEDO GALVÃO - PR011504
ADRIANE RAVELLI E OUTRO(S) - PR045207
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. IMPUGNAÇÃO AO CUMPRIMENTO
DE SENTENÇA. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. SÚMULA Nº
284/STF. ASTREINTES . VALOR. ALTERAÇÃO. POSSIBILIDADE. PRECLUSÃO.
INEXISTÊNCIA. OBRIGAÇÃO DE FAZER. DESCUMPRIMENTO. JUSTA CAUSA.
VERIFICAÇÃO. NECESSIDADE. MULTA DO ART. 475-J DO CPC/1973.
INAPLICABILIDADE. TÍTULO JUDICIAL ILÍQUIDO. PENHORA. SEGURO GARANTIA
JUDICIAL. INDICAÇÃO. POSSIBILIDADE. EQUIPARAÇÃO A DINHEIRO. PRINCÍPIO
DA MENOR ONEROSIDADE PARA O DEVEDOR E PRINCÍPIO DA MÁXIMA
EFICÁCIA DA EXECUÇÃO PARA O CREDOR. COMPATIBILIZAÇÃO. PROTEÇÃO
ÀS DUAS PARTES DO PROCESSO.
1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de
Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ).
2. A alegação genérica da suposta violação do art. 1.022, II, do CPC/2015, sem
especificação das teses que teriam restado omissas pelo acórdão recorrido, atrai a
incidência da Súmula nº 284/STF.
3. A decisão que arbitra astreintes , instrumento de coerção indireta ao cumprimento
do julgado, não faz coisa julgada material, podendo, por isso mesmo, ser modificada,
a requerimento da parte ou de ofício, seja para aumentar ou diminuir o valor da multa
ou, ainda, para suprimi-la. Precedentes.
4. Nos termos do art. 537 do CPC/2015, a alteração do valor da multa cominatória
pode ser dar quando se revelar insuficiente ou excessivo para compelir o devedor a
cumprir o julgado, ou caso se demonstrar o cumprimento parcial superveniente da
obrigação ou a justa causa para o seu descumprimento. Necessidade, na hipótese, de
o magistrado de primeiro grau apreciar a alegação de impossibilidade de cumprimento
da obrigação de fazer conforme o comando judicial antes de ser feito novo cálculo
pela Contadoria Judicial.
5. Não há como aplicar, na fase de cumprimento de sentença, a multa de 10% (dez
por cento) prevista no art. 475-J do CPC/1973 (atual art. 523, § 1º, do CPC/2015) se a
condenação não se revestir da liquidez necessária ao seu cumprimento espontâneo.
6. Configurada a iliquidez do título judicial exequendo (perdas e danos e astreintes ),
revela-se prematura a imposição da multa do art. 475-J do CPC/1973, sendo de rigor
o seu afastamento.
7. O CPC/2015 (art. 835, § 2º) equiparou, para fins de substituição da penhora, a
dinheiro a fiança bancária e o seguro garantia judicial, desde que em valor não inferior
ao do débito constante da inicial da execução, acrescido de 30% (trinta por cento).
8. O seguro garantia judicial, espécie de seguro de danos, garante o pagamento de
valor correspondente aos depósitos judiciais que o tomador (potencial devedor)
necessite realizar no trâmite de processos judiciais, incluídas multas e indenizações. A
cobertura terá efeito depois de transitada em julgado a decisão ou o acordo judicial

favorável ao segurado (potencial credor de obrigação pecuniária sub judice) e sua
vigência deverá vigorar até a extinção das obrigações do tomador (Circular SUSEP nº
477/2013). A renovação da apólice, a princípio automática, somente não ocorrerá se
não houver mais risco a ser coberto ou se apresentada nova garantia.
9. No cumprimento de sentença, a fiança bancária e o seguro garantia judicial são as
opções mais eficientes sob o prisma da análise econômica do direito, visto que
reduzem os efeitos prejudiciais da penhora ao desonerar os ativos de sociedades
empresárias submetidas ao processo de execução, além de assegurar, com eficiência
equiparada ao dinheiro, que o exequente receberá a soma pretendida quando obter
êxito ao final da demanda.
10. Dentro do sistema de execução, a fiança bancária e o seguro garantia judicial
produzem os mesmos efeitos jurídicos que o dinheiro para fins de garantir o juízo, não
podendo o exequente rejeitar a indicação, salvo por insuficiência, defeito formal ou
inidoneidade da salvaguarda oferecida.
11. Por serem automaticamente conversíveis em dinheiro ao final do feito executivo, a
fiança bancária e o seguro garantia judicial acarretam a harmonização entre o
princípio da máxima eficácia da execução para o credor e o princípio da menor
onerosidade para o executado, a aprimorar consideravelmente as bases do sistema
de penhora judicial e a ordem de gradação legal de bens penhoráveis, conferindo
maior proporcionalidade aos meios de satisfação do crédito ao exequente.
12. No caso, após a definição dos valores a serem pagos a título de perdas e danos e
de astreintes , nova penhora poderá ser feita, devendo ser autorizado, nesse instante,
o oferecimento de seguro garantia judicial pelo devedor, desde que cubra a
integralidade do débito e contenha o acréscimo de 30% (trinta por cento), pois, com a
entrada em vigor do CPC/2015, equiparou-se a dinheiro.
13. Não evidenciado o caráter protelatório dos embargos de declaração, impõe-se a
inaplicabilidade da multa prevista no § 2º do art. 1.026 do CPC/2015. Incidência da
Súmula nº 98/STJ.
14. Recurso especial provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos, em que são partes as acima indicadas, decide a
Terceira Turma, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr.
Ministro Relator. Os Srs. Ministros Marco Aurélio Bellizze (Presidente), Moura Ribeiro e Paulo de
Tarso Sanseverino votaram com o Sr. Ministro Relator.
Impedida a Sra. Ministra Nancy Andrighi.
Brasília (DF), 07 de novembro de 2017(Data do Julgamento)
Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA - Relator

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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