O dano moral e o direito de resposta na justiça eleitoral

O dano moral e o direito de resposta na justiça eleitoral

Apenas na democracia é necessário a criação de mecanismos que viabilizem a recomposição dos danos morais causados pela seara eleitoral e o tratamento igualitário entre os candidatos.

Com o avizinhamento das eleições de 2012 para prefeito e vereador, já é possível notar o surgimento de declarações verbais, documentos e imagens que caracterizam crimes contra a honra, injúria, difamação e calúnia, tipos penais previstos tanto no Código Penal quanto na seara Eleitoral. A previsão deles nos códigos mencionados possuem a função de tutelar e proteger a imagem e honra do candidato ou partido político.

A liberdade de informação prevista no art. 220 da Constituição Federal de 1988, combinado com os incisos IV, XII e XIV do art. 5º do mesmo codex, dispõe que a manifestação do pensamento, criação, expressão e informação, sob qualquer forma, processo ou veículo, não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto na própria Constituição.

Apenas na democracia é necessário a criação de mecanismos que viabilizem a recomposição dos danos morais causados pela seara eleitoral e o tratamento igualitário entre os candidatos.

É natural que os indivíduos que participam do processo eleitoral possuem expectativas e ideologias próprias, sendo que no calor do embate político, envolvem-se em discussões acirradas e fervorosas que extrapolam um ambiente normal de exposição de idéias, não sendo raro ou mesmo incomum que ocorram afirmações que atingem o “direito da personalidade”. E, para os casos extremos, existe a incidência da Lei Eleitoral para nortear o ambiente das eleições e devolver através da recomposição pecuniária e do direito de resposta o equilíbrio entre os conflitantes e o status quo ante.

Mas existe uma diferença entre liberdade de expressão e direito à informação, sendo o primeiro um direito assegurado na Constituição, o segundo um direito coletivo. O “animus injuriandi” é outra fator fundamental na análise dos fatos.

A razoabilidade e proporcionalidade são outros princípios que devem imperar no sopesamento para a possibilidade de imputação da infração, porquanto se nenhum tipo de crítica ou de fato potencialmente ofensivo à honra pudesse ser divulgado, seria esvaziado a própria garantia de liberdade de expressão e o desenvolvimento da democracia. Não são poucos os autores que alertam para o perigo da beatificação dos políticos pela censura, que usam o Poder Público como mola ou mero joguete de interesses obscuros. Assim, as críticas sérias e sem excessos de linguagem, pautada em fundamentos, fatos e fontes sólidas, devem ser protegidas, até mesmo como garantia basilar do Estado Democrático de Direito.

A salvaguarda da honra abrange tanto a reputação do indivíduo perante a sociedade (aspecto objetivo), quanto sua auto-estima (aspecto subjetivo).

No Código Penal, encontram-se nos artigos 138 a 140:

“Art. 138 - Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato definido como crime:”

“Art. 139 - Difamar alguém, imputando-lhe fato ofensivo à sua reputação:”

“Art. 140 - Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro:”

Assim, as duas primeiras teriam afetação objetiva a reputação e imagem atingidas, a última de forma subjetiva a consciência do candidato.

E, tendo em vista o conhecido ambiente conturbado que o período eleitoral sempre fomentou a divulgação e propagação desses materiais criminosos, ainda em 65 os legisladores resolveram regulamentar os crimes contra a honra também na legislação eleitoral. E, como esses crimes foram aditivados pelas redes sociais e a facilidade na montagem e confecção daqueles, o tema recebe destaque.

A Lei n.° 4737 de 15 de julho de 1965, que instituiu o Código Eleitoral prevê nos artigos 324 a 326 que:

“Art. 243. Não será tolerada propaganda:

IX - que caluniar, difamar ou injuriar quaisquer pessoas, bem como órgãos ou entidades que exerçam autoridade pública.

O parágrafo primeiro assegura o direito à obtenção da indenização ainda que não seja promovida a ação criminal, imputando inclusive ao partido político a responsabilidade solidária, dependendo da relação com os fatos e/ou com os agentes ofensores:

§ 1º O ofendido por calúnia, difamação ou injúria, sem prejuízo e independentemente da ação penal competente, poderá demandar, no Juízo Civil a reparação do dano moral respondendo por êste o ofensor e, solidariamente, o partido político dêste, quando responsável por ação ou omissão a quem que favorecido pelo crime, haja de qualquer modo contribuído para êle.

