Desmistificando o uso do celular em estabelecimentos penais
O celular despertou o interesse do crime organizado, o qual utiliza-o como uma arma poderosa, de eficiência incontroversa, no interior dos estabelecimentos penais. Acerca das legislações já em vigor e recém sancionadas, se motivam estas breves linhas.
Introdução
O telefone foi criado por Alexander Graham Bell em 1875. Professor de surdos-mudos, ele fazia experiências com um telégrafo harmônico quando seu ajudante, Thomas Watson puxou a corda do transmissor e emitiu um som diferente. O som foi ouvido por Bell do outro lado da linha. Estava assim inventado o telefone.[1]
No Brasil, o primeiro celular foi lançado na cidade do Rio de Janeiro em 1990, seguido pela cidade de Salvador. Segundo a UIT - União Internacional das Telecomunicações, o Brasil é o sexto maior mercado do mundo em telefonia celular e atualmente conta com mais de 152 milhões de aparelhos em uso. [2]
Porém, o celular despertou o interesse do crime organizado, o qual utiliza-o como uma arma poderosa, de eficiência incontroversa, no interior dos estabelecimentos penais. Acerca das legislações já em vigor e recém sancionadas, se motiva estas breves linhas.
O diretor de penitenciária e o agente público
Com o advento da lei nº. 11.466, de 28 de março de 2007, o Estado, numa tentativa de resposta à sociedade, iniciou uma branda caminhada em amordaçar o livre acesso dos detentos aos telefones celulares no interior das penitenciárias. Eis o texto de lei:
Art. 319-A do CP
Deixar o Diretor de Penitenciária e/ou agente público, de cumprir seu dever de vedar ao preso o acesso a aparelho telefônico, de rádio ou similar, que permita a comunicação com outros presos ou com o ambiente externo: Pena: detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano.
Assim, passa a ser considerado crime a conduta do diretor de penitenciária ou congênere e do agente de presídio que deixar de cumprir seu dever de vedar ao preso o acesso a aparelho telefônico, de rádio ou similar, que permita a comunicação com outros presos ou com o ambiente externo. Dessa forma, o art. 319-A criminaliza a conduta daquele que, tendo o dever legal de impedir o acesso do preso ao aparelho telefônico, rádio ou similar, torna-se omisso.
O condenado a pena privativa de liberdadeNo mesmo diploma legal, ou seja, na lei nº. 11.466, o legislador tratou do preso quando flagrado portando aparelho de telefonia celular ou congêneres, incluindo o inciso VII no art. 50 da LEP, passando a considerar falta grave, o condenado à pena privativa de liberdade que “tiver em sua posse, utilizar ou fornecer aparelho telefônico, de rádio ou similar, que permita a comunicação com outros presos ou com o ambiente externo”.
Eis a legislação:
Lei de Execuções Penais
Art. 50 - Comete falta grave o condenado à pena privativa de liberdade que:
VII – tiver em sua posse, utilizar ou fornecer aparelho telefônico, de rádio ou similar, que permita a comunicação com outros presos ou com o ambiente externo.
Assim, estará o condenado sujeito a uma série de conseqüências, como a perda dos dias remidos, a impossibilidade da concessão do livramento condicional pela ausência de comportamento satisfatório e da progressão de regime, bem como ensejará a regressão de regime.
Lei nº. 12.012 de 2009
Ainda na tentativa de fechar o cerco contra o crime organizado, o Estado sancionou a lei nº. 12.012 de 6 de agosto de 2009, objetivando coibir a facilidade com que os presos têm acesso ao celular dentro dos estabelecimentos prisionais, bem como punir penalmente aqueles que tentem adentrar os muros dos presídios com os aparelhos, pois a única punição para esse visitante era, até então, a proibição de retornar na mesma unidade para novas visitas.
Eis a legislação:
Lei nº. 12.012
Art. 1o Esta Lei acrescenta ao Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal Brasileiro, no Capítulo III, denominado Dos Crimes Contra a Administração da Justiça, o art. 349-A, tipificando o ingresso de pessoa portando aparelho telefônico de comunicação móvel, de rádio ou similar, sem autorização legal, em estabelecimento prisional.
Art. 2o O Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, passa a vigorar acrescido do seguinte art. 349-A:
“Art. 349-A. Ingressar, promover, intermediar, auxiliar ou facilitar a entrada de aparelho telefônico de comunicação móvel, de rádio ou similar, sem autorização legal, em estabelecimento prisional.
Pena: detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano.”
A inserção do art. 349-A do Código Penal tem relação direta com o crime do art. 319-A, do mesmo diploma legal, introduzido pela Lei n. 11.466/2007, onde pune com iguais conseqüências penais “o Diretor de Penitenciária e/ou agente público que deixar de cumprir seu dever de vedar ao preso o acesso a aparelho telefônico, de rádio ou similar, que permita a comunicação com outros presos ou com o ambiente externo”.
Dessa forma, e certamente mais condigna aos ditames do princípio da razoabilidade, passou o legislador a criminalizar a conduta de quem introduz o aparelho celular nos limites penitenciários.
Ademais, advogamos que o diretor de penitenciária ou o agente penitenciário que praticar quaisquer dos verbos núcleos do art. 349-A do CP, quais sejam, ingressar, promover, intermediar, auxiliar ou facilitar, responde em concurso material com o art. 319-A do mesmo codex, uma vez que também deixa de cumprir seu dever de vedar ao preso o acesso a aparelho telefônico, de rádio ou similar, que permita a comunicação com outros presos ou com o ambiente externo.
Conclusão
Ademais, nem a legislação já vigente, nem mesmo a novel lei, criminaliza a conduta do interno em estar fazendo uso de aparelho celular ou congênere. Tão somente, neste caso, recebe o interno uma reprimenda administrativa. Quem sofre as conseqüências persecutórias penais são aqueles que tem o dever de impedir, ou seja, os diretores de penitenciárias e agentes.
Com o advento da lei nº. 12.012, qualquer pessoa que ingressar, promover, intermediar, auxiliar ou facilitar a entrada de celular ou congênere em estabelecimentos prisionais também estará sujeito aos rigores da lei, ou seja, à detenção de três meses a um ano. Data vênia, os procedimentos encontram-se sob os maleáveis sabores da lei nº. 9.099, por serem crimes de menor potencial ofensivo, o que, ao nosso entendimento, trata-se de patente desproporcionalidade.
Como já esposado noutro artigo, continuo afirmando que é impreterivelmente preciso que a pena seja proporcional ao delito e também se faz necessário que a medida da proporcionalidade se estabeleça com base na importância social do fato delituoso, ou seja, proporcional a sua nocividade social. [3]
Bibliografia
MAFFEI, Fabiana. O uso do celular. Disponível em: www.projetos.unijui.edu.br.
MUSEU DO TELEFONE. Disponível em: www.museudotelefone.org.br/celular.htm.
PRESIDENCIA DA REPUBLICA - Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil
CHAGAS, José Ricardo. As Penas no Ordenamento Jurídico Brasileiro à Luz do Princípio da Proporcionalidade. Disponível em: http://jusvi.com/artigos/41061
[1] MAFFEI, Fabiana. O uso do celular. Disponível em: www.projetos.unijui.edu.br.[2] Museu do Telefone. Disponível em: www.museudotelefone.org.br/celular.htm.
[3] CHAGAS, José Ricardo. As Penas no Ordenamento Jurídico Brasileiro à Luz do Princípio da Proporcionalidade. Artigo publicado na Revista Jus Vigilantibus. Disponível em: http://jusvi.com/artigos/41061