Proteção ao portador de HIV e do aidético na relação de trabalho

Proteção ao portador de HIV e do aidético na relação de trabalho

Enfoque trabalhista sobre a discriminação na relação de emprego aos portadores de HIV e aidéticos.

A s doenças sempre foram motivo de práticas discriminatórias. Algumas enfermidades, pela sua natureza, sua forma de exteriorização, não podem ser escondidas. Quando sua manifestação exterior não ocorre, a convivência social pode se dar de maneira relativamente normal. Entretanto, quando não mais pode-se esconder a doença, em virtude da discriminação, esconde-se o doente.

Sempre foi assim. Desde os tempos remotos, as vítimas de doenças que causam deformidades corporais foram sempre segregadas, condenadas a viverem fora do ciclo social. Assim ocorreu com os portadores de câncer, doentes mentais, entre outros. O quadro piorava, então, se a doença era contagiosa. Na antiguidade, os portadores de lepra eram jogados em vales para que ali continuassem sua sobrevivência e os parentes próximos apenas apareciam no local para, do alto dos montes que circundavam o vale, jogarem alimentos.

No Brasil, Antônio Francisco Lisboa, gênio do barroco, foi exemplo de discriminação por ser portador de doença degenerativa. A discriminação era tamanha que ele era obrigado a esconder-se para trabalhar. A aversão ao que é anormal na forma física do homem reflete no comportamento das pessoas de uma forma tão profunda, que as imperfeições corporais tomam dimensões tamanhas ao ponto de virarem referência. Assim ocorreu com o referido gênio barroco, também conhecido por aleijadinho.

Atualmente, não houve mudanças significativas nesse tipo de comportamento. Tudo aquilo que foge da normalidade ou até mesmo, que não se encontre dentro do padrão preestabelecido de comportamento ou forma física, é passível de discriminação. Assim se passa com a pessoa gorda, com a pessoa muito alta, com a pessoa muito baixa, com cegos, surdos-mudos, deficientes físicos, mancos, etc... E quando a deformidade é incurável, o preconceito aumenta.

De todas as discriminações, as piores, talvez, sejam aquelas que, como a dos portadores do vírus da AIDS e do aidético, acarretem a perda de emprego. Sem emprego não há salário, sem salário não há como manter-se com dignidade e tampouco dar continuidade ao tratamento de saúde. Na crise atual de empregos, encontrar novo emprego para quem é portador do vírus da AIDS ou aidético é praticamente impossível.

A síndrome da imunodeficiência adquirida, hoje, apesar de não ter cura, vem sendo bem controlada com o tratamento a base de coquitéis. É difícil encontrar um portador de HIV ou um aidético, possuidor de renda, pálido, magro, cambaleando pela rua. Esses doentes usam transportes coletivos, têm entrada livre em qualquer restaurante, bar noturno e, freqüentemente, conversamos e fazemos amizade com esses "anormais" por não desconfiármos de seu problema de saúde. Tanto é assim que todos os governos do mundo investem milhões em propagandas que incentivam o uso de preservativos, pois até o sexo com portadores de HIV e aidéticos não é proibido pelos médicos se efetuado com segurança. É a doença que não se vê, o inimigo invisível.

Dessa forma, se é comum manter relações com portadores de HIV e com aidéticos, inclusive sexuais, porque não permitir que esses ocupem um posto de trabalho? Engraçada é a posição da sociedade: desde que se ignore a doença na pessoa, qualquer relacionamento com ela é permitido. A partir do momento que se torna conhecido o estado de saúde da pessoa, visando a proteção dos demais membros da sociedade, faz-se necessária a segregação da pessoa doente?

Existem atividades, cujo exercício é plenamente compatível com os infectados e com os aidéticos: a contabilidade de empresas, o secretariado, a advocacia, vendas, entre outras. É claro que existem também as profissões que não são recomendáveis a esses doentes, mas não por uma questão de um pré conceito (preconceito), mas por cuidados, como as relacionadas à feitura de alimentos e as que requerem contato constante com sangue, como a enfermagem.

O preconceito em torno da AIDS, na maioria das vezes, assenta-se em torno da falta de informações a respeito da doença e de suas formas de contágio e ocorre de forma silenciosa, através da omissão.

Na esfera trabalhista, não existe uma norma que de modo expresso garanta a estabilidade de um soropositivo ou da pessoa que já desenvolveu a doença em seu emprego. Existe uma lei, a Lei 9.029/95 que proíbe discriminações para efeito de relações de emprego por motivo de raça, sexo, cor, estado civil. Mas o legislador deixou de fora outras hipóteses previstas expressamente na Constituição. Assim, o Judiciário trabalhista, não aplica a lei acima referida nos casos em que a discriminação decorre da referida doença. Entretanto, isso não significa que os juizes não estejam buscando uma solução para o caso. A jurisprudência vem fornecendo subsídios para os intérpretes. Na primeira instância, as sentenças tem sido marcadas pelo pioneirismo. São vários os casos de sentenças proferidas pelas Juntas de Conciliação e Julgamento, determinando a reintegração imediata de empregado infectado pelo vírus da AIDS ou aidético. Também, perante a segunda instância trabalhista, já são encontrados alguns julgados, coibindo a prática discriminatória contra aidéticos, como por exemplo: TRT 3ª Reg./MS 76/93 Rel. Juiz Dárcio Guimarães de Andrade; TRT 3ª Reg./RO 6763/94-Rel. Juiz Álfio Amaury dos Santos; TST/RR 221.7791/95.3-Ac. 2ª T, 3.473/97, 14.5.97-Rel. Min. Valdir Righetto.

Cabe aqui salientar sobre a existência de Projeto de Lei sob nº 41/99, do Deputado Paulo Rocha, que reapresenta o projeto da ex deputada Marta Suplicy, dispondo sobre alguns direitos básicos dos portadores do vírus da AIDS e dando outras providêcias.


REFERÊNCIAS:

Baseado no texto Proteção ao Portador do Vírus HIV e ao Aidético: enfoque trabalhista a um Projeto de Lei; Maria Elizabeth Antunes Lima.

Sobre o(a) autor(a)
Ana Carolina Dalcanale
Bacharel em Direito
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