Cabe multa cominatória em ação de fornecimento de dados para identificar ofensor virtual

Cabe multa cominatória em ação de fornecimento de dados para identificar ofensor virtual

Para a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), é possível a imposição de multa cominatória no âmbito de ação cautelar, quando se pretende o fornecimento de dados para identificação de usuário de provedor de acesso à internet, de modo a permitir eventual ação indenizatória futura.

Com base nesse entendimento, o colegiado negou provimento a recurso da Telemar Norte Leste que questionava a aplicação de multa cominatória em ação cautelar de exibição de documentos.

A controvérsia envolveu ação que pedia o fornecimento de dados para identificação de usuário da Telemar que teria ofendido, com comentários na internet, a Petrobras e seus dirigentes.

Em primeiro grau, foi julgado procedente o pedido de fornecimento de dados que possibilitassem a identificação do usuário, o qual teria causado danos à reputação da empresa e de seus administradores.

Confirmando a sentença, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) determinou a prestação das informações requeridas, no prazo de 15 dias, sob pena de multa diária no valor de R$ 50.

Após ter sua apelação negada pelo TJRJ, a Telemar recorreu ao STJ argumentando que na ação cautelar de exibição de documentos não cabe a aplicação de multa cominatória, conforme preceitua aSúmula 372/STJ.

Obrigação de fazer

O relator, ministro Luis Felipe Salomão, afirmou que, na hipótese dos autos, a pretensão cautelar busca o fornecimento de dados para identificação de suposto ofensor da imagem da estatal e de seus dirigentes. "Evidencia-se a preponderância da obrigação de fazer, consistente no ato de identificação do usuário do serviço de internet", afirmou.

Segundo o ministro, a obrigação de fazer difere da pretensão cautelar de exibição de documento. "No meu sentir, tal obrigação, certificada mediante decisão judicial, de prestar informações para identificação de ofensor usuário da internet, não se confunde com a pretensão cautelar de exibição de documento, a qual era regulada pelo artigo 844 do Código de Processo Civil de 1973", destacou.

No caso em análise, esclareceu o relator, os autores da ação não buscavam a exibição de um documento específico, mas, sim, o fornecimento de informações aptas a identificar usuário do serviço prestado pela Telemar.

Salomão lembrou que há, desde 2009, recomendação do Comitê Gestor de Internet no Brasil no sentido de que os provedores de acesso mantenham, por um prazo mínimo de três anos, os dados de conexão e comunicação realizadas por meio de seus equipamentos.

O ministro observou que julgado recente da Terceira Turma (REsp 1.622.483) reconheceu a obrigação do provedor de acesso à internet de fornecer, com base no endereço de IP (Internet Protocol), os dados cadastrais de usuário autor de ato ilícito, ainda que em data anterior à Lei 12.965/2014, quando solicitado pelo Poder Judiciário.

Medidas inócuas

Salomão ressaltou que, no caso analisado, as sanções processuais aplicáveis à recusa de exibição de documento – presunção de veracidade dos fatos alegados pelo autor e busca e apreensão – seriam inócuas.

De acordo com o ministro, os fatos narrados na petição inicial – a serem oportunamente examinados em ação própria – dizem respeito a terceiro (o usuário a ser identificado pela requerida) e, além disso, não há documento a ser objeto de busca e apreensão, pois o fornecimento das informações pleiteadas pelas supostas vítimas exige somente pesquisa no sistema informatizado da Telemar.

