Loja de materiais de construção é condenada por coagir cobrador a pedir demissão
A Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou recurso da manteve decisão que condenou a Dias e Dias Ltda., loja de materiais de construção de Primavera do Leste (MT), a indenizar um cobrador coagido pelo sócio da empresa a pedir demissão, sob ameaça de que, caso não o fizesse, “montaria uma justa causa” e “colocaria a polícia atrás dele”. A Turma considerou que a atitude afrontou os direitos da personalidade do trabalhador, justificando a reparação do dano.
Segundo registrado em boletim de ocorrência, o sócio proprietário da empresa chamou o cobrador no escritório, acusou-o de transportar a filha no horário de trabalho em veículo da empresa e o chamou de “drogado”, além de afirmar, na polícia, que ele teria furtado R$ 2 mil. O trabalhador disse que se recusou a assinar o termo de rescisão contratual no qual constava que a dispensa era por justa causa, e, na Justiça, pediu a retificação na Carteira de Trabalho para dispensa sem justa causa e indenização por dano moral.
A empresa, em sua defesa, alegou que a dispensa ocorreu por justa causa por ato de improbidade do empregado, que teria se apropriado de valores referentes a cobranças feitas junto a clientes.
O Tribunal Regional do Trabalho da 23ª Região (MT) verificou, com base em depoimento do gerente da empresa, que o cobrador não tinha acesso às notas de cobrança, e prestava contas diariamente das notas recebidas. Por isso, não acolheu a alegação relativa à apropriação de valores. Evidenciado o intuito de prejudicar o trabalhador e o ato ilícito, concluiu ser devida a reparação.
A empresa tentou destrancar o recurso com agravo ao TST, no qual alegou que cabia ao trabalhador demonstrar o alegado dano moral sofrido, pois a comunicação de ato ilícito às autoridades policiais e a consequente abertura de inquérito penal não poderia ser considerada causa para isso. O relator, ministro Lelio Bentes Corrêa, com base no princípio da livre apreciação das provas (artigo 131 do Código de Processo Civil de 1973 e no quadro descrito pelo Regional, considerou inócua a discussão sobre ônus da prova, que só teria relevância se não houvesse provas suficientes para solução da controvérsia, o que não foi o caso.
Por unanimidade, a Turma negou provimento ao agravo.
Processo: AIRR-34700-89.2010.5.23.0000
A C Ó R D Ã O
(1ª Turma)
RESCISÃO CONTRATUAL. JUSTA CAUSA. ÔNUS
DA PROVA. Nos termos das disposições
legais atinentes à distribuição do
encargo probatório nas reclamações
trabalhistas - artigos 818 da
Consolidação das Leis do Trabalho e 373,
I e II, do Código de Processo Civil de
2015 (artigo 333, I e II, do CPC de 1973)
-, compete ao reclamante o ônus de
comprovar os fatos constitutivos do
direito alegado na petição inicial e à
reclamada o encargo de demonstrar a
existência de fatos impeditivos,
modificativos ou extintivos do direito
vindicado pelo trabalhador.
Tratando-se de pretensão relativa à
desconstituição da justa causa e, por
conseguinte, à retificação da CTPS e ao
pagamento de verbas rescisórias,
compete ao empregador comprovar o justo
motivo da rescisão contratual, por ser
tal fato impeditivo da pretensão
obreira. Atribuindo a Corte de origem o
ônus da prova à demandada, decidiu em
consonância com as regras de
distribuição do encargo probatório.
Agravo de Instrumento a que se nega
provimento.
DANO MORAL. CARACTERIZAÇÃO. VALORAÇÃO
DA PROVA. O debate sobre a valoração da
prova efetivamente produzida tende à
reavaliação do conjunto probatório dos
autos, o que, induvidosamente, não
rende ensejo ao recurso de revista, em
face de sua natureza extraordinária.
Óbice da Súmula n.º 126 desta Corte
superior. No presente caso,
convenceu-se a Corte de origem, com base
nos elementos de prova, testemunhal e
documental, de que a reclamada, ao
coagir o reclamante a pedir demissão,
sob ameaça de que, caso assim não
fizesse, “iria montar uma ‘justa causa’
e colocaria a polícia atrás dele”,
afrontou os direitos da personalidade
do trabalhador, ensejando a reparação
do dano. Agravo de Instrumento a que se
nega provimento.
MULTA PREVISTA NO ARTIGO 477, § 8º, DA
CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO.
REVERSÃO DA JUSTA CAUSA. 1. Está
consolidado, neste colendo Tribunal
Superior, o entendimento de que o escopo
da penalidade prevista no artigo 477, §
8º, da Consolidação das Leis do Trabalho
é reprimir a atitude do empregador que
cause injustificado atraso no pagamento
das verbas rescisórias. 2. Nos termos do
artigo 477, § 8º, da Consolidação das
Leis do Trabalho, a inobservância da
obrigação de efetuar o pagamento das
verbas rescisórias no prazo legal
sujeitará o empresário infrator ao
pagamento de multa administrativa, bem
assim de “multa a favor do empregado, em
valor equivalente ao seu salário,
devidamente corrigido pelo índice de
variação do BTN, salvo quando,
comprovadamente, o trabalhador der
causa à mora”. 3. A controvérsia a
respeito da modalidade da rescisão
contratual, por si só, não tem o condão
de afastar a incidência da multa,
porquanto não se pode cogitar em culpa
do empregado, uma vez que cabe ao
empregador responder por seus atos.
Precedentes desta Corte superior. 4.
Não é outro o entendimento
jurisprudencial desta Corte superior,
consubstanciado no texto da Súmula n.º
462, segundo o qual “a circunstância de
a relação de emprego ter sido
reconhecida apenas em juízo não tem o
condão de afastar a incidência da multa
prevista no art. 477, §8º, da CLT. A
referida multa não será devida apenas
quando, comprovadamente, o empregado
der causa à mora no pagamento das verbas
rescisórias”. 5. Irretocável a decisão
proferida pelo Tribunal Regional, no
sentido de manter a condenação da
reclamada ao pagamento da multa em
questão. 6. Agravo de Instrumento a que
se nega provimento.
MULTA PELA INTERPOSIÇÃO DE EMBARGOS DE
DECLARAÇÃO PROTELATÓRIOS. A arguição de
violação do artigo 5º, LV, da
Constituição da República não se revela
capaz de impulsionar a pretensão
recursal relativa à exclusão da multa
aplicada, uma vez que o tema encontra
regência no parágrafo único do artigo
538 do Código de Processo Civil. Agravo
de Instrumento a que se nega provimento.