§ 2º No que couber aplicar-se-ão na reparação do dano moral, referido no parágrafo anterior, os artigos. 81 a 88 da Lei nº 4117, de 27/08/1962. (Incluído pela Lei nº 4.961, de 4.5.1966)

O doutrinador Carlos Alberto Bittar, aduz que: "qualificam-se como morais os danos em razão da esfera da subjetividade, ou do plano valorativo da pessoa na sociedade, em que repercute o fato violador, havendo-se como tais aqueles que atingem os aspectos mais íntimos da personalidade humana (o da intimidade e da consideração pessoal), ou o da própria violação da pessoa no meio em que vive e atua (o da reputação ou da consideração social)" (Reparação civil por danos morais, RT, 1992, p. 41)”.

Em destaque o voto proferido no REsp 270.730, pela Ministra Nancy Andrighi, do STJ, ao asseverar, in verbis:

“a amplitude de que se utilizou o legislador, no art. 5º., inc. X da CF/88, deixou claro que a expressão ‘moral’, que qualifica o substantivo dano, não se restringe àquilo que é digno ou virtuoso de acordo com as regras de convivência social. É possível a concretização do dano moral, posto que a honra subjetiva tem termômetro próprio inerente a cada indivíduo. É o decoro, é o sentimento de auto-estima, de avaliação própria que possuem valoração individual, não se podendo negar esta dor de acordo com sentimentos alheios. A alma de cada um tem suas fragilidades próprias. Por isso, a sábia doutrina concebeu uma divisão no conceito de honorabilidade: honra objetiva, a opinião moral, social, profissional, religiosa que os outros têm sobre aquele indivíduo, e, honra subjetiva, a opinião que o indivíduo tem de si próprio. Uma vez vulnerado, por ato ilícito alheio, o limite valoração que exigimos de nós mesmos, surge o dever de compensar o sofrimento psíquico que o fato nos causar. É a norma jurídica incidindo sobre o acontecimento íntimo que se concretiza no mais recôndito da alma humana, mas o que o direito moderno sente orgulho de abarcar, pois somente uma compreensão madura pode ter direito reparável, com tamanha abstratividade” (grifado).

O Código Eleitoral inicia as reprimendas com a calúnia:

“Art. 324. Caluniar alguém, na propaganda eleitoral, ou visando fins de propaganda, imputando-lhe falsamente fato definido como crime:

Pena - detenção de seis meses a dois anos, e pagamento de 10 a 40 dias-multa.

§ 1° Nas mesmas penas incorre quem, sabendo falsa a imputação, a propala ou divulga.

§ 2º A prova da verdade do fato imputado exclui o crime, mas não é admitida:

I - se, constituindo o fato imputado crime de ação privada, o ofendido, não foi condenado por sentença irrecorrível;

II - se o fato é imputado ao Presidente da República ou chefe de governo estrangeiro;

III - se do crime imputado, embora de ação pública, o ofendido foi absolvido por sentença irrecorrível.”

Segue com a difamação:

“Art. 325. Difamar alguém, na propaganda eleitoral, ou visando a fins de propaganda, imputando-lhe fato ofensivo à sua reputação:

Pena - detenção de três meses a um ano, e pagamento de 5 a 30 dias-multa.

Parágrafo único. A exceção da verdade somente se admite se ofendido é funcionário público e a ofensa é relativa ao exercício de suas funções.”

E termina coma injúria e suas exceções:

“Art. 326. Injuriar alguém, na propaganda eleitoral, ou visando a fins de propaganda, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro:

Pena - detenção até seis meses, ou pagamento de 30 a 60 dias-multa.

§ 1º O juiz pode deixar de aplicar a pena:

I - se o ofendido, de forma reprovável, provocou diretamente a injúria;

II - no caso de retorsão imediata, que consista em outra injúria.

§ 2º Se a injúria consiste em violência ou vias de fato, que, por sua natureza ou meio empregado, se considerem aviltantes:

Pena - detenção de três meses a um ano e pagamento de 5 a 20 dias-multa, além das penas correspondentes à violência prevista no Código Penal.

“Art. 327. As penas cominadas nos artigos. 324, 325 e 326, aumentam-se de um terço, se qualquer dos crimes é cometido:

I - contra o Presidente da República ou chefe de governo estrangeiro;

II - contra funcionário público, em razão de suas funções;

III - na presença de várias pessoas, ou por meio que facilite a divulgação da ofensa.”