Ao negar o recurso da empresa de internet, o relator destacou que as peculiaridades do caso concreto constituem distinguishing apto a afastar a incidência do entendimento firmado na Súmula 372/STJ e reafirmado no Tema 705 dos recursos repetitivos.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.560.976 - RJ (2012/0089933-0)
RELATOR : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO
RECORRENTE : TELEMAR NORTE LESTE S/A
ADVOGADOS : ANA CAROLINA REIS DO VALLE MONTEIRO E OUTRO(S) - RJ0123191
LUIZ FELIPE NEVES DO COUTO VARGAS - RJ0159050
BRUNO DI MARINO - RJ0093384
EVELYN WANZENIAK AGUIAR - RJ0169953
RECORRIDO : PETRÓLEO BRASILEIRO S A PETROBRAS
RECORRIDO : JOSE SERGIO GABRIELLI DE AZEVEDO
RECORRIDO : WILSON SANTAROSA
ADVOGADOS : NILTON ANTONIO DE ALMEIDA MAIA E OUTRO(S) - RJ0067460
LEONAN CALDERARO FILHO - RJ0064823
EDUARDO SILVA SANTIAGO - RJ0134133
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CAUTELAR INOMINADA AJUIZADA EM
FACE DE PROVEDOR DE ACESSO A INTERNET. ORDEM JUDICIAL
PARA FORNECIMENTO DE DADOS VISANDO À IDENTIFICAÇÃO DE
USUÁRIO (TERCEIRO), DE MODO A VIABILIZAR FUTURA AÇÃO
INDENIZATÓRIA. FIXAÇÃO DE MULTA DIÁRIA. SÚMULA 372/STJ.
INAPLICABILIDADE.
1. A multa cominatória (também chamada de astreintes, multa coercitiva
ou multa diária) é penalidade pecuniária que caracteriza medida executiva
de coerção indireta, pois seu único escopo é compelir o devedor a realizar
a obrigação de fazer ou a não realizar determinado comportamento.
Cuida-se de uma medida atípica de apoio à decisão judicial, de caráter
meramente persuasório e instrumental, não caracterizando um fim em si
mesmo.
2. No que diz respeito à obrigação de fazer, seu objeto consiste na
adoção de comportamento ativo que não se destina preponderantemente
a transferir a posse ou titularidade de coisa ou soma ao titular do direito.
Para sua constatação, é necessário investigar, dentre os diversos
aspectos da prestação (fazer, entregar, pagar), em qual deles reside o
núcleo do interesse objetivo.
3. Na hipótese dos autos, verifica-se que a pretensão cautelar reside no
fornecimento de dados para identificação de suposto ofensor da imagem
da sociedade de economia federal e de seus dirigentes. Assim,
evidencia-se a preponderância da obrigação de fazer, consistente no ato
de identificação do usuário do serviço de internet.
4. Tal obrigação, certificada mediante decisão judicial, não se confunde
com a pretensão cautelar de exibição de documento, a qual era regulada
pelo artigo 844 do CPC de 1973. Isso porque os autores da cautelar
inominada não buscaram a exibição de um documento específico, mas,
sim, o fornecimento de informações aptas a identificação do tomador do

serviço prestado pela requerida, sendo certo que, desde 2009, já havia
recomendação do Comitê Gestor de Internet no Brasil no sentido de que
os provedores de acesso mantivessem, por um prazo mínimo de três
anos, os dados de conexão e comunicação realizadas por meio de seus
equipamentos.
5. Além do mais, as sanções processuais aplicáveis à recusa de exibição
de documento – presunção de veracidade dos fatos alegados pelo autor e
busca e apreensão (artigos 359 e 362 do CPC de 1973) –, revelam-se
evidentemente inócuas na espécie. É que os fatos narrados na inicial – a
serem oportunamente examinados em ação própria – dizem respeito a
terceiro (o usuário a ser identificado pela requerida), inexistindo,
outrossim, documento a ser objeto de busca e apreensão, pois o
fornecimento das informações pleiteadas pelas supostas vítimas reclama,
tão somente, pesquisa no sistema informatizado da ré.
6. As citadas peculiaridades, extraídas do caso concreto, constituem
distinguishing apto a afastar a incidência do entendimento plasmado na
Súmula 372/STJ ("na ação de exibição de documentos, não cabe a
aplicação de multa cominatória") e reafirmado no Recurso Especial
repetitivo 1.333.988/SP ("descabimento de multa cominatória na exibição,
incidental ou autônoma, de documento relativo a direito disponível").
7. Recurso especial não provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, os Ministros da Quarta Turma do
Superior Tribunal de Justiça acordam, por unanimidade, negar provimento ao recurso
especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Raul Araújo, Antonio
Carlos Ferreira (Presidente) e Marco Buzzi votaram com o Sr. Ministro Relator.
Ausente, justificadamente, a Sra. Ministra Maria Isabel Gallotti.
Sustentou oralmente o Dr. THIAGO DRUMMOND DE PAULA LINS, pela parte
RECORRENTE – TELEMAR NORTE LESTE S/A.
Brasília (DF), 30 de maio de 2019(Data do Julgamento)
MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO
Relator

Esta notícia foi publicada originalmente em um site oficial (STJ - Superior Tribunal de Justiça) e não reflete, necessariamente, a opinião do DireitoNet. Permitida a reprodução total ou parcial, desde que citada a fonte. Consulte sempre um advogado.
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