A divulgação de pesquisa eleitoral fraudulenta (art. 33, § § 3º e 4º c/c art 35 da Lei das Eleições), ainda é prática comum no período eleitoral e igualmente passível de ressarcimento aos prejudicados, sem prejuízos das multas eleitorais pertinentes.

A divulgação de fatos inverídicos é outra vertente que permeia os ilícitos eleitorais contra a honra:

Art. 323. Divulgar, na propaganda, fatos que sabe inveridicos, em relação a partidos ou candidatos e capazes de exercerem influência perante o eleitorado:

Pena - detenção de dois meses a um ano, ou pagamento de 120 a 150 dias-multa.

Parágrafo único. A pena é agravada se o crime é cometido pela imprensa, rádio ou televisão.”

A similaridade entre os textos do Código Penal e o Eleitoral, a exceção das expressões específicas ao direito eleitoral: na propaganda eleitoral, ou visando a fins de propaganda, aponta que os tipos penais atuarão praticamente da mesma forma, mas no caso as infrações cometidas no âmbito eleitoral, deverão guardar relação direta com propagandas eleitorais ou para obter vantagem eleitoral indireta.

Outro ponto relevante quanto à distinção entre os crimes previstos naqueles Códigos, reside no fato que no Código Penal referem-se à lesão de direito particular, promovida como ação penal privada (art. 145 do CP), mediante queixa do ofendido, enquanto no Código Eleitoral o interesse tutelado é mais amplo, abrangendo além da honra os direitos públicos subjetivos do eleitorado, promovidos através de ação penal pública incondicionada (art. 355 do CE), dada a afetação do Estado Democrático de Direito.

Tanto é clara essa distinção que o juiz federal Marllon Souza abriu prazo, de forma sábia e pioneira no país, para que os 11,5 mil eleitores de Santo Antônio do Levenger - Mato Grosso pudessem requerer indenização por danos morais, contra o prefeito Faustino Dias Neto do DEM, cassado após eleição municipal anulada por compra de votos.

Dado os crimes em xeque serem eminentemente de menor potencial ofensivo, a competência para o julgamento é do Juizado Especial Criminal, conforme previsão da Lei n.° 9.09/95 ou da Lei n.° 10.259/01, cujas aplicabilidades destinam-se também aos crimes eleitorais, conforme a conduta.

Na órbita da reparação, o direito de resposta é uma das garantias igualmente previstas na Carta Maior, conforme art. 5º, V:

"V - É assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da

indenização por dano material, moral ou à imagem".

O direito a resposta é o cotejo ao agravo, garantia da pessoa ofendida ao respectivo desagravo pelos meios utilizados pelo primeiro.

No âmbito eleitoral, o diploma legal que rege as eleições, ao se referir à propaganda ilícita no art. 243, assegurou o direito de resposta "a quem for injuriado, difamado ou caluniado através da imprensa, rádio, televisão, ou alto-falante, aplicando-se, no que couber, os arts. 90 e 96 da Lei 4.117, de 27 de agosto de 1962".

Tornou-se claro, especialmente pelos últimos escândalos envolvendo das grandes mídias brasileiras, que a imprensa efetivamente representa um dos poderes atuantes na sociedade e, no período eleitoral, sua atuação ganha relevo, eclodindo no abuso de comunicação por algumas entidades e jornalistas.

A Lei n.° 9.504 de 30 de setembro de 1997, que estabelece normas para as eleições, deixa claro o direito de resposta ao ofendido:

“Art. 58. A partir da escolha de candidatos em convenção, é assegurado o direito de resposta a candidato, partido ou coligação atingidos, ainda que de forma indireta, por conceito, imagem ou afirmação caluniosa, difamatória, injuriosa ou sabidamente inverídica, difundidos por qualquer veículo de comunicação social.”

O direito de resposta foi incluído ao texto legal em 66, assegurando ao ofendido, conter o abalo a imagem e honra, pelo meio utilizado pelo ofensor ou conforme a necessidade:

§ 3º É assegurado o direito de resposta a quem fôr, injuriado difamado ou caluniado através da imprensa rádio, televisão, ou alto-falante, aplicando-se, no que couber, os artigos. 90 e 96 da Lei nº 4117, de 27/08/1962. (Incluído pela Lei nº 4.961, de 4.5.1966)

A questão eleva-se aos ataques a imagem ou honra dos candidatos ou partidos para ganhar relevo sobre o próprio agressor, seus patrocinadores ou beneficiados, porquanto pessoas que não conseguem conviver em sociedade, respeitando direitos naturais dos seus adversários, será incapaz de aceitar qualquer política democrática e naturalmente embasada em opiniões e desejos contrários, pautando sua carreira política em achaque moral censurável.

Há que se lembrar que o Código Eleitoral foi publicado em 1965, durante o regime militar, onde se previa a além da indenização pecuniária como ressarcimento do dano moral, também o direito de resposta ao ofendido, independentemente (não de forma absoluta) da ação penal. Também era costume, a pré-determinação dos valores indenizatórios, do percentual mínimo ao máximo, a chamada tarifação do dano moral.

Ao menos esses parâmetros, até então previstos nos arts. 81 a 88 da Lei n.º 4.117 de 27 de agosto de 1962, foram revogados pelo art. 3º do Decreto Lei n.º 236/1967

Colaciona-se a jurisprudência abaixo como exemplo de demanda envolvendo o ressarcimento por danos morais a candidato ofendido por panfleto político:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. OFENSAS À HONRA PESSOAL PUBLICADAS EM PANFLETO POLÍTICO. Ofensas à honra pessoal de vereador, publicadas em panfleto político-partidário, geram danos morais. Dano moral é reputado como sendo a dor, vexame, sofrimento ou humilhação que, fugindo da normalidade, interfere no comportamento psicológico do indivíduo, causando aflições, angústia e desequilíbrio em seu bem-estar. No momento em que são divulgadas afirmações ofensivas em panfleto de partido político, resta caracterizada a violação à imagem e à honra. Essa violação induvidosamente feriu a intimidade do autor, na medida em que violou seus direitos subjetivos privados. A ofensa alcançou o complexo das relações sociais do demandante, vindo a atingir os chamados direitos da personalidade, especialmente sua integridade moral, componentes de sua esfera íntima, os quais se encontram protegidos pelo art. 5º, incisos V e X, da Constituição Federal. Considerando-se as peculiaridades do caso concreto, os parâmetros utilizados na doutrina e na jurisprudência, o montante de 20 salários mínimos nacionais, a título de indenização por danos morais, mostra-se adequado. Deram provimento ao apelo. (TJ/RS – Apelação Cível, 9ª Câmara, Processo nº 70006885933, Relator Adão Sérgio do Nascimento Cassiano, julgado em 22/03/2006)

Os membros do partido político agindo em nome da sigla e em defesa dos seus interesses também são partes legítimas para figurarem como réus solidários na ação indenizatória. O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul – TJRS, em entendimento unânime da 10ª Câmara Cível condenou o Partido dos Trabalhadores –PT, a indenizar em R$ 9.000,00 mil reais um homem caluniado por partidários, que o acusaram de compra de votos mediante entrega de saco de cimentos. (Processo n.º 70014374771)

Com o aprimoramento e desenvolvimento das ferramentas de montagens e personalização de imagens (photoshop), atrelada à rapidez e abrangência das redes sociais (facebook, twitter, blog´s), o que se tem visto em Campinas e no restante do país, é o uso desenfreado e criminoso de imagens dos candidatos em montagens difamatórias, que são objetos de reparação no Poder Judiciário:

USO INDEVIDO DE IMAGEM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS Folheto de propaganda eleitoral do réu (então candidato a prefeito de Osasco) contendo fotografia da autora e dizeres a ela atribuídos (e por ela negados) (o que afasta a alegada- Ausência de autorização desta última para tal veiculação - Finalidade institucional) Configuração - Indenização devida Desnecessidade de demonstração dos prejuízos, que residem na própria utilização indevida da imagem - Proteção constitucional do direito à imagem dá ensejo aos pleitos indenizatórios postulados na exordial (artigo 5º, X, da CF/88) Precedentes - Fixação em 20 salários mínimos Montante que não se mostra excessivo e atende à finalidade da indenização, não ensejando, de outra parte, o enriquecimento indevido da autora Sentença mantida Recurso improvido.5ºXCF/88

(389141020088260405 SP 0038914-10.2008.8.26.0405, Relator: Salles Rossi, Data de Julgamento: 29/09/2011, 8ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 30/09/2011)

Mas isso não se traduz automaticamente em crime na internet, como visto abaixo:

“REPARAÇÃO DE DANOS PUBLICAÇÃO. ARTIGOS. INTERNET. DISPUTA ELEITORAL.I - DURANTE O PERÍODO DE ELEIÇÕES, É COSTUMEIRO QUE A ANIMOSIDADE E A RIVALIDADE ENTRE OS CANDIDATOS DA SITUAÇÃO E DA OPOSIÇÃO LEVEM SEUS INTEGRANTES A EXALTAREM-SE MUTUAMENTE EM PALAVRAS RÍGIDAS, MAS QUE, NO PROCESSO EM EXAME, NÃO CARACTERIZAM, PORQUE REALIZADAS EM AMBIENTE DE DISPUTA ELEITORAL, OFENSA APTA A CONFIGURAR DANO MORAL.II - APELAÇÃO IMPROVIDA.” (783254420058070001 DF 0078325-44.2005.807.0001, Relator: VERA ANDRIGHI, Data de Julgamento: 05/05/2010, 1ª Turma Cível, Data de Publicação: 18/05/2010, DJ-e Pág. 63)

No tocante a competência para ao julgamento dessas demandas, se na Justiça Comum ou na Justiça Eleitoral, será necessário perquirir se os fatos inverídicos e/ou a imputação ofensiva ao político ou partido, ocorreram no período eleitoral ou as vésperas dele, bem como se a finalidade das ofensas era ocasionar o desequilíbrio eleitoral. Em caso positivo, a demanda será processada pela Justiça Eleitoral, senão seguirá a regra geral, devendo ser julgada pela Justiça Comum.

Como critérios para a fixação a sentença, o grau de culpabilidade e reprovação das condutas, o juiz deverá ater-se aos princípios constitucionais em xeque, tais como a liberdade de expressão, o direito a informação, a dignidade da pessoa humana e o direito a honra, sopesando o grau de culpa e extensão do dano e desnudando os reais interesses das partes envolvidas. Isto porque o país tem revivido um período de falso moralismo e censura exacerbada nos meios de comunicação, gerando denúncias e demandas que visam tão somente impedir a ciência e divulgação dos crimes praticados numa tentativa de santificação artificial dos políticos.

Contudo, o volume dessas demandas indenizatórias comuns não se reflete na seara eleitoral, vez que os partidos e seus políticos ainda têm resistência ao ajuizamento dessas ações, tendo em vista que causam uma imagem ainda mais negativa sobre os demandantes, que passam a ser encarados como perseguidores ou associados aos políticos de regimes totalitaristas e antidemocráticos.

Sem contar que, invariavelmente, além das exceções de verdade, incidem diversas excludentes de culpabilidade ou ilicitude e a possibilidade de compensação das culpas, se recíproco, ainda que extemporâneos e não relacionado aos mesmos fatos.

Nesse contexto, o meio e a possibilidade ou não de apuração dos eleitores afetados, onde é empregada a calúnia, difamação ou injúria é relevante porque também pode configurar a propaganda eleitoral negativa, antecipada ou regular e ajudam nos critérios de fixação do quantum devido na indenização.

O embaraço deverá ser analisado então sobre diversos aspectos, a princípio independentes entre si, visto que a condutas podem percorrer apenas a via criminal da justiça comum, eleitoral, ainda sem prejuízo da demanda cível e administrativa reparatórias.

Quanto a questão probatória, a divulgação de informações prejudiciais à pessoa pública não implica, automaticamente, prejuízo de natureza política, sendo necessária a comprovação da ocorrência de dano à honra objetiva ou subjetiva da vítima.

A jurisprudência selecionada pelo próprio Tribunal Superior Eleitoral - TSE, traz luz ao tema, senão vejamos:

“Habeas corpus. Crime. Arts. 325 E 326 do Código Eleitoral. Ofensa veiculada na propaganda eleitoral. Tipicidade. Competência da Justiça Eleitoral. 1. Para a tipificação dos crimes de difamação e injúria eleitorais, previstos nos arts. 325 e 326 do Código Eleitoral, não é preciso que a ofensa seja praticada contra candidato, uma vez que a norma descreve as condutas de difamar e injuriar alguém, sem especificar nenhuma qualidade especial quanto ao ofendido. 2. O que define a natureza eleitoral desses ilícitos é o fato de a ofensa ser perpetrada na propaganda eleitoral ou visar a fins de propaganda. [...]”(Ac. de 14.12.2010 no HC nº 187635, rel. Min. Aldir Passarinho Junior.)(sublinhado)

“Denúncia. Difamação. 1. Em virtude do elemento normativo ‘visando a fins de propaganda’, constante do art. 325 do Código Eleitoral, o crime de difamação pode ocorrer em contexto que não seja ato tipicamente de propaganda eleitoral. 2. Demonstrados indícios de autoria e materialidade, a configurar, em tese, o crime previsto no art. 325, combinado com o art. 327, III, do Código Eleitoral, a denúncia deve ser recebida. Recurso especial provido.”

(Ac. de 27.5.2010 no REspe nº 36.671, rel. Min. Arnaldo Versiani.)(sublinhado)

O TSE ainda faz referência a outra jurisprudência onde mostra uma das milhares de excludentes de culpabilidade passíveis de argüição:

“Ação penal. Crimes contra a honra. Decisão regional. Procedência parcial. Recurso especial. Alegação. Violação. Art. 324 do Código Eleitoral. Calúnia. Não-configuração. Imputação. Ausência. Fato determinado. 1. A ofensa de caráter genérico, sem indicação de circunstâncias a mostrar fato específico e determinado, não caracteriza o crime de calúnia previsto no art. 324 do Código Eleitoral. [...]”

(Ac. de 31.10.2006 no AgRgREspe nº 25.583, rel. Min. Caputo Bastos.)(sublinhado)

O governador Agnelo Queiroz do Partido dos Trabalhadores – PT teve o pedido de indenização por danos morais negado contra a revista Época, contra a matéria “Um Candidato Enrolado”, que era considerado por ele como difamatório, mas a juíza considerou que não havia abuso no exercício do direito porque a notícia apenas informou a suspeita e que as declarações do imposto de renda não comprovavam a renda suficiente para a aquisição. Sem o emprego de adjetivos ofensivos à honra do autor, mas mera narração dos fatos, com intenção de narrar e informar a sociedade os fatos, o processo foi julgado improcedente. O “animus narrandi” prevaleceu. (Processo n.º 2010.01.1.128347-3)

Em outras oportunidades os partidos foram obrigados a indenizar por danos morais, tal como o Partido Republicano Progressista – PRP, indenizou em R$ 5.000,00 mil reais o senhor G.M.C.H, por divulgação e uso indevido de imagem. E, neste caso sequer fazia menção negativa, mas o juiz considerou que o simples uso da imagem já caracterizava o dano moral, dado o caráter personalíssimo. (Processo nº1.0134.08.105277-8/001). O PT moveu ação contra José Serra, por ter, em tese, sido acusado de criar um dossiê contra o candidato. O mesmo partido já processou o PSDB e o candidato da época Índio da Costa por ofensas a Dilma Rousseff, onde aquele afirmou em entrevista que o “Partido dos Trabalhadores (PT) tem ligação com o narcotráfico e com os guerrilheiros das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) e que estaria ligado ao que há de pior”. Além disso, o candidato a vice-presidente pelo PSDB afirmou que Dilma Rousseff usa a máquina do governo em eventos de campanha (RESP 187.987), e a revista Free São Paulo por difamação e calúnia por matéria sobre Celso Daniel, que tinha o nome “Por trás de um crime”, o jornalista Gil Campos afirmava que o prefeito de Santo André, “era idealista e envolvido no esquema do caixa 2″ e que, “embora tivesse a consciência disso, acreditava que a arrecadação de dinheiro ilicitamente justificava o projeto político do seu grupo”.

As pessoas públicas, pela própria natureza da profissão e necessidade de promoção e exposição pessoal são mais suscetíveis a críticas, mas não perdem o direito à honra. O limite para a informação é o da honra da pessoa física ou jurídica afetada. Críticas indiscriminadas e levianas devem ser rechaçadas, ressalvadas aquelas tuteladas pelas exceções e feitas no calor natural das discussões eleitorais. No caso de caracterização da infração ofensiva, o direito de resposta e a recomposição pela condenação por danos morais são instrumentos reparatórios que tem forçado a mudança de postura dos políticos brasileiros, ainda que de forma quase imperceptível. A crescente formação de um eleitorado mais exigente e consciente, que tem privilegiado propostas e currículos dos candidatos em detrimento de ofensas à parte contrária também reflete a mudança de postura dos participantes das campanhas eleitorais.

Fontes

Tribunal Superior Eleitoral

Agência Estado

Sobre o(a) autor(a)
Guilherme Pessoa Franco de Camargo
Guilherme Pessoa Franco de Camargo
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